PRINCIPAL    EQUIPE    LIVRO DE VISITAS    LINKS    ARQUIVO DE ATUALIZAÇÕES    ARQUIVO DE COLUNAS    CONTATO

Samba Paulistano

4 de março de 2021, nº 45
TRINTA EM TRINTA
por Bruno Malta

Com o Anhembi completando trinta anos de desfiles, esse texto vai relembrar trinta apresentações memoráveis do Carnaval de São Paulo

Seguindo o padrão de apresentar o Carnaval de São Paulo e um pouco da sua história e aproveitando o fato do Sambódromo do Anhembi ter completado trinta anos de desfiles em Fevereiro, apresento aqui no Sambario, trinta apresentações que ficaram na história do samba paulistano. Obviamente, há muitas outras apresentações inesquecíveis que também poderiam entrar nessa lista como: Rosas de Ouro 1991, Império de Casa Verde 2005, Vai-Vai 2000, Mocidade Alegre 2004, Gaviões da Fiel 2003… entre outras. Mas, optei por apresentações que resumem o que aquele ano deixou de mensagem. Sem mais delongas, logo abaixo estão os escolhidos, com o limite de uma apresentação por ano.

1991
Camisa Verde e Branco — O Combustível da Ilusão


Grego (à esquerda) e Zulu (à direita) no primeiro ano do Anhembi; Vitória do Camisa marca a estreia do novo sambódromo (Foto: Reprodução)

No primeiro ano do Anhembi, o resultado foi o mesmo do último ano da Avenida Tiradentes. O tricampeonato do Camisa Verde e Branco (dividindo em dois anos com o Rosas de Ouro) marcou a estreia da passarela. O desfile sobre a cerveja foi muito técnico e manteve o alto nível que o Trevo tinha na época, confirmando o domínio da alviverde no período. 

Uma curiosidade posterior ao desfile, foi que a Império de Casa Verde quando falou da cerveja em 2011, mencionou o desfile do Camisa, sua madrinha, em seu samba e seu enredo. Também é o penúltimo título da escola da Barra Funda no Grupo Especial.

1992
Rosas de Ouro — Non Ducor Duco, Qual É a Minha Cara?

O começo dos anos 90 foi dominado pelo Rosas de Ouro, com quatro títulos em cinco anos. Em 1992, não foi diferente. Com um enredo sobre São Paulo e o melhor samba de sua história, a Roseira levantou um Anhembi que se viu representado em alegorias, fantasias e sobretudo no enredo. A azul e rosa foi a segunda a desfilar na noite de Sábado e definiu logo cedo que a taça iria para Brasilândia. O samba fantástico funcionou muito na maior apresentação da carreira de Royce do Cavaco. Um desfile pra eternidade!

Esse samba é considerado um dos clássicos do Carnaval de São Paulo. Foi regravado por Thobias do Vai-Vai, Leandro Lehart dentre outros. No entanto, foi “escondido” por anos pela Roseira, por conta da mágoa com a saída do “sabiá” Royce, que foi para a X-9 em 1994. Felizmente, esse fato foi superado em 2016, com a volta do intérprete para a Roseira. Inclusive, a agremiação usou a hashtag #avoltadosabiá para divulgar o retorno do cantor. Na apresentação, obviamente não faltou o clássico de 92.

1993
Camisa Verde e Branco —Talismã


Vivi, histórica porta-bandeira, bailou lindamente no último campeonato do Trevo (Foto: Acervo Globo)

1993 marca o último título do glorioso Camisa Verde e Branco. Com um enredo sobre os talismãs, a escola que tem o Trevo como símbolo levantou, como já era de costume, o Anhembi e venceu o Carnaval (dividindo a taça com outro grande símbolo da folia paulistana, o Vai-Vai). Foi o nono título da verde e branco. O desfile foi muito grandioso para época e ainda significa, digamos assim, um marco final, até os dias atuais, da trajetória vitoriosa do Camisa. De 1993 pra cá foram desfiles medianos, muitas decepções e muitos rebaixamentos.

Só que a grande curiosidade desse Carnaval foi revelada em 2010. O empate duplo foi bastante polêmico. Segundo Zulu, voz oficial da leitura das notas, tudo começou quando uma parte da imprensa, horas antes da apuração, já tinha conhecimento do resultado final. Temendo uma confusão pelo vazamento do resultado e uma provável suspeita sobre o título, a então presidente da escola da Barra Funda, Magali, resolveu “aceitar” uma divisão com a Saracura e a taça ficou com as duas escolas.

