PRINCIPAL EQUIPE LIVRO DE VISITAS LINKS ARQUIVO DE ATUALIZAÇÕES ARQUIVO DE COLUNAS CONTATO |
|||
SAMBA-ENREDO BARROCA ZONA SUL 2022
por Bruno Malta
Se inscreva no canal SAMBARIO no YouTube
Coluna anterior: Os Sambas-Enredo de São Paulo 2022 - Vila Maria Coluna anterior: Os Sambas-Enredo de São Paulo 2022 - Tatuapé Coluna anterior: Os Sambas-Enredo de São Paulo 2022 - Gaviões da Fiel Coluna anterior: Os Sambas-Enredo de São Paulo 2022 - Grupo Especial Para
o próximo Carnaval, o Barroca Zona Sul apresenta um enredo sobre
a entidade Zé Pelintra onde o foco foge dos clichês do
misticismo da figura e embarca numa quase biografia sobre quem foi a
pessoa e como ela virou santidade para os devotos da Umbanda.
História de Zé Pelintra em formato de curta-metragem
O enredo A temática falará da figura do Zé Pelintra de maneira biográfica. Nascido no sertão pernambucano, sofreu um revés na seca e se viu sozinho. De lá, partiu para o Porto e conseguiu sobreviver. Após um tempo, partiu para o Rio de Janeiro. A história mais aceita dessa entidade é que ele tenha nascido no povoado de Bodocó, sertão pernambucano. E sua família precisou mudar para Recife, devido a uma grande seca que devastou toda a região. Infelizmente, quando menos esperava, o menino José dos Anjos perdeu toda sua família, vítima de uma doença desconhecida. Sem ter para onde ir, se criou no rua no meio do porto, se sustentando como podia. Dormia em meio a malandragem e trabalhava como garoto de recados, cresceu tendo a noite em suas mãos: amava os jogos e as mulheres. Zé possuía grande habilidade com facas, ninguém tinha coragem de enfrentá-lo, era temido até mesmo pela polícia. Na juventude, decidiu então mudar-se para o Rio de Janeiro, e logo passa a ser conhecido nas áreas boêmias da cidade. O caboclo de sangue quente encontra-se em um cenário de transformação, onde os mais pobres começam a povoar pedaços das cidades em desenvolvimento, surgindo assim as favelas. Exímio conhecedor de tratamentos com ervas (adquirido entre o povo nordestino), temido nas mesas de jogos e apostas, e principalmente um grande galanteador, não se sabe ao certo como aconteceu o assassinato da figura, mas pode-se afirmar que foi pelas costas. Pois não havia ninguém no litoral carioca capaz de enfrentar o Pelintra frente a frente. Sua morte, até hoje, é um mistério. Para os devotos, o Zé vive pelos becos e vielas sempre protegendo aqueles que precisam dele. Samba-Enredo Gravação do Estúdio Samba ao vivo Compositores: Sukata, Thiago Morganti, Thiago Meiners, Marcos Thiago, Jairo Roizen, Luan, Pixulé e Emerson Franco (in memorian) Intérprete: Pixulé Letra do samba Axé, quando a noite alumia Vou seguir a caminhada carregando a tua guia Eis o Pilintra sob o clarão da lua Nosso povo toma a rua, louvação se inicia Laroyê, Exu…pra quem quiser chamar Saravá, Saravá, Mojubá A seca castigava sua terra Nessa vida severina vai buscar a liberdade Salve a Jurema no sertão do catimbó O destino dá um nó e num “Porto” de saudade Partiu e abraçou novo terreiro Vestiu a malandragem lá no Rio de Janeiro Zé Pilintra, Zé Pilintra, boêmio da madrugada É o rei do carteado e também da encruzilhada Zé Pilintra, Zé Pilintra do sapato bicolor Juramento de malandro é fugir do desamor Acende o candeeiro As almas de umbanda iluminam o congá Nas sete linhas, a responsabilidade A fé reflete a paz de Oxalá Tu és o grito das favelas Entre becos e vielas A voz do povo sofredor Quem me protege não dorme Meu redentor! Quando o couro do tambor, arrepia Abre a gira pra saudar meu protetor Incorpora na avenida A Barroca é quem te chama Salve Zé Pilintra de Aruanda (Respeite quem veio vencer demanda!) Análise Para o próximo Carnaval, o Barroca Zona Sul apresenta o belo enredo “A evolução está na sua fé…Saravá, seu Zé!” que aborda a entidade Zé Pelintra onde o foco foge dos clichês do misticismo da figura e embarca numa quase biografia sobre quem foi a pessoa e como ela virou santidade para os devotos da Umbanda. A trilha sonora do desfile completa a trilogia de encomendas para a parceria de Sukata, Thiago Morganti, Thiago Meiners, Marcos Thiago, Jairo Roizen, Luan, Pixulé e Emerson Franco. A parceria, sempre competente, consegue sair do seu lugar-comum e entrega uma composição que é forte, mas tem balanço e, acima de tudo, transmite a mensagem com a especificidade que ela se propõe: Descrever sem esquecer da devoção. Na narrativa imposta pela letra, o samba transcreve a vida do malandro em terceira pessoa, como se tivesse clamando pela sua chegada. O início parte com um “axé, quando a noite alumia // vou seguir a caminhada carregando a tua guia” que praticamente impõe um desejo de seguir os passos da vida do homenageado. A partir daí, a obra se qualifica para exaltar a trajetória com uma ótima sequência