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Quem não viu, vai ver... As Fábulas do Beija-Flor (Beija-Flor - 2019)
Quem não viu, vai ver... As Fábulas do Beija-Flor (Beija-Flor - 2019)

INTRODUÇÃO

No dia de Natal, à luz do Criador Deus Menino, sete décadas atrás, nasceu faceiro Beija-Flor, criado com muito amor; dádiva de quem já estreou abençoado na manjedoura nilopolitana, esmeralda reluzente riscando o céu no infinito.

Conduzindo essa viagem fascinante, voando de flor em flor nos Jardins da Folia, disseminou o pólen da informação e o grão do entretenimento, semeando Cultura Popular; bailando e rodopiando pelos ares, até na floração do Carnaval nova flor ver desabrochar.

Fez da História milenar alimento, cruzou céus e mares, igarapés e mananciais. Promoveu o encontro entre tambores e tribos, lendas e mitos; e viu despontar costumes, peculiaridades e tradições. Escreveu páginas de ouro da poesia brasileira ao revisitar nossas raízes, e nos fez mais felizes ao cantar a exuberante beleza das riquezas áureas do Brasil de Norte à Sul, em tons de branco e azul.

Viajou pelo mundo místico dos Caruanas nas águas do Patu-Anu, pelo paraíso hospitaleiro de onde se avista o sol primeiro, da Terra Santa – verde paraíso do povo da floresta e seu canto de fé pela missão de preservar, embebido de força, mistério e magia – para as terras dos Pampas, onde sete povos, na fé e na dor, ergueram sete missões de amor, em meio à liberdade dos campos e aldeias.

Viu brilhar o seu valor a iluminar o estado de amor de uma Comunidade que impõe respeito, e cheia de orgulho, bate no peito. Retirou o chapéu de bamba para anunciar Brasília, a capital da esperança, inspirada na arte e nos traços do mestre da arquitetura; e declamou ainda, o poema encantado da terra do bumba-meu-boi, da encantaria e das palmeiras onde canta o sabiá.

Resgatou as nossas origens e a nossa herança africana, legado dos nossos ancestrais. Testemunhou a criação do mundo na tradição Nagô e às Pretas-Velhas... quanto amor! Cantando em louvor à grande constelação das estrelas negras e todo o seu esplendor.

Ao abordar a importância da negritude, rompeu fronteiras e conheceu o berço de diferentes civilizações. Do Egito à liberdade, esclareceu que negros escravos viveram em grande aflição, foram o braço forte da nação; saga de quem vai seguindo o seu destino...

Enfim reencontrou as Áfricas de lutas e de glórias – do baobá da vida de Ilê Ifé à irmandade do conto do griô, negro na raça, no sangue e na cor.

Narrador-personagem a desvendar mistérios trajados de fantasias, consagrou-se ave Soberana, desfilando a exaltar a Corte de reis e rainhas no cortejo dos plebeus, composto por mestiços, índios, negros e europeus.

Homenagens que passeiam pela exaltação à José de Alencar, ao bom Natal – saudado pela Majestade, o Samba; pela coroação da Dama das Bromélias Margareth Mee, que fez a festa na Sapucaí, e pelo canto de cristal da diva internacional Bidu Sayão, que sacudiu a Passarela.

Comoveu ao botar pra fora a felicidade de reverenciar a simplicidade, momentos lindos que fizeram do Samba, oração. Sonhou o sonho do sonhador ao viajar nos feitos do astro iluminado da televisão, e na genialidade do Marquês que batizou a Avenida, palco das mais esplêndidas atrações.

Audacioso pássaro pequenino se fez gigante, ao propor reflexão social, ao soltar o grito de liberdade, o clamor por igualdade. A utopia de um Brasil livre da ganância nociva que há por baixo dos panos, ninho de famintas serpentes, onde ratos e urubus, trepados no cangote do povo, fingem não entender que todo mundo nasceu nu, e que saco vazio não pára em pé. Santuário de ambição que vitimiza brava gente sofrida, cansada de ganhar tão pouco, que vive no sufoco e precisa desabafar: seus filhos já não aguentam mais! Monstro é quem não sabe amar!

 Foi o nosso DNA precursor e revolucionário, de quem tem sede de vitória, que permitiu que chegássemos até aqui, conquistando 14 estrelas, revelando o sorriso alegre do sambista, e sendo aclamada o festival de prata em plena pista.

A possibilidade de fazer uma releitura de desfiles memoráveis, alguns considerados mesmo antológicos, é um afago para a nossa gente humilde, que defende o nosso manto sagrado, na alegria ou na dor. Enamorada do nosso país, Nilópolis é nossa raiz!

Hoje, a nossa declaração de respeito, reverência e devoção ao Pavilhão virou fabuloso enredo sobre nossa septuagenária Agremiação; hino a ser defendido e entoado pelo canto inebriante de uma Comunidade fascinante. Quem Não Viu, Vai Ver, as Fábulas do Beija-Flor!

Que o ímpeto de voar seja o nosso segredo para acreditar, que o palpite, é certo!

JUSTIFICATIVA

A proposta do Carnaval 2019 da Beija-Flor de Nilópolis é uma celebração aos seus 70 anos de história, resgatando a memória do Pavilhão através de uma releitura contemporânea e fabulosa dos enredos mais marcantes da Agremiação.

