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Sinopse Estácio 2009

Que Chita Bacana (Estácio - 2009)

Histórico

Provavelmente todo mundo já viu ou pelo menos ouviu falar de um tecido muito popular principalmente no Norte e Nordeste do Brasil conhecido com o nome de chita ou chitão.

Mas o que certamente poucos sabem é que este tecido de algodão com desenho de flores coloridas, com cara de festa do interior e brincadeira de criança, tão integrado no nosso dia-a-dia e no nosso folclore, possui ancestrais ilustres: de fato surgiu no Oriente, mais precisamente na Índia, reino que impregnava a imaginação dos europeus de forma intensa no século XV por causa dos relatos dos viajantes, referentes a seus imensos tesouros.

A Europa ansiava pelas maravilhas do Oriente, como sedas, porcelanas e especiarias e a busca por se encontrar um caminho marítimo que conduzisse até as fabulosas riquezas da Índia era desejo de praticamente todos os reinos do Velho Continente.

Foi o navegador português Vasco da gama, quem, no século XV, chegou às Índias pelo mar.

Pimenta, cravo, canela, açafrão e noz moscada não eram, porém, os únicos sonhos de consumo da Europa quinhentista. Quando conheceram o algodão estampado indiano, vários povos europeus ficaram fascinados, como os ingleses e os franceses. Já os portugueses não se encantaram tanto com os novos tecidos, mas sim com sua comercialização.

Dessa maneira, graças às Grandes Navegações e a conseqüente descoberta do caminho marítimo para as Índias, o tecido estampado de algodão espalhou-se e conquistou boa parte da Europa.

Na Inglaterra a padronagem floral recebeu o nome de chintz derivado do termo indiano "chint", que significa um tecido de algodão mais barato, estampado em toda a sua superfície de forma vívida. Depois de dominar os guarda-roupas das pessoas de classe alta e de ganhar também as paredes em forma de papel, esta padronagem passou a ser usada nas louças de mesa pelos ingleses e depois internacionalmente, para definir peças decoradas com padrões florais intrincados e vistosos, que geralmente recobrem a maior parte da louça. O já famoso "chá das cinco" inglês ganhava mais charme e elegância.

A padronagem indiana chegou ao Brasil através dos portugueses que mantinham negócios com a Índia, e dos ingleses, principais parceiros comerciais de Portugal naquela época.

As primeiras remessas do tecido chegaram nos estados da Bahia e de Pernambuco, onde estavam os mais importantes centros administrativos no início da colonização.

Com a força do colorido brasileiro estampado na fauna e na flora e com um toque de brasilidade todo especial, a estampa popularizou-se e virou moda.

As tradicionais estampas florais ganharam a companhia de vários outros motivos inspirados na natureza exuberante do Brasil: figuras de pássaros, borboletas, jacarés, frutas e folhagens tropicais coloriram a chita nacional emprestando-lhe uma brasilidade inconfundível.
Depois de adaptado ao gosto local, com padrões mais simplificados com flores maiores, de cores contrastantes e intensas, o Chint Indiano, com o tempo sofreu influência na maneira popular de se pronunciar a palavra que acabou transformando "chint" em "chita".

Com presença marcante em todo território nacional, mas com força extraordinária nas regiões norte e nordeste, logo o tecido estampado se fez presente no folclore e em outras manifestações culturais e religiosas destas regiões, vestindo de maneira democrática e sem distinção, tanto as celebrações pagãs como os tradicionais festejos religiosos do Brasil.

Até os dias de hoje, a chita é indispensável na vestimenta dos palhaços das folias de reis ou nos estandartes das festas do Divino. Enche de cores a indumentária de fantoches, bonecos e marionetes e se faz marcante nos cortejos do Maracatu e nos trajes das quadrilhas de São João.

Em sua vitoriosa trajetória pelas terras brasileiras a chita deixou de ser peça comum do vestuário do povo mais simples, para na década de 60 se tornar símbolo de várias revoluções: nos costumes, no comportamento, na moda, na sexualidade e na política. Enquanto nosso país atravessava os chamados "anos de chumbo", a chita ajudava a compor o tom psicodélico daqueles tempos. As roupas de chitão eram a cara do movimento hippie e o oposto da repressão militar.

Assim, pegando carona no movimento hippie e até no figurino do Chacrinha, ícone da TV brasileira a partir dos anos 60, os chitões vestiriam Gil, Caetano, Tom Zé e a trupe tropicalista em 1967 e 1968.
Finalmente a chita conquistou as passarelas da moda e ganhou ares de glamour aparecendo em desfiles e diferentes peças assinadas por renomados estilistas nacionais. Uma das pioneiras a adotar a chita foi a estilista Zuzu Angel, vítima da ditadura, e que usava o tecido em suas coleções, ousadas para a época.

Com o tempo, a chita passou a ser sinônimo de brasilidade, símbolo da nossa riqueza folclórica e de nossa diversidade cultural, e hoje vem brilhar na Marquês de Sapucaí, a mais importante das passarelas deste país, palco onde celebramos esta riqueza folclórica e esta diversidade cultural com o desfile das nossas Escolas de Samba e que fazendo justiça, rende suas homenagens a história da chita que muito trás da própria trajetória do Brasil.

