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Os sambas de 2018 por Carlos Alberto Fonseca

Os sambas de 2018 por Carlos Alberto Fonseca
Twitter: @eucarlosfonseca

As avaliações e notas referidas apresentam critérios distintos dos utilizados pelo júri oficial, em nada relacionados aos referidos desempenhos que as obras virão a ter no desfile
Carlos Alberto Fonseca é o apresentador do Carnaval Show na Rádio Show do Esporte, toda quarta-feira às 20h

Veja também o último editorial com a análise de alguns sambas eliminados para 2018 (e 2017 também)

A GRAVAÇÃO DO CD Em 50 anos de produção do álbum de sambas-enredo do carnaval carioca, completados em 2018 - desde o LP de 1968, passando pelo CD até as plataformas digitais de hoje em dia - já ouvimos de tudo: gravações de estúdio, ao vivo, coros abafando a voz principal, "We Are The World" do samba, intérprete chamando o outro ("Faz barulho pro Wantuiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiir"), explanações de carnavalesco antes do samba ("Tem se falado muito em preservação, tá em moda falar em ecologia...") e outras coisas mais. Só que para este ano, não bastasse ter acontecido sorteio pra saber quem seria a faixa 1 - a horrenda capa do álbum e a contracapa pior ainda - tudo por conta da divisão do título entre Portela e Mocidade, decidido só um mês depois da apuração - o CD do cinquentenário é aberto por... um interminável solo de violão que dura INTERMINÁVEIS UM MINUTO E DOZE SEGUNDOS. Na boa, precisava mesmo disso? Pulando essa parte indigesta, o bamba é agraciado por mais uma boa produção capitaneada por Laíla e Mario Jorge Bruno, destacando a mudança no estilo de gravação, com a primeira passada sem bateria - recurso usado nos CDs de 1996 e 2004 - para valorizar ainda mais cada samba. Outros grandes destaques do disco são a integração dos instumentos de base (principalmente o tantã) com a bateria e uma aparição maior dos desenhos de cordas, principalmente a viola. Quanto ao principal, isto é, a safra, destacam-se as grandes obras de Mocidade, Beija-Flor e Mangueira, seguidas de perto por Tuiuti, Portela e Salgueiro. Não temos nada do que reclamar do álbum que celebra as cinco décadas de samba registradas em disco, temos que reclamar é do que inventaram para abri-lo. - NOTA: 9.7

1 - MOCIDADE - "Padre Miguel chamou Shiva pro carnaval". Campeã do carnaval após 21 anos de jejum e graças ao erro na justificativa de Valmir Aleixo que tirou a escola da briga (e depois resultou na plenária que decidiu pela divisão do título) a estrela-guia de Padre Miguel nos presenteia com um estupendo samba-enredo. Da mesma parceria de 2017, é uma obra de melodia forte e letra inspirada do primeiro ao último verso. Atentem primeiro para a cabeça do samba: "Kamadhenu derrama leite em nosso terreiro/Ganesha tem licença do Cruzeiro/Desemboca o ganges cá no Rio de Janeiro/Os filhos de Gandhi hoje são brasileiros". Outro grande momento é a cabeça da segunda parte: "Clama o meu país/À Flor de Lótus símbolo da paz/E a vitória régia da mesma raiz/Pela tolerância entre os desiguais". Os refrões são excelentes, em especial o principal, que faz a ponte entre Nova Délhi ao céu brasileiro e exalta "O amor da Mocidade sem início, meio e fim". Wander Pires foi perfeito mais uma vez, até mesmo na chatíssima introdução da faixa. Aliás, pra que foram enfiar aquela viola fazendo firula por mais de um minuto, hein?! A bateria, que atuou nas duas passadas, tirou onda. Benditos sejam Altay Veloso e Paulo César Feital, estes monstros da MPB que se aventuram no carnaval com sucesso. Uma obra prima dessas nos faz esquecer qualquer briga inútil protagonizada pelas torcidas do carnaval na internet no período pós plenária. - NOTA: 10

