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O CARNAVAL NA TV BRASILEIRA
. 1º Capítulo: Os Primórdios (Anos 60) . 2º Capítulo: Do Preto e Branco o Homem Coloriu (Anos 70) . 3º Capítulo: A Era da Televisão – Anos 80 (1ª Parte - 1980-1983) . 4º Capítulo: Aconteceu, virou Manchete – Anos 80 (2ª Parte: 1984-1987) . 5º Capítulo: Na Tela da TV no meio desse povo (Virada Anos 80/90) . 6º Capítulo: O Canto dessa Cidade é meu! (Anos 90) 22 de junho de 2020, nº 43 CAPÍTULO 6 – O CANTO DESSA CIDADE É MEU! (Anos 90)
Mil voltas o mundo tem “O
Canto da Cidade” (Daniela Mercury e Tote Gira) – a
canção foi a terceira mais ouvida no país em 1992.
Além
disso, os próprios festejos de Momo mostravam outra cara: um novo sotaque,
desta vez nordestino – mais precisamente soteropolitano – e cheio de dengo se
ajuntava à turma da folia um ritmo um pouco diferente dos sambas de enredo
ouvidos nas passarelas construídas em concreto. Ouviram
de Salvador, às margens da Bahia de Todos os Santos, um ritmo mais frenético,
igualmente percussivo, mas que ganhava a sonoridade de guitarras distorcidas e
teclados sintetizadores. O
merchandising também desembarcava com força (e muita espuma) e em doses
superlativas no carnaval brasileiro. A guerra comercial dos anúncios de TV
elegeu a cerveja, a bebida estival preferida dos brasileiros para brindar a
batalha carnavalesca. E
mais uma emissora resolve entrar no seleto rol da mídia eletrônica que passa a
apoiar o carnaval. E desta vez, é um canal com sotaque sulista que finca seu
estandarte nas plagas da Sapucaí para apoiar as entidades do grupo de acesso. A
Globo segue na manutenção de sua programação clássica de carnaval, mas a
Manchete deixa as passarelas do samba um pouco de lado e resolve investir no
carnaval baiano. Há quem diga que seria o início do fim da televisão da família
Bloch. Bem-vindos,
finalmente, à década de 90 na história do carnaval na TV brasileira. Manchete e a Era IBF (1992 – 1993) Desde
o início de suas operações, a Manchete passou por crises que eram provocadas
por altos gastos em produção de conteúdo. No entanto, em 1992, o canal passou
por sua primeira grande crise quando estreou sua nova grade de programação e
investiu pesado na telenovela “Amazônia”. A
megaprodução, escrita por Denise Bandeira e Jorge Duran, e dirigida por Tizuka
Yamasaki e Marcos Schechtman, foi levada ao ar de 10 de dezembro de 1991 a 29
de junho de 1992, às 21h30, substituindo “A História de Ana Raio e Zé Trovão”. “Amazônia”
reuniu um superelenco de astros e estrelas que contava, entre outros nomes, com
Marcos Palmeira, Cristiana Oliveira, Júlia Lemmertz, Leonardo Villar, Jussara
Freire, Antônio Abujamra, José de Abreu e Antônio Petrin nos papéis centrais. Noticiou-se
na época que a Rede Manchete teria investido 20 milhões de dólares na obra, com
o intuito de repetir o sucesso provocado pela novela “Pantanal” (exibida pela
própria emissora em 1990), um fenômeno da teledramaturgia brasileira. A trama era uma adaptação do livro de Márcio
de Souza, Galvez, o Imperador do Acre,
com o enredo da novela se passando entre os séculos 19 e 20. No
entanto, o que Amazônia gerou foi uma produção complicadíssima e um fiasco em
termos de audiência, apenas 2 pontos no Ibope. Audiência
em queda, enormes prejuízos em seu faturamento e dívidas acumuladas nos anos
anteriores. Este era o cenário desolador da emissora. Logo na estreia da Rede
Manchete, em 1983, Adolpho Bloch investiu 50 milhões de dólares na estrutura e
programação da emissora. Todo esse investimento, no entanto, não alcançou os
resultados esperados. Manchete e os programas de apelo
popular Três
anos depois da estreia, em 1986, já havia sido contabilizado um prejuízo de 34
milhões de dólares. Diante desse quadro, a administração Bloch decidiu investir
ainda mais na emissora, buscando mais recursos e investindo em atrações para as
classes mais populares. O sucesso adquirido com as atrações infantis,
principalmente com a exibição de seriados japoneses tokusatsu (termo em japonês para filmes ou séries que fazem um uso
forte de efeitos especiais) a partir de 1988, trouxeram recursos para a TV
Manchete, fundamentais para a manutenção da rede e para investimentos em outras
atrações. A
teledramaturgia, pelo fato de estar em alta nos anos de 1989 a 1991,
também
permitiu o crescimento da Rede Manchete e foi nessa época que
houve os sucessos
com “Kananga do Japão” (1989),
“Pantanal” (1990) e “A História de Ana Raio e
Zé
Trovão” (1991). No
entanto, à medida que a Manchete alcançou bons resultados no campo da teledramaturgia,
mais se investiu nesse segmento. É por esse motivo que se compreende o fato de
o prejuízo da novela Amazônia ter prejudicado tanto a rede. A baixa audiência da
novela não só afetou o faturamento da emissora, mas a deixou sem verbas para se
investir em outras produções. Dentro desse quadro, sem condições financeiras
para investir e com uma dívida crescente, Adolpho Bloch decidiu vender a Rede
Manchete, em junho de 1992. A compradora foi a Indústria Brasileira de
Formulários (IBF), presidida por Hamilton Lucas de Oliveira. O
empresário Hamilton Lucas de Oliveira nasceu em São Paulo, em 1950. Sua família
trabalhava no ramo gráfico e Hamilton também passou a trabalhar na gráfica de
sua família, chamada Triunfo. A empresa se especializou em imprimir formulários
contínuos, usados em contabilidade bancária e empresarial e bilhetes de
loteria. A
estratégia para o crescimento da gráfica consistia na aquisição de pequenas
gráficas em dificuldade financeira. Logo depois de comprá-las, a família de Hamilton
investia nelas para sanar as dividas e, a partir do momento em que começassem a
dar lucros, integravam o grupo gráfico. Foi desse modo que Hamilton uniu essas
empresas e formou a IBF de Hamilton, que em 1992, adquiriu a Rede Manchete de
Televisão. Passaram
para as mãos de Hamilton Lucas as cinco geradoras que compunham a TV Manchete (emissoras
em São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Recife e Fortaleza) e as rádios
que também pertenciam ao grupo Bloch. O empresário proprietário da IBF comprou por
70 milhões 49% da TV Manchete e passou, pelo acordo, a administrar a emissora
de televisão. O controle dos outros 51% da rede seria repassado após a quitação
de todas as parcelas estipuladas no acordo de venda. Diante
da grave crise econômica herdada da administração Bloch, logo no mês de julho de
1992 (com dívidas estimadas em mais de 150 milhões de dólares) a IBF demitiu
670 funcionários. Nessa época o único destaque da programação foi o programa “Clodovil
Abre o Jogo”, apresentado pelo estilista Clodovil Hernandes (1937 - 2009). A
Manchete decidiu apostar então suas últimas fichas em uma telenovela que
gerasse polêmica, mas que não fosse apelativa, mantendo a imagem de emissora
classe A. Reuniu os escritores José Louzeiro, Regina Braga, Eloy Santos e
Alexandre Lydia, propondo escrever uma releitura tragicômica sobre o processo
de impeachment que o então presidente Fernando Collor de Mello enfrentava. O
título escolhido foi “O Marajá” — palavra-chave em sua campanha.
Com
direção de Marcos Schechtman (que depois viria a dirigir as novelas globais O Clone e Caminho das Índias), a produção tinha a jornalista Mariana,
interpretada por Julia Lemmertz, como protagonista, revelando os bastidores do
poder. O presidente Elle era uma reprodução quase perfeita de Fernando Collor:
o ator era Hélcio Magalhães, que apesar da formação como jornalista, trabalhava
há três anos como sósia do presidente, fazendo comícios e campanhas
publicitárias. Além
de Collor, outros nomes presentes durante o impeachment foram parodiados;
Rosane Collor, a primeira-dama, foi parodiada como Ella, interpretada por Vânia
Bellas. Walter Francis interpretou PC, em referência a PC Farias (1945 - 1996).