O que não se imaginava é que a confusão aconteceria de qualquer forma. Integrantes dos Gaviões da Fiel reclamaram e muito das notas por eles recebidas e acusaram favorecimento para escolas grandes (Camisa, Vai-Vai e Rosas). Rolou quebra-pau entre integrantes da Fiel Torcida e do Trevo. Pra fechar, confira abaixo o vídeo do programa onde Zulu, em 2010, conta os detalhes da “divisão” do título entre as duas escolas. Um resultado bem paulistano, digamos assim.





1994
Gaviões da Fiel — A saliva do santo e o veneno da serpente

Na apresentação original de “A saliva do santo e o veneno da serpente”, os Gaviões da Fiel mostraram sua primeira credencial de que seria uma escola grandiosa. Com belas alegorias e fantasias a alvinegra deixou o Anhembi aclamada por público e crítica e muito cotada ao primeiro campeonato de sua história. Porém, uma inusitada nota 6 em Melodia, aplicada pelo compositor e músico Paulo Soledad, tirou a taça da Fiel Torcida. A pontuação final apontou a Roseira com 289 pontos e os Gaviões com 285 pontos (se o jurado tivesse dado a nota máxima, a então caçula da época teria dividido o campeonato com o Rosas de Ouro).

Uma curiosidade sobre a polêmica nota: Ernesto Teixeira, intérprete da Fiel Torcida, no anúncio da reedição do samba em 2018, chegou a dizer que Paulo Soledad se “equivocou” na avaliação aos Gaviões. Segundo o cantor, o jurado teria colocado em sua justificativa que a melodia do samba era muito pobre para falar do Vinho, só que a bebida foi tema do desfile da Primeira de Aclimação e não da alvinegra, o que certamente deixa ainda mais dolorosa a derrota da Torcida Que Samba.



1995
Gaviões da Fiel — Coisa Boa É Para Sempre


Para mostrar sua força, os Gaviões provocaram uma catarse na festa do Jubileu de Prata e levaram a inédita taça (Foto: Maurilo Clareto/Estadão Conteúdo)

O Explode Coração de São Paulo! Em 1995, mordidos pela injustiça sofrida no ano anterior, os Gaviões da Fiel conseguiram seu primeiro título, com um samba arrebatador que é lembrado até hoje nas rodas de samba, nos estádios e em toda e qualquer apresentação feita pela escola. Assim como diz o título do enredo, o samba se tornou uma “coisa boa para sempre”.

Um ponto interessante dessa exibição é que assim como aconteceu no Rio com o Acadêmicos do Salgueiro em 1993 no enredo “Peguei um Ita no Norte”, a alvinegra não estava tão opulenta e luxuosa quanto a concorrência (com destaque para a então campeã Rosas de Ouro) mas, o seu grande samba e a incrível conexão entre os componentes e o enredo daquele ano, garantiram uma apresentação absolutamente inesquecível.



1996
Vai-Vai — A rainha, a noite tudo transforma

Vai-Vai não levou apenas a taça em 1996, conquistou também o coração do paulistano (Foto: Reprodução)

Até 1996 muitas escolas dividiam o protagonismo no coração do paulistano. Nenê de Vila Matilde, Camisa Verde e Branco, Rosas de Ouro, Vai-Vai, dentre outras, conseguiram cativar o público e se tornando aguardadas pelo que representavam. Mas naquele ano, após um desfile inesquecível da Saracura, tudo mudou.

Falando da noite de São Paulo e com a atriz e empresária do ramo da noite, Lilian Gonçalves de fio condutor, o Vai-Vai fez um desfile perfeito, de fácil leitura e ainda contou um refrão que fez a arquibancada vir abaixo, garantindo assim o título e o carinho eterno da Selva de Pedra. Dessa forma, a Escola do Povo virou a cara do samba paulistano e criou um vínculo que se renovaria em muitas outras apresentações.


1997
X-9 Paulistana— Amazônia — A Dama do Universo

Vinte e oito dos vinte e nove títulos anteriores a esse Carnaval, haviam sido conquistados pelo pentagrama formado por Nenê de Vila Matilde, Camisa Verde e Branco, Rosas de Ouro, Vai-Vai e Mocidade Alegre. Apesar de jovem no Grupo Especial (apenas três anos) e do histórico que jogava contra, a X-9 Paulistana não ligou pra nada disso, surpreendeu e conquistou a taça pela primeira vez. Com um desfile inesquecível sobre a Amazônia a taça ficou na Parada Inglesa.

