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Os sambas de 2018 por Luiz Carlos Rosa

Os sambas de 2018 por Luiz Carlos Rosa
E-mail: luizfuga@yahoo.com.br


As avaliações e notas referidas apresentam critérios distintos dos utilizados pelo júri oficial, em nada relacionados aos referidos desempenhos que as obras virão a ter no desfile

Veja também o último editorial com a análise de alguns sambas eliminados para 2018 (e 2017 também)

A GRAVAÇÃO DO CD -Qual é o melhor samba de 2018? Sinceramente não é uma pergunta tão fácil de responder, assim, de prontidão. Você irá receber várias alternativas. Temos pelo menos CINCO sambas que se equivalem positivamente: IMPERATRIZ, TUIUTI, BEIJA-FLOR, MOCIDADE e MANGUEIRA. Certamente os CINCO mais citados em vários debates carnavalescos seja na internet ou em alguma mesa de botequim. Logo atrás com sambas muito bons e levemente inferiores a estes CINCO estão PORTELA, SALGUEIRO e SÃO CLEMENTE. A safra é ótima, talvez uma das melhores dos ultimos 20 anos. Evidentemente tem samba ruim, um ou dois, mas não compromete a safra num todo. Vale ressaltar que os compositores, na ampla maioria dos sambas aqui presentes, estão tendo mais capricho na hora de fazer a letra. Pelo menos pra 2018 é notável a falta dos famosos versos trash que apareciam de ano em ano. Com relação a gravação, tem que haver uma grande MUDANÇA na cúpula da produção por que não dá mais pra ouvir faixas muito mal acabadas mesmo com o consentimento das escolas. Tá ficando chato essa padronização da sonoridade em praticamente todas as faixas. Os arranjos são de qualidade duvidosa. Outra coisa que me incomoda é o coro que deveria ser apenas na segunda passada dos sambas e nos refrões. E qual seria a solução na minha opinião? Teriamos uma gravação de estudio para o CD e uma outra em DVD. Assim os sambas voltariam a serem gravados em estúdio logo após o termino de disputas.  E mais pra frente uma gravação destes mesmos moldes atuais em DVD. Nesse mesmo pacote teriamos a explanação do enredo, entrevistas, shows ao vivo, bastidores... enfim tudo registrado em DVD. Tenho certeza que essa idéia daria certo, uma coisa separada da outra. 2018 marca o CINQUENTENÁRIO da produção dos Albuns de Sambas Enredo, que infelizmente nas ultimas decadas vem sendo DESVALORIZADO. NOTA DA GRAVAÇÃO: 5

1 - MOCIDADE - Aclamadíssimo na internet, chegando até a ser chamado exageradamente de transcedental, o samba da Mocidade realmente tem uma pegada impressionante. É um samba de melodia diferenciada, que foge do óbvio e além disso tem uma força descomunal. Da primeira parte, passando pelo sensacional refrão central até a entrada da segunda parte é um verdadeiro rolo compressor. Os versos "Hora de ser benzer / hora de ir ao mar / do sal à doce liberdade a tempo ainda / desobedecer pra pacificar / como um dia fez a Índia" é de uma otima qualidade tanto em melodia quanto em letra. E por falar em letra, tem uns probleminhas como por exemplo o fato da palavra India estar 3 VEZES no samba. Evidentemente, o enredo É sobre a India mas me incomoda a mesma palavra se repetida mais de duas vezes ao longo da obra. Outro problema: a segunda parte cai de produção. Tem algumas citações mas faltou mencionar a figura do Boi, animal sagrado do país e que estava bem destacado na sinopse. Na versão concorrente ele aparecia como caco na virada do refrão principal que aliás é arrebatador. No geral, a Mocidade em estética tem um samba belissimo em 2018, um dos melhores da sua história. Mas na minha opinião um pouquinho inferior ao samba de 2017. NOTA 9,4


2 - PORTELA - O samba foi muito conduzido pelo Gilsinho no CD, que aliás desde que voltou a escola vem se destacando ano a ano. Nesta versão oficial o samba tem um andamento perfeito, na mais pura cadência. A melodia está totalmente de acordo com o enredo proposto. Mas tem alguns probleminhas técnicos como no verso "E um dia Pernambuco / o portugues reconquistou" que não soa bem. Engraçado que esse verso era um BIS e as palavras "seu irmão reconquistou" foram substituidas por "o português reconquistou". Alem disso a melodia do segundo BIS "Chega criança, homem muié..." não está resolvida, apesar da mudança do tom. A letra descreve o enredo de forma objetiva principalmente na primeira parte. A entrada para o belo refrão de cabeça é sensacional. E com esse refrão sendo cantado duvido que algum portelense não se emocione. O resultado desse samba aqui é muito satisfatório. NOTA 9