A
novela foi gravada entre o final de 1992 e o início de 1993. Logo que ficou
pronta, já começou a ser anunciada na programação em chamadas durante os
intervalos comerciais. Porém, mesmo sem citar o nome de Collor, o recém-saído
presidente se ofendeu com a obra e recorreu à justiça. Com estreia programada para
as 21h30 de 26 de julho de 1993, a emissora só foi informada que o recurso de
Collor tinha sido aceito às 18h do mesmo dia. Uma
correria no departamento jurídico se instaurou. Enquanto tentavam cassar a
liminar, o Jornal da Manchete se estendeu por mais 20 minutos, esperando algum
parecer. Entretanto, a liberação só poderia ser feita depois do julgamento, que
duraria no mínimo 60 dias. Sem ter como preencher a programação, antecipou a
minissérie que passaria após a estreia de O
Marajá, frustrando a audiência que, curiosa, esperava pela nova novela. A
liberação só ocorreu em 1994 com acordos de cortes em cenas com referências
claras ao ex-presidente. Porém, Adolpho Bloch não teve interesse em exibir após
os cortes, alegando que os problemas arranjados com a família Collor e com o
Supremo Tribunal Federal só trariam ainda mais problemas a emissora, que já
estava sendo pautada para haver a cassação de sua concessão. O paradeiro das
fitas da novela é desconhecido e O Marajá
continua inédita. Carnaval Axé 1993 Na
época que a Rede Manchete amargava uma bela crise, graças à IBF, ela não
transmitiu (pela segunda vez em sua história) os desfiles das escolas de samba
do Rio de Janeiro. Então, foi pra Bahia mostrar o carnaval de Salvador. Paulo
Stein comandou a transmissão da folia soteropolitana em 1993. Como
não tinha a expertise do carnaval baiano, a Manchete se uniu com uma emissora local,
a TV Aratu, esta foi a primeira emissora a transmitir o carnaval de Salvador em
rede nacional em conjunto com a Rede Manchete no especial Carnaval Axé em 1993,
e também foi a primeira a transmiti-lo em alta definição em 2010. Eduardo
Ramos, que era um dos diretores da TV Manchete, conta no livro “Rede Manchete – Aconteceu, virou história”
– que, na fase IBF, ele e Jayme Monjardim fizeram a primeira grande transmissão
do Carnaval da Bahia, que intitularam de “Carnaval Axé”. “A
Globo havia garantido a exclusividade dos carnavais do Rio e São Paulo. Eram tradicionais
os flashes de Carnaval da Bahia. Mas a transmissão como um evento, a Manchete
foi a primeira. Eu fui para a Bandeirantes por causa do Carnaval da Bahia. Na
época, a Band rivalizava com a Manchete nessa cobertura, mas até então só na
parte jornalística. Em 93 nós entramos com o que existe no ar hoje, essa
transmissão de quatro dias diretos, 24 horas, fizemos isso naquela época. No
ano seguinte, a Bandeirantes me chamou pra fazer. E o de 94, eu fiz pela Band.”
A
experiência do Carnaval da Bahia deu tão certo, que a partir de 1994, a
Bandeirantes praticamente desistiu de fazer a cobertura dos desfiles do Rio e
de São Paulo (com exceção de 1999, como veremos mais adiante) e transformou a
festa baiana em uma tradição, transmitida ano após ano, levando o nome de Band
Folia. A
cobertura do carnaval baiano se deu em três grandes pontos: no Campo Grande, na
Praça Castro Alves e na Barra. Clodovil Hernandes fazia entrevistas ao vivo a
bordo de um saveiro. O estilista trabalhou na transmissão durante dois dias. No
terceiro, desistiu. Tânia Rodrigues, que na época era apresentadora do programa
“Almanaque”, assumiu o comando. Além de Jayme Monjardim e Eduardo Ramos, o
evento teve direção geral de Nilton Travesso. A
equipe da Manchete envolveu cerca de 200 profissionais. Na sexta-feira, dia 19
de fevereiro, às 17h, a emissora exibiu o desfile do bloco As Acadêmicas, em
Salvador. No sábado, domingo, segunda e terça, as transmissões do carnaval na
capital baiana tinham início ao meio-dia. Baianidade Nagô “Axé”...
mas o que seria exatamente isso? Um dos conceitos mais aceitos é de que o axé seria
uma geléia geral musical surgida no estado da Bahia na década de 1980, durante
as manifestações populares do carnaval de Salvador, que mistura frevo
pernambucano, forró, maracatu, samba-de-roda, pagode, reggae e ritmos afro
caribenhos, como o calipso. A
palavra “axé” é uma saudação religiosa usada no candomblé e na umbanda. Para
simplificar, vamos dizer que o termo significa energia sagrada. Expressão
corrente no circuito musical soteropolitano, o vocábulo foi anexado à palavra
da língua inglesa music em 1987 pelo
jornalista baiano Hagamenon Brito para formar um termo que designaria
pejorativamente aquele tipo de música dançante com aspirações internacionais,
surgida no estado em 1985 com o disco Magia,
de Luiz Caldas. Na
época, o estilo foi visto como algo depreciativo, mas, depois, foi aprovado
pelos produtores e artistas do gênero.
Com
o impulso da mídia, o “axé music” rapidamente se espalhou pelo país todo (com a
realização de carnavais fora de época, as micaretas), e fortaleceu-se como
indústria, produzindo sucessos durante todo o ano.
O Carnaval Axé da Manchete retratou um momento em que a música baiana se mantinha na crista da onda no país. Passavam na telinha artistas que viviam o auge do sucesso em todo o país, como Daniela Mercury, Carlinhos Brown, Chiclete Com Banana, Cheiro de Amor (com Márcia Freire como cantora principal), Banda Mel – hoje Bamdamel – e Banda Beijo (do então vocalista Netinho).
A
audiência que não morava na Bahia viu em primeiríssima mão a fama até então
regional de nomes como Ricardo Chaves e Margareth Menezes, e das bandas Asa de
Águia, Timbalada e Eva – esta última que tinha nos vocais uma bonita morena de
voz grave chamada Ivete Sangalo. O
telespectador se requebrou com os tonitruantes tambores dos blocos afro Olodum,
Ilê-Aiyê, Muzenza e Araketu, que mandavam ver ao som do samba-reggae, cuja
criação é atribuída ao músico Antônio Luís Alves de Souza, mais conhecido como
Neguinho do Samba (1955 - 2009).
Passou
a ouvir (e ver) falar em uma das principais atrações do Carnaval de Salvador –
os trios elétricos, cujos nomes esbanjavam criatividade: Crocodilo,
Papa-Léguas, Camaleão, Os Internacionais e Sabor de Amor. O
grande público pôde rever ainda artistas de sucesso da geração anterior à onda
axé – que se pode afirmar foram os pioneiros do ritmo anteriormente conhecido
como “deboche” ou “fricote” – como Luiz Caldas, Sarajane, Gerônimo, Cid
Guerreiro e Banda Reflexu’s. A
cobertura da Manchete também acompanhou ao vivo as apresentações dos “velhos”
Novos Baianos Moraes Moreira (1947 - 2020), Pepeu Gomes e Baby Consuelo; dos
sempre ícones Caetano Veloso e Gilberto Gil, bloco Filhos de Gandhy e o trio
elétrico de Dodô e Osmar. Tudo
sob as bênçãos do “Buda Nagô” Dorival Caymmi (1914 - 2008), que com sua calma,
cabelos brancos e ares de vovô bonachão personificava uma espécie de Oxalá carnavalesco
da folia baiana.
A
Prefeitura de Salvador concentrou seus investimentos, cerca de 3 milhões de
dólares (segundo o jornal Folha de São Paulo, na edição de 14 de fevereiro de
1993), em infraestrutura, saneamento, decoração e segurança. De acordo com o
Executivo Municipal soteropolitano, o movimento no período da festa foi da
ordem de 50 milhões de dólares, gerado por gastos com hotéis, alimentação e
venda de passagens de avião. Em
termos de comparação, na mesma edição da FSP, a Prefeitura do Rio investiu 8
milhões na organização da folia carioca, sendo que 65% do total foi tragado na
preparação do Sambódromo para o desfile das escolas de samba. Conforme a
coordenação do Carnaval do Rio, as cifras geradas no período foi de 200 milhões
de dólares. MANCHETE Narração: Paulo Stein. Nos
anos 90 tornou-se acirrada a rivalidade e o antagonismo entre aquelas que, na
época, eram as duas principais marcas de cervejas brasileiras e que há décadas
fazem parte do imaginário popular – a rigor desde que a propaganda começou a se
massificar no país, a partir dos anos 50/60. Os
bons bebedores se dividiam em opinar qual era a melhor. A paulista Antarctica,
cujo rótulo continha o pinguim e a faixa azul? Ou a preferência iria para o
outro rótulo, o rubro, com a caneca espumante da popular e carioquíssima Brahma
Chopp?
E
o fenômeno passou a se repetir às vésperas do início de cada verão. A eterna
disputa entre as duas marcas extrapolou, ao longo dos anos, o campo puramente “cervejístico”. Na
década de 90, a disputa publicitária entre as cervejarias tomou ares de batalha
campal – foi chamada mesmo de “guerra das cervejas” – as agências responsáveis
pela imagem de cada uma das marcas disputavam copo a copo o mercado nacional. O
confronto Brahma versus Antarctica passou a ser jargão nos meios empresarial e
jornalístico para classificar concorrência acirrada, na qual uma ação sempre
correspondia a uma reação semelhante, numa cadeia interminável de campanhas,
filmes, outdoors, promoções e eventos. Em
1992, a guerra de malte e lúpulo chegou até o Carnaval do Rio de Janeiro.