Algo preponderante a essa conquista, foi o samba que foi bastante executado nas rádios da época (sim, já se tocou samba-enredo nas rádios). Com fortes refrões, a obra se comunicou com facilidade com o público e inflamou a passarela, numa exibição magnífica do experiente Royce do Cavaco. Mesmo com a apresentação sendo considerada excelente e o título sendo bastante justo, muita gente não ficou exatamente satisfeita com o resultado e a apuração foi tumultuada.

O presidente do Vai-Vai — que foi vice-campeão — na época, Solón Tadeu, reclamou bastante e chegou a proferir palavras preconceituosas contra a campeã. Além dele, integrantes dos Gaviões da Fiel e o mandatário da Nenê de Vila Matilde foram outros que não ficaram contentes com a conquista inédita da rubro-verde da Zona Norte.



1998
Vai-Vai — Banzai, Vai-Vai!


Banzai é mais do que um sacode na vida do Vai-Vai, é o início da consolidação do domínio da Saracura no Carnaval de São Paulo (Foto: SPTuris)

Repetindo o acontecido de dois anos antes, o Vai-Vai começou sua era de dominação do Carnaval Paulistano com um desfile inesquecível sobre o Japão. Com um samba de simples compreensão, a Saracura conquistou o público do Anhembi com muita objetividade em sua proposta de desfile, além de um chão característico e de muita força de sua comunidade. Sendo assim, vale ressaltar como pontos fortes do desfile, a parte musical, o ótimo enredo e a parte plástica — muito bem realizada pelo carnavalesco Chico Spinoza.

Vale também ressaltar a criatividade encontrada para ligar o Vai-Vai ao Japão. O mascote Criolé era o responsável por isso, já que, na visão do enredo ele dormia e sonhava que era um Imperador Japonês que levava o Anhembi a viajar pelo Japão e depois desembarcava no bairro da Liberdade e no próprio Anhembi. Demais!



1999
Nenê de Vila Matilde — Voa Águia, voa, que Sampa é toda tua!

No ano do seu cinquentenário, a Nenê de Vila Matilde fez uma apresentação absolutamente arrebatadora falando de São Paulo. A ideia da carnavalesca Vaníria Nejelschi era que a Águia — símbolo da escola — viajasse nos cartões postais da capital paulistana e deu muito certo. Com um enredo de fácil leitura e um samba fantástico, tudo ia bem e a escola da Zona Leste parecia se encaminhar para ser a grande favorita ao título.

Só que um carro quebrado—sobre a noite paulistana — e problemas na evolução (a escola estava muito grande e precisou apertar bastante o passo para concluir o desfile em sessenta e cinco minutos) tiraram o sonho do título e colocaram a Nenê em um amargo vice-campeonato, que teve com gosto de terceiro lugar, já que o título daquele Carnaval foi dividido entre Gaviões da Fiel (Dom Sebastião) e Vai-Vai (Nostradamus). Após a apuração a carnavalesca da azul-e-branco não se conformou com as notas, especialmente as notas da Comissão de Frente.



2000
X-9 Paulistana — Quem é você, Café?


Surpreendente e técnica, a X-9 Paulistana fez um desfile brilhante nos quesitos e conquistou o segundo título de sua história (Foto: Reprodução)

No primeiro ano com duas noites de desfiles, o Carnaval de São Paulo teve, mais uma vez, duas campeãs. O ano de 2000 marcou o segundo e até agora último título da X-9 Paulistana. Na estreia do carnavalesco Lucas Pinto – que se consagraria na escola – o enredo sobre a era do Café no Brasil foi o tema da escola da Parada Inglesa, que fez um desfile absolutamente irrepreensível no Anhembi.

Muitos disseram que a escola não levantou o público, o que em parte não deixa de ser verdade, principalmente na comparação com outras escolas como Gaviões da Fiel, Nenê de Vila Matilde e principalmente o Vai-Vai. Mas nos quesitos, foi dificílimo de tirar ponto da escola. Com um bom visual para os padrões da época, canto forte, evolução coesa e um dos três melhores sambas do ano, o título foi mais do que merecido.



2001
Nenê de Vila Matilde — Voei, Voei, na Vila Aportei, Onde Me Deram a Coroa de Rei

Vivendo o maior jejum de sua história até então – a Nenê de Vila Matilde sofria com a falta de títulos – A espera era ainda mais dolorosa pelas lembranças dos grandes desfiles, com pequenos problemas que impediram a conquista, como nos desfiles de 1997 (Narciso Negro) e 1999 (Voa Águia, Voa que Sampa é Toda Tua). Só que em 2001, a história finalmente mudou. Com um desfile lindíssimo, a Águia arrebatou o Anhembi e levou a taça falando sobre a trajetória do negro.

