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20 de maio de 2025, nº 39 Coluna anterior: Homenagem a Compositor Jacy InspiraçãoCANTIGAS TRADICIONAIS EM SAMBAS DE ENREDO Amigos do Sambario! Quem vos escreve novamente é Túlio Rabelo, do canal no YouTube TR - Sambas de Enredo. Nesta coluna, vamos lembrar de sambas de enredo que transcrevem trechos de cantigas tradicionais. São cantos entoados de geração em geração, pela cultura oral, perpetuando-se no tempo, sem geralmente sabermos quem criou. São de domínio público, não havendo nenhuma limitação em adaptar trechos em um samba enredo. E assim se fez… A presente coluna visa lembrar sambas de enredo, não tendo foco em criticar a reprodução destas cantigas. Sem dúvida, é da opinião de cada um, concordar ou não com a adaptação de versos populares em músicas e sambas. Vale destacar também que, não necessariamente lembrarei de todos os sambas de enredo, mas buscarei apresentar uma amostra que exemplifica bem o tema. Existem diversos sambas de enredo que citam em um verso uma cantiga ou música, mas por não transcrever de forma mais ampla, não as lembrarei aqui. Para alguns dos sambas enredo citados aqui, a menção talvez não seja exatamente de uma cantiga tradicional. Há casos em que é a adaptação de um trecho famoso de uma música popular de compositores conhecidos, ficando então no limiar de um e outro. Martinho da Vila - Vila Isabel 1967, 1970 e 1972 Martinho da Vila, em sua genialidade, sempre fez bom uso das cantigas, em sambas para a Vila Isabel. Em 1967, junto a Gemeu, finalizou bem o enredo “Carnaval das Ilusões” com o refrão “Ciranda, cirandinha / Vamos todos cirandar / Vamos dar a meia volta / Volta e meia vamos dar”. Em 1970, os versos vieram do Rio Grande do Sul, no embalo do tema “Glórias Gaúchas”. O samba de Martinho finaliza com os versos “Vou-me embora, vou-me embora / Prenda minha, tenho muito que fazer / Eu vou partir para bem longe, / Prenda minha, pro campo do bem-querer”, adaptação quase completa dos versos “Vou embora, vou-me embora / Prenda minha, tenho muito que fazer / Tenho de ir parar rodeio / Prenda minha, no campo do bem-querer”. Em 1972, o samba antológico “Onde o Brasil Aprendeu a Liberdade”, de Martinho, finaliza com o tradicional refrão “Cirandeiro, cirandeiro, oh / A pedra do seu anel / Brilha mais do que o sol”. Dois anos depois, a Unidos da Zona Sul fez pra 1974 o enredo “A Veneza Brasileira e sua História”, em homenagem a cidade de Recife/PE. A agremiação também utilizou-se do refrão “Cirandeiro, cirandeiro, oh / A pedra do seu anel / Brilha mais do que o sol” para finalizar seu samba. A agremiação viria a desfilar pelo Grupo 3, mas por algum motivo não desfilou. Fica a gravação, extraída de um raro disco da escola. Carnaval 1970 - Mocidade… Independente de Padre Miguel e Camisa Verde e Branco No Rio de Janeiro, Arsênio e Gibi, com genialidade, concluíram o bonito samba enredo “O Meu Pé de Laranja Lima” da Mocidade Independente de Padre Miguel com mais uma popular cantiga de roda. Trata-se de “Ai, eu entrei na roda / Ai, eu não sei como se dança / Ai, eu entrei na "rodadança" / Ai, eu não sei dançar” que foi levemente ajustado para “Ah eu entrei na roda / Eu entrei na roda-dança / Eu entrei na contra-dança / Eu não sei dançar” proporcionando um lindo encontro desta cantiga com o samba enredo. Em São Paulo, ainda como Cordão, o Mocidade Camisa Verde e Branco cantou “Festa das Flores”, ao som de uma bela poesia de Talismã e Márcia Figueiredo. “O cravo brigou com a rosa / A rosa pôs-se a chorar / A rosa ficou doente / O cravo foi lhe visitar”, é o refrão do meio deste samba enredo, que adapta quase que plenamente a famosa cantiga popular “O Cravo Brigou com a Rosa”. O presente samba inspira romantismo, com direito a casamento do icônico casal. Escute a gravação na voz de Noite Ilustrada, áudio que em meu canal TR - Sambas de Enredo, tive o prazer de ajudar a resgatar, junto a João Marcos (acervo e digitalização): Mangueira 1981 e