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COMPOSIÇÕES PADRONIZADAS E ENGESSADAS Chegamos então
à safra de 2009. E cada vez mais o carnaval está entregue aos
fazedores de samba enredo e não aos compositores de verdade.
Fazer o que, né? No entanto, grande parte dos compositores de
verdade “deitaram na sopa” (como escreveu Jorge Ben Jor
na letra de Charles Anjo 45): concorrem com obras padronizadas,
engessadas e pouco criativas. Entra ano e sai ano e tenho a
impressão de estar sempre ouvindo variações sobre o mesmo
tema. É claro que Russos, Nogueiras, Dinizes, Lequinhos,
Clarões, Santiagos, entre outros, têm talento suficiente para
produzirem obras mais inspiradas do que as repetitivas
produções que fazem atualmente. Afinal, se as escolas adotaram
uma fórmula de escolher samba, os caras foram lá adotaram uma
fórmula de fazer samba para serem escolhidos. Ou seja, não há
ousadia, talvez medo do diferente, medo do erro. É como aquele
time que vence o adversário por um magro e burocrático O que falta
atualmente para os sambas enredo é inspiração, poesia,
lirismo, malícia, uma pitada de bom humor e mais comunicação
com o público. Está na hora de rever conceitos como sambas
descartáveis, “funcionais”, obras compostas de uma
maneira que a validade destas expire na quarta-feira de Cinzas,
refrões auto-exaltativos – presentes em 99,99% dos sambas e
que servem apenas e tão somente para determinada agremiação.
Chega de hambúrgueres pasteurizados de lanchonetes fast-food.
Que voltem os saudáveis sanduíches de queijo e mortadela
preparados pelas nossas vovós. Enfim, amigos leitores: querem
escutar samba bom? Ponha para rodar antigos vinis e aquelas
coletâneas da Sony Music na década de 90 e chore! Mas, vamos falar
dos escolhidos para 2009 e dos não escolhidos que eu mais gostei
e que vou batizá-los de “lado B”: BEIJA-FLOR Laíla pediu e os
compositores procuraram se desvencilhar do estilo do samba
“Caruanas”, que vem perseguindo a escola desde 1998.
Também esteve proibido aos autores que pusessem nas obras
referências à “comunidade”. O vencedor foi a parceria
liderada por Tom Tom, que realmente tem uma letra extensa, mas
sem a melodia pesada e beirando a melancolia tão freqüente nos
carnavais passados da Deusa da Passarela. O refrão principal
promete funcionar muito bem no desfile. Lado B: Merece
destaque o samba derrotado de Isaías Rouxinol, Hélio PQD,
Marrom da Anastácia, Mestre Dudu e Beto Professor. Não sei se
fiquei contagiado pela gravação de Nelson Pião, mas percebi um
samba animado, pra cima, e bem-humorado, como há muito tempo a
BF não apresenta. Que gostoso seria sambar ao som da estrofe “Banho
de lua, de sol/Banho de gato ou de cheiro/Dançar na chuva/Ou no
xirê do meu terreiro” para logo em seguida desembocar
num refrão que toda a Sapucaí seria capaz de cantar.
Obviamente, o samba foi descartado logo de cara. Mas se a obra
viesse por uma escola de grupo de acesso, tipo Inocentes de
Belford Roxo, Curicica ou Sereno de Campo Grande, esse samba
seria um sacode na passarela. SALGUEIRO Moisés Santiago
é um cara que é oriundo do mundo do samba. E sabe fazer bem. No
entanto, já forjou uma marca própria de fazer sambas para o
Salgueiro, que é bem diferente do estilo que concorria na
Tradição. O samba deste ano é de boa qualidade, apesar de ser
funcional. É um estilo que casa perfeitamente ao estilo Quinho
de puxar samba. Lado B: O samba
da parceria de Wander Timbalada e JL Fróes era o meu predileto,
por apresentar uma melodia agradável: “Na magia do
tambor eu vou/Ouço o toque do tribal vibrar/Tocado, dobrado ele
rufa na aldeia/É afro, é raiz, é a força da cor”.
Obviamente, o samba foi descartado logo de cara. E quanto ao tão
falado samba do Edgar? Apesar de um pequeno equívoco de
fonética no já famoso refrão (no trecho “meniná
quem foi teu mestre?”), a obra era muito boa, mas sem
chance de ser aproveitada no atual momento do carnaval. GRANDE
RIO O samba vencedor
se encaixa bem no estilo Grande Rio de escolher samba: letra
extensa, variações de melodias e tonalidade em menor,
características de um dos seus compositores, o cavaquinista
Mingau, vencedor em 2000, 2003, 2004, 2005 e 2008. Lado B: Um samba
de boa qualidade foi o samba composto por Levi Dutra e parceria.