Mesmo dividindo a conquista com o Vai-Vai, a Vila Matilde (e a Zona Leste) festejou (e muito!) aquele campeonato, que marca até hoje o último título de seu Nenê (fundador da azul e branco), Betinho (presidente naquele ano) e da Águia Guerreira no Grupo Especial. Também registra o último campeonato do carnavalesco pernambucano Augusto de Oliveira, que foi responsável pela última conquista do Camisa em 1993 e o primeira conquista da X-9 Paulistana em 1997.



2002
Gaviões da Fiel—Xeque-Mate

Como num jogo de xadrez, os Gaviões da Fiel deram um Xeque-Mate com uma apresentação histórica e perfeita (Foto: Acervo Folha)

O mundo de 2002 era muito diferente do atual. As preocupações do Brasil era muito em torno da relação do país com o FMI. Nesse cenário, Jorge Freitas, então nos Gaviões da Fiel, criou o enredo Xeque-Mate, que misturava o jogo de xadrez com uma crítica política pra lá de pertinente. O resultado? Uma apresentação histórica, que na minha humilde opinião é o melhor desfile dos mais de trinta anos do Anhembi. A Torcida que Samba, não ligou nem pra tempestade que chegou a cair durante a noite e cravou seu nome definitivamente no rol das grandes escolas do Carnaval de São Paulo.

O samba, assim como o desfile, era fantástico. Trechos como “É hora da virada, vem amor” e “meu país, menino, vai mudar” foram usados no horário eleitoral no segundo semestre daquele ano. Como gostam de dizer…rompeu a bolha. Uma curiosidade desse Carnaval é que ele marcou o primeiro título do carnavalesco Jorge Freitas na cidade. Vindo do Rio de Janeiro, Jorge, atualmente na Mancha Verde, ainda venceria em 2003 com os Gaviões, em 2010 com o Rosas, em 2016 com a Império e em 2019 com a Mancha. É o maior campeão do Anhembi junto com Sidnei França. Ele ainda tem outros dois títulos como carnavalesco no Acesso com os Gaviões da Fiel (2005 e 2007) e mais um como diretor de Carnaval no Águia de Ouro (2018). São oito campeonatos entre Especial e Acesso. Impressionante.



2003
Mocidade Alegre — Omi — Berço da Civilização Iorubá

 “Vocês vão cair, hein”, “desse ano não passa, vocês são a bola da vez pra cair” e “abre o olho que vocês vão cair” foram frases que os integrantes da Mocidade Alegre escutaram no pré-Carnaval de 2003. Depois de anos no ostracismo e um desfile para esquecer no ano anterior, a previsão de um possível rebaixamento era coerente. O que quase ninguém esperava é que a Morada renasceria na força de seu samba.

Mesmo com desconfianças internas pelo enredo de matize africana, a agremiação honrou sua tradição de grandes desfiles. A rubro-verde foi vice-campeã pela primeira vez em 15 anos e fez com que a briga pelo título voltasse a ser realidade no Limão. Criativa e com um samba espetacular, a morada ressurgiu das cinzas e começou a trilhar o caminho que a transformaria em potência novamente. Carregada de axé, a Morada renasceu!



2004
Império de Casa Verde — O Novo Espelho de Narciso. Um Delírio Sobre os Heróis da Mitologia Paulistana


Apresentação surpreendente da Império de Casa Verde colocou o Tigre no rol das disputas de título na elite do samba paulistano (Foto: Acervo Folha)

No ano de 2004, as escolas de samba de São Paulo tiveram uma curiosa imposição: Falar dos 450 anos da cidade. Como o tema era único, muita coisa se repetiu, como chegada dos imigrantes, o ouro negro (café), as homenagens aos bairros das escolas… Em meio a tudo isso, a então caçula, Império de Casa Verde, fez um delirante desfile para driblar o tema único e se destacando muito. E pela primeira vez assustou as gigantes.

Com uma plástica arrebatadora e muito acima da média da cidade, a azul-e-branco se destacou pelos seus enormes tigres e por um enredo que viajou muito em tudo que a capital paulista poderia oferecer. Unindo Narciso (sim, o da Grécia), Matarazzo, São Paulo e Ayrton Senna, a agremiação brilhou no Anhembi. Apesar disso, erros na bateria e na evolução impediram o título, mas o caminho para a conquista estava traçado.



