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Ubuntu (São
Clemente - 2021)
Somos
um, somos todos a cuidar uns dos outros e do nosso lugar. Ubuntu, termo
africano da língua Zulu, oriundo do tronco linguístico
bantu, se conjuga na primeira pessoa do plural: NÓS.
Ressignifica a construção de um futuro dentro do
presente. A coletividade nos alcança. “Ubu” evoca a
ideia do ser e “ntu” indica toda manifestação
do ser-sendo, em constante movimento. Nossa Escola de Samba se
transforma em Escola de Vida, voluntária de uma grande
missão social, na qual o princípio é a garantia do
bem-estar coletivo dos seres humanos ao redor do mundo. São
Clemente! Nós, eu e tu, somos uma só voz. O encontro
étnico enriquece os gestos afetivos e contínuos à
realeza africana. Conecta-nos à vivência e aos
ensinamentos da Mãe África; traduz o sentimento da
filosofia ubuntu, identidade de uma gente de pele preta que
compartilha, que é solidária à dignidade humana e
à troca de saberes. O ser-sendo clementiano flerta com o mundo
negro africano, cria laços de apoio mútuo, veste a
esperança e personifica, em desfile, a xenofilia. Enreda-se
à reativação da comunidade afreekana, à
plena realização do ser: o direito a ter direitos,
Humanidade para Todos!
Ardente em sensações vivas, a rara missão, pulsa. Afaga a dor, emana amor e gratidão. Anuncia o alcance adquirido pela força das ações humanitárias. Materializa a generosidade e o desprendimento – valorizando o trabalho e a crença das mulheres Yanomamis. Incorpora o espírito de ubuntu ao colo materno de Amma, a santa dos abraços. Pede benção, saúda as Ialorixás, matriarcas do terreiro que preservam a humanidade do seu povo nas religiões afro-brasileiras. Corre, acolhe, ampara, socorre, renova a bondade das missionárias religiosas. Segue! Recria a fé e o pranto, a romaria de um velho padre, quase santo. Cultua um santuário à vida, um rito de humana compaixão que firma o passo e estende a mão. Solta a voz da memória e denuncia: tipificado ou estrutural, racismo é crime. Como trança que nos aproxima, segue a ancestralidade nos rincões escravocratas e ecoa pelos ares a resistência e a luta do Quilombo dos Palmares. Humanidade? Essa fora negada com os fragmentos de uma lei. Uma áurea exclusão de uma política conservadora de libertação. O punho é cerrado contra o mito da democracia racial: o negro desafia, atua, experimenta, ergue-se da palavra, despadroniza a tormenta! Luta Abdias, luta Mandela, lutam Luther King e Malcolm X, todos prestam à terra - de que são filhos - discursos bravios à condição de sujeitos de conhecimento contra a discriminação racial. Ao som da reciprocidade, Teresa lidera um quilombo, Garcia envia uma carta, o diário de uma favelada inspira…pois a fala da mulher preta nasce desse chão. Tudo em movimento: negro, unificado e antirracista; ubuntu da nossa existência junta e reflete da alma os protestos de que vidas negras importam! A vida eleva o conceito da filosofia ubuntu para além dos territórios africanos. Sem perder o foco, a missão segue, enxerga e envolve-se. Salvando vidas sem descanso na lida do dia a dia, sejam pessoas afetadas por acidentes naturais, conflitos armados ou pandemias, o trabalho de Médicos sem Fronteiras, de organizações de saúde e voluntários, aponta para onde caminha humanidade. Atos, atitudes, sensibilidade! Ação da Cidadania sugere “fome zero” para um Brasil em estado de calamidade. Age na contramão da desigualdade social e coroa, a luz da caridade, a princesa Diana como a “rainha do povo”. A ensinagem da vida afirma-se da arte das bonecas abayomis, feitas sem costura, que trazem a herança cultural africana do “abay” – encontro – e “omi”, precioso, como representação, no enredo do meu samba, das ações sociais realizadas pelas Ong´s - organizações não governamentais. Nesse trajeto do pensamento africano, a história educa e a missão clementiana preserva a ética humana, incluindo as ações desenvolvidas por meio da educação integral do Instituto Ayrton Senna, a valorização do grupo e o respeito às diversidades. E recriando a esfera de valores da Humanidade para Todos, atualiza os dados! Integrando a essa mesma humanidade, promove o sentido ecológico de ser e estar no mundo, um ato político de respeito ao meio ambiente. Permitindo-nos ouvir a voz da Natureza, o canto dos girassóis, enxergar o suor das folhas a cada raiar do sol e denunciar os diversos crimes ambientais: as queimadas das florestas, a caça predatória de animais em extinção, a poluição dos ares e dos mares. Tudo sufoca e destrói a Grande Mãe, a única que pode garantir a nossa própria sobrevivência. Como consequência natural da formação da cultura popular, a missão social da São Clemente compartilha do mesmo sentimento de comunidade levando-nos à compreensão das linguagens artísticas como vínculo de humanização deflagrado da preservação da memória, das tradições e dos valores de pertencimento: “eu sou na medida em que o meu coletivo é”. E se conecta com o que de mais profundo e humano cada um de nós guarda em si. Diretamente ligada à cosmovisão dos mitos populares da cultura bantu, tudo se alinha à ética africana e ecoa espontaneamente dos tambores de crioula, da tradição dos jongueiros e dos laços identitários do bloco Ilê Ayê. Encontra com o samba e com o conceito de união, herança que se aprende quando criança. A alegria é coroada pela relação dos seus ideais: desfila os ensinamentos das escolas mirins e preserva a cultura dos nossos carnavais. É a saga dos encontros, que (re)conecta pessoas e entidades a um grande abraço social, no qual a Escola de Vida sugere uma reflexão contra todo tipo de preconceito e discriminação. A São Clemente é o Carnaval da Inclusão ser-sendo resistência, porque Somos Todos Nós UBUNTU. GLOSSÁRIO: Afreekana – é o primeiro sistema de organização social no mundo e o responsável por manter viva a população afrodescendente. Ialorixá – nos terreiros de candomblés, é a mãe de santo, matriarca responsável pelo culto aos orixás. Yanomamis – refere-se à Associação das Mulheres Yanomami Kumirãyõma (AMYK) criada em 2015 pelas mulheres Yanomami da região de Maturacá para valorizar os saberes das mulheres e estimular os jovens sobre o conhecimento tradicional, especialmente sobre o artesanato. Xenofilia – sentimento de simpatia pelo estrangeiro, congraçamento com outras culturas. REFERÊNCIAS: GLOBAL Humanitarian Assistance. Defining humanitarian assistance. 2017. DOSSIÊ IPHAN. Jongo no Sudeste. Brasília, DF: Iphan, 2007. NOGUERA, Renato. Ubuntu como modo de existir: Elementos gerais para uma ética afroperspectivista. Revista da ABPN.V.3 p. 147-150. 2011. PONTES, Katiúscia Ribeiro. Kemet, escolas e arcádeas: a importância da filosofia africana no combate ao racismo epistêmico e a lei 10639/03; 2017. RAMOSE, Mogobe B. A ética do ubuntu. 2002. _________, Mogobe. Globalização e ubuntu. In: SANTOS, Boaventura; MENESES, Maria Paula (Orgs.). Epistemologias do Sul. São Paulo, 2010.p.175-220. |
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