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Maria Bethânia - A Menina dos Olhos de Oyá (Mangueira
-
2016)
Baila
no vento a mistura perfumada de mel, pitanga e dendê. O morro
desce a ladeira guiado pela filha de Oyá. Cavalga em
búfalos de ouro e bronze sobre o raio de Iansã. O
abebé de Oxum faz luzir o caminho que leva à passarela, e
por isso, minha gente não teme quebranto. O alfanje erguido nos
defende. O mal se esconde. Arruda, alfazema e guiné abrem os
caminhos. As águas de cheiro perfumam o verde e o rosa. Os
tambores de ketu derramam o axé no cortejo. Cortejo de santo,
xirê de orixá. Seu canto é o brado que saúda
quem faz da Avenida o terreiro. Pra quem chega, agô e
saravá! O branco reluz. O opaxorô de Oxalufã firma
nossos passos. Nele, apoio seguro: “XEU ÈPA
BÀBÁ!”
Corações ao alto. Valei-me meu Senhor do Bonfim. Doces para os santos meninos. Os balaios erguidos levam as flores. Tal qual na Baixa do Sapateiro - quando o calendário marca o quarto dia de Dezembro – o “dengo” da baiana se embala no chacoalhar dos balangandãs. Salve Santa Bárbara! No peito, a guia de contas e o Rosário de Maria. A voz de Bethânia ecoa. Voz ancestral, ventre de águas claras onde repousa o Brasil menino. Voz que é o Brasil matuto, caboclo e sertanejo. Pátria indígena onde Tupã reina. Voz que é solo africano, caroço de dendê, água de moringa, búzio de enfeitar trança nagô. Expressão do Brasil épico e dramático. Colorido feito o cetim que adorna quem brinca o reisado. Árido, como o barro seco. Grave como o voo sonoro do carcará, rapina do sertão, música inaugural, grito que se alastra desde o Opinião. Mergulhada nas canções, Mangueira dá asas aos versos cantados, e, a partir deles, ergue a fantasia que é o pilar de seu carnaval. Prova do mel puro, doce e cristalino – néctar musical - da Abelha Rainha. Desfolha o velho livro. Declama a poesia, seleciona poetas, oferece os mais belos versos. Dá vez ao gesto, faz da folia teatro. Reconstrói o palco, solo sagrado onde a “bordadeira da canção” reina soberana. O vento sopra a cortina de confetes e serpentinas, o Recôncavo deságua no Rio tal qual as águas que lavam os caminhos. Ao longe, a imagem de Nossa Senhora da Purificação. As vozes da novena; o frescor carregado de axé das águas das quartinhas; os pés que fazem a poeira subir junto à pele de ouro marrom. No cortejo - em louvor à filha de Santo Amaro - o “prato-e-faca” ditam o ritmo do samba de roda. Dia de festa, folia e vadiação. O puxador tira o verso. A flor de chita roça a pele mulata. O cavaco embala a massa, o pandeiro convoca os bambas. O palco, a velha Avenida - de tantas homenagens, de tantos carnavais. Espetáculo que passa. Alegria que desfila. Festa de Momo, mambembe. Errante feito o circo que lhe encantou quando menina. Céu de lona que a folia ergue agora, palco circense que lhe dedicamos. Fina poesia onde o trapezista se equilibra. Delírio de Morfeu. Ilusão de carnaval. Sonho que finda nas cinzas, mas vive eterno, enquanto o verde e o rosa reinarem na colina. P.S: Este enredo é uma “rosa sem espinhos” dedicada à Maria Bethânia. Voz que é o perfume do dendê. A joia encrustada na coroa do Rei. O coité, onde a canção é “macerada” tal qual folha bendita, e o sumo é a densa pasta verde que tinge a canção brasileira. Leandro Vieira (pesquisa, desenvolvimento e texto) |
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