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Coluna "Quesito Bateria"

BATUQUE DE BOI
por Ewerton Fintelman

Mês de agosto. Os tamborins ainda se esquentam. Os primeiros tambores rufam. Muitas baterias já encaminham seus ensaios desde maio, mas é no mês de agosto que a temporada começa pra valer. Por enquanto, o universo bateria é bem particular, afinal não temos sambas escolhidos e as baterias trabalham bem acanhadas. É uma fase de avaliação dos ritmistas novos e contagem dos sobreviventes do Carnaval 2009. Pouco temos para comentar. Por isso, para esta edição do “Quesito Bateria”, vou falar um pouco de um batuque que não é samba. É Boi-bumbá.

No final de junho, estive pelo segundo ano consecutivo na pacata cidade de Parintins, interior do Amazonas, para presenciar o Festival Folclórico, onde os bois Caprichoso e Garantido fazem um espetáculo marcante.         

Os amantes do Carnaval com certeza já ouviram alguma citação referente ao Festival de Parintins, mesmo que seja nos movimentos das alegorias, que realmente são infinitamente superiores às alegorias que vemos nos carnavais de todo o Brasil. É uma média de 45 metros de boca, 30 de altura, o que resulta em um cenário absurdo. A beleza é contagiante. Mas eu, como amante de uma boa percussão, fiquei mais impressionado com a base rítmica do Boi-bumbá que da beleza apresentada.

Os bois possuem também uma espécie de “bateria”. No Boi Caprichoso, é chamada de “Marujada de Guerra”. Já no Boi Garantido, a percussão fica por conta da “Batucada”.

Os instrumentos são bem semelhantes com os utilizados no Carnaval para tocar o samba. Existem surdos, repiques, caixas-de-guerra, chocalhos. O diferencial do Boi-bumbá está em alguns instrumentos de molho, como os xequelês, cabaças e as palminhas (instrumento que consiste em dois pedaços de madeira que marcam o ritmo).

É intrigante que no Carnaval as baterias levam uma surra pra ensaiar um samba, enquanto no Boi-bumbá são aproximadamente 30 músicas diferentes, com aproximadamente 6 batidas diferentes. E o mais intrigante: parte ensaia na cidade de Parintins e a outra parte na Capital Manaus... e só se encontram na hora do festival! E tocam em total harmonia. Nos três dias de festival, não consegui ouvir um errinho sequer da Batucada ou da Marujada de Guerra. Pensa que acabou? Não. O tempo também nem se compara com o Carnaval. São 210 minutos de apresentação sem parar. E detalhe: são três dias de festival.

O Festival de Parintins conquista seu espaço a cada dia. Os próprios foliões estão viajando à Ilha de Parintins para conhecer o Festival. Este ano, por exemplo, Ivo Meirelles (Presidente da Mangueira) e Neguinho da Beija-Flor (Intérprete da Beija-Flor) foram figuras carnavalescas carimbadas no festival, além de Milton Cunha, que foi pelo segundo ano comentarista da Rede Bandeirantes, emissora que detém os Direitos de transmissão do Festival. E numa breve conversa com o carnavalesco no hotel onde ficamos hospedados, Milton Cunha diz não entender como os parintinenses conseguem fazer um espetáculo tão grandioso com materiais tão “dispensáveis” no Carnaval.

O que é mais interessante dentre os “materiais”, é que como os bois levantam a bandeira da preservação do meio ambiente, a Batucada e a Marujada de Guerra só usam peles sintéticas nos instrumentos. E o resultado não é nem um pouco inferior aos instrumentos de couro.         

Imagino que a esta altura, você que não conhece deve estar curioso para ver, ouvir ou entender como e onde essa magia acontece. Para isso, separei uma pequena amostra de conteúdo do Festival para os foliões do Sambario poderem apreciar um pouco do que o nosso Brasil tem a oferecer além do samba.

Antes de conhecer o espetáculo, vou mostrar um vídeo do ensaio da Batucada do Boi Garantido. Veja como o ritmo é preciso: 

Nesse vídeo, você ouve a música Sublime Inspiração, faixa 1 do CD de 2008. Ouçam e observem como os desenhos rítmicos mudam de acordo com o ritmo.
        

Saindo do ensaio, vamos à prática: 

Esse é a evolução de uma alegoria do Boi Caprichoso. É interessante como no início do vídeo a alegoria parece pequena e insignificante e com o desenrolar da história ela vai evoluindo. O vídeo foi retirado da transmissão da Rede Bandeirantes.         

O mais surpreendente do Festival, na minha opinião foi a Lenda do índio Ajuricaba, que contou com a evolução de 300 pessoas em cima de uma alegoria. Você deve estar afirmando: isso é Paulo Barros. Não, não é. Quando Paulo Barros fez o carro do DNA em 2004, em Parintins a cênica já era marca registrada. Parintins faz questão de manter a sua engenharia toda feita por gente de lá, sem importar talentos. 

Observe no vídeo as 300 pessoas subindo na alegoria e começando a encenar o encontro das águas do Rio Negro com o Rio Solimões. Depois os brincantes descem da alegoria, e ajuricaba emerge da alegoria. Foi, sem dúvida, o ponto alto de 2009.

O Festival foi impressionante, pura emoção. Para quem está acostumado com um espetáculo do tamanho do Carnaval, não imagina que no interior do Amazonas há um espetáculo de maiores dimensões, ainda não tão conhecido.

Mas como nem tudo é perfeito, o Festival de 2009 terminou como termina muitos carnavais. Na segunda-feira, poucas horas da apuração, soube que o resultado já havia sido comprado. Soube com detalhes o nome dos jurados subornados e algumas notas que seriam atribuídas. O Boi Garantido sagrou-se campeão, tirando o tricampeonato do Boi Caprichoso.  

Se realmente houve a compra do resultado, é difícil provar, mas é muita coincidência que a pessoa tenha me informado com precisão as notas e o resultado final com a diferença de pontuação. Infelizmente o Brasileiro aprendeu a investir no meio mais fácil pra vencer.        

O resultado duvidoso do Festival não tirou o brilho da festa, e com certeza em 2010 estarei bumbando em Parintins. Mas, por ora, a temporada é de Carnaval. Por aqui a festa está só começando.   

E para os foliões que estão apressados para cair no samba, o Carnaval Virtual está se aproximando. Nos dias 14 e 15 de Agosto, as Escolas de Samba do Carnaval Virtual desfilarão na tela do seu computador. Para saber mais, vá à seção Espaço LIESV aqui mesmo no Sambario.

Por ora, vou ficando por aqui, com o orgulho de ter irmãos brasileiros que sabem nos proporcionar a verdadeira emoção, seja no boi ou no samba.

Ewerton Fintelmann
etho_vp@globo.com

Bruno Guedes
bruno_guedes1986@yahoo.com.br