2005
Rosas de Ouro — Mar de Rosas


Mesmo sem a conquista, Mar de Rosas é um dos desfiles históricos da Era Anhembi. Com um visual marcante e com uma bênção divina, a Roseira protagoniza uma apresentação inesquecível em 2005 (Foto: Reprodução)

Não é o melhor desfile daquele ano, também não é um dos três melhores desfiles da história do Anhembi, mas Mar de Rosas é um desfiles mais marcantes e lembrados da história do Sambódromo. O Rosas de Ouro, uma das escolas mais tradicionais da cidade, falando sobre seu símbolo maior, a Rosa, emocionou o público com uma apresentação inesquecível.

Oriundo de uma ideia de 1994 do carnavalesco Fábio Borges, quando estava na Estação Primeira de Mangueira, a temática brindou os sambistas da cidade e encantou a Roseira. Nem mesmo os problemas em harmonia, evolução e na plástica, que afastaram a escola da briga pelo título, conseguiram apagar a eterna imagem da entrada com o céu azul e rosa e o lindo samba que é lembrado até hoje. Nem tudo é resultado.



2006
Mancha Verde — Bem aventurados sejam os perseguidos por causa da justiça dos homens… Porque deles é o reino dos céus

Após a consolidação dos Gaviões da Fiel nos anos anteriores, a Mancha Verde resolveu entrar no Carnaval e também mostrar sua grandeza. Em uma decisão esdrúxula, que foi fruto de uma tentativa fracassada de eliminar as “organizadas” da folia -um artigo do regulamento a obrigava a desfilar “sozinha” num grupo “independente”, não contando para o resultado oficial- o que fez com que a alviverde não estivesse na disputa do título do Carnaval.

Mesmo com essa decisão esdrúxula e sendo alvo de perseguição, a agremiação não se calou e emocionou o público. Com uma arrebatadora e brilhante passagem pelo Anhembi, deixou muita gente de olho marejado com sua forte Comissão de Frente e a beleza de seu ótimo samba.



2007
Unidos de Vila Maria — Canta, Encanta Com Minha História… Cubatão, Rainha Das Serras


Apresentação sobre Cubatão colocou a Vila Maria em outro patamar no Grupo Especial. Escola do Jardim Japão teve seu auge nos anos 2000 (Foto: Acervo Folha)

Apesar de nos últimos anos o Carnaval de São Paulo ser criticado por reaproveitar fórmulas em enredo e samba, é importante salientar que a terra da garoa já foi reduto de muita criatividade e esse enredo é um dos maiores exemplos disso. Com Cubatão de enredo, em 2007 a Unidos de Vila Maria assombrou o Anhembi com um desfile lindo, carnavalizado e baseado num grande samba. Parece mentira, mas sim, isso foi possível.

A escola do Jardim Japão fez uma apresentação brilhante. O enredo foi desenvolvido com clareza e apresentou um lado que poucos conheciam da cidade do litoral: A renovação ambiental. Além disso, foi embalado pelo melhor samba da história da agremiação da Zona Norte, o que ajudou ainda mais a consagrar a apresentação. O melhor desfile da história da Vila Mais Famosa, rendeu também o melhor resultado de sua histórica, com um honroso vice-campeonato.



2008
Vai-Vai —  Acorda Brasil, a saída é ter esperança

 “A levada do meu samba vai te enlouquecer” como numa previsão do futuro, a letra do samba do Vai-Vai em 2008 já dizia o que o público do Anhembi ia sentir em sua apresentação. Repetindo em maior proporção algo que já tinha acontecido em 1996, 1998 e 2000, a Saracura contou com visual esplendoroso, crítica social e um show na parte musical, para arrebatar o sambódromo. Não ficou uma pessoa parada com o sacode da Escola do Povo.

O jejum de sete anos sem conquistas acabou com um luxuoso campeonato conquistado em cima da maior rival - Mocidade Alegre - numa apuração apertadíssima. Mesmo assim, a lembrança que ficou daquele inesquecível desfile de 2008 da escola do Bixiga é que, mais do que um sacode no público, a exibição também foi incontestável em plástica e enredo. Um momento marcante do Vai-Vai.