Naquele ano, a Antarctica resolveu enfrentar a hegemonia da Brahma, que
mantinha um luxuoso camarote para recepcionar celebridades no Sambódromo da
Marquês de Sapucaí, o “Camarote Número 1”, o espaço mais famoso do carnaval
brasileiro. Durante
muitos anos, o Camarote da Brahma na Sapucaí funcionou anexo à fábrica que a
cervejaria possuía e que foi derrubada em 2011 para as obras de ampliação do
Sambódromo. Mas
o que a Antarctica havia montado do outro lado da avenida do samba não fez feio
e conquistou admiradores e, principalmente, a mídia. No
ano seguinte, a briga se intensificou. A “paixão nacional” voltou sua mira para
o Carnaval de Salvador e foi anunciante máster da cobertura carnavalesca da
Manchete de 1993, com a exibição exaustiva de comerciais estrelados pela principal
contratada, a musa Daniela Mercury, nos intervalos da programação. Já
a “número um” puxou a serpentina para o lado da Globo – como veremos mais
adiante – e se tornou anunciante máster da programação carnavalesca da Plim
Plim, com total monopólio na Marquês de Sapucaí e direito a jingle gravado por
outra cantora nordestina e também expert
em ritmos festivos: a paraibana Elba Ramalho.
Curiosidade:
apesar de ter sido fundada na cidade do Rio de Janeiro e ser anunciante da
Globo na transmissão do grupo especial do carnaval carioca em 1993, a Brahma só
se tornaria parceira comercial da Liesa no ano seguinte, quando sua logomarca
estampou a capa dos discos dos sambas de enredo do Primeiro Grupo nos anos de
1994 e 1995. Antes disso, a cervejaria preferida da Liga era a Kaiser, como
podemos observar a logo da empresa nas capas dos discos de 1989 a 1993. O
cessar-fogo entre os dois principais concorrentes do setor cervejeiro se deu em
de julho de 1999 quando o mercado foi surpreendido com a notícia da fusão entre
Brahma e Antarctica, movimento que resultou na formação da AmBev, ou Companhia
de Bebida das Américas. Alô, você! Uma
das marcas registradas das transmissões do carnaval da Globo nos anos 80 e 90
foi sem dúvida o jornalista, locutor e comentarista esportivo Fernando Vanucci.
O mineiro de Uberaba já era um rosto conhecido do público em rede nacional
desde 1977 quando, aos 26 anos de idade, passou a trabalhar no Rio de Janeiro,
na Central Globo de Jornalismo. Na
TV Globo apresentou vários jornais: Globo Esporte, RJTV, Esporte Espetacular,
Jornal Nacional, Jornal Hoje, Fantástico, Gols do Fantástico, entre outros. Em
1985, já com duas Copas do Mundo nas costas (cobriu os torneios de 1978, na
Argentina, e 1982, na Espanha), Vanucci foi escalado para a cobertura
carnavalesca da Globo. Foi um dos narradores do Carnaval da Globo de 1985 a
1999. Enquanto
esteve na Plim-Plim, o apresentador encarnava um tipo bem-humorado e criava frases
de efeito e bordões que caíram nas graças do grande público, quebrando o rígido
padrão Globo com sua informalidade. Quem
não se lembra de frases como “não tem lero-lero nem vem cá que eu também quero”?
Ou “tudo em nome da alegria”? Várias expressões de sua autoria figuraram no
vocabulário popular, como “esse até eu faria” – para aquele gol fácil perdido
pelo atacante. Sem falar do “schlap”,
que criou para o gol de cabeça. “Nas peladas de rua, para mim, esse era o
barulho da cabeça batendo na bola: schlap”,
explicava. Além,
é lógico, do mais célebre: “alô,
você, como é bom estarmos juntinhos de novo”.
O inefável bordão foi utilizado até como caco de
empolgação pelo cantor Maurício
Cem, puxador de samba no desfile da União da Ilha do Governador,
em 1993. Enquanto
conduzia a escola entoando o samba-enredo “Os maiores
espetáculos da terra”, o
intérprete insulano de vez em quando largava um “alô
você” no microfone ao
longo da avenida, ao que era prontamente respondido com outro
“alô você” na
transmissão televisiva pelo âncora da Rede Globo e autor
do bordão original,
Fernando Vanucci.
Fernando
Vanucci está casado desde 2001 com a amazonense Alessandra Terra. Entretanto, há
30 anos, o jornalista tinha fama de galã e conquistador. Mesmo
com 1,69 m de altura, uma calvície pronunciada e uma barriguinha persistente, Vanucci
teve inúmeras namoradas. Pelo menos três delas foram musas nos anos 80 e 90 e estamparam
a capa da revista Playboy: Suzane Carvalho, Marcella Prado e Marinara Costa.
Todas com alguma participação destacada em carnaval. Suzane
foi capa da revista masculina em 1982 e atuou em três novelas da TV Globo, além
de filmes, peças de teatro e programas de comédia. Depois, se dedicou ao
automobilismo, correndo na F-3, Stock Car e Indy Lights. Após deixar as pistas,
se tornou dona de um centro de treinamento de pilotos. Pouca gente sabe, mas
Suzane Carvalho é jornalista formada pela Faculdade de Comunicação Social da
PUC do Rio de Janeiro em 1982. Apresentou bailes de Carnaval e de Réveillon da TV
Bandeirantes (1988-1993) e desfilava sempre pela Beija-Flor, sua escola de
coração.
Marcella
foi uma das “Garotas do Fantástico” e duas vezes capa da Playboy em 1987. Além
de Vanucci, namorou o piloto de F-1 Ayrton Senna (1960 - 1994), de quem se
suspeitou da paternidade de uma filha. Ela abandonou a fama em meados dos anos
90, deixou o país e entrou para a Igreja. A musa desfilou pela Beija-Flor em
1988 e pela Grande Rio em 1993.
Marinara
Costa foi musa dos anos 90 e tirou a roupa para seis capas de revistas
masculinas. Participou de novelas e seriados da TV Globo e, no auge da fama,
chegou a ser candidata a deputada federal em 2002. Integrou o elenco do lendário
show “Básico Instinto” (1993), produzido pelo cantor e escritor carioca Fausto
Fawcett – no qual colocava mulheres lindas e louras dançando no palco, com a
participação de músicos e das musas-vocalistas Regininha Poltergeist, Kátia
Bronstein, além da própria Marinara, conhecida como “Explode Coração”. Ex-modelo
e policial civil, Marinara fez a Sapucaí babar em 1992 ao desfilar pela
Beija-Flor e, no ano seguinte, pela Grande Rio. Hoje leva vida fitness e atua em igreja. Com Vanucci, a
beldade teve uma filha chamada Júlia, que hoje é psicóloga.
Voltando
a Fernando Vanucci, em 1998, após entrar no ar ao vivo mastigando uma bolacha
em plena apresentação do Esporte Espetacular, foi para geladeira global, de
onde saiu para narrar o seu último carnaval (1999). Após isso, o jornalista e
apresentador foi demitido da emissora onde trabalhou por mais de 20 anos. Vanucci
trabalhou ainda na Band (1999 – 2001), Rede Record (2002), RedeTV! (2003 – 2011)
e desde agosto de 2014 passou a fazer parte da equipe da Rede Brasil de
Televisão, onde é o editor de esportes.
Em
abril de 2019, sofreu um infarto que o deixou muito debilitado. Debate global, modelo Manchete O carnaval
de 1993, a exemplo de 88, foi transmitido com exclusividade pela Globo.
Certamente, a Plim-Plim se inspirou e se espelhou novamente no modelo Manchete
para compor a programação carnavalesca. Dois
domingos antes do carnaval, a emissora organizou um debate reunindo os 14
carnavalescos das escolas de samba do Grupo Especial, um expediente que a
televisão da Família Bloch já fazia nos anos 80, geralmente sob o comando de
Paulo Stein e Fernando Pamplona. Sob
a mediação de Fátima Bernardes, participaram do programa, que foi ao ar à
noite, logo após o Fantástico: Alexandre Louzada (Acadêmicos do Grande Rio),
Chiquinho Spinoza (Estácio de Sá), Ilvamar Magalhães (Estação Primeira de
Mangueira), Luis Fernando Reis (Caprichosos de Pilares), Maria Augusta
Rodrigues (Beija-Flor de Nilópolis), Mário Borriello (Acadêmicos do Salgueiro),
Mario Monteiro (Portela), Max Lopes (Unidos do Viradouro), Oswaldo Jardim (1960
- 2003, Unidos de Vila Isabel), Renato Lage (Mocidade Independente de Padre
Miguel), Roberto Szaniecki (Unidos da Ponte), Rosa Magalhães (Imperatriz
Leopoldinense), Sylvio Cunha (União da Ilha do Governador), Carlos Fernandes, o
“Xangai” (1952 - 2013, Unidos da Tijuca), e o presidente da Liesa, Capitão
Airton Guimarães Jorge. Os debatedores foram Albino Pinheiro e Sérgio Cabral,
comentaristas da emissora na cobertura, que teve patrocínio da cervejaria
Brahma. O
debate teve alguns momentos de tensão, por exemplo, quando Fátima Bernardes
perguntou a Chiquinho Spinoza e Mario Monteiro quem era o verdadeiro
responsável pelo campeonato da Estácio de Sá no ano anterior. Mário iniciou o
trabalho no enredo “Pauliceia Desvairada”, mas depois deixou a escola.