a cantiga preferida do JK O Ex-Presidente Juscelino Kubitschek foi enredo na Estação Primeira de Mangueira em 1981. Falecido em 1976, os versos utilizam-se da cantiga preferida do homenageado para exaltar e demonstrar saudade: “Como pode um peixe vivo / Viver fora d'água fria /Como poderei viver / Como poderei viver / Sem a tua, sem a tua / Sem a tua companhia”. Considero o “peixe vivo”, uma boa sacada dos compositores Jurandir, Comprido e Arroz: Zuzuca na disputa do Salgueiro para 1973 Na disputa pro Carnaval de 1973 “Eneida, Amor e Fantasia”, o Zuzuca fez um samba de muito sucesso, que mesmo não embalando o desfile, ficou marcado na carreira do compositor, tendo sido inclusive gravado por Jair Rodrigues. Extraída de uma das mais populares cantigas de ninar do país, os versos “Boi, boi, boi / Boi da cara preta / Pega essa criança / Que tem medo de careta”, teve papel considerável no sucesso do samba enredo de Zuzuca, sendo utilizado comercialmente como título do samba “Boi Da Cara Preta (Eneida, Amor E Fantasia)”. Casamento na avenida… Bloco Boi da Freguesia 1978 O então Bloco de Enredo Boi da Freguesia da Ilha do Governador, hoje conhecido como a Escola de Samba Boi da Ilha do Governador, fez um lindo casamento na avenida em 1978, desfilando pelo Grupo 2. O enredo propunha, em plena pista, o Casamento do Mestre Sala com a Porta Bandeira. O “Lalalaiá Lalalaiá Lalalaiá Lalalaiá” presente neste samba enredo é simplesmente genial, pois tem a execução perfeita de uma marcha nupcial. É, portanto, a adaptação de uma melodia popular, imortalizada em casamentos. O samba foi gravado no disco dos Blocos de Enredo de 1978. Mais menções melódicas em forma de lalalaiá… A Acadêmicos de Santa Cruz em 1978 apresentou o enredo "Carlos Gomes - O Mestre da Musicologia Nacional". O samba enredo, gravado pelo eterno Dominguinhos do Estácio, tem seu lalalaiá com melodia em alusão aos acordes introdutórios da ópera "O Guarani" de Carlos Gomes, homenageado do enredo. Por sua vez, em 1976, o Império do Marangá, com seu samba enredo "Glórias do Teatro Municipal", tem seu lalalaiá referenciando melodicamente o balé "O Lago dos Cisnes", do compositor russo Piotr Ilitch Tchaikovski. A letra também cita diretamente “O Lago dos Cisnes” com o refrão “O Lago dos Cisnes / O balé que encanta o mundo inteiro / Revive no Carnaval / A festa popular do brasileiro”. Já em 1980, foi a vez da Caprichosos de Pilares, com o enredo "É a Maior", em homenagem a Emilinha Borba, uma das maiores estrelas da Era de Ouro do Rádio. Como o próprio samba cita, ela era a Favorita da Marinha do Brasil. Logo em seguida é entoado um lalalaiá com melodia em alusão ao "Cisne Branco", Hino da Marinha do Brasil que Emilinha já deu voz. Ô abre alas… Chiquinha Gonzaga No Carnaval de 1972, o Tupy de Brás de Pina ascendeu ao Especial de 1973, com um enredo em homenagem a Chiquinha Gonzaga. O samba enredo, curtíssimo, é eficiente em trazer uma melodia maravilhosa e marcante. Em determinado momento, a letra transcreve um de seus sucessos em forma de refrão: “Ô abre-alas, que eu quero passar / Eu sou da lira não posso negar”. Versos magníficos advindos de uma marcha-rancho de grande sucesso. Chiquinha Gonzaga compôs "Ô Abre Alas" em 1899, para o Carnaval de 1900, e ela é a primeira marchinha de Carnaval da história, um marco na música popular brasileira. A versão mais fiel ao que Chiquinha imaginou, é a de 1971 na voz de Dircinha e Linda Batista. Viva Zé Pereira que a ninguém faz mal O refrão “Viva Zé Pereira / Que a ninguém faz mal / E viva a bebedeira / Nos dias de Carnaval!” utilizado no samba enredo do Bloco de Enredo Baba do Quiabo para o Carnaval de 1979 advém do Século XIX. A folia carioca fez, de forma alegre e espontânea, a adaptação da peça francesa Les pompiers de Nanterre (Os bombeiros de Nanterre), cuja versão brasileira ajudou a popularizar o personagem. O hino carnavalesco caiu na boca do povo e perpetuou-se no imaginário popular. E o Bloco, desfilando pelo Grupo 