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3 de fevereiro de 2024,
nº 63 Série de coluna anterior: A História do Carnaval na TV Brasileira Em novembro
de 2023, o colega do Sambario, Túlio Rabelo, propôs uma coluna com sambas enredo
que trazem como mensagem a paz universal. A lista contemplou obras que
desfilaram no carnaval do Rio de Janeiro. Como é um
tema bem pertinente ao momento no qual o mundo está passando, fui na esteira do
assunto e elenquei uma segunda parte de enredos que exaltam a paz, desta vez,
incluindo sambas de outros polos carnavalescos, mas também com a presença de obras
cariocas. 10º lugar: IMPERADORES DO SAMBA 1994 – “Gandhi, o Guerreiro da Paz” Quando
homenageou Lupicínio Rodrigues em 1993 a Imperadores do Samba, de Porto Alegre,
se sagrou campeã e se preparou para no carnaval seguinte, com o tema “Gandhi, o
Guerreiro da Paz”, alcançar o bicampeonato. A escola caprichou nos figurinos e
nas alegorias, além de levar para a Avenida Augusto de Carvalho um belo e
comunicativo samba-enredo. A Imperadores fez um desfile esplendoroso, levando
até um sósia de Gandhi para o desfile. No entanto, na apuração, a perda de pontos nos quesitos samba-enredo e tema-enredo tirou a chance da escola conquistar o bicampeonato. Um dos jurados de tema-enredo, em sua justificativa de nota, questionou: “como alguém pode guerrear pela paz”? A escola foi tomada de um misto de indignação, estupefação e inconformismo após a apuração, pois era nítido o clima de “já ganhou”. Com os descontos, a vermelho e branco ficou com o vice-campeonato, perdendo para a Estado Maior da Restinga que homenageou os 300 anos de Zumbi dos Palmares. Imperadores
do Samba perdeu o campeonato porque o jurado de tema-enredo questionou: “como
pode alguém guerrear pela paz?”. Reprodução YouTube Quero ser livre e viver Com violência jamais Dizia Gandhi, o guerreiro da paz (Maguila, Sandro Ferraz e Renato) 9º lugar: UNIDOS DA TIJUCA 2000 – “Terra dos Papagaios...
Navegar foi preciso!” Já
no grito de guerra o saudoso intérprete David do Pandeiro (1959 -2020) dizia:
“o mundo clama por paz”. Em 2000, no carnaval comemorativo dos 500 anos de
Descobrimento do Brasil, a Unidos da Tijuca apresentou o enredo “Terra dos
Papagaios… Navegar Foi Preciso!”, no qual (re) contou a história dos
portugueses da aventura das Grandes Navegações ao Descobrimento: a chegada ao
Brasil, o contato com os índios, a carta ao rei de Portugal e a primeira missa
rezada em solo brasileiro. O setor final do desfile abordava uma dose extra de
esperança no futuro do país. A última alegoria mostrava um índio em extinção e
um curumim renascendo, em nome da “paz, amor e esperança”. Naquele
desfile, houve polêmica devido ao uso da imagem de Nossa Senhora da Boa
Esperança e uma cruz. O carnavalesco Chico Spinoza chegou a ser detido e o
painel apreendido em plena Sapucaí. O delegado responsável pela operação chegou
a dizer que a escola já teria, com isso, alcançado seus minutos de fama, já que
possivelmente obteria uma má colocação. No entanto, o quinto lugar obtido foi o
melhor resultado em quase 50 anos. O
carro abre-alas da Unidos da Tijuca no carnaval do ano 2000. Crédito: Site
Apoteose. Paz, amor e esperança Uma voz anunciou É chegada a nova era Abençoada pelo Criador (Henrique Badá, Jacy Inspiração e Édson de Oliveira) 8º lugar: UNIDOS DA PIEDADE 2020 – “Francisco’s”. Em 2020, a Unidos da Piedade, a escola mais antiga
do carnaval de Vitória (foi fundada em 1955) e 15 vezes campeã da folia
capixaba, homenageou grandes personalidades do Brasil e do mundo com um nome em
comum: Francisco. O carnavalesco Paulo Balbino explicou à época que
o tema foi, na verdade, uma mensagem de paz e fraternidade para a comunidade e
todo o Estado. Com dois mil integrantes, a Piedade abriu o
desfile com duas alas coreografadas e um carro alegórico representando São
Francisco de Assis. Em cada destaque de chão, a escola apresentava um novo
Francisco e sua luta. Assim, levou para a avenida Chico Xavier, psicografando
palavras como "Amor", "Liberdade" e "Piedade".