Chiquinho Spinoza, até então um figurinista que estava na equipe, assumiu o
trabalho no barracão e finalizou várias alas e alegorias. Outro
momento que gerou controvérsia no debate foi quando os artistas foram
questionados se também se consideravam coautores dos sambas-enredo, já que a
obra musical se originava de uma sinopse elaborada pelos profissionais. Quase a
totalidade dos carnavalescos se considerou coautor e que mereceriam receber os
mesmos direitos autorais juntamente com os compositores.
No
domingo seguinte, uma semana antes do carnaval, foi a vez dos presidentes das
escolas do Especial formarem uma mesa-redonda para discutir o carnaval. O
programa, que também foi levado ao ar após o Fantástico, contou com a
participação de Acyr Pereira Alves (1943 - 2002, Estácio de Sá), Anísio Abraão
David (Beija-Flor), Castor de Andrade (1926 - 1997, Mocidade), Edson Tessier (Ponte),
Fernando Leandro (1927 - 2000, Caprichosos), Giovanni Riente (União da Ilha), Helinho
Oliveira (diretor de carnaval da Grande Rio, representando o presidente Jaider
Soares), José Carlos Monassa (1940 - 2005, Viradouro), Luizinho Drummond (Imperatriz),
Miro Garcia (1927 - 2004, Salgueiro), Nelson Nunes Alves (Unidos da Tijuca), Olício
Alves dos Santos (Vila Isabel), Paulo Miranda (diretor de carnaval da Portela,
representando o presidente Carlinhos Maracanã) e Roberto Firmino dos Santos (?
- 2012, Mangueira). Chamada
Carnaval Globeleza 1993. Crédito: Canal MofoTV/Youtube.
Susto com a prisão dos patronos Poucos
meses depois do carnaval de 1993 um fato surpreendeu o país e até ameaçou a
viabilidade dos desfiles para 94. Na
tarde de 21 de maio os 14 maiores banqueiros de jogo do bicho do Rio foram
condenados a seis anos de prisão, pena máxima para o crime de formação de
quadrilha ou bando armado. Muitos deles conhecidos por serem patronos de
entidades carnavalescas: "Anísio" Abraão David; Ailton Guimarães
Jorge, o Capitão Guimarães; Carlos Teixeira Martins, o Carlinhos Maracanã (1926
- 2020); Castor de Andrade; Luizinho Drummond; Paulinho de Andrade (1951 –
1998, filho de Castor), Waldemiro Garcia, o Miro; Waldemir Paes Garcia, o
Maninho (1962 – 2004, filho de Miro) e Antônio Petrus Kalil, o Turcão (1925-2019),
benfeitor da Estácio de Sá. Os
outros bicheiros presos foram: Emil Pinheiro (1923 – 2001, ex-presidente do
Botafogo); Haroldo Rodrigues Nunes, o Haroldo Saens Pena (1929 – 2010); José Caruzzo
Escafura, o Piruinha; José Petrus, o Zinho (irmão de Turcão), e Raul Correa de
Mello, o Raul Capitão (1909 - 1997).
A
sorte dos contraventores começou a mudar quando o promotor Luiz Carlos Cáffaro
reuniu provas de que dezenas de PMs haviam sido punidos pela corporação por
envolvimento com os bicheiros. A partir daí, ele sustentou a tese de que os
bicheiros formavam uma quadrilha para corromper funcionários públicos. Os
"corretores zoológicos" respondiam no mesmo processo por associação
para tráfico de drogas e crime de tortura. Nas alegações finais, Cáffaro pediu
a exclusão desses crimes por não ter provas. Foi o pulo do gato para levar a
cúpula do bicho à cadeia. A
prisão dos bicheiros aconteceu durante uma audiência, uma semana antes de a
sentença ser anunciada. Por saber que havia o risco de alguns, ou até mesmo
todos, não comparecerem no dia da leitura da sentença, a juíza Denise Frossard
usou de uma estratégia. Do lado de fora havia vários seguranças dos bicheiros
que estavam armados. Bastou a prisão de um deles para comprovar que, mesmo
respondendo a processo, os bicheiros ainda formavam uma quadrilha.
A
sentença, no entanto, fora modificada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que
reduziu a pena para a metade. Por meio de recursos, advogados conseguiram
excluir o crime de bando armado. Quase cinco anos depois, todos já estavam
soltos. O primeiro contraventor a deixar a cadeira foi Raul Capitão, por
questões de saúde, apenas 2 meses depois de condenado. Em seguida, em 24 de
maio de 1995, foram libertados Paulinho de Andrade e Turcão, e em 9 de setembro
do mesmo ano, foi a vez de Anísio deixar a cadeia. Mesmo
com a maioria de seus patronos presos, as escolas mantiveram os preparativos
para os desfiles de 1994 e o carnaval na Sapucaí aconteceu. Desde a prisão da
chamada cúpula do jogo do bicho o comportamento dos contraventores modificou. Antigamente,
os bicheiros transitavam em todos os meios, apareciam em colunas sociais,
programas de TV, tinham princípios éticos definidos e, espantosamente, contavam
com o apoio da população, as pessoas gostavam deles, não os enxergavam como indivíduos
fora da lei, muito por conta das práticas clientelistas. Desde a prisão de 93,
o comportamento dos bicheiros mudou bastante. Muitos se tornaram reclusos,
evitando badalações e holofotes, apesar de seguirem no comando dos negócios. A
ligação do jogo do bicho com o carnaval começou por volta dos anos 1930,
através de Natal da Portela. Após perder um braço por causa de um acidente de
trem, Natal perdeu o emprego e foi trabalhar como apontador de bicho. Em pouco
tempo, virou gerente de banca e, depois, conseguiu montar a sua própria, vindo
a se tornar banqueiro de jogo do bicho, controlando toda a área de Madureira. Com
a morte de seu grande amigo Paulo da Portela (1901 - 1949), Natal, como forma
de homenageá-lo, resolveu investir dinheiro na Portela para que ela pudesse se
transformar em uma grande escola de samba, criando aí a figura do bicheiro
patrono. Como
forma de se legitimar perante a sociedade, os demais banqueiros de jogo do
bicho passaram a seguir o exemplo de Natal, vinculando-se às escolas de samba
de suas respectivas áreas de atuação, o que posteriormente também seria usado,
segundo alguns, como forma de lavagem de dinheiro da contravenção. Terra da Garoa e uma interminável
chuva Após
quase uma década transmitindo apenas para o estado de São Paulo, a Globo
decidiu que em 1994 também iria transmitir ao vivo em rede nacional os desfiles
das escolas de samba do Grupo Especial da cidade de São Paulo, direto do
Sambódromo do Anhembi, na noite de sábado de carnaval. E
a Vênus Platinada valorizou bastante a folia paulistana no período
pré-carnavalesco, exibindo reportagens nos telejornais locais, debates e até a
participação dos sambistas em um Globo Repórter às vésperas do carnaval. Com
cerca de 80% de seu projeto concluído, o sambódromo do Anhembi foi palco de uma
interminável chuva que acompanhou 10 das 12 escolas do Grupo Especial.
Destaques impedidos de subir pelos bombeiros, muitas alegorias quebradas na
concentração e uma chuva de atas de penalidade marcaram o carnaval vencido pela
Rosas de Ouro e que revelou uma nova grande escola; a vice-campeã Gaviões da
Fiel. A
narração da folia paulistana ficou a cargo de William Bonner e Mariana Godoy.
Passaram
pela tela da Globo as seguintes escolas e enredo, na ordem em que desfilaram: Unidos
de São Miguel (“Encontro das nações africanas no Brasil”); Primeira da
Aclimação (“O vinho da verdade”); Unidos do Peruche (“O Reino de Oyó visto pelos olhos
de Xangô”); Mocidade Alegre (“Somos todos irmãos”); Leandro de Itaquera
(“Tietê,
um rio de verdade”); Acadêmicos do Tucuruvi (“Calçadas Musicais”);
Rosas de Ouro (“Sapoti”); Camisa Verde e Branco (“Eternamente jovem”); Vai-Vai
(“Inã
Gbe: Pegando fogo”); Nenê de Vila Matilde (“Pira-ique, mistério e magia”);
Barroca Zona Sul (“Nas ocas da Barroca o índio viu quem invadiu”) e Gaviões da
Fiel (“A saliva do santo e o veneno da serpente”).
