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Tem confete e serpentina, tem Pierrot e Colombina: Pedra Branca revive a magia das marchinhas (Acadêmicos da Pedra Branca - 2021)
Tem confete e serpentina, tem Pierrot e Colombina: Pedra Branca revive a magia das marchinhas (Acadêmicos da Pedra Branca - 2021)

Por: Laerte Gulini

Ao contrário do que se imagina, a origem do carnaval brasileiro é totalmente européia. A comemoração carnavalesca data do início da colonização, sendo uma herança do entrudo português e das máscaras italianas de carnaval inspiradas na Commédia Dell’Arte. Somente muitos anos mais tarde, no início do século XX, foram acrescentados os elementos africanos, que contribuíram de forma definitiva para o seu desenvolvimento e originalidade.

O Entrudo foi trazido pelos portugueses ao Brasil por volta do século XVII e era uma festa onde não havia música nem dança. O povo saía às ruas em loucas corridas, sujando uns aos outros com farinhas, águas podres e outros detritos, chegando até a agressões físicas, enquanto os ricos se refugiavam dentro de casa ou no campo. Em países como Itália e França, o carnaval ocorria em forma de desfiles urbanos, onde os carnavalescos usavam máscaras e fantasias. E assim, personagens que integram também o carnaval brasileiro, como a Colombina, o Pierrot e o Rei Momo foram incorporados, embora sejam de origem européia.

Em 1834, o gosto pelas máscaras se acentuou no país. De procedência francesa, eram confeccionadas em cera muito fina ou em papelão, simulando caras de animais, caretas, entre outros. As fantasias apareceram logo após o surgimento das máscaras, dando mais vida, charme e colorido ao carnaval, tanto nos salões quanto nas ruas. E Paris que dá origem a essa tradição carregada pelo tempo, pois foi onde tudo começou. Os bailes de carnaval eram incentivados e promovidos pelas sociedades dançantes da época, os Bailes à Fantasia ou Bals Masques, mais conhecido como Bailes de Máscaras, que foram a origem para o moderno baile de carnaval no Brasil.

Já nos meados do século XIX o Rio de Janeiro, querendo fazer concorrência às brincadeiras conhecidas como Entrudo, de origem portuguesa, a nova burguesia aderiu aos bailes carnavalescos dando assim origem a um festejo brasileiro de luxo e sofisticação, com grande semelhança com os da grande capital parisiense, com participação apenas da alta sociedade como reis e rainhas, príncipes e princesas, condes e condessas, duques e duquesas. Logo também foi implementada a ideia de desfilar em carruagens abertas exibindo fantasias riquíssimas, de certa forma querendo a civilização do carnaval dos moldes do “entrudo”.

Ainda no século XVII, a anarquia musical imperava no carnaval. Ritmos europeus como a polca e os “zé-pereiras”, tocadores de bumbo da tradição portuguesa, que se misturavam pelas ruas do Rio de Janeiro com valsas, cantigas de roda, hinos e quadrinhas musicadas na hora. Em suma, dançava-se e cantava-se qualquer coisa. Sim, nem só de confete e serpentina, eram feitos nossos antigos carnavais. Claro que sem música não há carnaval! O samba, o frevo, o maracatu e outros ritmos regionais sempre nos representaram muito bem, mas as marchinhas… Ah! As marchinhas! Elas foram peças fundamentais da festa!!! Mais que isso, fixaram-se no inconsciente coletivo do nosso povo mais que qualquer outro ritmo. A marchinha é um tipo de música que tem uma cadência que lembra as músicas tocadas pelas fanfarras militares, daí o nome marcha.

Poeticamente falando, é principalmente nesse repertório irônico, engraçado, espirituoso, mordaz, escrachado, “esculhambador” e implacável que está gravada a nossa história de pelo menos cinco décadas.

Eram esquecidas durante o ano, mas tinham seu lugar garantido nos dias de folia. Tratava-se de uma mistura alegre e bem brasileira dos ritmos da polca, americanos e até mesmo das marchas das bandas de coreto e de desfiles militares. Não se aprende a dançar marchinha. Não é preciso… Cada um se expressa como quer, como sabe, como não sabe, como inventa! Basta fazer uso do espontâneo, mais nada.

A primeira música feita exclusivamente para o carnaval constituindo-se num marco para a história cultural brasileira foi a marcha “Ô abre alas”, da maestrina Chiquinha Gonzaga, composta em 1899 e inspirada na cadência rítmica dos ranchos e cordões. A partir de então, as marchas, caíram no gosto popular. De compasso binário, eram inicialmente mais lentas para que seus dançarinos marchassem em seu ritmo. Com o passar do tempo, tiveram seu andamento acelerado por influência das “Jazz Band’s”; daí serem conhecidas também como marchinhas.

Quem não se lembra, e quem não gosta, de “Mamãe Eu Quero”; “A Jardineira”; “Pó de Mico”; “Me Dá Um Dinheiro Aí”; “Índio Quer Apito; “Roubaram a Mulher do Rui”; “Vai com Jeito”. Quem não brincou velhos e novos carnavais ao som de “Máscara Negra”; “Aurora”; “A Lua É dos Namorados”; “Cachaça”; “Turma do Funil” e “Alá-lá-ô”. Para que os foliões ficassem afiados na letra das marchinhas, elas eram divulgadas pelas rádios já a partir de dezembro. Ainda não havia televisão e as pessoas se reuniam em torno do aparelho de rádio, ansiosas para ouvir os lançamentos para o próximo Carnaval. Aí então elas eram tocadas e cantadas nas ruas, pelos blocos e cordões, e nos bailes de salão. Por isso muitas delas foram eternizadas pelas famosas Rainhas do Rádio.

Dentro das marchinhas, o último grande compositor foi João Roberto Kelly, que lançou “Cabeleira do Zezé” em 1964. Também foi o autor de “Joga a chave, meu amor” e “Colombina iê iê iê”. Ele teve um revival, nos anos 70, em uma parceria com Chacrinha, de onde saíram “Maria Sapatão” e “Bota a camisinha”. O amor, o preconceito, a traição, as louras, morenas e mulatas, nomes de mulher, homenagens, profissões, falta de água, luz, tudo enfim que fez ou faz parte do nosso cotidiano já foi abordado à exaustão nas marchinhas, mas sempre mantendo a originalidade, simplicidade, graça e criatividade.

O Carnaval de rua, dos blocos, reavivado nos últimos anos, principalmente no Rio de Janeiro, continua incentivando a composição de marchinhas, um gênero leve, humorado e satírico de comentar costumes, personagens e acontecimentos do dia a dia, do Brasil e do e do mundo.