1-B, com o tema “Rio Carnaval dos Carnavais”, resgatou de forma inteligente o popular refrão do Zé Pereira. Carlão Elegante deu voz ao samba enredo, que abre o disco de 1979 dos Blocos: Beija-Flor 1987 "As Mágicas Luzes da Ribalta" O caso de agora é de uma fascinante canção, que marcou época. Em 1952 era lançado o filme Limelight, de Charlie Chaplin, no Brasil nomeado como “Luzes da Ribalta”. O próprio Charlie Chaplin criou a música tema, que posteriormente teria versão brasileira de João de Barro, o Braguinha, junto a Antônio Almeida. E a Beija Flor, no enredo de 1987, trouxe de forma bonita os versos “Para que chorar / O que passou / Lamentar perdidas ilusões”, mantendo a melodia original de Chaplin. A novidade fica com o complemento do refrão “O meu povo vibra / Cheio de euforia / Extasiando os corações”, trazendo boa contribuição a discografia da agremiação nilopolitana. Versão original:
Versão brasileira:
O samba enredo da Beija-Flor para 1987:
O Rio Amanheceu Cantando A eterna Carmen Miranda, em 1934, deu voz a “Primavera no Rio”, mais uma obra-prima da carreira de João de Barro, o Braguinha. A canção começa muito bem com “O Rio amanheceu cantando / Toda a cidade amanheceu em flor / E os namorados vêm pra rua em bando / Porque a primavera é a estação do amor”. Os compositores Tolito e Otacílio Da Mangueira criaram um lindo samba para o enredo da Mangueira 1984, tendo ido até as semifinais daquela disputa de samba. Jair Rodrigues gravou como “Passarinho Engenheiro”, cujo letra em determinado trecho faz menção aos versos citados acima. A adaptação ficou assim: “O Rio amanheceu cantando / Toda cidade amanheceu em flor / Das pastorinhas choro de saudade / Da Colombina, do Arlequim e do Pierrot”. “Que Beijinho Doce” na Unidos de Bangu em 1978 Até pouco tempo atrás nada se sabia deste Carnaval da Unidos de Bangu, até que o CTAv Centro Técnico Audiovisual resgatou um vídeo raríssimo da escolha do samba enredo da agremiação para 1978. O enredo “Essa Dupla é uma Parada” era uma homenagem às atrizes Eliana Macedo (1926-1990) e Adelaide Chiozzo (1931-2020). O samba campeão de Crioulo e Nilo possui uma boa sacada transcrevendo a canção “Beijinho de Doce” de Nhô Pai em sua letra. Não é por acaso… as atrizes deram voz a canção, imortalizando-a em número musical presente no filme “Aviso aos Navegantes” (1950), de Watson Macedo. “Que beijinho doce, que ele tem / Depois que beijei ele, nunca mais amei ninguém…”. Interessante que os poetas incluíram o segmento “Que coisa boa é gostar de alguém / Que coisa boa é gostar de alguém”, dando um charme original ao samba. O samba enredo:
Eliana e Adelaide Chiozzo cantam "Beijinho Doce" (1950):
Esta ciranda quem me deu foi Lia / Que mora na ilha de Itamaracá Na disputa para 1997, cujo enredo era em homenagem a Olinda, o Mestre Monarco, junto a Mauro Diniz e Ratinho, transcreveram com inspiração os versos “Esta ciranda quem me deu foi Lia / Que mora na ilha de Itamaracá”, música de domínio público gravada pela primeira vez por Teca Calazans, em 1963. O samba foi finalista naquele ano:
Lia, com vasta carreira musical, foi homenageada em 2024 pela Nenê de Vila Matilde e pela Império da Tijuca. Na disputa do Império, a parceria de Samir Trindade e cia, tinha um belo refrão que também referenciava aqueles versos, adaptando para “Esse samba quem me deu foi Lia / Que é da Formiga e de Itamaracá”. Certamente há muito mais exemplos possíveis de se lembrar. O presente colunista aprecia o uso desses versos tradicionais, desde que, é claro, sejam executados com sabedoria. Creio que os sambas aqui lembrados, souberam adaptar bem a cultura oral aos enredos apresentados. Por fim, agradeço a Gerson Brisolara e Marco Maciel pelas dicas. O tema em questão começou a ser idealizado em Novembro de 2023, só sendo de fato escrito agora em Maio de 2025. Leia as colunas anteriores de Túlio Rabelo Inscreva-se no canal SAMBARIO no YouTube
Túlio Rabelo |
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