A obra tinha uma melodia mais lírica e refrões muito bem
feitos. PORTELA A Portela possui,
atualmente, a melhor ala de compositores do carnaval carioca.
Participaram da disputa deste ano nomes fortíssimos não apenas
no carnaval, mas também na MPB: Mauro Diniz, Toninho Geraes,
Diogo Nogueira, Wanderley Monteiro, Serginho Procópio, Bandeira
Brasil, Elaine Faria, Ary do Cavaco... Ou seja, sambistas 100%
genuínos. Logo, foi a escola que apresentou a mais qualificada
safra de concorrentes para a escolha de seu samba enredo. Diogo
Nogueira conquistou o tricampeonato numa disputa acirradíssima.
O estilo mistura lirismo com a já tão decantada vaidade
portelense. Lado B: A
estréia de Elaine Faria (a filha de Paulinho da Viola) como
concorrente na Portela foi excelente. Um samba de altíssimo
nível conquistou quem acompanhou a final no Portelão. Esta
moça ainda dará muitas alegrias à família portelense. UNIDOS DA TIJUCA Até a chegada de
Paulo Barros, logo após o carnaval de IMPERATRIZ LEOPOLDINENSE O samba traça
muito bem a trajetória e os aspectos da Imperatriz, e comprova
que a escola e seu bairro de origem, Ramos, têm muito samba no
pé e desmente que a GRESIL seja apenas sinônimo de desfiles
luxuosos, porém, excessivamente técnicos, frios e de pouca
empolgação. Os sambas do Josimar conseguem se diferenciar pelas
boas soluções melódicas que ele vem definindo em seus sambas,
como a “Turma do Sítio”, de 2005, e “Marias e
João”, do ano passado (eu adoro o trecho “Vai virar
cenário de novela / vem comigo reviver / fala, Martin Cererê”)
. Apesar de não ter sido o meu predileto, trata-se de um belo
samba. Concordo com o Marquinho quando ele diz que Preto Jóia
fará falta na Sapucaí, apesar da contratação do
competentíssimo Paulinho Mocidade. O samba escolhido cairia como
uma luva para Preto Jóia, cria da verde e branco da Leopoldina,
e conhecido por dar verdadeiros upgrades nos sambas. Lado B: O samba
de Guga e parceiros era realmente espetacular. Mais melódico,
mais inspirado e sem a melancolia das disputas anteriores,
incluindo o “Breazail”, de 2004. VIRADOURO É sempre bom
escutar um samba da parceria de Heraldo Faria e Flavinho Machado.
A dupla de sambistas veteranos de Nikiti já produziu
anteriormente obras muito mais inspiradas do que esta, mas foi o
que mais se adequou ao enredo “viajandão” de Milton
Cunha. Lado B: No
primeiro ano de disputa sem a presença de Gusttavo Clarão, a
Viradouro teve uma safra regular. Depois da obra de Heraldo &
Flavinho, a composição que eu destaco foi a da parceria de
Gilberto Gomes, principalmente pela cabeça do samba (primeiras
estofes) seguido por um belo e animado refrão. MOCIDADE O samba escolhido
pela Mocidade é muito bom e a escola está de parabéns. Ponto e
c’est fini. A meu ver, é um dos melhores que irão
passar pela Marquês de Sapucaí em 2009. Envolvido por uma
polêmica, principalmente provocada por alguns internautas
sambeiros (ou seriam sambeiros internautas?), a beleza e leveza
da melodia do samba acabaram ficando em segundo plano, já que a
galera virtual preferiu lamentar a não-vitória de um forte
concorrente. A meu ver, o samba de Jefinho & Cia retorna os
bons momentos da escola, incluindo o tempo do saudoso Ney Vianna.