3 - SALGUEIRO - O BANHO DE ARRANJOS energizou o samba salgueirense que antes era praticamente despercebido entre todas as faixas na versões concorrentes. O enredo pedia um samba com mais pegada e tinha que agradar de qualquer maneira o ouvinte em detrimento a um samba sem sal e preguiçoso. E a gravação foi perfeita com destaques para a introdução da Zezé Motta que é algo extraordinario, assim como o naipes de atabaques que deram uma força tremenda a obra no papel de desenvoltura. O samba no geral tem a letra que conta o enredo sem precisar fazer citações. O problema é quando chega no meio da segunda parte. O verso "Ecoou no quariterê / o sangue é malê / em São Salvador" era um BIS que teve o seu efeito quebrado por tal mudança. Com isso a segunda parte ficou muito mais extensa que a primeira. Os versos seguintes "Oh matriarca desse cafundó / a preta que me faz um cafuné..." são de gosto duvidoso e destoam do samba num todo. Já o refrão de cabeça "Firma o tambor..." só vai ganhar músculos se for cantado de forma vibrante. É um bom samba que melhorou muito no CD. NOTA 8,9

4 - MANGUEIRA - Se compararmos esse samba a um jogo de futebol foi por muito pouco que a escola - que fez uma grande partida - quase fez gol contra nos acréscimos. A diretoria logo assim que escolheu o samba resolveu inserir a palavra UNIVERSAL no refrão de cabeça. Se isso acontecesse a proposta da obra iria por agua abaixo. O verso "Pecado é não brincar o carnaval" não faria sentido algum. Graças aos segmentos da escola (que abominaram tal mudança) que a palavra - que chegou a dormir uma noite na letra da obra - foi excluída de vez. Quanto ao belo samba mangueirense, assim como o da Mocidade, foi bastante aclamado pelas redes sociais, mas nesse caso mais pela força de um enredo manifestativo, que é possivel brincar o carnaval sem dinheiro. A bem da verdade, o tema poderia ter sido um pouco mais feroz por que não engloba somente as picuinhas do atual prefeito carioca. A própria entidade que conduz os rumos das agremiações tem uma parcela muito grande para a quase derrocada do nosso carnaval. Politicos que estão dentro das próprias escolas em esquemas sujos. Mas isso é uma outra história. O samba tem uma otima melodia. O refrão principal é muito chamativo, gostoso de cantar e de ouvir. Já o início do refrão central "Somos a voz do povo / embarque nesse cordão" é espetacular. Aí surge o "láláia" que só está ali como ponte, ou seja, ligando esse verso citado com o próximo "vem como pode no meio da multidão". Em seguida o "não, não liga não" é de gosto duvidoso. A partir daí o samba cresce mesmo com o verso "sambando na cara da sociedade" que, se eu fosse um dos compositores, trocaria por "sambando na cara das autoridades" pra deixar a letra com mais ácidez ainda. Enfim, mais um otimo samba de 2018. Engraçado que toda vez que eu ouço esse samba lembro do saudoso intérprete Luizito. Talvez pela garra de cantar e essa obra cairia nele como uma luva. NOTA 9,3

5 - GRANDE RIO - A única virtude neste sambinha da Grande Rio é a animação por que sem duvidas é o pior samba do ano no Grupo Especial. Emerson Dias, que nesse momento é um dos melhores interprete do carnaval, carregou esse sambinha nas costas porque até ele sabe que a obra é ruim. A letra é bem simplória, repleta de clichês com músicas que fizeram sucesso nos programas do Chacrinha. A melodia alterna bons e maus momentos. Não entendi por que enfatizar o FICA-Á (cantado dessa forma) no verso "outra vez vou ficar / maluco beleza..." Indo mais a frente, o verso "se eu buzinar" virou na realidade "seu buzinar". O refrão central é bom, uma das poucas coisas que agrada no samba. Na segunda parte o samba de fato dá uma melhoradinha pois começa a contar o enredo depois de uma primeira parte enumerativa de clichês. Aí vem o verso "Recife... Em Surubim nasceu o Rei menino" onde a palavra "Recife" está completamente isolada e não tem fundamento algum no discurso do verso. Fora que a parte final do samba tem a melodia bastante requentada. Se um dos bordões do Chacrinha dizia que ele não veio pra explicar e sim pra confudir, esse sambinha veio com essa proposta. NOTA 6,5