Quem Não Viu, Vai Ver, e quem viu, vai novamente poder se emocionar com As Fábulas do Beija-Flor, uma coletânea das aventuras conduzidas pelo voo do Beija-Flor, animal símbolo da Escola, e o narrador-personagem dos enredos.

O embasamento e a argumentação deste projeto carnavalesco perpassam pela definição do conceito de fábula, pela relevância histórica e pedagógica do escravo grego Esopo, e pela missão do Carnaval enquanto espetáculo e manifestação cultural.

As fábulas são narrativas de fatos, imaginários ou não; fabulações cujas personagens são animais (e ainda plantas e seres inanimados) que agem como seres humanos, apresentam características humanas,  tais como a fala e os costumes, e têm como objetivo promover reflexão e propiciar  ensinamentos através da moral da história.

A inspiração na obra milenar de Esopo baseia-se em uma identificação imediata, pois do mesmo modo que os preceitos morais deixados como legado por este  visionário permanecem atuais e atemporais, a Beija-Flor de Nilópolis sempre revelou-se uma Escola pioneira, à frente de seu tempo.

Da mesma forma que as narrativas de Esopo se tornaram famosas ao longo da História da humanidade, os carnavais da Beija-Flor inspiraram e incitaram importantes reflexões na nossa sociedade, ambos embebidos de arte em um universo de magia e fantasia; e tanto as fábulas quanto o Carnaval são elementos populares. Sendo que o Carnaval, enquanto a mais genuína expressão da nossa identidade, também apresenta, através dos desfiles das Escolas de Samba, temáticas fictícias que têm por finalidade disseminar informação, conhecimento, cultura e entretenimento, cantadas em verso e prosa – tal qual as fábulas – através do samba-enredo.

SINOPSE

Uma lágrima sentida caiu dos olhos da Vovó, lembrando imagens de crianças e do velho tempo que passou. Olhem o céu que maravilha! Retalhos de nuvens, bordados de estrelas... Iluminada pelo sol da meia-noite, a natureza vem mostrar sua beleza.

Pela porta da imaginação, galopando em cavalos alados, chegamos ao País das Maravilhas. Recebidos por soldadinhos de chumbo, entramos na floresta onde os animais falam e as plantas cantam; tudo neste mundo é encantado!

Com o despontar da primavera, tirem do passado a nobreza, e do futuro, a magia da surpresa! Criem a mais linda fantasia, delirem no universo fantástico deste canto de emoção!
Não chore não Vovó, não chore não! Veja quanta alegria dentro da recordação!

Hoje, novamente sou livre, sou criança Beija-Flor; nessa bela fantasia, brindando à vitória do amor!

Pousarei nos luxuriantes Jardins das Delícias onde repousa o gigante em berço esplêndido. Celebrarei os donos da terra, sua cultura, suas lendas e seus rituais mágicos. Lavarei a alma e matarei a sede nas águas do rio mar, acompanhado de Caruanas e Amazonas à luz do luar. Ensinarei a dádiva da preservação das nossas riquezas, que estão abaixo e acima do solo; e revisitarei diversos cantos e recantos desse torrão miscigenado. Ouvirei ainda poemas encantados de amor; renascendo nas águas de um paraíso hospitaleiro de onde se avista o sol primeiro. Me tornarei candango e calango na capital da esperança e, traçando o destino ainda criança, me transfigurarei em brilho de fogo sob o sol do novo dia.

Iluminado feito um festival de prata, subirei ao Orum sagrado dos Nagôs, e descortinarei a reluzente constelação das estrelas negras para resgatar as nossas diversas Áfricas: a de lá e as de cá. Guiarei um cortejo de reis, rainhas e guerreiros negros, aqueles que romperam grilhões e carregaram nos ombros, marcados pelas chibatas, a opulência do nosso país, mas que sempre ficaram esquecidos nas savanas da memória oficial. Então, lembrarei que o mundo deve o perdão aos filhos de ébano, àqueles que sangrando pela História, foram tratados como mercadoria pela cruel ganância da escravidão.

Recordarei a grandiosidade da nossa cultura, múltipla, diversificada. Sonharei com rei e acertarei no leão. Ouvirei novamente aquela inesquecível voz de cristal encantando corações; me emocionarei com a sensibilidade da Dama das Bromélias; reviverei um tempo que passou, uma lembrança que ficou, para encontrar, lá no Cachoeiro, o Rei ainda menino e; finalmente, quando o amor invadir as almas e a magia trouxer  inspiração, triunfará uma canção para embalar os corações.

Porém, entristecido, constatarei que não somos o Brasil das maravilhas. Verei que os trabalhadores mais humildes continuam carregando o peso descomunal dos impostos, enquanto os “donos do poder” se esbaldam em farras bancadas com dinheiro público. Serei mais uma vez o porta-voz dos excluídos contra as mazelas que corroem as nossas riquezas, por que faz parte da minha missão.

Retirarei das imensas lixeiras desse país, restos de luxo, convocando o povo para um grande Bal Masqué. Fazendo, da própria angústia, um grito de desabafo: ratos e urubus, larguem nossas fantasias! Chega de ganhar tão pouco, chega de sufoco e de covardia! Parem com essa ganância, pois a tolerância pode se acabar um dia! Oh! Pátria amada, por onde andarás? Seus filhos já não aguentam mais!

É bem verdade, Vovó, que de lá pra cá, tudo se transformou. Mas a vitória da folia ficou no encanto do meu povo, que brinca sambando quando samba a Beija-Flor!