Abílio Martins - O Cigano do Samba
Abílio
Martins - O Cigano do Samba
Enredo
Bambas Sambario - 2014
SINOPSE
Caro Bilinho
Tomei a liberdade de lhe dirigir pelo apelido, pois sou tão
íntimo de sua voz, de sua imponência ao cantar um samba,
que lhe considero uma amiga de longa data. Por que não um amor
paterno?
Escrevo-lhe esta carta como forma de exaltação à
sua voz... Um timbre quase gutural, de tão grave. O agudo era
considerado uma preciosidade. Notável marcação
rítmica, divisões silábicas perfeitas, uma
categoria singular. Qualquer canção soava vibrante,
envolvente, mas também com um tom de carícia que
purificava qualquer alma.
Toda vez que lembro de Madureira, impossível sua figura
não florescer em minha mente. Madureira querida. Berço de
grandes sambistas, onde o senhor despontou para ser mais uma estrela do
samba. Aliás, não se importa que eu lhe trate como
senhor? Acredito que não... Sua humildade e simplicidade sempre
foram características.
No primeiro desfile da história do Império Serrano,
lá estava você, menino serelepe, na Ala dos Periquitos,
ala que o senhor mesmo criou. Como arrumador do Cais do Porto, o
contato com a malandragem carioca sempre se fez presente. E a
aproximação com o samba era ainda maior.
Seu talento vinha de família. Que privilégio ter como tio
o grande Mano Décio da Viola, que lhe impulsionou para se tornar
solista do Império. Como consequência, sagrou-se
campeão de samba-enredo junto com o tio, naquela ocasião
em que o Império homenageou o Brasil Holandês de
Maurício de Nassau, lembra? Difícil não recordar,
afinal você estreou como intérprete no Carnaval na
verde-e-branco da Serrinha naquele mesmo ano.
Em devoção, volta e meia me pego cantarolando
“Ontem chorei por você,
você hoje chora por
mim”, um dos clássicos da Velha Guarda da Coroa
Imperial
que cantou e compôs junto com Mano Décio. Teve uma vez em
que o diretor de harmonia se desesperou pela ausência da cabrocha
Yayá, a ponto de chamar um garoto de recado. “O samba
já começou, e a minha Yayá não chegou,
menino tome um cruzeiro e chame a Yayá, diga para ela que o
diretor de harmonia mandou chamar”. A propósito,
ela
apareceu naquele dia? Se não, como o samba teria rolado sem seu
balanço?
Cada samba recebia a benção dos orixás. Permite
que eu ore contigo. Caô cabecile, Xangô. Rei de Oyó.
Líder de seu povo. Deus dos raios e trovões. Erga seu
machado e traga a paz eterna ao coração deste filho de
fé e sua melódica negritude. Sob os cuidados de
Xangô e também de Ogum, toda a força para eliminar
os dragões do dia-a-dia. Salve São Jorge Guerreiro. Para
tirar feitiço e mandinga. Saravá Vovó Juventina da
Bahia. Saravá à Rainha de Umbanda.
Foi Oxalá quem recomendou que o senhor iniciasse uma
peregrinação? Tal qual um cigano, a caminhada iniciou.
Mas a poucas quadras do Império. As escassas pegadas de
então tinham como destino a Estrada da Portela, passando a
integrar a Velha Guarda azul-e-branco, tornando-se o intérprete
da escola de Natal e Paulo Benjamin de Oliveira. O horizonte do cigano
do samba se abria. Levando consigo a proteção de
Oxóssi e a melodia na bagagem, aquele novato bloco carnavalesco
Cacique de Ramos lhe recebeu. Com direito a LP e a uma temporada de
shows na Boate Arpège.
Samba-enredo. Uma marca indelével começaria a ser
gravada. Sua história passaria a se confundir com a
poética ópera carnavalesca. No primeiro disco oficial do
gênero, aquela voz imponente pulsava com maestria o
inesquecível clássico oriundo de Parada de Lucas. Nada
como um timbre negro para exaltar a história do negro no Brasil.
O tom de lamento inicial. “Os
negros não sabiam ser apenas
sedução, pra serem armazenados e vendidos como escravos
na mais cruel traição”. A esperança
que
vinha aos poucos. “E de repente
uma lei surgiu, que os filhos dos
escravos não seriam mais escravos do Brasil”.
Até a
euforia final. “Uma voz na
varanda no paço ecoou, meu
Deus, meu Deus, está extinta a escravidão”.
Oh,
Sublime Pergaminho, libertação geral!
A preservação da memória do samba-enredo passaria
a ser sua bandeira. Dezenas de obras-primas nunca outrora registradas
ganhariam sua voz, movendo-as do limbo do esquecimento para a
eternidade. Em qualquer coletânea carnavalesca dos setenta,
lá estava o senhor batendo ponto sempre com magistrais
gravações e louváveis serviços
fonográficos prestados.