2009
Mocidade Alegre — Da Chama da Razão Ao Palco Das Emoções, Sou Máquina, Sou Vida, Sou Coração Pulsando Forte Na Avenida

Com mais um título e uma apresentação dominante, a Mocidade Alegre elevava seu patamar na história do Carnaval de São Paulo. (Foto: UOL)

Nesse ano, a Morada do Samba começaria o domínio que lhe daria quatro títulos e dois vice campeonatos no período de sete anos. Com o talento de Sidnei França e Márcio Gonçalves, a escola se tornou a escola ser batida. Falando do coração, a Mocidade Alegre fez um desfile incontestável. Com a bateria no auge, um samba espetacular e um enredo que tocou o coração da sua comunidade de forma sublime, a conquista só serviu pra coroar o início do trabalho que ainda traria muitos e muitos frutos.

Mesmo assim, o triunfo não foi nada fácil. Numa árdua batalha com a sempre rival Vai-Vai, a conquista da taça só veio na última nota. O sonho de ser campeão cantado no samba e retratado em alegoria na pista, se tornava realidade numa apuração emocionante. Só que toda essa emoção para a conquista do título pregou uma peça na mais alegre figura das grandes escolas de São Paulo - Juárez da Cruz - fundador da escola, passou mal durante a apuração, teve um ataque cardíaco que levou ao seu falecimento uma semana mais tarde.

Como forma de homenagem seu eterno presidente, no ano seguinte a escola resolveu apostar num desfile sobre os espelhos. O último setor falava do espelho da própria agremiação. E sabe quem era o espelho? Sim, seu Juárez. Afinal, somos espelho de quem nos criou. Uma linda, merecida e marcante homenagem.



2010
Acadêmicos do Tucuruvi — São Luis do Maranhão, Um Universo de Encanto e Magia

São Luís do Maranhão já recebeu muitas homenagens tanto em São Paulo quanto no Rio de Janeiro, mas o Acadêmicos do Tucuruvi fez um desfile inesquecível sobre a cidade em 2010. Praticamente irretocável, o Zaca fez seu nome e, pela primeira vez, sonhou com o título. Contando a história da cidade onde nasceu, Wagner Santos, que estreava na agremiação, brilhou na concepção de alegorias e fantasias no enredo sobre a capital maranhense.

Um ponto bastante interessante nessa apresentação é o tom clássico que ela teve. O desfile foi muito bem construído no ponto de vista plástico, reafirmando o modelo criativo do carnavalesco que, mais uma vez, reforçou a exímia capacidade de construir bons enredos sobre temas que não chamavam a atenção dos sambistas em geral. Uma curiosidade negativa é que o resultado final foi “apenas” um modesto oitavo lugar por conta de apenas um único quesito: Evolução. A escola da Zona Norte somou a nota máxima em todos os outros oito quesitos, mas perdeu décimos preciosos em Evolução e ficou bem longe da briga pelo título.



2011
Vai-Vai — A Música Venceu!


Feliz da Vida, o Bixiga provocou uma catarse de emoção no Anhembi na linda homenagem a João Carlos Martins (Foto: Reprodução)

Como já exposto nesse espaço anteriormente, o Vai-Vai é a única escola de São Paulo que trilha um caminho de conquistas ainda na escolha de seu enredo e consequentemente de seu samba. Não foi diferente em 2011… Mesmo com o carnavalesco Alexandre Louzada sendo fundamental com seu belíssimo trabalho plástico, a Saracura reforçou sua aura de “imbatível” quando “pega na veia” e conquistou mais uma taça com uma apresentação arrebatadora sobre o maestro João Carlos Martins.

Com um lindo samba, a escola que desfilou já com a luz do sol, conseguiu emocionar o Anhembi naquela inesquecível manhã de sábado. O maestro, de linda história de vida, regeu a bateria e ainda correu para desfilar no último carro, onde foi consagrado com a união do erudito com o popular. Mais uma vez a Saracura foi feliz da vida.



2012
Mocidade Alegre — Ojuobá — No Céu, os Olhos o Rei… Na Terra, a Morada dos Milagres… No Coração, um Obá Muito Amado!

No ano em que a Liga Independente das Escolas de Samba comemorava seu Jubileu de Prata, o Carnaval de São Paulo viveu o que tem de melhor e de pior. O lado bom foi a melhor safra de sambas da década e desfiles excepcionais, que ajudaram a marcar um dos melhores anos da história do sambódromo. O lado ruim foi tudo o que aconteceu na terça-feira de apuração, que passou desde notas rasgadas, até brigas e alegoria incendiada. Um vexame histórico em rede nacional.

