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O DIA EM QUE A CUBANGO (QUASE) REEDITOU O ITA
         

4 de novembro de 2024, nº 93


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O DIA EM QUE A CUBANGO (QUASE) REEDITOU O ITA

Qualquer pessoa no planeta, incluindo aquelas que tem zero identidade com o carnaval, sabe cantar ou pelo menos conhece os famosos versos “Explode coração / Na maior felicidade / É lindo o meu Salgueiro / Contagiando, sacudindo esta cidade”. Favas contadas. É um dos sambas mais famosos do carnaval, que levou o Salgueiro ao campeonato de 1993 e consagrou um dos maiores desfiles da história da Sapucaí. Mas disso qualquer pessoa no planeta – até quem não tem afinidade com as escolas de samba - sabe.

 

Mas uma história que quase ninguém conhece é que faltou muito pouco para o velho Ita voltar a Sapucaí 21 anos depois. Mas não pelas mãos da escola que o consagrou.

 

O histórico “Peguei um Ita no Norte” do Salgueiro – “Explode Coração” para os íntimos – quase foi reeditado pela Cubango em 2014 (Foto: Leonardo Aversa/Agência O Globo)

 

Era o longínquo abril de 2013 quando começou a se ventilar na imprensa a possibilidade da Acadêmicos do Cubango reeditar “Peguei um Ita no Norte” para o carnaval de 2014, quando desfilaria mais uma vez na atual Série Ouro. O fato, inclusive, é citado no verbete da escola no Wikipédia, usando como referência matérias publicadas à época pelo site Carnavalesco. “Em 2014, foi especulado que a escola reeditaria o enredo Peguei um Ita no Norte, que deu ao Salgueiro, o título no carnaval de 1993 e apostando no carnavalesco Márcio Puluker para conquistar o inédito acesso ao Especial. Mas a ideia acabou rechaçada pela direção da escola, que decidiu por apostar em mais um enredo afro”, diz o artigo. As reportagens em questão não estão mais no ar, porém seus anúncios em redes sociais continuam ativos.

 

 

Mesmo em uma época em que a conhecida “bolha do carnaval” não era tão grande quanto nos tempos atuais, só a possibilidade já gerou muitas reações (a maioria delas, claro, negativas) via Twitter – quando este ainda era um ambiente muito mais saudável. “Sério que a Cubango quer reeditar o Ita do Salgueiro (popular "Explode Coração"). Pra uma escola com tantos sambas antológicos, triste...”, escreveu o editor-chefe do SAMBARIO Marco Maciel. “Se eu sou compositor da Cubango, principalmente, compositor campeão da Cubango e ela reedita samba do Salgueiro eu deixo a escola”, disse o compositor e hoje autor de teatro Aloísio Villar. “Cubango estudando reeditar o "Ita" do Salgueiro. Por que não "Fruto do Amor Proibido" [samba de 1981] que é da escola e muito mais samba?”, questionou à época Pedro Migão, do Blog Ouro de Tolo. Há quem preferiu levar pro lado da gozação, como o amigo internauta Yuri Fareli: “Paraíso do Tuiuti com Kizomba, Cubango com o Ita... Já já a Tradição vai anunciar mais uma reedição da Portela...”

 

Aqui cabe um parênteses: de fato, a Tradição reeditou. Mas não foi um samba da Portela como sugerido...

 

Fato é que em 25 de maio de 2013 a Cubango apresentou oficialmente seu enredo pro carnaval seguinte. E não era o Ita. “Continente Negro - uma epopeia africana” foi o tema escolhido e desenvolvido. “Depois de quatro carnavais sem apresentar um enredo com sua característica mais marcante, a íntima relação com o continente africano, a Acadêmicos do Cubango voltará a abordar a temática em 2014.”, diz um trecho da matéria do site Carnavalesco publicada no dia seguinte ao lançamento do enredo.

 

 

Mas afinal, a possibilidade do Ita ser cantado pela escola de Niterói realmente existiu? O carnavalesco cubanguense daquele 2014 confirma que sim. “Era uma ideia quando eu cheguei. Devido a admiração e amizade que nosso patrono na época tinha pela Regina [Celi, presidente do Salgueiro à época], existiu a possibilidade dessa homenagem. Assim como foi a contratação e a parceria com o Carlinhos Salgueiro, que foi valioso para minha estreia na Sapucaí”, recorda Márcio Puluker em depoimento exclusivo ao SAMBARIO.

 

Hoje atuando no carnaval de Vitória, Márcio Puluker foi o carnavalesco da Cubango em 2014. (Foto: Acervo Pessoal)

 

Se em 2025 estará desenvolvendo o desfile do Império de Fátima no carnaval de Vitória, onze anos atrás o carnavalesco era um estreante no Rio de Janeiro. Puluker ainda revela que uma iniciativa própria fez a Cubango abandonar a reedição e apostar num enredo inédito: “Uma proposta minha do enredo foi para avenida. Fui conversar com nosso patrono [Marcelo Calil, atual presidente de honra da Viradouro] na casa dele quando expus que para a minha estreia seria bacana já imprimir minha marca, um enredo autoral. Já fui munido de sinopse, ideias e uma provável logo. Disse que era um enredo campeão e que não cabia reeditar pois ninguém jamais irá superar. Era único e deveria continuar inédito”. O argumento do artista acabou prevalecendo. E convencendo. “Ele leu minha sinopse e pediu quatro dias para decidir. Em dois dias ele me ligou e disse que optou pela minha ideia. Aí foi só alegria!”, orgulha-se Puluker.

 

Embalado pelo “Bate no tambor ôôô / Canta pra saudar Alafiá”, a Cubango entrou na avenida para encerrar aquela Série A já sob o amanhecer do domingo de carnaval. “Saiu um baita carnaval, pena que desfilamos a luz do dia... sem sol, mas numa manhã nublada. Foi o carnaval que fiz com recurso menor que o ano anterior, mas que me deu uma imensa satisfação de trabalhar com a família Calil e sentir o quanto são sérios em gestão de carnaval”, recorda o carnavalesco. A verde e branca terminou na quinta colocação.

 

“Continente Negro – uma epopeia africana”: o desfile da Cubango em 2014 (Foto: Gabriel Santos/Riotur)

 

O poeta popular sempre diz que o “se” não entra em campo nem cruza a faixa amarela da avenida. Mas “e se...” aquela Série A de 2014 tivesse reservado uma safra contendo releituras de clássicos do naipe de Kizomba, Sonhar com Rei dá Leão... e o Ita?



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Carlos Fonseca
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