2 - PORTELA - "Coração aberto, quem quiser pode chegar". A outra campeã (esta desde a quarta-feira de cinzas) de 2017, que enfim encerrou seu calvário de 33 anos, vem pra avenida com um sambão que cresceu ainda mais, todavia foi muito mexido em relação as eliminatórias, com diversas subidas de melodia. A obra começa muito bem ("Vamos simbora, povo vencedor/Contar a mesma história/Sou nordestino, estrangeiro, versador/Eh eh eh viola…") tendo mais a frente uma passagem que gosto muito: "Ô saudade que vai na maré/Passa o tempo e não passa a dor/E um dia Pernambuco o português reconquistou". O grande diferencial do hino portelense são os estribilhos espalhados, como o "Cada um em seu destino e a tristeza dá um nó". O melhor momento do samba começa na última parte ("É legado, é união, é presente, igualdade") e termina no refrão principal, com um trecho final lindo demais: "Vem irmanar a vida inteira/Na campeã das campeãs em Madureira". A Tabajara dá um show na faixa, bem como Gilsinho, que na divulgação das prévias do CD teve seu grito de guerra limado com fade out, posteriormente refeito para a versão integral. Aliás, os cacos feitos pelo intérprete com sotaque nordestino ("salve, salve, meu présidenti") são bem divertidos. Comovente a abertura da faixa pela comunidade entoando o "Hino da Portela" de Chico Santana - apesar da tosca edição no trecho que, curiosamente, consta a palavra "mocidade" - a pedido de Laíla. Pra registrar: até que enfim o "Vinte e uma vezes campeã do carnaval" de Tributo à Vaidade (1991) foi trocado, agora pelo "22 vezes minha estrela lá no céu" deste ano como o verso-exaltação às conquistas da águia. - NOTA: 9.9

3 - SALGUEIRO - "A alma não tem cor". Samba pesado (em melodia e letra) para exaltar as "Senhoras do ventre do mundo inteiro". Começo aqui destacando duas belas passagens da primeira: "A me guiar… vermelha inspiração/ Faz misturar ao branco nesse chão" e "Bendita ela é… e traz no axé um canto de amor/Magia pra quem tem fé/Na gira que me criou". A sequência que dá início a segunda parte ("Guerreira feiticeira, general contra o invasor/A dona dos saberes confirmando seu valor/Ecoou no quariterê/O sangue é malê em São Salvador") considero um dos grandes momentos do samba - e o meu preferido. Seus refrões, sobretudo o central ("É mãe, é mulher, a mão guardiã") são de uma força impressionante. O novo trio de cantores da Academia, formado pelo experiente Leonardo Bessa e pelos estreantes Tuninho Júnior e Hudson Luiz - este, pouco conhecido até então - conduziram com muita segurança a faixa, sendo auxiliados por Xande de Pilares (um dos autores do samba e pela sexta vez seguida dando expediente na faixa salgueirense) e a introdução que ganhou um requinte especial e primoroso de Zezé Motta. A Furiosa, que atuou na segunda passada, tem atuação convencional. Com um forte hino, o Salgueiro vai tentar buscar a "décima" firmando o tambor pra rainha do terreiro. - NOTA: 9.9

4 - MANGUEIRA - "Bate na lata pro povo sambar". O hino do carnaval carioca na atualidade. Em enredo de protesto contra as atrocidades praticadas pelo atual prefeito do Rio no que se diz respeito a cultura popular da cidade, a verde e rosa apresenta mais um senhor samba-enredo da safra. Os grandes destaques são a primorosa melodia, os refrões fortes (em especial o segundo, terceiro e o principal) o hino mangueirense começa forte, conclamando os sambistas a lutar pelo seu livre direito de carnavalizar: "Chegou a hora de mudar ôôô/Erguer a bandeira do samba/Vem a luz à consciência/Que ilumina a resistência dessa gente bamba" e tem grandes achados espalhados pela letra como "A minha escola de vida é o botequim/Com garfo e prato eu faço meu tamborim/Firmo na palma da mão, cantando laiálaiá/Sou mestre-sala na arte de improvisar" e trechos fortíssimos como "Vem, pode chegar/Que a rua é nossa, mas é por direito/Vem vadiar por opção/Derrubar esse portão/Resgatar nosso respeito". O estilo de gravação da faixa - sobretudo a primeira passada, em formato de pagode - me lembrou muito o samba de 2012, sobre o Cacique de Ramos. Neste ano, Ciganerey ganha a companhia do cantor Péricles, o rei da voz. Ambos abrilhantaram o hino verde e rosa, mostrando sintonia e entrosamento. No mais, a Mangueira vai gritar na avenida que é a voz do povo e que "pecado é não brincar o carnaval". Entendeu ou quer que eu desenhe, Crivella? - NOTA: 10