Pelas escolas de samba, as andanças do cigano prosseguiam.
Breves retornos ao seu Império Serrano para decantar Dona Santa,
a Rainha do Maracatu, além de Pero Vaz de Caminha, o
célebre eminente precursor. Muitas léguas caminhou. E
todas as senhoras lhe abriam as portas. Afinal, a folia de reis em Lins
também seria enaltecida. Em Ramos, perto do já conhecido
Cacique, embalou as terras dos incas, uma paisagem colossal.
Mesmo já consagrado como intérprete de samba-enredo,
sempre louvei uma de suas maiores virtudes: o respeito com todas as
agremiações, sobretudo com as menores. Muitas escolas de
grupos inferiores tiveram a primazia de contarem com hinos em sua voz.
Então surge a lembrança de Belém do Pará e
seu curioso mercado do Ver-o-Peso. E no imaginário do sambista,
um vozerio alucinante. Ou melhor, um vozeirão. Sério,
Bilinho! É uma das mais belas interpretações de um
samba-enredo que já ouvi. Não me venha com falsa
modéstia. É fato! “Guajará
era ancoradouro e
desde o tempo do colono e do ouro, o velho vale do
Igapó-de-Açaí virou mercado junto a Foz de
Piri”.
Mais uma glória pessoal estava por vir. Oriunda de Exú.
Até o Lua Viajante resolveu trazer a sanfona branca de fole
prateado só pra lhe ouvir cantando. Eis Luiz Gonzaga, o rei do
baião em pessoa, contemplando sua voz e corroborando cada verso
entoado na gravação daquele lindo samba da Unidos de
Lucas, que novamente concedeu ao senhor a honra de defender mais uma
obra-prima anos depois da voz na varanda no Paço ecoar. Somente
as dádivas do céu poderiam ofertar tanta grandeza.
Cigano negro, suas últimas paradas ocorreriam no bairro de
Ismael pra desfilar de renda bordada lá na Ilha da Madeira.
Ainda haveria tempo para a sua única passagem no novo
Sambódromo, ofertando rosas brancas para Iemanjá. Ogum
Guerreiro, ogunhê! Sei que a sua força você buscou
até morrer, Bilinho. Mas na fé de Oxalá, a vida
ganhou outro matiz. Oxalá tomou as formas de Jesus Cristo e, nos
seus dias derradeiros conosco, uma nova vocação religiosa
lhe tomou por inteiro. Suas andanças finalmente chegariam ao
fim, quando Jesus, a quem você se entregou, lhe conduziu à
vida eterna.
Abílio Martins
Sua voz jamais se calará! Ela é o eterno pulso do
coração do sambista.
Onde você estiver, receba esse forte abraço de sua amiga
do peito!
Bambas Sambario.
Presidente: Marco Maciel
Carnavalesco: Marco
Aurélio Assunção
Texto e Enredo: Marco Maciel
Intérprete: Antônio
Carlos
Links de sambas para
audição:
Chorei por Você - http://www.youtube.com/watch?v=VP64U0jireY&hd=1
Minha Yayá - http://www.youtube.com/watch?v=JjXg967-XQ4
Sublime Pergaminho
- http://www.youtube.com/watch?v=HCO-kZIG1jI&hd=1
O Curioso Mercado do Ver-o-Peso - http://www.youtube.com/watch?v=b558qdOKU7E
Lua Viajante - http://www.youtube.com/watch?v=MwYrY16aP-0&hd=1
Magia da Vovó (Vovó Juventina da Bahia) - http://www.youtube.com/watch?v=6ksMOFqA4gA&hd=1
REGRAS DO CONCURSO DE SAMBA-ENREDO DA GRESV
BAMBAS SAMBARIO
- O compositor pode enviar quantos
sambas quiser, seja solo ou com parceria;
- A
gravação pode ser à capella (só com voz) ou
com bateria de fundo;
- A Bambas Sambario
recomenda um samba emocionante, e ao mesmo tempo valente. No entanto, o
compositor tem toda a liberdade para construir sua obra, ao seu estilo;
- Os sambas devem
ser enviados em mp3 ou wma para sambariobr@yahoo.com.br.
Qualquer dúvida, entrar em contato com o presidente Marco Maciel
(https://www.facebook.com/marco.maciel.5);
- A escola recebe
sambas até às 23h59min
do dia 12 de janeiro de 2014.
Todos os sambas-enredo concorrentes serão divulgados no Sambario
e no SRZD Carnaval Virtual
após esta data. A final acontecerá em 19 de janeiro.