6 - BEIJA-FLOR - A escola nilopolitana emplaca mais um ano com um belíssimo samba. Este aqui apela mais pelo lado emocional do que o sambaço de 2017 que ganhou o Estandarte de Ouro. O samba tem a melhor letra entre todas as escolas do Grupo Especial. Não precisa de sinopse pra falar de varios assuntos seríssimos como intolerancia, racismo, corrupção e principalmente a falta de amor entre os seres humanos. Chamo a atenção para o belíssimo trecho: "Mas o samba faz / essa dor dentro do peito ir embora / feito um arrastão / de alegria e emoção o pranto rola/ meu canto é resistência/ no ecoar de um tambor / vem ver brilhar/ mais um menino que você abandonou" é simplesmente fantástico. O refrão de cabeça é extraordinário, principalmente em termos melódicos. O refrão do meio, apesar de pequenos problemas de métrica, é excelente em seu discurso. Já a entrada para segunda parte destoa um pouquinho do restante do samba mas não compromete em nada. E Neguinho da Beija-Flor tem uma atuação exuberante, o que não é novidade pra ninguem. Belo momento da escola em matéria de sambas. NOTA 9,7

7 - IMPERATRIZ - Tecnicamente, é o MELHOR SAMBA do Grupo Especial na minha opinião. É o samba que tem o melhor casamento entre letra e melodia entre todas as coirmãs do grupo. Porém, a contida atuação do bom intérprete Arthur Franco, que foi um dos destaque do carnaval em 2017, fez com que o samba no CD ficasse mais comportado, diferentemente da versão concorrente cantada por Tinga, que colocou a obra num tom pra cima, do jeito que a melodia pedia. Mesmo assim não compromete em nada porque sabemos que a obra se sustenta sozinha. O refrão de cabeça "Gira coroa/ da majestade..." é excelente. O central - apesar do "tucanarara" em que a métrica ficou sem freios, transformando duas palavras em uma - tem uma pegada magnífica. E que efeito bonito o verso "Para o Rei de Daomé" que é um BIS dentro desse refrão. Já entrando na segunda parte nota-se o perfeito enlace entre a letra poética e a melodia suave dos versos "A brisa me levou para o Egito / onde um solfejo lindo da cantora de Amon / ecoa sob a lua e o sereno / perfumando a deusa Vênus sem jamais sair do tom". Aí o samba já te conquistou de vez. Enfim, é um samba que tem perfil pra ser trilha sonora de campeonato. NOTA 9,8

8 - UNIÃO DA ILHA - Parece que a Ilha não conseguiu bons ingredientes no seu samba. O enredo é batido, de fácil leitura porem faltou um pouco mais de técnica tanto na letra como em melodia. O refrão de cabeça é genérico, não tem força. A primeira parte em termos melódicos é até boa, principalmente quando o samba entra nos versos "Eta tempero bom eu quero provar...". Já em termos de letra me incomoda o excesso de rimas terminadas em AR. O refrão central é o grande momento do samba da Ilha. A segunda parte tem alguns deslizes como o versos "vó quitutera mexendo a panela / da nossa terra um gostinho especial / pro seu prazer doce cacau" em que a melodia é meio esquisita. A partir do final deste verso para o seguinte "Ilha / prepare a mesa..." tem um mudança brusca na melodia que chega a doer nos ouvidos. Dificil sentir o sabor desse samba que é absolutamente burocrático. NOTA 7

9 - SÃO CLEMENTE Leozinho Nunes me surpreendeu positivamente ao conduzir muito bem um samba totalmente fora de seu estilo vocal de interpretar, na minha opinião. Esse samba é bem pesado, mas tem a ver com o enredo, com uma melodia que é o grande destaque da obra. Logo de cara há uma marcação de silabas interessante em "Vem ver / convidei Debret..." O refrão central "É a força da mata / salve Sao Sebastião" melodicamente é fantástico. Tem uma sutileza que me agrada muito. Na segunda parte o samba passa tranquilo, correto, até chegar o ultimo verso da obra "Academicamente popular" onde a métrica vai pro espaço. Aí é preciso dar aquela corridinha pra poder caber tudinho dentro da melodia. É um bom samba, bem redondinho e é estranho o quanto ficou despercebido pelos internautas. NOTA 8,7