5 - GRANDE RIO - "Sou Abelardo, aquele abraço!". A tricolor caxiense conseguiu fazer um péssimo samba sobre Chacrinha. Parecia inimaginável, mas aconteceu. Com sambas bem melhores durante sua disputa, a escola optou por um samba animadinho e repleto de aspas e citações a sucessos que passaram pelos programas do comunicador. Segue a lista: "O show não terminou", "Outra vez vou ficar maluco beleza", "Agora, aguenta coração", "Quero vê-la sorrir, quero vê-la cantar", "São tantas 'emoções' eu te confesso" e por aí vai. O único bom momento do samba é o falso refrão que começa no ""Meu iaiá", quando a sirene tocar" e termina na releitura da clássica abertura do programa: "'Oh, Terezinha! Oh, Terezinha!'/Vai começar mais um Cassino do Chacrinha/'Oh, Terezinha! Oh, Terezinha!'/A Grande Rio é o Cassino do Chacrinha". Os destaques, mais uma vez, foram Emerson Dias e a Invocada, bem como a hilária participação de Stepan Nercessian (que viveu Chacrinha no teatro) incorporando o Velho Guerreiro. Ademais, o samba do centenário de Seu Abelardo não vai para o trono e merece um belo Troféu Abacaxi. - NOTA: 9.2

6 - BEIJA-FLOR - "Teu livro eu não sei ler, Brasil". Espetacular! Isso não é só um samba-enredo, é um grito de protesto em forma de poesia, uma ligeira porrada na cara, uma bazucada, ou como queira definir. É primazia do começo ao fim. A crítica já se escancara num achado da primeira: "O alvo na mira do desprezo e da segregação/Do pai que renegou a criação/Refém da intolerância dessa gente". Logo mais a frente aquele que considero o ponto alto da obra nilopolitana, o EXCEPCIONAL refrão central: "Estenda a mão, meu senhor/Pois não entendo sua fé/Se ofereces com amor/Me alimento de axé/Me chamas tanto de irmão/E me abandonas ao léu/Troca um pedaço de pão/Por um pedaço de céu". Refrão este que sucedido a um outro felicíssimo verso que abre a segunda: "Ganância veste terno e gravata/Onde a esperança sucumbiu" - aliás, este trecho quase ganhou um caco curioso: um grito de "Ladrão!" que foi rejeitado pelo patrono da escola. Ainda sobre a segunda, ela é encerrada com mais um belo trecho: "Meu canto é resistência/No ecoar de um tambor/Vem ver brilhar/Mais um menino que você abandonou". O refrão principal, bem, é outro achado, especialmente em seus versos finais: "Você que não soube cuidar/Você que negou o amor/Vem aprender na Beija-Flor". A interpretação do Neguinho dispensa comentários, bem como o arranjo da faixa num todo. Entra fácil na galeria de grandes sambas nilopolitanos. Enfim, é um samba que beira a perfeição. - NOTA: 10

7 - IMPERATRIZ - "Samba de verdade, identidade cultural". O samba que mais cresceu em relação às eliminatórias. Melodia requintada e uma letra que, com uma falha e outra, é muito boa e descreve muito bem o enredo sobre o Museu Nacional. O começo da obra é um achado: "Onde a musa inspira poesia/A cultura irradia no cantar da Imperatriz/É um palácio, emoldura a beleza/Abrigou a realeza, patrimônio é raiz". Não muito distante, outra passagem muito interessante: "No anoitecer dizem que tudo ganha vida/Paisagem colorida, deslumbrante de viver". A grande incógnita ao meu ver é o refrão central, em especial os dois primeiros versos: o "Voa tiê, tucano, arara" - cantado "Voa tiê, TUCANARARA" - e "Quero-quero ver onça pintada" (?!?!). A segunda parte começa dolente e aposta em vocábulos até então inéditos em um samba-enredo como "bororós", "chimus" e "grimpas". A mesma volta para o lirismo em seu final com "A luz dourada do amanhecer/As princesas deixam o jardim/Os portões se abrem pro lazer" até chegar no forte refrão principal que derrapa no lugar comum com o "relicário no bicentenário". Arthur Franco tem outra grande atuação, melhor até que a do ano passado. Uma bola dentro da produção foi a volta do histórico alusivo "O meu sonho de ser feliz, vem de lá sou Imperatriz" fora dos registros desde Breazail (2004). - NOTA: 9.8

