Sinopse Renascer 2008
É
chegado a Portugal o tempo de padecer, se te oprime a cruel
França, sorte melhor hás de ter... (Renascer de Jacarepaguá -
2008)
No ano em que se completam 200
anos da chegada da família real portuguesa na cidade do Rio de
Janeiro, a Renascer de Jacarepaguá realiza uma expedição ao
Mosteiro de São Vicente de Fora, em Lisboa, visando desvendar a
história daquele que foi o grande responsável pela formação
do Brasil enquanto nação - D. João VI. Seus restos mortais
foram enterrados no chão da Capela dos Meninos de Palhavã, em
potes de porcelana. Dentro desses potes foram encontrados em bom
estado de conservação alguns manuscritos que acreditamos ser
anotações feitas pelo próprio D. João sobre a sua viagem ao
Brasil. Conclusão essa tomada por se tratar de um documento
datado de 1821, e por uma das frases que se encontram logo no
inicio do documento.
Por sua riqueza de mensagem em 2008 esse trecho transforma-se no
enredo da agremiação da Zona Oeste que desenvolve o seu
carnaval revivendo na Sapucaí fatos da vida do emblemático Dom
João VI. A frase de autoria popular e que foi adotada pelo
então príncipe Regente expressa o seu sentimento sobre a saída
de Portugal.
"É chegado a Portugal o tempo de padecer,
se te oprime a cruel França,
sorte melhor hás de ter...".
26 de abril de 1821...
Aos vinte e um dias do mês de abril do ano de 1821 minha
esquadra zarpa do cais do Rio de Janeiro rumo a Portugal.
Recordo-me ainda dos momentos de aflição que me fizeram deixar
para trás há 14 anos minha terrinha querida - Portugal.
Era o ano de 1807 e o impiedoso Napoleão Bonaparte com sua sede
de poder decide me obrigar a virar as costas para meus mais
fiéis parceiros econômicos - os ingleses. Estava eu entre a
cruz e a espada, por um lado cumprir com os meus acordos
econômicos junto à coroa inglesa, e, por outro desobedecer a
Napoleão e ser invadido por suas tropas.
Tentei por muito adiar essa decisão e juntamente com meus amigos
ingleses criamos estratégias a fim de iludir o imperador
francês. Tudo em vão! Em outubro de 1807 Napoleão ordena a
invasão de minhas terras. Estava a ponto de perder para sempre a
coroa do meu reino. Incentivado mais uma vez por meus fiéis
parceiros ingleses decido por me retirar um tempo, levando comigo
toda a corte para terras distantes. O ponto de exílio é uma de
minhas colônias que ficam além-mar. Uma terra a certo ponto
desconhecida de nome Brasil.
Os preparativos da viagem se dão às pressas, não há muito
tempo para organizações. Sigo na frente a fim de acompanhar de
perto todos os acontecimentos. No porto muita correria e
confusão, baús empilhados, a chuva que caía sobre Portugal
teimava em molhar livros, móveis e quadros, que estavam prontos
para o embarque. Logo após minha chegada começou aparecer o
restante de minha família: minha esposa Carlota Joaquina e meus
filhos. Tenso mesmo foi o momento de embarque de minha santa
mãezinha. Oh, coitada! Desde a morte de meu irmão,
verdadeiramente preparado para ser rei, foi tomada pela loucura e
ficou incapaz de governar, passando para mim esse fardo. Ela
relutou bastante em embarcar e bradava aos quatro cantos seu
desejo de ficar e lutar por seu reino contra os inimigos. O
último a embarcar foi meu filho mais velho Pedro, popular no
reino foi saudado pelos súditos como nenhum outro membro da
comitiva fora.
Aos 29 dias do mês de novembro do ano de 1807 meus navios,
favorecidos por um vento que soprava, começaram a partir em
direção as novas terras. Em questões de horas as tropas
napoleônicas já estavam em Lisboa. Escapamos por pouco! É
chegado a Portugal o tempo de padecer, se te oprime a cruel
França, sorte melhor hás de ter. Seguimos viagem escoltados
pela esquadra inglesa, e enfrentamos muitas tempestades e
tormentas. Por diversas vezes os navios se desencontraram,
gerando em todos uma sensação de preocupação. A organização
às pressas da viagem fez com que os baús carregados com os
pertences pessoais de cada um fossem misturados e se encontrassem
em navios diferentes. Muitos foram os que passaram todo o trajeto
com a mesma roupa. Os víveres e a água de qualidade também
eram poucos e se esgotaram com facilidade. Não felizes com
tantos infortúnios fomos abatidos por uma forte epidemia de
pulgas e piolhos o que fez com que muitas damas raspassem suas
cabeleiras a fim de extinguir de vez a peste.