GLOBO
SÃO
PAULO Narração: William Bonner e Mariana
Godoy. Paranauê, Paraná... Com
as atenções da Manchete voltadas para o carnaval baiano, a Globo em 1993 novamente
se viu dona do campinho na Sapucaí – assim como cinco anos antes. Ao menos no
Grupo Especial. No
entanto, quem reinou em 1993 nas duas noites de desfile das escolas do Grupo de
Acesso foi uma TV obscura fundada no Paraná, que tinha Galvão Bueno como
narrador, apresentador e diretor de esportes, e em 92 mostrou sozinha a
Libertadores. A
Rede OM foi uma emissora criada no Paraná pelo empresário e político José
Carlos Martinez (1948 - 2003), que tinha o sonho de erguer uma TV nacional de
relevância fora do eixo Rio-São Paulo. A emissora,
criada em março de 1992, logo em seguida compra os direitos de exibição da Taça
Libertadores da América, dando a sorte de registrar a histórica campanha do São
Paulo FC, treinado por Telê Santana. O torneio foi uma das duas grandes
cartadas da emissora baseada no Paraná. O
outro investimento que mexeu com o mercado foi a contratação de Galvão Bueno,
em abril daquele ano. O profissional havia deixado o posto de narrador número 1
da Globo em nome de um projeto para comandar o departamento de esporte da nova
empresa. No
final do mesmo ano, a OM fechou um contrato com a TV Gazeta de São Paulo, da
propriedade da Fundação Cásper Líbero, celebrando um fornecimento de
programação entre as duas redes, com a parceria OM/Gazeta. No
início de 1993, a Rede OM anunciou a transmissão com exclusividade dos desfiles
das 16 escolas de samba do Grupo de Acesso, cobrindo a lacuna deixada pela
Manchete (que se bandeou para Salvador) e pela TV Globo (cujo interesse maior
era mostrar o Grupo Especial). Estava no ar o projeto “Carnaval de Primeira”.
REDE
OM (1993) / CNT
(1994 a 1997) Apresentação: Cristina Rego Monteiro (1993
e 1994) e Claudinho Mil (1996 e 1997). Em
seu primeiro carnaval, a OM/Gazeta escalou a jornalista Cristina Rego Monteiro
para ser a âncora da transmissão. Os jornalistas da casa fizeram as reportagens
na avenida. O toque de irreverência na cobertura ficava a cargo do humorista
Paulo Silvino (1939 - 2017), apresentado como “repórter especial”. Para
os comentários, um time de luxo: o intérprete Dominguinhos do Estácio, na época, defendendo o microfone número 1
da GRES Estácio de Sá; o ator e produtor cultural Jorge Coutinho (que já havia
sido comentarista na Globo, nos anos 80, como vimos no capítulo 5 da nossa série). Nos quatro anos seguintes – já com a
marca CNT – o sambista Jorginho do Império reforçara o time. A camisa 10 da
equipe era, sem dúvida, do cracaço do jornalismo carnavalesco Tárcio Santos
(1949 - 2019). Jornalista
e radialista, Tárcio se notabilizou por grandes coberturas em diversas
editorias, como de competições esportivas (entre 1987 e 2002) e a primeira visita
do Papa João Paulo II ao Brasil, em 1981. Foi no Carnaval, no entanto, que
acabou ganhando prestígio, sendo apontado como um dos principais repórteres e
comentaristas especializados.
O
jornalista participou de coberturas do carnaval, como coordenador de equipe,
comentarista e repórter, na Rádio Nacional (de 1977 a 2004) e na CNT (de 1993 a
1995). Atuou em diversas rádios, como Tupi, Manchete e Roquette Pinto e também
teve passagens por emissoras de televisão, como a extinta TV Rio, além da
própria CNT. Até pouco antes de falecer, Tárcio Santos mantinha uma coluna no
site Galeria do Samba, chamada “Ensaio Geral”.
Desfile da Império Serrano transmitido
pela OM/Gazeta em 1993.
No
dia 19 de fevereiro (sexta-feira), a TV exibiu os desfiles: Mocidade Unida de
Jacarepaguá (“Dona Zica e Dona Neuma, enredos de verdade””); Acadêmicos do
Cubango (“Do fogo às águas, recriando a terra”); Arrastão de Cascadura (“Quem
canta seus males espanta”); Império Serrano (“Um ato de amor”); Acadêmicos
da Rocinha (“Tristão e Isolda, uma ópera no asfalto”); São Clemente (“O
pão nosso de cada dia”); Unidos do Jacarezinho (“Mangueira, beleza que a natureza
criou”) e Tradição (“Não me leve a mal, hoje é carnaval”). A
segunda noite de transmissão do Grupo de Acesso pela OM (sábado, dia 20 de
fevereiro) teve as escolas Arranco (“Acredite se quiser”); Lins Imperial
(“No
mundo encantado de Beto Carrero”); Império da Tijuca (“Vitis
vinífera, o Império é uma uva”); Unidos do Cabuçu (“De quadrinho em quadrinho, lá
vai meu recado... Maurício de Souza”); Unidos de Lucas (“O
Galo cantou e Lucas saboreou”); Acadêmicos de Santa Cruz (“Quo
vadis, meu negro de ouro”); Leão de Nova Iguaçu (“O que é que a Baixada tem?”)
e Acadêmicos do Engenho da Rainha (“Ciranda, cirandinha, vamos todos sonhar”).
Logo
após o carnaval de 93, houve uma reformulação na emissora e o nome Rede OM
Brasil deixa de ser utilizado, dando lugar à Central Nacional de Televisão, com
as iniciais CNT. A emissora, que desde sua transformação em rede nacional
ambicionava o terceiro lugar em audiência, detecta a necessidade de se
alavancar economicamente. A
CNT contratou nomes de peso nacional para a sua programação. Clodovil
Hernandez, o humorista João Kleber, a jornalista Leila Richards (vinda da Rede
Manchete) e a apresentadora infantil Mariane (egressa do SBT) aportam no novo
canal e passaram a apresentar seus programas direto da sede em Curitiba. No
carnaval, a CNT investiu seu foco na cobertura do desfile das escolas do Grupo
1 (formado pelas subcategorias A e B). De 1994 a 1997, ainda com o nome
“Carnaval de Primeira”, a emissora curitibana realizou uma transmissão enxuta,
modesta e até certo ponto convencional, mas não errou, ou melhor, não se expôs
demais, e os tropeços da narração acabaram assimilados com bom humor pelos
integrantes da equipe e pela própria audiência. Em
1995, devido a alguns não rebaixamentos, tapetões e participação de escolas
convidadas, o Grupo A teve 19 escolas participando da disputa, promovida pela Liesga
– Liga das Escolas de Samba do Grupo de Acesso, presidida por Paulo de Almeida,
que havia sido dirigente da Caprichosos de Pilares. Depois
dos desfiles, a Liesga foi extinta e o grupão de acesso de 95 passou ao comando
da Associação das Escolas de Samba da Cidade do Rio de Janeiro (AESCRJ) e foi
dividido em duas subcategorias: grupo de acesso A e grupo de acesso B. Em
96, o Grupo de Acesso A foi composto por 10 escolas – as que chegaram entre o
3º e o 10º lugar em 95 mais as duas rebaixadas do Especial. O desfile passou a
ocorrer no sábado. Já o desfile do Acesso B passou a acontecer na sexta-feira (um
dia antes do sábado de carnaval) e foi formado por 12 escolas – as que chegaram
entre o 11º e o 19º lugar do Acesso no ano anterior mais as três primeiras
colocadas do antigo grupo B e que a partir de então se tornaria o Acesso C.
Complicado, né? Coisas dos cartolas do nosso carnaval... Em
1996, a CNT exibiu seguintes desfiles, ao vivo, diretamente da Passarela do
Samba da Marquês de Sapucaí: GRUPO A (sábado, 17 de fevereiro): 1)Em Cima da Hora (“Yara cigana, canta, dança e toca, é Rio, é
rua, é Carioca”) 2)Acadêmicos do Engenho da
Rainha (“Anjo azul”) 3)Arrastão de Cascadura (“As Icamiabas”) 4)Vizinha Faladeira (“Elba Popular Brasileira”) 5)Acadêmicos do Cubango (“Dos brasões do reino de Portugal, ao
esplendor da bandeira nacional”) 6)Unidos do Cabuçu (“Do reclame ao merchandising, a história da
propaganda no Brasil”) 7)Acadêmicos de Santa Cruz
(“Ribalta – Luz, sonho e ilusão”) 8)São Clemente (“Se a canoa não virar, a São Clemente chega
lá”) 9)Acadêmicos da Rocinha (“Bahia com muito amor”) A Unidos
de Villa Rica, que seria a última a desfilar e apresentar o enredo “A Lavagem
do Bonfim”, não desfilou e foi automaticamente rebaixada para o Grupo B em
1997.