8 - UNIÃO DA ILHA - "Bota água no feijão que o samba esquentou". Um enredo batido gera uma obra batida. E foi a vez da insulana cair nessa. Que samba chato. Falando sobre a culinária brasileira, a obra possui melodia de poucas variações (apenas no refrão central) e repleta de clichês, como o famigerado "Eita tempero bom, eu quero provar/Nas terras tupiniquins o que se planta dá" e "um gostinho sem igual". Não bastasse isso, ainda contém aqueles versos batidos que narram a mesma história que já vimos (e ouvimos) outras vezes como "E Tupã abençoou esse sabor da aldeia", "Riqueza milenar". Dois momentos fazem o samba crescer um pouco: o primeiro, o trecho que começa no refrão central ("Fogo aceso no terreiro das Yabás, ôô") e termina em "Sinto o cheiro de cravo e canela/Vó quituteira mexendo a panela" já na segunda. Ainda na segunda, o "Ilha, prepara a mesa do bar, faz a festa/Servimos um banquete à fantasia/Uma receita impossível de esquecer" é outro momento de "up" do samba. O refrão principal novamente apela para as expressões batidas em "Vou deixar água na boca/Provocar uma vontade louca". Ito Melodia interpreta bem ao estilo inconfundível dele, e o "Bonde do Caveira" dá seu show particular de ritmo, mas são insuficientes pra salvar o samba de uma indigestão. - NOTA: 9.4

9 - SÃO CLEMENTE - "Hoje quem chorava vai sorrir". Misturando valentia e emoção, a São Clemente exalta o bicentenário da Escola de Belas Artes do Rio. Todo em tom lírico e letra fiel a sinopse, o samba tem um começo em rima tônica: "Vem ver! Convidei Debret". De uma força impressionante é o refrão central ("É a força da mata, salve São Sebastião/Onde o artista encontra o povo, a beleza desse chão") e os versos finais da segunda parte: "A “missão” no peito de quem ama/Em manter acesa a chama/Recriar… os 200 anos de história/Numa linda trajetória/Academicamente popular". Aliás, é raro um samba da São Clemente ter uma citação ao samba-exaltação da escola ("A São Clemente vem aí, lê lê lê, quem chorava vai sorrir"). Por fim, o aguerrido refrão principal exalta "A mais bela arte" e o "retrato fiel" que é a escola de Botafogo. Leozinho Nunes conduz muito bem a faixa, auxiliado pela convencional performance da Fiel Bateria, com bossa em sua entrada. Grande destaque para a linda homenagem feita ao ex-presidente Ricardo Gomes, falecido em setembro, no fim da faixa com a frase "Eu sei que você está nos braços de Deus. A São Clemente te ama!" entoada por Leozinho. Valente obra clementiana. - NOTA: 9.8

10 - VILA ISABEL - "O povo do samba é vanguarda popular". Samba que é bem a cara do Paulo Barros: não tem nada brilhante, é só um mera trilha sonora para sua mente criativa. A letra começa com um ligeiro convite para o futuro conforme o enredo: "Quem quer tocar o horizonte/E conhecer o que virá/Mergulhe fundo, o passado é a fonte/Quem nunca foi, jamais será". Todavia, a primeira parte termina com uma melodia genérica ao esticar o verso "Briiiiiiiiiiiilhaaaaaaa nooooo meeeeeu ser". A meu ver o melhor momento do samba é o refrão central: "O mundo gira nas voltas da Vila/Rodas da vida que movem moinhos". A segunda apelando para um tom narrativo dos fatos: "Nas ondas do rádio ou na televisão/Na sétima arte que mostra até mais/Ensinamentos, efeitos bem mais que especiais/Aventureiros cruzaram o oceano/Chegaram ao fundo do mar/Riscaram o espaço e deram um passo/Maior que o homem podia imaginar". O jogo de palavras "ciência/consciência" antecede o funcional refrão que exalta a Vila em sua totalidade, que une "o moderno e o tradicional". Igor Sorriso mais uma vez valoriza a faixa. A bateria, bem no registro, já ganha as características do recém chegado Chuvisco: andamento pra frente e com diversos desenhos de terceira. - NOTA: 9.7

11 - UNIDOS DA TIJUCA - "Sai de baixo! Chegou a hora, é a vez do povo do Borel". Buscando apagar da memória o trágico desfile de 2017, a Tijuca buscou inspiração na vida e obra de Miguel Falabella o caminho para se reerguer. O enredo que inicialmente foi rechaçado por alguns torcedores da escola resultou um grande samba-enredo. A grande sacada, tanto de enredo, quanto de samba, foi fugir das inúmeras citações a obras de Falabella, seja atuando ou escrevendo, buscando narrar sua infância na Ilha do Governador ("Na ilha encantada, a lembrança/No reino dos mares, a inspiração") e suas inspirações de menino ("Espelho de “clara” sabedoria/A escrita o fascinou/Fez do Tablado a sua vida/Arcanjo do riso, poeta do humor"). Destaco também as citações, no mínimo, interessantes para as obas mais recentes do artista: "No carnaval, um “toma lá da cá” de gente bamba/Que tira o “pé da cova” quando samba". Os pontos altos do samba tijucano são o ótimo refrão central ("Quando a luz acender, o céu clarear/O morro descer pra vê-lo brilhar") e os versos finais da segunda, que são os mais felizes e oportunos possíveis: "Tijuca, escola de vida, és minha paixão/As lágrimas de outrora já não rolam mais/Se rolarem é emoção!". O refrão principal, que é muito bonito, quase foi modificado devido ao verso "O povo do samba chamou" já que "povo do samba" ganhou forte assimilação à Vila Isabel. Uma polêmica desnecessária, lógico. Grande destaque no fragilizado desfile anterior, Tinga conduz muito bem o samba. O "poema de amor" ao inesquecível Caco Antibes não é coisa de pobre. - NOTA: 9.8