Outro Francisco lembrado foi Chico Mendes, com carro alegórico e uma ala
voltada à natureza e à comunidade indígena que o ativista defendia. O último Francisco homenageado pela escola foi o
Papa Francisco, personalidade notória por seu discurso enfatizando a humildade
e a solidariedade. A verde, vermelho e branco louvou todos os Franciscos que
lutaram por causas humanitárias e são fontes de inspiração para todos. A
Piedade obteve o 5º lugar. Depende de nós fazer A humanidade semear a paz Como um rio de amor Sem desistir jamais (Robert, Rafael, Thiago, Fernando,
Leandro, Lucas, Carlos, Pinho, Daniel, André e Amanda) A escola mais tradicional
de Vitória obteve o 5º lugar no Grupo Especial em 2020. Foto: Paulo Silva. 7º lugar: TOM MAIOR 2012 – “Paz na terra e aos homens de boa
vontade” Em
2012 a Tom Maior fechou a segunda noite de carnaval no Sambódromo do Anhembi
levando para a avenida arcanjos e querubins para pedir paz e homenagear Marko
Antônio Silva, presidente que comandou a agremiação por 27 anos e morreu em
2011 em consequência de leucemia. Já era manhã de domingo (19) em São Paulo
quando a escola encerrou com tranquilidade sua passagem pela Avenida. A
comissão de frente da Tom Maior deu vida às ninfas e aos guerreiros da corte
celestial, que representava os lutadores que trarão paz à terra. A quarta
alegoria da Tom Maior, “Enfim, a comunidade em paz”, reverenciava as crianças,
consideradas o futuro da humanidade. O libelo a favor da paz, desenvolvido pelo
carnavalesco Marco Aurélio Ruffinn, rendeu à vermelho e amarelo do Sumaré o 7º
lugar no Grupo Especial.
A
Tom Maior encerrou a segunda noite de desfile no Anhembi com líderes que se
destacaram por uma postura pacifista. Foto: Folha Imagem. É tempo de mudar, somos todos irmãos E de mãos dadas vamos juntos num só coração Fazer o bem, sem distinção, por onde for Paz e amor! (André Nascimento, Bruno Tomageski, Carlos Dorea, Darlan Alves,
Emerson Bernado, Marquinhos Godin, Pedro Barnabé, Tonn Queiroz e Vinicius
Faria) 6º
lugar: MOCIDADE INDEPENDENTE DE PADRE MIGUEL 2004 – “Não corra, não
mate, não morra. Pegue carona com a Mocidade!” A GRANDE FAMÍLIA 2006 – “Pare, Olhe, Pense... Basta de Tanto
Acidente! Não Seja Imprudente! Seja Mais Consciente! A Vida é um Presente!” /
2016 – “Paz no Trânsito” O
sexto lugar desta lista é ocupado por duas escolas que se preocuparam em
abordar a paz e a educação no trânsito. A carioquíssima Mocidade Independente
de Padre Miguel apresentou no ano de 2004 para o Sambódromo do Rio o enredo “Não
Corra, Não Mate, Não Morra. Pegue Carona com a Mocidade”, do carnavalesco
Chiquinho Spinoza. O desfile teve o patrocínio parcial da companhia de bebidas
Ambev e quis mostrar que o perigo não é a bebida, mas a combinação dela com a
direção. A verde e branco de Padre Miguel mostrou como surgiu a primeira concepção de trânsito da história e até contou como foi o primeiro acidente automobilístico no país, sofrido em 1901 pelos escritores José do Patrocínio e Olavo Bilac. A Mocidade foi a última escola a desfilar na segunda-feira no sambódromo da Sapucaí e conquistou o 8º lugar. A Mocidade quis passar uma mensagem de paz e
educação no trânsito no desfile de 2004. Foto: Bruno Domingos/Reuters Pare, pense Olhe a sinalização Proteja quem te ama Siga em paz na direção (Santana e Ricardo Simpatia) Dois
anos depois da Mocidade, no carnaval de Manaus, foi a vez da escola de samba A
Grande Família retratar a educação no trânsito na Avenida, com “Pare, Olhe,
Pense... Basta de Tanto Acidente! Não Seja Imprudente! Seja Mais Consciente! A
Vida é um Presente!”, da carnavalesca Islene Botelho. As estatísticas do
Denatran (Departamento Nacional de Trânsito) mostravam à época que, em média,
20 mil pessoas morriam anualmente nas ruas e rodovias brasileiras. A
comissão de frente trazia 14 componentes com elementos cenográficos em forma de
caixões simbolizando as vítimas fatais no trânsito. O desfile do Galo de Ouro foi
marcado pela falta de energia no Centro de Convenções, onde se localiza o
sambódromo, em virtude de um acidente ocorrido na concentração com um carro
alegórico de outra escola. Sendo assim, não houve leitura das notas da agremiação,
sendo a mesma considerada campeã hors
concours (sem concorrer).