GRUPO B (sexta-feira, 16 de
fevereiro): 1)Acadêmicos da Abolição (“Quem é que faz a alegria do povo?”) 2)Acadêmicos de Vigário
Geral (“Fica o dito pelo não dito”) 3)Acadêmicos do Dendê (“Prédio roubado, ponha-se na rua... Ora
pois, pois!”) 4)Leão de Nova Iguaçu (“Tudo isto quer dizer Brasil”) 5)Mocidade Unida de
Jacarepaguá (“Quilombo dos Palmares, um
paraíso negro”) 6)Arranco (“Ser Brasil, ser brasileiro”) 7)Canários das Laranjeiras
(“Aruanda, um sonho de Zumbi”) 8)Unidos do Jacarezinho (“Vapt Vupt, 44 anos de cultura, humor e
fantasia”) 9)Difícil é o Nome (“João, nosso João”) 10)Lins Imperial (“Méier, ponto de encontro de cantos e
encantos”) 11)Unidos de Lucas (“Rua da Carioca, a mais carioca do Rio”) 12)Independentes de
Cordovil (“Que rei sou eu?”) A
Mocidade Unida de Jacarepaguá passou pela Sapucaí com apenas um surdo e com
faixas retratando a dor e o sofrimento dos moradores da Cidade de Deus,
castigados por uma grande enchente atingindo por completo toda a comunidade e,
consequentemente, o carnaval da escola. Especiais de samba-enredo Em
1996 e 1997, a CNT exibiu semanas antes dos desfiles programas especiais com os
sambas enredos das escolas dos grupos A e B. Em formato clássico, esses
especiais tinham pitadas dos antigos programas Cassino do Chacrinha, Clube do
Bolinha e Rio Dá Samba. Os intérpretes das escolas cantavam o samba em playback
e entravam em cena acompanhado pelos casais de mestre-sala e porta-bandeira e
seus respectivos pavilhões.
O
cenário do programa remetia aos motivos carnavalescos, com muito confete e
serpentina e um corpo de baile formado por belíssimas mulatas, a maioria
oriunda das escolas de samba do Rio de Janeiro. A apresentação
nos dois anos ficou a cargo de Jorginho
do Império que, após algumas idas e vindas do seu Império Serrano, estava
de volta à verde e branco da Serrinha, desta vez como intérprete principal
(consultar a ficha na Seção Intérpretes).
Em
1997, a CNT transmitiu na sexta-feira, dia 7 de fevereiro, pelo Grupo B:
Mocidade Unida de Vicente de Carvalho; Boi da Ilha do Governador; Difícil é o
Nome; Lins Imperial; Unidos de Lucas; Acadêmicos de Vigário Geral; Unidos do
Jacarezinho; Acadêmicos do Engenho da Rainha; Canários das Laranjeiras; Unidos
da Villa Rica; Arrastão de Cascadura e Acadêmicos do Cubango. Já
no sábado, dia 8, de fevereiro, a emissora exibiu, pelo Grupo A: Acadêmicos do
Dendê (“Do pasto, fantasia, do gado,
alegoria”); Arranco (“Chico Anísio,
50 anos de humor”); Vizinha Faladeira (“Lan,
a cara alegre e colorida do Rio”); São Clemente (“A São Clemente Botafogo na Sapucaí”); Unidos da Ponte (“Da lata de lixo ao luxo da lata”); Unidos
do Cabuçu (“Todas as Marias de nossa
terra”); Em Cima da Hora (“Sérgio
Cabral, a cara do Rio”); Caprichosos de Pilares (“Do tambor ao computador”); Tradição (“Os balagandãs”) e Império da Tijuca (“A coroa do perdão na terra de Oyó”).
Após
os desfiles de 1997, a Rede CNT interrompeu suas coberturas carnavalescas. A
emissora passava por uma crise financeira, que teve início em 1994. Em 1989, seu
proprietário, o empresário e deputado José Carlos Martinez (na época dono da TV
Paraná Canal 6), apoiou a campanha de Fernando Collor. Logo depois da vitória
eleitoral, o Canal 6 começou a ter grandes investimentos do governo Collor. E a
TV Paraná foi lançada como rede nacional de televisão (como vimos, na Rede OM). Mas
com o impeachment de Collor em 1992, a CNT ficou sem sustentação, e procurou
outra parceria. Desta vez foi com o banqueiro José Eduardo de Andrade Vieira,
dono do Bamerindus. Mas esta nova parceria não durou muito. Com a crise do
banco em 1994, e a venda para o HSBC em 1997, a emissora afundou em dificuldades.
E, para completar o quadro já complicado, o dono da CNT, José Carlos Martinez,
morreu em um acidente de avião em 2003. A
Rede CNT ainda prosseguiria, mas com poucos programas de peso, e com quase
todos os seus horários vendidos para igrejas. A emissora só retornou às
transmissões carnavalescas em 2002, através de um projeto televisivo
capitaneado por Jorge Perlingeiro, como veremos no próximo capítulo desta série. A volta da Manchete à Sapucaí, o samba
de São Paulo em rede nacional via Rede Globo e o carnaval na selva As
Empresas Bloch retomaram o controle da TV Manchete no final de 1993. E com o
retorno do Dr. Adolpho, retornou também o carnaval da Manchete. Em
1994, Globo e Manchete dividiram as transmissões do Grupo Especial do Rio de
Janeiro, nas tradicionais noites de domingo e segunda-feira. Mas as duas
emissoras trouxeram novidades aos súditos do Rei Momo no sábado de carnaval
daquele ano. A
Globo mostrou pela primeira vez, em rede nacional, o desfile das escolas de
samba de São Paulo. E a Manchete, em vez de exibir também o carnaval da
Pauliceia (o qual a emissora já tinha uma expertise por ter mostrado o
espetáculo no ano da inauguração do sambódromo paulistano em 1991) ou as
escolas do Grupo A – àquela altura já a cargo da CNT – resolveu inovar e
transmitir o carnaval de Manaus. Carnaval de Manaus A
transmissão da folia amazonense pela TV Manchete foi realizada em fevereiro de
1994, com o patrocínio da Zona Franca de Manaus, tanto que na parte inferior da
tela apareciam desenhos que simbolizavam os produtos ali vendidos. No
ano anterior, a TV Bandeirantes foi até o Sambódromo da capital amazonense (que
ainda não estava totalmente edificado – apenas o setor conhecido como “ferradura”
e dois lances de arquibancada) e exibiu em rede nacional flashes dos desfiles,
com destaque aos trechos da apresentação da Mocidade Independente de Aparecida
– maior detentora de títulos do carnaval de Manaus – narrados por José Luiz
Datena. Foi a primeira e última vez que a Band cobriu o carnaval manauara. Para
promover a folia amazônica, a Manchete exibiu nas semanas que antecederam o
carnaval uma vinheta nos intervalos da programação com uma modelo morena,
provavelmente nascida no Amazonas, de feições miscigenadas – uma espécie de “Globeleza
Cabocla” –, que tinha o corpo pintado, alguns adereços indígenas e sambava em
frente ao chroma-key, ao som do samba-jingle da cobertura gravado na voz de Neguinho
da Beija-Flor. O intérprete não aparecia no vídeo. A
transmissão também contou com o apoio do Governo do Estado do Amazonas, na
época, gerido pelo governador Gilberto Mestrinho (1928 - 2009), lendário
cacique do PMDB que fez história ao ser amado e tratado pelo povo como “Boto
Navegador”. Postumamente, seu nome foi incorporado ao suntuoso Sambódromo de
Manaus, cuja inauguração oficial aconteceu justamente em 1994. Havia até uma
cobertura, que desabou pouco tempo depois.
Segundo
dados que constam no site da Secretaria de Cultura do Estado do Amazonas, o
Centro de Convenções Professor Gilberto Mestrinho, tem 146 mil metros
quadrados, pista de 405 metros de comprimento e capacidade para 80 mil pessoas.
O colosso baré já sediou shows religiosos, regionais, nacionais e
internacionais, além dos desfiles das escolas de samba, o Carnaboi, os desfiles
escolares e militares no mês de setembro, e o Boi Manaus. No complexo cultural também
funciona o Liceu de Artes e Ofícios Claudio Santoro, escola de artes com oferta
de um extenso leque de cursos gratuitos. Noticiou-se
na época que para o primeiro desfile no novo sambódromo o governo amazonense chegou
a pagar um cachê de 7 mil dólares para a globeleza Valéria Valenssa aparecer
como madrinha da escola Sem Compromisso.
Liderada
por Paulo Stein e Fernando Pamplona, a equipe da Manchete desembarcou no
coração da Amazônia disposta a transmitir ao vivo para todo o país, no dia 12
de fevereiro, a noite principal do carnaval de Manaus. A reportagem ficou a
cargo dos jornalistas locais. Foram
12 horas de transmissão do desfile das escolas do Grupo Especial. A cobertura se
deu através de pool formado com a
Rádio e Televisão Cultura do Amazonas. Segundo
dados da Empresa Amazonense de Turismo, cerca de 150 mil pessoas assistiram aos
desfiles no carnaval de 1994. A transmissão da Manchete fazia questão de frisar
que a entrada para o público era gratuita. Doze
câmeras mostraram os desfiles dos mais diversos ângulos. Uma estação geradora foi
montada no Sambódromo. Um timão gigante, símbolo da gestão Gilberto Mestrinho, foi
instalado no centro de convenções e era sempre focado na transmissão da TV
Manchete. Antes
de cada desfile, era exibida uma reportagem com a respectiva escola de samba e
apresentado o referido samba enredo na voz de seus intérpretes e compositores
no Botequim da Manchete instalado no sambódromo, também sob o comando de
Adelzon Alves. Uma curiosidade: após a escola ter iniciado o desfile, a
apresentação das escolas não podia ser interrompida para reportagens, que foram
apresentadas nos intervalos de uma agremiação para outra.