Que chita bacana!

Cid Carvalho (carnavalesco)

Bibliografia Consultada
Livro: "Que Chita Bacana"
Editora: A Casa
Autores: Renata Mellão e Renato Imbroisi

Sinopse

Quem me vê assim tão faceira, na festança e na brincadeira de adulto ou de criança nem imagina a distância da terra de onde vim.
Pois então, seu moço, não se espante que vou relatar num instante uma história que sem querer me gabar é bonita pra danar. Eu venho de um tempo e de uma terra muito distante, de uma cultura milenar, fascinante, que fica pra lá da linha do horizonte.

Chamavam de "Índias" a minha terra natal e naquele tempo muitos diziam não haver reino igual.

A fama de tão pródigo lugar não tardou pra se espalhar. Atravessou as areias do deserto, cortou matas, cruzou as águas do mar. Em todo canto e lugar só se ouvia falar daquela terra formosa.
A Europa toda garbosa era um reboliço só. Era rei, era plebeu, era aventureiro, enfim o povo inteiro sem distinção querendo descobrir a localização, o paradeiro de tão abençoado torrão.

Pois foi lá naquelas bandas do Oriente, que buscando fama e fortuna, aquela gente esquisita, estranhamente vestida acabou por me encontrar. Fiquei sabendo depois que eram de Portugal, um pequeno, porém próspero reino europeu. Dizem que a viagem pelo mar foi uma epopéia, uma façanha sem igual; mas afinal, não é a ambição e a ganância maior que o medo ou qualquer distância?

Na verdade o que aqueles homens buscavam eram as famosas especiarias e os tesouros fabulosos, mas posso afirmar, sem receio de mentir ou errar, que nem mesmo os mais gananciosos deixaram de me notar.

Esse encontro, moço, mudou meu destino. Levaram-me pra outros mundos, conheci outros lugares e diante de grande espanto, logo substituído por encanto, desembarquei no Brasil.

Deus meu, como é bonito esse país! Por tudo que já ouvi falar do Paraíso, de mais nenhuma prova preciso. Bastou-me olhar para a imensidão do mar, praquele céu azul anil, se de fato tal lugar existiu, não tem como negar, ele se chama Brasil. Por aqui as riquezas e os tesouros são outros. É tanto bicho, tanta planta, tanta flor que, mesmo sem estar com medo, desespero ou dor, se a gente não se segurar é bem capaz de chorar sim senhor.

Em todo canto encontrei uma festa, uma brincadeira, uma procissão.
Uma mão, um abraço, um afago. Um compadre, um irmão.
Assim fui mudando um pouco de aparência, ganhei novas estampas, novas cores, fiquei mais alegre, sem, porém perder a inocência. Tornei-me mais tropical, mais debochada eu diria até mesmo marcada com a cara do Brasil.

Aí não teve jeito, meu irmão. Aliás, o jeito foi me fazer presente no sagrado e no profano, sem distinção.

E não me fiz de rogada, entrei na dança, na contra-dança, estampei o vestidinho da sinhazinha de trança, rezei nas novenas com esperança, colori o palhaço, alegrei as crianças.

Enfeitei a nobreza negra em cortejo e até hoje o que mais desejo é levar pra essa gente sofrida, a fé que a vida um dia pode mudar.
Com o tempo me tornei um símbolo, a voz dos oprimidos, dos reprimidos, dos excluídos. Levantei bandeiras, virei rebelde com causa. Protestei, argumentei, buzinei com o Chacrinha, dei troféu abacaxi pra repressão. Sai pra lá, que ninguém vai me prender, não!
Sai pra lá essa vida tão sofrida, essa vida dita dura. Entre em cena um Brasil novamente colorido, estampado, tropical, tropicalista. Que loucura!

E não adianta censurar, porque quando um país, quando um povo quer ninguém consegue segurar.

E assim vencemos! O povo, o país e eu!

É o povo que está novamente no poder. Este povo malandro, bonito, sagaz e maneiro. Que canta e dança, pinta, borda e é feliz.
Que não se envergonha da cara que tem, muito menos de ser tachado de cafona. Aliás, cafona é o sujeito que da sua cultura se envergonha.
Ih! Quase ia me esquecendo, deixe-me apresentar. Todos me conhecem por chita, alguns por chitinha e outros por chitão, mas ninguém se esqueça não que vim lá de longe, mas foi aqui que encontrei meu chão, somente aqui me tornei tão popular a ponto de me transformar em sinônimo do lugar.

Hoje a Estácio de Sá, através das minhas estampas e das minhas cores vem apresentar um pouco da trajetória e da alma do povo deste país. Cantando e batucando, espantando pra bem longe o mal, fazendo arte, brincando carnaval.

Afinal, nós somos é brasileiros acima de tudo e de todos. Estampados, coloridos, listrados e vestidos de chita. Um povo que se agita, que grita para o mundo orgulhoso: eu, eu sou brasileiro seu moço!

Cid Carvalho (carnavalesco)