Em 2006, a comissão de frente trouxe
componentes com elementos cenográficos em forma de caixões simbolizando as
vítimas fatais no trânsito. O desfile da agremiação foi prejudicado pela
falta de luz no sambódromo. Reprodução Youtube.
Em
2016, a Gigante da Zona Leste reeditou o mesmo enredo e samba, apenas mudando o
título para “Paz no Trânsito”, e repetiu a mensagem social sobre educação no
trânsito. A agremiação se considerava em dívida com o público carnavalesco
devido ao apagão ocorrido dez anos antes o que prejudicou a escola na
apresentação do espetáculo. Por
conta da crise financeira do Brasil, o desfile de 2016, assinado pelo
carnavalesco Jorge Granjeiro, foi menos luxuoso e mais objetivo do que o de 2006.
Mesmo assim, a Grande Família levou o vice-campeonato. A Gigante da Zona Leste reeditou em 2016 a
mensagem social sobre educação no trânsito porque se considerava em dívida com
o público devido ao apagão ocorrido em seu desfile 10 anos antes. Reprodução
Youtube.
Paz no trânsito Respeite a sinalização Valorize a vida, não tem nada a ver Bebida e direção (Kleber Paiva, Marquinhos Dutam e Marquinhos Negritude) 5º lugar: UNIDOS DA COLONINHA 2008 – “Planeta
Terra, Amor e Vida” Uma
temática ambiental. Foi o que propôs a Unidos da Coloninha no carnaval de Florianópolis
em 2008. Em forma de uma crítica muito bem elaborada a escola abordou os
cuidados com o Planeta Terra de toda forma de vida. O
enredo assinado pelo carnavalesco Lucas Davi clamava por paz e pela preservação
da terra. A Gigante do Continente chegou em 4º lugar no carnaval. Um arco-íris de esplendor com muito amor Vai colorir a passarela Pedindo paz, preservação pra nossa Terra (Rogério Martins, Gule, Celso Carioca, Bokeira) 4º lugar: PEGA NO SAMBA
2020 – “Viva e Deixe-Me Viver,
Intolerância Jamais - O Pega Pede Paz” Última
colocada do Grupo Especial em 2019, a Pega No Samba tinha por intenção voltar à
elite do Carnaval de Vitória no ano seguinte, com um desfile contra a
desigualdade e a discriminação. Para isso, a agremiação de Consolação, na
capital capixaba, contou com moradores em situação de rua atuando como
voluntários no barracão. Além de participarem da preparação de fantasias,
adereços e alegorias, eles também vão desfilar pela escola em uma ala que
representa a inclusão social. As lutas entre índios, negros e portugueses deram o tom do enredo-manifesto. A Pega No Samba chegou em 4º lugar em 2020. A Pega no Samba mostrou animação e colorido
na avenida. Crédito: Leonardo Silveira/Prefeitura de Vitória-ES Meu canto ecoa por igualdade Sou Pega no Samba num grito de paz Eu ergo a bandeira, levanto poeira Intolerância jamais (Leandro Maciel, Thiago Meiners, Vinicius Vasconcelos, Rafael Mikaiá, Carlos Jarjura, Vlad Aks e André Cavalcante) 3º lugar: BAMBAS DA
ALEGRIA 2023 – “Onde houver ódio que eu leve o amor” A
Bambas da Alegria, de Uruguaiana, homenageou São Francisco de Assis, o protetor
dos animais, transformando oração em samba-enredo. O
título do enredo é autoexplicativo a respeito da proposta da escola, que chegou
em sexto lugar no desfile de 2023. Os ritmistas da