O escritor
e pesquisador do carnaval amazonense Daniel Sales, no livro “É tempo de sambar:
história do carnaval de Manaus” (2008), conta que a Manchete em sua transmissão
pecou pela falta de experiência e semi-profissionalismo dos que ali estavam
cobrindo a festa e que não conheciam as peculiaridades do povo de Manaus e de
seus sambistas e torcedores. “Quando
as câmeras focavam alguém bocejando ou somente observando ‘quietamente’ o
desfile, não retratava uma singularidade do desfile de Manaus – as torcidas.
Quando, por exemplo, desfila a Vitória Régia, nem um chiado se ouve na torcida
da Aparecida. Quando desfila a Reino Unido, silêncio na Vitória Régia e na
Aparecida e assim por diante (...). Em Manaus se age no Sambódromo como
acontece nos estádios de futebol. Então o certo era mostrar em close o rosto
dos torcedores da Aparecida, da Vitória Regia, Sem Compromisso, etc, quando as
suas escolas estavam passando naquele momento e não nas horas dos desfiles dos
grêmios opostos, pouco interessados no sucesso dos oponentes, é claro.”
Pelo
visto, o carnaval de Manaus herdou um comportamento parecido como o que ocorre
no Festival Folclórico de Parintins, onde a torcida de um boi tem que ficar em
silêncio durante a apresentação do outro – a manifestação de uma torcida
durante a apresentação do boi adversário (ou “contrário”, como é chamado na
festival) pode acarretar perda de pontos. A
Manchete exibiu as seguintes agremiações na transmissão feita na noite do dia 12
de fevereiro de 1994, no sambódromo de Manaus: A
Grande Família (escola convidada – “A
lenda do guaraná”) Balaku
Blaku (“No mundo das nuvens: venha voar
comigo”) Reino
Unido da Liberdade (“A saga do sonho
perdido contra os guardiões do medo”) Mocidade
Independente da Aparecida (“Parque dos
Anjos, faz de conta que assim será”) Sem
Compromisso (“Tempos de guerra, sonho de
paz”) Vitória
Régia (“Dos tambores de Mestre Antão ao
ecoar de uma nação”) Primos
da Ilha (“Brasil, cem anos de futebol”)
Tão
logo se encerrou a transmissão do carnaval de Manaus, Stein e Pamplona
retornaram ao Rio de Janeiro para à noite participarem da cobertura do Grupo
Especial carioca. Além
dos tradicionais bailes e concursos de fantasias, a Manchete voltava a
transmitir programas especiais recordando os antigos carnavais da Era
Sambódromo. Na
madrugada de sexta para sábado de carnaval, a emissora exibiu a primeira parte
de “Recordar é Viver”, um programa gravado com mais de duas horas de duração em
que a Manchete fez relembrar os carnavais que fizeram a história da Passarela
do Samba, reunindo trechos dos desfiles entre os anos de 1984 a 1992 das
escolas que disputavam o Grupo Especial. A
segunda parte de “Recordar é Viver” foi ao ar na tarde do sábado. O especial
teve a apresentação de Carla Cavalcante, comentários de José Carlos Rego e a
produção da jornalista Norma Ajara. Na verdade, este foi um programa requentado.
O mesmo especial já tinha sido apresentado durante a programação carnavalesca
da emissora em 1992, com o nome de Tantos Carnavais, reunido os melhores
momentos das escolas do Especial entre os anos de 1984 e 1991. Em 94, a equipe
de jornalismo da Manchete apenas inseriu os trechos dos desfiles de 92, já que
a emissora não exibira a folia carioca em 93.
Toda nudez carnavalesca será castigada Na
falta de assunto mais relevante para discutir como melhorar as
condições de saúde,
da educação, segurança pública, transportes
ou habitação da população – itens
que, pelo jeito, iam muito bem ao país na década de 90
– parlamentares discutiam
em Brasília diferentes formas de exercer um controle sobre a
programação de TV.
Suas Excelências estavam temerosas, já que as redes Globo
e Manchete se preparavam
para mais uma cobertura de Carnaval carregada de cenas de nudez e
erotismo. Com
câmeras espalhadas pelo Sambódromo, a cobertura, já nas chamadas, prometiam os
tradicionais closes nas partes íntimas das personalidades que dispensam
fantasias na avenida. “Os câmeras são instruídos para não fechar no bumbum das
mulheres, mas, no calor da cobertura, eles se empolgam”, declarou, na época,
Fernando Barbosa Lima (1933 - 2008), diretor-geral da Manchete. A declaração
consta na reportagem “Tesourando o Carnaval”, da Folha de São Paulo, edição de
15 de fevereiro de 1998. Esses
closes, que já se tornaram marca registrada do Carnaval na TV, incomodaram a então
deputada federal Marta Suplicy (PT-SP), autora de projeto que previa a criação
de um órgão em defesa do telespectador. "A
nudez faz parte dessa festa, que é uma grande manifestação de sensualidade. Só
não gosto quando os câmeras focalizam apenas determinadas partes, apresentando
o corpo da mulher como um objeto fragmentado. Isso é de muito mau gosto",
afirmava. “Sou contra a censura, mas quero que a sociedade possa ser
representada por uma comissão que a escute e defenda seus direitos na condição
de espectador.” Outro
projeto que pretendia limitar as cenas de nudez nos carnavais era de autoria do
então deputado federal Antonio Henrique da Cunha Bueno (PPB-SP). Ele sugeria a
utilização de um dispositivo eletrônico que permitia ao usuário bloquear a
recepção de programas que contenham cenas de nudez, sexo e violência no seu
televisor. A
avalanche de cenas de nudez na época de folia era justificada pelas emissoras
como um cumprimento das regras do jogo. “Simplesmente mostramos o Carnaval como
ele é, mas procuramos fazer uma transmissão dentro dos padrões aceitáveis de
comportamento. Não existe nenhuma orientação para botar todo mundo nu no vídeo”,
destacava Pedro Paulo Couto, então diretor de produção do Carnaval da Globo, em
entrevista à Folha de São Paulo na edição de 15 de fevereiro de 1998. A
ex-mulata Globeleza, Valéria Valenssa, então no auge da forma, aos 26 anos, que
aparecia sambando nua na vinheta de Carnaval da emissora, dizia que não dá para
cortar a nudez da festa. "O Brasil tem mulheres lindíssimas, e essa é a
melhor época do ano para mostrar isso", comentou a modelo. “Sempre vou
nua. Apenas mudo a pintura no meu corpo.” Francy
Mourão, a modelo morena que aparecia nua na vinheta de Carnaval da Manchete, na
época com 22 anos, dizia que tudo é uma questão de profissionalismo. “Em
trabalhos assim, a nudez deve ser encarada como uma forma de expressão,
principalmente quando é Carnaval."
Como
já era de se esperar, a TFP (Tradição, Família e Propriedade) condena a postura
das emissoras nesse período. "Durante
a festa, as emissoras costumam ultrapassar todos os limites possíveis no que se
refere às cenas de nudez, constituindo tal ostentação um verdadeiro insulto à
instituição da família e, sobretudo, uma gravíssima ofensa aos
mandamentos", diz o assessor de imprensa da entidade Paulo Henrique
Chaves. O
diretor-geral da Manchete lembra que a maioria das atrações de Carnaval
exibidas na emissora atendem aos pedidos do telespectador. “Pessoalmente, não
gosto de transmitir o baile gay. Mas é impressionante o número de pessoas que a
cada ano telefonam para a emissora perguntando se nós vamos exibi-lo”, conta. “É
uma questão de gosto.” Band volta a transmitir Carnaval do RJ Após
uma ausência de mais de uma década na Sapucaí, a Bandeirantes viria a exibir os
desfiles do Sambódromo do Rio em 1999.