12 - TUIUTI - "Pela luz do candeeiro, liberte o cativeiro social". Fazendo sua melhor participação no Grupo Especial (dois anos seguidos) com o não rebaixamento no carnaval passado, a azul e amarelo narra os 130 anos da Lei Áurea com um samba que toca o coração. A letra é uma primazia mesmo não encaixando na melodia em sua totalidade. A primeira parte tem belas e felizes passagens no começo ("Irmão de olho claro ou da Guiné/Qual será o seu valor? Pobre artigo de mercado/Senhor, eu não tenho a sua fé, e nem tenho a sua cor/Tenho sangue avermelhado") e no fim ("Mas falta em seu peito um coração/Ao me dar escravidão e um prato de feijão com arroz"). A parte seguinte a esta ("Eu fui mandinga, Cambinda, Haussá") é que deixa a melodia bem fragilizada. O refrão central tem outro trecho muito bom ("Onde mora a senhora liberdade/Não tem ferro, nem feitor...") e a segunda parte é um absurdo de linda, principalmente neste trecho: "Deu no noticiário, com lágrimas escrito/Um rito, uma luta, um homem de cor/E assim quando a lei foi assinada/Uma lua atordoada assistiu fogos no céu/Áurea feito o ouro da bandeira/Fui rezar na cachoeira contra bondade cruel". Os dois refrões seguintes ("Meu Deus! Meu Deus! Se eu chorar não leve a mal"; "Não sou escravo de nenhum senhor") são de uma pureza impressionante. De contratação bem criticada, Nino do Milênio faz aquela gravação convencional e ganha a companhia dos dois grandes destaques do Carnaval de São Paulo na atualidade: Celsinho Mody (que divide o microfone com Nino, alternando-se entre o Rio, a Tatuapé e a Torcida Jovem, estas de São Paulo) e Grazzi Brasil, de recente passagem pelo The Voice e que vai compor o carro de som do Tuiuti - além de ser a voz principal do Vai-Vai. Os dois conduziram muito bem a faixa, cada um no seu estilo, destacando o "Eu sou livre" entoado por Mody. Na segunda passada, a Supersom opta por fazer bossas rápidas mais para o final do samba. Independente do que acontecer, a Tuiuti passará na avenida com o segundo maior hino de sua história - perdendo, claro, para 2001. - NOTA: 9.9

13 - IMPÉRIO SERRANO - "Império de tradições imponentes, nos oriente a desvendar". Após torturantes nove anos, o Reizinho volta ao seu lugar, e de quebra gravando pela primeira vez na Cidade do Samba - em 2009 o CD ainda era gravado em estúdio. Todavia, o Império tem um enredo complicadíssimo e um samba mais ainda. Não que a China seja um enredo pra lá de inspirador, já que a solução encontrada pelos compositores foi encher a letra de aspas e mesclar a cultura chinesa com o gingado imperiano - vide este trecho da primeira: "Numa cidade majestosa e proibida/Ganha vida, uma aquarela imperial". Neste recurso há muitas passagens que acabam no lugar comum como "A dinastia registrada nos metais/Salve os ancestrais/Um legado imortal" e "A sabedoria tão perfeita/Feito um oásis de invenções". O grande momento do samba é a a parte final: "Sua 'fortaleza' é o que me faz seguir/Sou mais um guerreiro a lutar por ti/'Não desfazendo de ninguém'/Voltei ao 'meu lugar'/'Serrinha custa mas vem'/Pra ficar" que desagua na repetição principal: "Deixa o povo cantar/Matar a saudade do Império Serrano". Marquinho Art'Samba conduz muito bem a faixa, e a Sinfônica se destaca com várias bossas. O samba está muito longe de ser grande coisa, mas é suficiente para, conforme a letra, "matar a saudade do Império Serrano" no Grupo Especial. - NOTA: 9.5

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