Na Passarela da Vida, Todo Menino é um Rei - Tributo a
um Malandro Maneiro, Roberto Ribeiro
ENREDO
UNIÃO DE NITERÓI 2008
Na Passarela da Vida, Todo Menino é um
Rei - Tributo a um Malandro Maneiro, Roberto Ribeiro
"Desata
o nó da garganta e canta
A forma mais simples de se cantar
Quem canta seus males espanta
E tem sempre tanta esperança pra sonhar"
(Passarela da Vida - 1981)
Para Roberto Ribeiro, um autêntico malandro maneiro, a arte de
cantar não tinha mistérios. Em qualquer roda de samba ou
em eventos ao vivo, transmitido ou não pelas mídias, sua
voz e sua afinação saíam com
perfeição. Um dos mais belos timbres que o Brasil
já conheceu, era muito difícil não se emocionar ao
ouvir um samba cantado por Roberto, ou Demerval Miranda Maciel como
fora batizado. Já diria o compositor Paulo César
Pinheiro, na contracapa de um dos discos de Roberto: "O timbre de sua
voz é personalíssimo. Forte mas doce. Comovente quando
precisa. Festeiro quando tem de ser. Romântico quando quer.
Emocionante sempre".
Versátil, se saía bem cantando sambas românticos,
de cunho africano, de partido alto e de enredo. Neste último
gênero, obteve notoriedade puxando o Império Serrano, sua
escola de coração, no ano de 1971 e no período de
1974 a 1981. Até hoje é considerado um dos melhores
intérpretes de escola de samba da história. Mesmo depois
de largar o microfone imperiano, sempre fez questão de defender
a sua amada verde-e-branco da Serrinha, desfilando anualmente. Roberto
Ribeiro era sobrinho da não menos consagrada Dona Ivone Lara,
pois antes de iniciar a carreira profissionalmente, defendeu sambas de
sua tia nas rodas de samba.
Seu
primeiro grande sucesso foi "Estrela de Madureira", samba-enredo
derrotado nas eliminatórias do Império Serrano para o
tema "Záquia Jorge" em 1975. Roberto, na verdade, já
poderia ser considerada a verdadeira estrela de Madureira que brilhava
num imenso cenário: o Brasil! Roberto também se destaca
como compositor, tendo feito os sambas-enredo de 1977 “Brasil,
Berço dos Imigrantes” e de 1979 “Municipal,
Maravilhoso, 50 Anos de Glória” do Império Serrano,
além de, em "Império Bamba", tecer uma sublime
exaltação à sua escola.
"Império quando te vejo na avenida
Meu coração bate na vida
Como se fosse a tua batucada
Império é tão grande a tua arte
E à noite pede estandarte
E vem sambar na madrugada
Império és a felicidade que caminha
Tua mulata que passa
Tem um porte de rainha
Teu verde-branco mostra raça
De um tamborim que é bamba
Só sei que a vida lá fora
Não tem vida chora...
Quando longe do teu samba"
(Império Bamba - 1976)
Na faixa "Um Dia de Rei", Roberto cantava o fato de, na avenida, se
sentir rei por um dia.
"Não sei se chorava ou sorria
Era tanta alegria
Que a batida do meu coração
Se igualava ao compasso da harmonia
No mundo da fantasia
Eu fui rei por um dia
E findou o carnaval
Tudo voltou ao normal
Terminou o meu reinado"
(Um dia de rei - 1977)
No
seu disco de 1978, constam dois de seus maiores sucessos: a faixa de
abertura "Todo Menino é um Rei" e "Meu Drama (Senhora
Tentação)", esta última inclusa na trilha sonora
da novela global “Pai Herói” (1979). Nada como
sonhar com as coisas fora do alcance, afinal ninguém pode
impedir que as pessoas sonhem. São elas quem comandam os
próprios sonhos, sendo reis absolutos até despertarem
para a realidade. E se a pessoa sucumbir com uma senhora
tentação provocada pelo poder de sedução do
ser amado, que assopre um vendaval de paixão... Afinal, na
música “Um Poema pra Você (Fonte de
Inspiração)”, o único pensamento de uma
pessoa apaixonada é exaltar o seu amor, e nada mais importa. E a
canção “Vazio”, conhecida também como
“Está faltando alguma coisa em mim” diz tudo: quando
o grande amor faz falta, certamente a sua ausência será
sentida, representando um verdadeiro vazio existencial que
acabará por lhe acorrentar nas algemas da solidão
(música “Algemas”).
Roberto ainda regravou, em seus discos, memoráveis sambas de
enredo do Império Serrano, como “Os Cinco Bailes da
História do Rio”, “Glórias e Graças da
Bahia”, “Pernambuco, Leão do Norte”,
“Nordeste, seu Povo, seu Canto, sua Gente”, além do
antológico registro do clássico imperiano de 1969
“Heróis da Liberdade”, em que canta a primeira parte
do samba à capela.
A canção “Passarela da Vida” revela o
espírito não só de Roberto Ribeiro como
também de todo o brasileiro. É muito importante o
componente de uma escola de samba, no carnaval em plena avenida,
esquecer de seus problemas e conflitos existenciais, desatar o
angustiante nó da garganta que lhe persegue o ano inteiro e
só cantar, cantar, cantar... As escolas estão aí
para trazer alegria ao povo, e por isso merecem o reconhecimento e todo
o tipo de homenagem. Daí o trecho de “Passarela da
Vida” que faz justiça a quem ajuda a construir a
felicidade de um povo ou pelo menos amenizar a sua tristeza:
Beija
Flor perfumosa e bela
Faz seu Império na serra, Isabel
Caminha na estrada velha da Portela
Faz suas preces de fé em Padre Miguel
Que o fruto da Mangueira te alimentará
Nos ramos do Salgueiro em paz descançará
Unidos, União, Imperatriz
Desata o nó da garganta e canta
E na passarela da vida
Será feliz
(Passarela da Vida – 1981)
Outros sucessos cantados por Roberto Ribeiro: Proposta Amorosa, Os
Cinco Bailes da História do Rio, Tempo Ê, Acreditar, O
Quitandeiro, Liberdade, Prece a Xangô, Propagas, Amor de Verdade,
Poeira Pura, Favela, Isso não são Horas, Flor Mulher,
Noite Amiga, Amei Demais, Ao Povo em Forma de Arte, Triste Desventura,
Amor Aventureiro, Impetuosa, Partilha, Ingenuidade, Resto de
Esperança, Vem, Quem Lucrou fui eu, Só Chora quem Ama,
Gamação Danada, Fala Brasil, Jongo do Irmão
Café, Santa Clara Clareou, Amar como eu te Amei, De Palmares ao
Tamborim, Malandros Maneiros, Festa de Reis, Mel pra Toda Dor, entre
outras.
Roberto Ribeiro cantava a escola de samba e agora a escola canta
Roberto Ribeiro, que lá de cima acompanha a
evolução da festa virtual, da qual seria muito bem-vindo.
Mas a certeza é absoluta de que ele nos abençoa lá
do céu e no paraíso ele está emocionando seus
habitantes com a sua linda voz, como emocionou e até hoje
emociona a todos nós. Parafraseando Nelson Sargento na sua
referência à Cartola: Roberto Ribeiro não existiu,
ele foi um sonho! Sonho que até hoje encanta a gente e nos
acompanha passo a passo.
Nada como ser um rei na avenida, na passarela da vida. Eis a
lição de um velho malandro maneiro: Roberto Ribeiro.
Texto: Marco Maciel