De certa forma, preenchendo a lacuna deixada pela Manchete (veremos a extinção
da TV Manchete no capítulo 7 desta série) que, como alternativa de transmissão,
a emissora da família Saad pisou forte na avenida com a cobertura conhecida
como Band Folia. Band
Folia é a cobertura do carnaval no Brasil feita pela Rede Bandeirantes. Feita
anualmente desde 1993, com um período de hiato entre 1995 e 1998, a cobertura se
baseia na transmissão ao vivo e em flashs dos blocos de carnaval em Salvador,
São Paulo e Rio de Janeiro, durante a programação e nos telejornais. Como parte
da programação de expectativa que antecede a festa, a emissora exibe ao longo
da programação o Boletim Band Folia. Na cobertura regular, algumas das
afiliadas da Band pelo país fazem a cobertura sob suas marcas locais. Em
1999, a Band transmitiu com exclusividade, no sábado de carnaval, dia 13 de
fevereiro, os desfiles das 11 escolas de samba do Grupo 1, pela ordem: 1-
Cabuçu (“O meu cabelo não nega”) 2-
Jacarezinho (“Jacarezinho canta e se
encanta com os mistérios do Senhor da Luz”) 3-
Santa Cruz (“Abraham Medina em noite de
gala”) 4-
Império da Tijuca (“No palco da alegria,
Molejão é rei nesta folia”) 5-
Villa Rica (“Sargentelli, Lenda Viva do
Ziriguidum”) 6-
Unidos da Tijuca (“O dono da terra”) 7-
Em Cima da Hora (“Horas, eras de glórias
e outras histórias”) 8-
Porto da Pedra (“E na farofa do confete,
tem limão, tem serpentina”) 9-
Cubango (“Tempero, uma pitada na
história”) 10-
Estácio de Sá (“No passo do Compasso, a
Estácio no Sapatinho”) 11-
Ponte (“O samba é a minha voz”) Nos dias 14 e 15 (domingo e segunda), o canal
exibiu, em pool com a Globo, as 14
escolas do Grupo Especial. A ordem de desfile foi: Domingo 1-
São Clemente (“A São Clemente comemora e
traz Rui Barbosa para os braços do povo”) 2-
União da Ilha (“Barbosa Lima, 101 anos
do Sobrinho do Brasil”) 3-
Portela (“De Volta aos Caminhos de Minas
Gerais”) 4-
Salgueiro (“Salgueiro é sol e sal nos
quatrocentos anos de Natal”) 5-
Vila Isabel (“João Pessoa, onde o sol
brilha mais cedo”) 6-
Império Serrano (“Uma rua chamada Brasil”) 7-
Viradouro (“Anita Garibaldi, heroína das
sete magias”) Segunda-feira 1-
Tradição (“Nos braços da história,
Jacarepaguá, quatro séculos de glórias”) 2-
Grande Rio (“Ei, ei, ei, Chatô é nosso
rei!”) 3-
Caprichosos (“No universo da beleza,
Mestre Pitanguy”) 4-
Mangueira (“O século do samba”) 5-
Mocidade (“Villa-Lobos e a apoteose
brasileira”) 6-
Beija-Flor (“Araxá, lugar alto onde
primeiro se avista o sol”) 7-
Imperatriz (“Brasil mostra a sua cara
em... Theatrum Rerum Naturalium Brasiliae”) BAND
Narração: Luciano do Valle e Astrid Fontenelle. A
cobertura da Band durou mais de 50 horas em quatro noites de desfiles na
Marquês de Sapucaí (contando o Desfile das Campeãs). A narração foi de Luciano
do Valle (1947 - 2014)– mantendo a tradição das emissoras reservarem a
ancoragem da transmissão carnavalesca a um experiente locutor esportivo. A
jornalista e apresentadora Astrid Fontenelle, recém-egressa da MTV Brasil, era
uma espécie de copiloto da nave Band Folia, o braço direito de Luciano durante
a transmissão. Fazendo a linha descolada e neófita em carnaval, mesmo tendo
nascido no Rio, Astrid se colocava no lugar do telespectador que não tinha
muito conhecimento carnavalesco e fazia perguntas aos comentaristas como “por
que a ala de baianas é obrigatória nas escolas”, “por que o casal de
mestre-sala e porta-bandeira não samba”, “qual a função da comissão de frente”,
“qual a diferença de intérprete e puxador de samba”, etc. A
jornalista Silvia Poppovic era uma das comentaristas da transmissão. Silvia, à
época, apresentava no canal um programa que levava seu nome e que foi pioneiro nos
programas de debates na televisão brasileira. Cabia a ela também fazer
reportagens com as celebridades televisivas e do samba que visitavam a cabine
da Band. Os
comentários mais abalizados referente aos desfiles, ficavam a cargo de
convidados, como o sambista e compositor Jorge Aragão e do jornalista e
escritor carioca Alexandre Medeiros. Egresso
da Manchete – onde apresentou o Botequim do Samba por quatro anos –, Aragão
fazia a linha do sambista empático ao carnaval, apesar do artista não ter um
currículo ativo nos desfiles. Enaltecia os esforços das agremiações e de seus componentes
em estar na avenida, “após um ano de intenso trabalho”, além da virtude dos
compositores dos sambas. Jornalista
com passagens pelas redações do Jornal do Brasil, O Globo, O Dia, além da
própria Band, cabia a Alexandre Medeiros fazer os comentários mais objetivos
nos desfiles. Analisava, sobretudo, questões mais técnicas de cada
apresentação, como a qualidade plástica, a evolução, o conjunto visual,
projetava quais eram as reais postulantes ao título e também municiava o
telespectador com informações sobre os bastidores e o pré-carnaval de cada
escola.
O fenômeno Tiazinha Se
a Globo tinha a mulata Valeria Valenssa sambando nua nas vinhetas da programação
de carnaval, e uma modelo loira representava o Carnaval da Manchete, a Band
contratacou pesado e escalou o fenômeno Tiazinha para aparecer nas vinhetas e ser
a marca visual do Band Folia 99. Aos
19 anos, a morena Suzana Alves – nascida em 1978 – se transformou em um
fenômeno na televisão ao interpretar a personagem Tiazinha no Programa H,
apresentado por Luciano Huck. Na atração, ela encarnava uma jovem sensual, com
um visual sadomasô light, que vestia lingerie, máscara de Mulher-Gato, salto e
chicotinho. Em pouco tempo, Tiazinha tornou-se um ícone pop, levando as
plateias de adolescentes (e de muitos grandinhos também) à loucura. A
jovem realizava jogos com os garotos da plateia, nos quais eles tinham que
responder corretamente as perguntas ou pagar a prenda estipulada por ela – que
ia desde algumas chicotadas até depilar alguma parte do corpo do rapaz.
Teve
início, então, a “era Tiazinha” no qual a artista conquistou uma legião de fãs,
configurando em símbolo sexual. A Band não perdeu tempo e aproveitou o produto
criado pela casa e colocou a Tiazinha nas vinhetas do Band Folia 99. Aproveitando
o momento de auge da popularidade do personagem, o presidente Nésio Nascimento,
da escola de samba Tradição, com extremo oportunismo, contratou a jovem para
ser rainha de bateria da escola do Campinho. A aparição da Tiazinha na passarela
do Sambódromo à frente dos ritmistas provocou uma aglomeração jamais vista de
fotógrafos e cinegrafistas para captar a performance da moça no desfile. Depois
do carnaval e ainda aproveitando o ponto alto da carreira, Tiazinha estampou a
capa da Playboy, em março de 1999, sendo a segunda edição mais vendida da
história da revista, superando o marco de 1 milhão de cópias. Em 2000, ela fez
outra capa, também com vendas expressivas.
Depois
de muito sucesso, Suzana Alves aposentou a personagem e, antes de virar a
página completamente, lançou o CD “Tiazinha Faz a Festa” e a série “As
Aventuras de Tiazinha” (Band, 1999-2000), em que deixava para trás o posto de
símbolo sexual e encarnava uma heroína. O seriado ficou no ar até março de
2000, quando Suzana não renovou seu contrato com a emissora, alegando que
queria deixar de interpretá-la antes que se tornasse decadente no imaginário do
público. A
Band também transmitiu o Desfile das Campeãs, no sábado seguinte ao carnaval,
com a mesma equipe de apresentadores, comentaristas e repórteres. Aliás, 1999
foi o último ano em que a campeã e a vice do Segundo Grupo participaram do
desfile comemorativo. Naquele ano, a Unidos da Tijuca levou o título do então
Acesso A, e subiu com a vice, Porto da Pedra – ambas desfilaram no sábado. A
participação da campeã da Série A no Desfile das Campeãs é um desejo permanente
de muitos da comunidade do samba, desde que a Liesa deixou de convidar, por
questões legais, as vencedoras do acesso. No
próximo capítulo da série, veremos como foi a primeira década do século 21,
resgatando o canto do cisne da emissora que mais esteve ao lado dos
carnavalescos na história, o surgimento do projeto que retomou as transmissões do
grupo de acesso, o carnaval dos 500 anos e o drible que uma emissora aplicou no
monopólio para valorizar a escola que homenageava o “homem do Baú”. REFERÊNCIAS: BARBOSA, Guilherme. Trajetória da Manchete. 1991-1992: Era do
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sobre o período de crise e extinção da emissora. Universidade Estadual
Paulista, Bauru, SP – Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos
Interdisciplinares da Comunicação. XVIII Congresso de Ciências da Comunicação
na Região Sudeste – Bauru - SP – 03 a 05 de julho de 2013. Disponível em
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Acesso em 20 de maio de 2020. O GLOBO, Acervo. Em 1993, 14 chefões do bicho foram
condenados por formação de quadrilha. In: 21 de agosto de 2013. Disponível
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Acesso em 19 de junho 2020. PEREIRA, Ianá Souza. Axé-axé: o megafenômeno baiano. Revista
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Acesso em: 10 mai. 2020. SALES, Daniel. É tempo de sambar: história do carnaval de
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Acesso em mai 2020. Gerson
Brisolara (Rixxa Jr.)
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