Era janeiro de 1808 quando chegamos à costa da Bahia, sou
obrigado a alterar a minha primeira idéia que era de ir direto
para o Rio de Janeiro, pois a situação da viagem era muito
difícil, todos mereciam um momento de descanso, inclusive eu.
Fundeamos na costa da Bahia e fomos visitados pelos governantes
do local. Já desembarcado através de uma carta régia abri os
portos do Brasil as nações amigas, era o meu primeiro ato na
nova terra.
Fiquei nas terras da Bahia até o dia 26 de fevereiro, quando
decidi terminar o meu trajeto, e zarpamos novamente em direção
ao Rio de Janeiro, encerrando minha viagem aos oito dias do mês
de março de 1808. Foi uma longa jornada, mas acredito que a
partir de agora uma nova história se inicia aqui nessa terra, e
desembarco do navio Príncipe Real disposto a daqui dar
continuidade ao meu Reino.
Junto com minha esposa Carlota Joaquina e meus filhos seguimos em
cortejo pelas ruas atapetadas de folhagens. A cidade se
enfeitara. Janelas com grinaldas de flores, famílias vestidas
com suas melhores roupas e ostentando suas melhores jóias
contrastavam com as impressões de minha senhora que achava tudo
péssimo. Enquanto eu me extasiava com o carinho recebido
acenando feliz minha esposa chorava copiosamente.
Passado o período de instalação da realeza iniciei uma série
de movimentos que visaram o rápido desenvolvimento da antiga
colônia, e tentei dar ares mais europeu naquela que mais tarde
elevei a Reino Unido a Portugal e Algarves.
Logo no primeiro ano dentre meus reais atos decretei a liberdade
de comércio do Brasil e revoguei a proibição de construção
de fábricas; criei o ensino médico na colônia e Biblioteca
Real; elevei a casa da Relação à categoria de casa da
Suplicação; fundei a imprensa Régia, que inaugurou o
surgimento da imprensa brasileira; criei o Jardim Botânico, o
Banco do Brasil, a Academia Real Militar na corte e na cidade do
Rio de Janeiro; criei a Guarda-Marinha; além de fundar no Rio de
Janeiro o Teatro São João, palco de grandes acontecimentos da
época. E querendo dar ares mais imperiais ao novo reino, com
intenção de terminar meu processo de europeização abri as
portas do Brasil em 1816 à missão artística francesa que
trouxe entre outros artistas Jean-Baptiste Debret e Nicolas
Antonine Taunay, artistas esses que caíram em descrédito na
Europa após a queda do meu inimigo Napoleão.
Já acertado anteriormente após muita negociação o casamento
de meu filho mais velho Pedro acontece por procuração com a
arquiduquesa austríaca Dona Leopoldina, que e em 1817 chega ao
Brasil com grande pompa. Sua comitiva era simplesmente suntuosa!
Com ela desembarcaram suas damas de honra, criados de todos os
tipos e funções, artistas, médicos e naturalistas, entre eles
o Dr. Mickan (professor de botânica), Dr. Natterer (zoólogo),
Dr. Pohl (mineralogista) e o bibliotecário Roque Schuch.
Durante o período em que estive no Brasil ocorreram muitas
batalhas dentre as quais o movimento republicano Pernambucano,
que fortemente apoiado pela maçonaria só foi possível devido:
primeiro a Pernambuco ser uma província riquíssima em função
dos engenhos de cana de açúcar, e em segundo lugar ao
sentimento nativista fortíssimo. Os pernambucanos da época
chegavam a retirar da mesa produtos europeus, substituindo muitas
vezes a farinha de trigo por farinha de mandioca e o vinho pela
cachaça.
Fiquei em terras brasileiras por 13 anos e habituei-me aos
costumes da terra, no entanto, minha esposa continuava
descontente e reclamava uma volta a Europa. Os apelos de Carlota
ganharam força a partir da revolução constitucionalista que se
instalou em Portugal. Agora já rei, após a morte de minha amada
mãezinha, tentei o quanto pude administrar os acontecimentos
aqui do Brasil, mas tenho de partir e levo comigo minha esposa e
sete dos meus oito filhos vivos. Só Pedro, o mais velho, ficará
no Brasil como Príncipe Regente. Minha comitiva é composta de
14 navios, que levam também 4.000 cortesãos e serviçais.
Enquanto parto saudoso da terra que deixo para trás e de meu
filho Pedro, minha esposa Carlota Joaquina se realiza com o sonho
de retornar a Europa, desejo este, que faz questão de alardear a
todo o momento. Eu retorno a Portugal ciente do importante legado
e das profundas transformações ocorridas na antiga colônia,
atos essenciais e formadores da nação que todos podem chamar de
Brasil.
Léo Morais e Sérgio Silva, carnavalescos