Sinopse Lins Imperial 2009
Lapa:
estrela da vida inteira (Lins Imperial - 2009)
Sinopse
A Lapa é a estrela do carnaval da SRES Lins Imperial. E toda
estrela nasce, cresce, amadurece. Conta a Ciência que morre
também, mas, seu brilho permanece anos-luz. Porém, na sua
poesia, a Lapa é estrela diferente, ainda que tenham espalhado
por aí que ela já não era mais a mesma: só existia
nostálgica na lembrança dos antigos. Todavia, ainda cintila na
paisagem desta Muy Leal Cidade de São Sebastião do Rio de
Janeiro com brilho próprio porque surgiu para encantar pintores,
cronistas, poetas, cantores e seresteiros.
Nasceu e cresceu em torno da Igreja de Nossa Senhora do Carmo da
Lapa do Desterro (24 de outubro de 1750). Desterro é lugar onde
vivem os desterrados, os banidos. Lapa, nos informa o
dicionário, é "grande pedra ou laje que forma um
abrigo." Portanto, desde sempre é a "pátria" dos
forasteiros, dos "exilados".
Em sua aurora, já brindava a província com as águas cariocas,
encantava artistas e foi moldura de uma lenda amorosa.
Adornaram-lhe as feições: foi lagoa, ganhou Arcos,
esculpiram-lhe fontes e geometrizaram-na em suas formas. A luz da
manhã intensificou-lhe a vocação para o burburinho das gentes
e suas multicoloridas origens, desejos e necessidades. Sua oferta
sempre foi generosa e diversificada.
Suas pontas vão da Glória, pela rua Conde Lage (e mais as ruas
Taylor e Joaquim Silva, consagradas ao miché), percorre e
atravessa os Arcos (que desemboca no Largo da Carioca, antigo
Tabuleiro da Baiana), segue a Riachuelo (a imortal rua de
Mata-cavalos de Machado de Assis), paralela à rua Mem de Sá,
chegando até a Praça Tiradentes. Por este quase corredor, a
cidade foi crescendo, penetrando o sertão.
A Lapa é mulher que se entrega (sem pudor) ao olhar devasso dos
amantes. Bordada e em enfeites, abriu-se aos aventureiros de
outras terras. Lapa de Debret.
Enfeitiçou, com seu jeito faceiro e dengoso, quem se permitiu
ousar. Estrela vésper. Lapa das baianas.
Entregou-se Mulher aos andarilhos como a lua ao poeta e fez da
noite o seu retrato definitivo. Lupanares.
Se o Estado era novo e a ordem era trabalhar - como? -,
sobreviver, sim, sempre foi o mister. Malandro é um Ás que
encaçapa a vida na sorte.
E o poeta de sua janela, cronista de tudo, admirando-a,
mistura-se à turba sonora, aos loucos, aos bêbados, às
prostitutas bonitas e nem tão bonitas, aos clowns e enjeitados,
comungando da mesma solidão que passa imperceptível e secreta
sob sua inevitável alegria noturna, juvenil, contemporânea.
Como escreveu o poetinha Vinícius de Moraes, "A Lapa de
Bandeira " era um Beco e, como uma escarpa, em cujo cimo
brilhava o farol da poesia, era um aceno de um porto seguro às
almas sem norte, sem leme, sem rumo. Rosa dos Ventos.
Este Beco é a rua Moraes e Vale, uma das primeiras ruas do Rio,
criada em 1773, quando se fez famosa por sua Folia de Reis e sua
festa anual do Divino. É o que restou de seu outrora
deslumbrante casario: viu passar o féretro da Rainha Maria I e
serviu de cenário a autores como Joaquim Manoel de Macedo e
Machado de Assis.
Foi rota e "parada" de Mestre Valentim, Chiquinha
Gonzaga, Ernesto Nazaré, Sinhô, Villa-Lobos, Portinari, João
do Rio, João Gilberto, Vinícius de Moraes, Noel Rosa, Aracy de
Almeida. Centro da boêmia carioca, coração da Lapa de Di
Cavalcanti e Jayme Ovalle, desde 1916. Rua de Eneida, Madame
Satã e Manuel Bandeira que a imortalizou com os Poemas do Beco.
Reduto do samba e berço do carnaval (nela nasceu o entrudo) e do
modernismo brasileiro (iniciado por Di Cavalcanti, com desenhos
da mesma rua). Área 1 do Corredor Cultural, hoje reduzida a um
único e importante quarteirão.
O Beco: dos exilados morais e amorosos; dos expatriados
nacionais, das polacas e francesas - a Montmartre carioca.
Mas, onde está a malandragem? O que foi feito da
"Montmartre" tropical?
"Foram os dois últimos anos da Lapa que marcaram época.
Vieram logo depois o fechamento dos prostíbulos e a decretação
da ilegalidade do jogo. Os malandros iriam ficar por ali,
esperando o quê? Dispersaram-se, empobreceram, arribaram nos
subúrbios, em casas de parentes humildes que os esperavam,
cheios de fé, com uma cama por forrar e um prato a mais a pôr
na mesa", lembra queixoso e entristecido um de seus
ex-moradores mais ilustres.
Já não havia mais o Beco, o Grande Hotel, os bordéis, nem
Madame Satã. Não há mais aquele Poeta. "Homenagem ao
malandro" , apenas um "Passado de Glória".
Porém, dos subúrbios voltam os "filhos" dos bambas e
malandros e começam as primeiras rodas de samba sob os Arcos e
no Beco do Rato. Da Zona Sul, aporta um "Circo sem
lona". Na companhia do Cabaré Casanova, da Sala Cecília
Meirelles, da Escola de Música da UFRJ, da Escola de Balé Maria
Olenewa, da Gafieira, do Museu da Imagem e do Som, a cidade
então chamada "Partida" reata-se. A Fundição é
progresso, é futuro. São esses jovens sonhadores e
empreendedores que pintam as novas "Cores da Lapa". É
caleidoscópio, é universal, é jovem, contemporânea. Ainda
eternamente OFF, livre, deliciosamente transgressora e
"marginal".
Novos tempos, novas palavras. Mas, sempre Malandra, boêmia,
"abrigo" das mesmas gentes nada comuns.
Enredo de Rogério Rodrigues, Eduardo Gonçalves e Flávio
Melo
Pesquisa e textos: Rogério Rodrigues
Roteiro de Desfile: Comissão de Carnaval