bateria de Bambas da Alegria desfilaram fantasiados de monges franciscanos. Peregrino pedindo por quem chama Ao divino clamando por quem sofre Palavra de paz, franciscano perdão Vida por tantas vidas, prece de devoção (Samir Trindade e Marcelo Demétrio) 2º lugar: UNIÃO DO
PARQUE CURICICA 2004 – “Verdade Pra Quem Viveu,
Miragem Pra Quem Não Viu, Invasão de Amor e Paz Nas Terras do Meu Brasil” No
ano de 2004 a União do Parque Curicica apresentou um enredo sobre um ser
interplanetário que pousa sua nave espacial em terras brasileiras, e se encanta
com a fauna e a flora, mas se decepciona com o homem que é alimentado por um
bicho de sete cabeças, representado pela ganância, poder, ira, miséria, ódio,
guerra e desunião. Então,
o visitante sideral, veste-se de anjo, e, com uma trombeta, faz ecoar uma linda
canção de amor e paz, que se espalha pelo ar, e contagia toda a gente. Apesar da boa intenção do enredo, este se mostrou um pouco confuso para os jurados e sob chuva incessante, a escola foi a 10ª colocada no Grupo B (terceira divisão) do carnaval do Rio de Janeiro e foi rebaixada para o Grupo C (quarta divisão). Curicica apresentou um confuso enredo de
cunho pacifista-interespacial debaixo de forte chuva e foi rebaixada. Reprodução
Canal Chico Frota/YouTube. Verdade para quem viveu Miragem pra quem não viu Invasão de amor e paz Nas terras do meu Brasil (Luis Maia, Marcelo Rodrigues, Robertinho Grande e Paulo Victor) 1º lugar: UNIDOS DE
VILA ISABEL (1993 e 2024) – “Gbala, o Templo da Criação” Apesar de
ser o único samba desta lista que não contém a palavra “paz”, a proposta
pacifista está implícita no tema enredo, levado à Sapucaí pela Vila Isabel em
1993 e que ganha reedição em 2024, novamente na escola do bairro de Noel, com o
mesmo samba assinado por Martinho da Vila. Para o desfile
de 1993, o carnavalesco Oswaldo Jardim (1960 - 2003) quis implantar uma nova
estética na Vila Isabel, mais alegre, mais colorida e passar uma mensagem
positiva. Assim, criou um enredo em que mesclou a realidade e divindades da
cultura iorubá para apontar soluções para os problemas enfrentados pelos seres
da Terra. O enredo
foi dividido em três partes: os problemas do planeta (a Terra estava muito
doente), as causas de tudo isso e a solução apresentada pelos orixás às
crianças, que fariam uma jornada mágica ao templo da criação, onde iriam
aprender os segredos para uma vida melhor. Mudar o mundo. Daí o porquê da
palavra gbala, que significa resgatar, salvar, conforme a letra desta
verdadeira obra-prima. Ou como explica o próprio Martinho na versão do samba de
2024: “significa socorrer quem está em perigo”. A classificação da escola em 1993 foi o 8º lugar. E agora, nas mãos do carnavalesco Paulo Barros, qual será a posição da Vila? A resposta será dada após a apuração na quarta-feira de Cinzas. Alegoria da Vila Isabel no desfile de 1993.
Foto: Júlio César Guimarães. Meu Deus O grande criador adoeceu Porque A sua geração já se perdeu Quando acaba a criação Desaparece o criador Pra salvar a geração Só esperança e muito amor (Martinho da Vila) Série de coluna anterior: A História do Carnaval na TV Brasileira |
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