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Um Canto para a Eternidade

SINOPSE ENREDO 2013

Um Canto para a Eternidade

Desenhou-se no céu azul o plainar da revoada. Seres alados bailavam entre as nuvens quando um deles se deixou levar pela maciez do vento e pôs-se a repousar nas mãos de Santa Teresinha.

Era um pequeno pardal dotado de um aveludado canto que encantou os anjos e fez correr pela face lisa da santa uma lágrima de emoção. A gota se transformou em luz e se dirigiu ao frágil ser cantor. A plumagem acastanhada dourou-se e, aos poucos, o pássaro e a luz tornaram-se um só. Formou-se uma estrela cintilante que, lentamente, despediu-se da imensidão celeste e descansou sob uma calçada de Belleville.

A estrela transformou-se em mais um frágil e jovem ser que, se não apresentava mais a plumagem, permanecia carregando consigo a doce voz. Em meio à fria e cinzenta calçada ecoava o choro da pequena Edith. Ali se deu sua primeira apresentação.

Mesmo não sendo mais um ser alado, a vida lhe obrigou a conseguir "voar com as próprias asas". Herdou da mãe o dom da música, mas não foi considerada digna, por ela, de obter também o seu amor. Desde muito jovem sofreu na pele a dor da solidão, sendo abandonada pelas vielas de Belleville enquanto sua mãe, Annetta, cantarolava embriagada. O alento de seu pai, Louis, a ela também não foi destinado, já que batalhava pelo exército francês, na Primeira Guerra Mundial.

Em meio à eloqüência materna, seu pai encontrou como solução enviar-lhe para a casa de sua avó. O novo lar de Edith era um bordel, na fria Bernay. O profano recinto proporcionou à menina as primeiras manifestações de amor, por parte daquelas julgadas impuras ou incapazes de amar. As prostitutas criaram Edith como filha e, aos poucos, conseguiram descongelar o frio coração de sua avó.

Bastante jovem, o destino teceu um novo encontrou entre Edith e sua mãe celestial. A capacidade de contemplar o sol transformou-se em um breu semelhante ao despertar da madrugada. "La petite"[1] ficou cega devido a uma queratite e através de suas "mães" foi levada ao túmulo de Santa Tereza Lisieux, reencontrando sua divina luz que operou o milagre de lhe possibilitar enxergar novamente.

Edith reencontrou seu pai, após anos de guerra, e, ao mesmo tempo, a dor. De forma abrupta, foi retirada do carinho de suas "mães" e deixou pela estrada uma trilha de lágrimas. Louis retomou seu antigo ofício, trabalhando em um circo como contorcionista.

A magia do picadeiro encantava a pequena menina. Ao mesmo tempo em que o circo a inebriava, a solidão de Edith só aumentava, pois a itinerante circense não permitia que a flor dos afetos desabrochasse. Edith era um pássaro aprisionado em uma gaiola mágica.

A incerteza do circo fez com que seu pai buscasse sustento se apresentando pelas ruas parisienses. É nesse momento que o pássaro entoou seu canto doce para a multidão. "Liberté, Liberté chérie!'[2]. Cantando "La Marseillaise"[3], a voz se libertou, a emoção se libertou, Edith se libertou para voar. Abandonou o "ninho" e voou livremente "sous le ciel de Paris"[4].

Como em toda a sua vida, após alçar vôo, a trajetória da estrela permanecera repleta de tristezas e desilusões. Conflitos amorosos e a morte de sua única filha, ainda muito jovem, aprofundaram mais a fenda que a dor cavou em seu peito. A música assumiu o papel de elixir de sobrevivência.

Apesar de todo o sofrimento, enfim o canto de Edith encontrou um coração capaz de levar essa voz para outros milhões de corações. Louis Leplée a escutou cantando na rua e lhe apelidou de "La Môme Piaf"[5]. Edith tornou-se "oficialmente" o pardal cantor e entoou seu canto pelos palcos da vida.

Arrebatou corações durante toda sua trajetória, mas para ela não havia "La Vieen rose"[6]. Apesar do sucesso que se propagava como o seu cantar, a tristeza insistia em lhe dar as mãos.

"Padam...Padam"! Fez de sua vida musical um "Hymne A L'amour"[7]. Clamava a todo instante "’Mon Dieu[8]’, livre-me da companhia da tristeza!", mesmo que parecesse dizer e ela "Ne Me Quitte Pas"[9]. O sucesso floresceu em solos de todo mundo, mas foi em terras americanas que se frutificou um amor, que, posteriormente, foi levado pelo vento em um acidente no ar.

O pardal cantor teceu seu ninho, acolhendo novos seres até que pudessem voar para o sucesso, como havia feito. Desta forma, tornou-se um norte na carreira de vários pássaros cantores e uma diva da música de seu país.

A tristeza que insistiu em caminhar ao seu lado, por toda vida, corroeu suas forças e obrigou o pardal cantor a realizar seu último voo. Em mais um momento de libertação, voou ao encontro de Santa Tereza e cercada de anjos, no palco celestial, cantou para toda a eternidade.

"Non... rien de rien...Non... je ne regrette rien. Ni le bien qu'on ma fait, ni le mal - tout ça m'est bien égal!

Non... rien de rien...Non... je ne regrette rien . Car ma vie, car mes joies, Aujourd'hui, ça commence avec toi!".[10]

Guilherme Estevão

[1] Tradução: A pequena

[2] Tradução: Liberdade, liberdade, querida!

[3] Nome do hino nacional da França.

[4] Tradução: Sob o céu de Paris.

[5] Tradução: O pequeno pardal.

[6] Tradução: A vida cor de rosa.

[7] Tradução: Hino ao Amor.

[8] Tradução: Meu Deus

[9] Tradução: Não me deixe.

[10] Tradução: "Não ... nada nada ... Não ... Eu não tenho arrependimentos. Nem o bem que eu fiz, nem o mal - todos os cuidados que eu!

Não ... nada nada ... Não ... Eu não tenho arrependimentos. Porque a minha vida, porque as minhas alegrias, hoje, começa com você ".