Alheia a tudo isso, e reforçada pelo seu sangue guerreiro, a Mocidade Alegre, que sofreu com um incêndio a menos de um mês para o carnaval, superou as adversidades para provocar uma catarse. Com um dos mais lindos sambas-enredo que o Anhembi já viu, a agremiação fez uma apresentação que é sem dúvida nenhuma, uma das maiores da história do sambódromo. Premiando luxo, enredo cultural e muita força de sua comunidade, o título, apesar de ligeiramente esquecido pela confusão, é um dos mais justos de toda sua história.



2013
Águia de Ouro — Minha Missão. O Canto do Povo. João Nogueira

Buscando se recuperar de um desastroso resultado no ano anterior, quando falou da Tropicália, o Águia de Ouro brindou o Anhembi com o mais belo samba de enredo de sua história. Em uma exibição vibrante, envolvente e com problemas, a escola prestou uma linda homenagem a João Nogueira. Poucas vezes, uma comunidade cantou tanto quanto a do Águia em 2013. Mesmo com o Anhembi vazio e depois de uma tempestade durante a noite, a escola mostrou que “ninguém faz samba só porque prefere” e brilhou graças ao seu fantástico samba.

Apesar disso, o povo da Pompeia não conseguiu vencer o Carnaval. Mesmo com a maior pontuação do júri daquele ano, os muitos (incontáveis) problemas em evolução fizeram a agremiação estourar o tempo do desfile e perder 1,1 ponto. Abrindo então caminho para o bicampeonato da Mocidade Alegre. A azul-e-branca terminou em terceiro lugar, garantindo o retorno ao desfile das campeãs, o que não acontecia desde 2007. Por mais que a punição tenha evitado o inédito título, a escola comemorou muito o resultado.



2014
Mocidade Alegre — Andar com fé eu vou, que a fé não costuma falhar!


De joelho e clamando pela fé, a Mocidade Alegre conquistou um tri histórico que coroou sua era de domínio no Carnaval de São Paulo (Foto: Fotos Públicas)

Foram mais de 40 anos de espera, mas a Mocidade Alegre conseguiu ser novamente tricampeã do Carnaval de São Paulo. Com um enredo sobre a fé, o grande mérito da apresentação foi a incorporação total dos desfilantes com o tema. Cada componente sentiu na pele a emoção do momento. E nesse cenário, emocionada e emocionando como nunca, o tri veio.

Os carnavalescos Sidnei França e Márcio Gonçalves conseguiram desenvolver o tema com felicidade, apostando na riqueza de detalhes e pensando, sobretudo, em emocionar seu componente, o que resultou numa escola em transe com seu próprio tema. O resultado foi um desfile inesquecível que consagrou a era da Morada. Mesmo com alguns problemas de evolução, a Mocidade, no samba, é tri. Amém!



2015
Vai-Vai — Simplesmente Elis. A Fábula de uma Voz na Transversal do Tempo

No ano do seu último campeonato no Grupo Especial, o Vai-Vai começou a desenhar sua décima quinta estrela já na escolha de seu samba-enredo e na introdução do marcante “lareilarei” na gravação do CD oficial. Antes mesmo do desfile acontecer, a sensação era de que a campeã estava definida. O que foi reforçada com mais um sacode histórico da escola do Bixiga.

Nem a então tricampeã Mocidade Alegre, com seus carros luxuosos e seu ótimo enredo sobre Marília Pêra, foi páreo para uma comoção que o Anhembi poucas vezes viu. De ponta a ponta, do anúncio ao fim, a Saracura passou campeã. Certamente alguns falarão de alegorias pobres e fantasias problemáticas. Existiram? Existiram! Isso importa? Pra mim, não. O Carnaval ainda é das escolas DE SAMBA e ninguém teve mais SAMBA que o Vai-Vai em 2015. Um campeonato que só a Escola do Povo é capaz de ganhar.



2016
Império de Casa Verde — O Império dos Mistérios

Não teve mistério capaz de impedir a conquista da Império de Casa Verde. Deslumbrante plasticamente, a Caçula deu o bote e levou a taça (Foto: Época)

Dez anos depois do bicampeonato e vindo de uma sequência de resultados abaixo do esperado, a Império de Casa Verde foi para a pista renovada. Sob a batuta de Jorge Freitas, que estreava na agremiação, com uma comunidade aplicada, ótimos segmentos e a voz potente de Carlos Júnior, não teve mistério. Dominante plasticamente e com as rivais tropeçando na evolução, a escola reconquistou a taça do Carnaval.

Rara foi as vezes que o Anhembi viu um título tão merecido. A Império dominou o ano com uma plástica que beirou a perfeição e ainda contou com outros quesitos fortíssimos como harmonia e samba-enredo. Vale mencionar o carro da Atlântida, que certamente está entre os mais bonitos dos trinta anos de sambódromo.