10 - VILA ISABEL - A Vila conseguiu encerrar sua ótima sequencia de sambas que vinha apresentando nos ultimos anos. O enredo extremamente complexo gerou um samba de letra estilo paulobarriana, que proriza o conceito visual. O trecho "Mergulhe fundo o passado é a fonte / quem nunca foi / jamais será" deixa muita gente com interrogações na cabeça: QUE FONTE É ESSA? QUEM NUNCA FOI AONDE? POR QUE JAMAIS SERÁ? DE QUE ESTÃO FALANDO? Outro problema é o refrão que é fraco melodicamente. A segunda parte tem alguns problemas de melodia como em "ensinamentos / efeitos bem mais que especiais" onde colocaram o "bem mais" por que sem essas palavras o "efeitos especiais" sobraria na melodia. Soa muito esquisito o verso "Riscaram o espaço e deram o passo" que na minha visão forçaram na rima. De bom o refrão principal que tem uma energia incrivel, mexendo com os brios do componente. O samba num todo é burocrático, não foge disso. NOTA 7,3

11 - UNIDOS DA TIJUCA - Coincidentemente, a Tijuca, assim como a Vila Isabel, adotou logo no primeiro verso do seu refrão de cabeça o clamativo "O povo do samba". Curiosamente um dos autores é filha de um grande baluarte da VILA. Mas isso não é momento pra insinuações. E por falar nesse refrão, convenhamos, é bonitinho mas requentado. A letra conta o enredo sobre Miguel Falabella de forma correta apesar de na segunda parte os versos serem longos. As citações de programas que ele participou estão bem encaixadas. O refrão é apenas razoável, mesmo tendo rimas terminadas em "ar" que buscam dar um efeito. Na parte final, o samba faz uma menção ao triste incidente no desfile de 2017 e que superou tal drama. No geral, um samba que dá pro gasto. NOTA 8

12 - TUIUTI - Indiscutivelmente é o melhor samba da história da escola, na minha opinião, superando o de 2001. É um sambaço feito por encomenda. Particularmente não sou muito a favor deste expediente, pois poderá virar uma tendência podendo acarretar até mesmo numa possível quebra das alas de compositores. Imagine uma escola entrando na avenida praticamente sem esse segmento? E como ficariam os compositores que fazem samba por amor a escola anualmente, independentemente de vencerem a disputa ou não? É algo a se pensar. Mas com relação ao sambaço, o seu grande destaque é a letra, muito bem feita, rebuscada e com várias imagens poéticas. Só faltou enfatizar mais o enredo. O samba focou em demasia a escravidão de pele negra sendo que a sinopse deixou claramente que o tema é amplo. Talvez os únicos versos que retratam isso de forma mais clara são os dos refrões "Pela luz do candieiro / liberte o cativeiro social" e o "Não sou escravo de nenhum senhor..." A melodia tem variaçoes interessantes apesar de em alguns momentos estar desconexa com a letra, como no final da primeira parte. Mas num geral não compromete o ótimo samba que tem refrões soberbos. Ao lado de Salgueiro e Portela, o samba foi muito bem gravado, com destaque para maravilhosa introdução. NOTA 9,6

13 - IMPÉRIO SERRANO - Samba extremamente funcional. O enredo sobre a China deu a oportunidade para os compositores fazerem uma mescla entre as tradições milenares chinesas e o Império do Samba, como se vê no verso "Império / de tradições imponentes / nos oriente a desvandar..." Aliás, a letra exalta muito mais a sua volta à elite do que o tema proposto, vista a segunda parte. Na minha opinião um certo exagero, até por que a instituição é GIGANTESCA e não precisa disso. O samba em si tem algumas soluções interessantes como o refrão de cabeça: "Deixa o povo cantar / matar a saudade do Império Serrano". Outro ponto forte é a melodia com variações bem arrojadas onde destaco o refrão central: "Quando soar o gongo...". E é nesse trecho que há o otimo casamento entre letra e melodia. Enfim... samba razoável, gostoso de se ouvir e fecha o CD de forma digna. NOTA 8,1

Veja também o último editorial com a análise de alguns sambas eliminados para 2018 (e 2017 também)