Aos independentes de Padre Miguel: não se preocupem! A sua
estrela sempre vai brilhar. Lado B:
Obviamente, o samba de Igor Leal e parceria é uma boa obra. Vai
ao encontro de outras boas parcerias – como as de Cláudio
Russo – que adoram compor sambas com melodias inteligentes e
pretensamente complexas, muitas palavras em cada verso e refrões
principais auto-exaltativos. São sambas que destacam
principalmente a inteligência de quem compôs, mas que deixam em
segundo plano um princípio fundamental do samba enredo, que é
uma obra musical para ser cantada por um grande contingente em um
desfile de carnaval e, de preferência, ecoar nas arquibancadas. VILA ISABEL Mais uma vez, a
Vila vai desfilar com um samba de André Diniz. A disputa na
escola vem tornando-se apenas uma praxe, já que o compositor
ingressa no concurso como favorito e virtual vencedor. A obra
deste ano contempla a fórmula adotada nos carnavais passados: os
trocadilhos no refrão (Vi lá), a sinuosidade da melodia
que passeia entre os tons maior e menor, além de um refrão
principal “pra cima” (Segura a Vila, que eu quero
ver / vem brindar e saciar a sede / no alto da sede, coroa hoje
brilha / a centenária maravilha). Lado B:
Mart’nália formou parceria com o grande sambista
prata-da-casa Agrião, Kleber Rodrigues e o gresilense Eduardo
Medrado (este último, integrante do “quarteto do
jegue”, do samba de 1995 da Imperatriz). O samba teve como
resultado uma proposta musical diferenciada, que muito me
agradou. Luis Carlos da Vila, em sua derradeira disputa, se
juntou a Ivanisia, ao pagodeiro Acyr Marques (irmão de Arlindo
Cruz) e Alessandro Silva, e apresentou uma obra com jeitão
daqueles sambas da virada dos anos 70/80. No entanto, o mais
carnavalesco entre os concorrentes era a composição de Paulo
Formigão, Wellington, Anailtom e do ex-imperiano Roger da
Fazenda. O único pecado era ter um refrão por demais curto “Sacode,
balança/Alegremente a comunidade canta”. Fora isso, o
samba tem uma ginga maravilhosa. Se você teve a oportunidade de
escutar, repare nos versos “Do nosso Theatro, o ilustre
freqüentador/ Que vai contar pra gente como tudo começou/Foi um
sururu danado/Por todo lado o caos total/O Rio se
modernizava/Modificava o estilo colonial”. Uma pena, a
Vila perdeu uma ótima chance de levar opções diferentes de
sambas para a Sapucaí. Mais uma vez. MANGUEIRA A coisa esteve um
pouco feia na Estação Primeira. Enquanto outras escolas
comemoravam a fertilidade da safra nas disputas, a Mangueira
amargou uma competição com poucos bons sambas. Como síntese da
situação para 2009, resolveu-se criar uma
“superparceria”: Gusttavo Clarão (apesar de oriundo da
Manga, era egresso da Viradouro), e os tradicionais adversários
Gilson Bernini e Lequinho resolveram unir forças e ainda
chamaram Júnior Fionda. Só que o resultado não foi um
supersamba e ficou aquela impressão de que “poderia ter
sido melhor”. E a partir de agora não há mais mestre
Jamelão, que desentortou um monte de samba torto que a Mangueira
“cometeu” nesta primeira década do século 21. Lado B: Nas
disputas da verde e rosa já não participam mais nomes como
Comprido, Arroz, Jajá, Tolito, Padeirinho, Rubens, Jurandir,
Batista, Darci, Helio Turco ou Nelson Sargento. E, infelizmente,
ainda não houve reposição à altura. Na disputa para 2009, o
samba de David Corrêa era uma boa opção, apesar de estar
anos-luz “daquela” inspiração dos sambas que ele
fazia para a Portela, Salgueiro e Vila Isabel. PORTO DA PEDRA A escola de São
Gonçalo escolheu uma bela obra para 2009. Apesar de eu não
curtir o recurso que os compositores utilizam de “sou tal
escola”, o refrão principal é muito bom, e as soluções
melódicas do hino apesar de não serem inventivas, são bem
funcionais (Pandora, a esperança e o amor ôôôô). Há
a referência do samba da União da Ilha de 1978 (Como será o
amanhã / que Deus me permita ser só alegria). Só uma
pergunta: que diacho significa “curiar”? Lado B: A
parceria liderada pelo veterano Jorge Melodia compôs uma linda
obra, o que chamamos de “samba enredo de verdade”: Salve
Ogum, é meu rei / o astro vão me guiar / crenças, rezas e
magia / traz energia, é preciso curiar. IMPÉRIO SERRANO Depois de
“Aquarela Brasileira”, o Império Serrano reedita
“A lenda das sereias do mar”, levado anteriormente em
1976. O samba tem todos os ingredientes para emocionar a todos na
Sapucaí: é um samba popular, fácil de cantar, ótima
comunicação com o público e que tem o chamado refrão
arrasta-povo, que fará explodir em empolgação tanto os
componentes da escola quanto o público presente nas
arquibancadas. É um tipo de samba que não é apenas da escola
da Serrinha. Já se tornou um samba de todos nós, foliões.
Neste caso, óbvio que não cabe Lado B. VALEU, LUIZ
CARLOS DA VILA! Rixxa Jr. |
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