com “louvação se inicia” e o pedido de “proteção” para a entidade Exu a seguir. Devidamente protegido, é hora de partir para mostrar quem foi a figura. A narrativa, passa então, a mergulhar na vida do José Pereira que sem ainda ser a “entidade”, é transcrito com as dificuldades que encontrou. A vida no sertão pernambucano é contada com os versos “a seca castigava sua terra // nessa vida severina via buscar a liberdade”. No momento seguinte, o início da transformação com José vivendo sozinho no meio do porto da capital de Pernambuco. Lá, o menino se transforma em homem, ganha ares de lenda e se muda para o Rio de Janeiro. No samba, essa transição é feita com clareza nos versos “partiu e abraçou novo terreiro // vestiu a malandragem lá no Rio de Janeiro” onde a melodia sobe de tom para ganhar desenhos mais festivos que remetem a pontos de umbanda, relembrando a boemia que se torna a vida dele nessa fase. O refrão central é repetido, mas tem um falso bis proposital. A partir dele, o José vira o Zé Pilintra e demonstra toda sua magia. A boêmia na madrugada, o rei do carteado e da encruzilhada, o sapato bicolor, as paixões que deixa pelo caminho, tudo isso é mencionado de forma direta, quase em formato de lista — Zé Pilintra, Zé Pilintra, boêmio da madrugada // É o rei do carteado e também da encruzilhada // Zé Pilintra, Zé Pilintra do sapato bicolor // Juramento de malandro é fugir do desamor — , mas se conectando muito bem na construção. As células da melodia são desenhadas com variações de tom com uma repetição que envolve e traz todo o ar do gingado da malandragem, mas que no verso final prepara já a descida para o início da estrofe a seguir. É excelente! Na segunda estrofe, a história se propõe a mostrar o legado. Se a entidade já existia, é hora de saber o que ela construiu. Sem cair em clichês, traz dois momentos distintos. O primeiro mais religioso aparece nos quatro primeiros versos com “acende o candeeiro // as almas da umbanda iluminam o congá // nas setes linhas, a responsabilidade // a fé reflete a paz de Oxalá” que mostram o que a entidade virou na Umbanda, onde é cultuado em rituais opostos; O primeiro o apresenta como um Exu junto do próprio e de pomba-gira. O segundo, lhe traz como malandro junto de caboclos e preto-velhos para tirar energias negativas, como “pede” Oxalá. A seguir, três versos lembram do lado social da figura que era conhecida como “advogado dos pobres”. Nesse sentido, aparece “tu és o grito das favelas entre becos e vielas // a voz do povo sofredor”, falando de sua postura. No fim, a estrofe fecha com o famoso ditado “Quem me protege não dorme” e o exalta com um forte “meu redentor” que faz associação dele a famosa figura do Cristo Redentor, símbolo da cidade que o abrigou. Para finalizar uma narrativa com começo, meio e fim, o refrão principal conclama a chegada do homenageado “ao desfile”. Com os versos “quando o couro do tambor, arrepia // abre a gira para saudar meu protetor // incorpora na avenida, a Barroca é quem te chama” a ideia se fecha com a chegada de Zé Pelintra. Percebam: O início abre pedindo licença, depois apresenta a trajetória do José, a transformação em Zé, o legado religioso e social e fecha o trazendo para “incorporar” na avenida, afinal é preciso “respeitar quem veio vencer demanda”, como diz a própria composição. Um espetáculo. Uma proposta que brilha de ponta a ponta e desenha com toda competência os momentos da trajetória, inclusive com células que permeiam cada momento com clareza. Trazendo, inclusive, em determinados momentos, tons relativos ao samba de roda, tão amado pelo homenageado. Nesse cenário, é seguro dizer que das três encomendas (2019 — Okê Arô, 2020 — Benguela… A Barroca clama a ti, Tereza! e 2021 — A evolução está na sua fé…Saravá, seu Zé!) foi nessa que a parceria foi mais feliz. A palavra equilíbrio é a mais adequada para definir essa trilha. Com pertinência na construção e sem esquecer das ousadias tão essenciais no gênero, o grupo que a compôs construiu um samba praticamente perfeito. Praticamente justamente por um detalhe. O nome Zé Pilintra é repetido quatro vezes com a repetição do central e mais duas vezes no principal. São seis vezes. Isso multiplicado pelo número de passadas na avenida cansa com o passar do tempo e atrapalha a riqueza poética da obra (-0,1 riq.poé). De todo modo, servindo bem ao canto no desfile — como os últimos — e também, sem dúvida alguma, buscando a fuga dos clichês e dos desenhos melódicos previsíveis — algo que tinha virado constante nos últimos dois sambas da agremiação que, mesmo com qualidade, não geravam empatia ao ouvinte — a composição da verde-e-rosa é a mais completa da temporada. Nota: 9,9 Falhas: ⦁ Riqueza Poética: -0,1 Bruno Malta |
Tweets by @sitesambario Tweets by @sambariosite |