2017
Dragões da Real — Dragões Canta Asa Branca


Munida por um grande samba e dona da melhor comunicação com o público, a Dragões não levou, mas fez história no Anhembi em 2017 (Foto: SASP)

Fundada em 2000 e sendo integrante da elite desde 2012, a “caçula” do Grupo Especial, Dragões da Real, marcou seu nome na história, e fez um dos mais brilhantes desfiles da era Anhembi. Com um enredo sobre Luiz Gonzaga e um grande samba, arrebatou público e crítica, com uma apresentação inesquecível.

Apesar do grande desfile a Tricolor ficou com a frustração do vice-campeonato, perdendo o título na última nota, para o Acadêmicos do Tatuapé. De qualquer forma, mais do que um bom resultado, a escola da Vila Anastácio foi, sem dúvida nenhuma a melhor coisa que aconteceu naquele ano, dando um verdadeiro show para todos que assistiram sua magnífica apresentação.



2018
Acadêmicos do Tatuapé —  Maranhão, os Tambores vão Ecoar na Terra da Encantaria

Nenhuma campeã surge do nada. Uma bicampeã então…menos ainda. Depois do vice campeonato em 2016 e do título em 2017, o Acadêmicos do Tatuapé se consolidou como uma potência com um lindo desfile sobre o Maranhão- na estreia do carnavalesco Wagner Santos. Com um ótimo samba e uma comunidade fortíssima o bi virou realidade!

É até plausível dizer que alguma outra escola tenha sido melhor que o Tatuapé, mas é impossível mencionar que alguém cantou mais que o povo da Zona Leste. O samba berrado em uníssono, unido a sua boa Comissão de Frente, sua boa plástica e um enredo muito bem desenvolvido, resultou numa ótima apresentação. Apresentação sem dúvida nenhuma digna de campeonato.



2019
Gaviões da Fiel — A saliva do santo e o veneno da serpente

Com o repeteco da catarse de 1994, os Gaviões da Fiel fizeram um dos grandes sacodes da Era Anhembi e deixaram uma lembrança eterna na mente de todo sambista (Foto: Folha)

Os Gaviões da Fiel reeditaram seu clássico enredo de 1994 e mais uma vez fizeram o Anhembi enlouquecer. Com um desfile simplesmente espetacular nos quesitos de chão, a Torcida que Samba fez o público ficar em transe com sua passagem arrebatadora. Muita coisa deu certo no desfile dos Gaviões. É até difícil citar algum destaque. O resultado fala pouco sobre o que a apresentação foi. Pra quem estava lá, é difícil de lembrar sem se arrepiar. Uma manhã de domingo mágica.

Mais do que qualquer campeonato ou coisa parecida, o que a alvinegra proporcionou foi um momento mágico que fez o público se sentir como em 1994, onde nem tudo era só grandiosidade e regulamento, mas muito era samba e festa. Sendo assim, considero uma apresentação marcante e que serve inclusive — apesar do nono lugar- como referência do que um desfile de escola de samba pode ser no sambódromo do Anhembi.

2020
Mocidade Alegre — Do Canto das Yabás, Renasce Uma Nova Morada

A Mocidade Alegre é possivelmente a mais dominante das escolas de samba de São Paulo no século, mas após. o tricampeonato a escola vinha numa fase de apresentações tímidas. Entretanto em 2020, a Morada do Samba fez um desfile do qual o público do Anhembi jamais esquecerá. A cada ala que passava pela pista, o olhar dos componentes no verso “nossa Morada renascerá” deixava um impacto ainda maior.

Se recuperando do pior resultado de sua história, a escola do Limão repetiu o que aconteceu em 2003, quando mesmo sem conquistar o campeonato deixou a sensação de que voltou a trilhar o caminho que a fez uma das maiores escolas da cidade. A sensação de que voltou para o rumo certo se fez presente mais uma vez, e ainda faz com que pensemos que a taça não deve demorar a chegar para a rubro-verde. Mais uma vez, carregada de axé, a Morada renasceu!



Confira a série de três lives TRINTA EM TRINTA que o SAMBARIO promoveu, recebendo como convidado o pesquisador Odirley Isidoro. Participações de Theo Valter, Bruno Malta, Victor Raphael e Rodrigo Vilela. Se inscreva em nosso canal no YouTube.





Bruno Malta

Twitter: @BrunoMalta_