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Samba Paulistano
   
11 de março de 2019, nº 34
O QUE O CARNAVAL DE SÃO PAULO IRÁ LEVAR DO ANHEMBI EM 2019
por Bruno Malta

Passados os desfiles e a apuração, é hora de fazermos um balanço geral e relembrarmos o que o Anhembi irá levar de lembranças do ano de 2019. Novamente, a campeã — inédita — teve a pontuação máxima, mas dessa vez, venceu de forma isolada, sem empates. Além dela, houve surpresas entre as cinco primeiras colocadas, o fim do domínio do Acadêmicos do Tatuapé, a reestreia do Colorado do Brás no Grupo Especial, o histórico rebaixamento do Vai-Vai e o fim de uma passagem de mais de vinte anos do Acadêmicos do Tucuruvi na elite. É hora de relembrar as apresentações do Carnaval de São Paulo.

Carnaval 2019 consagrou o inédito título da Mancha Verde ( Foto: Werther Santana/Estadão)

No pré-Carnaval, a pergunta que ecoava na mente dos sambistas da cidade era: Quem poderia impedir o tricampeonato do Acadêmicos do Tatuapé? A escola da Zona Leste, aliás, teria uma história que exaltava os bravos guerreiros da história e sua comunidade e, portanto, era considerada favorita. As concorrentes eram muitas, mas uma das principais ameaças ao sonho do tricampeonato, era a Mocidade Alegre que teria como tema, a lenda que deu origem ao Rio Amazonas como enredo e, além dela, a Mancha Verde com a história da neta de Zumbi dos Palmares e a estreia de Jorge Freitas também era bastante aguardada.

Além destas, a Tom Maior, após o melhor desfile de sua história, levaria para a pista, uma obra acerca das indagações da humanidade, a Dragões da Real falaria sobre o Tempo, a Império de Casa Verde de cinema e os Gaviões da Fiel reeditariam vinte cinco anos depois, o desfile que falava do Tabaco.

Outros temas dos desfiles eram a Roseira homenageando a Armênia, a Vila Maria falando do Peru, o Vai-Vai contando a história da negritude no passado, no presente e no futuro, a X-9 homenageando Arlindo Cruz, o Tucuruvi, a história da liberdade brasileira e o Águia de Ouro fazendo um passeio polêmico sobre os problemas dos 518 anos da história do Brasil. Além destas, reestreando na elite, o Colorado do Brás teria como tema, a Independência do Quênia através da música Hakuna Matata.

Os desfiles na Sexta

A abertura dos desfiles do Grupo Especial atrasou cerca de 20 minutos do previsto, mas o público — abaixo do esperado — gostou da entrada, após vinte e seis anos fora da Elite, do Colorado do Brás na avenida. Com um lindo alusivo relembrando a popular música Hakuna Matata, Chitão Martins incendiou o público que começou apoiando a escola. O problema foi que o desfile não correspondeu e o público foi ficando mais quieto e menos participativo. A Comissão de Frente e o casal entraram nervosos e não conseguiram empolgar. Além disso, a Evolução também não foi das melhores, houve atropelamento de alas e também descompassos em termos de andamento dos componentes.


O casal do Colorado do Brás; Escola fez uma apresentação conturbada na abertura dos desfiles. (Foto: Recordar É Viver — Adriano Moraes)

Nos quesitos musicais, embora o samba tenha passado muito bem, tanto Harmonia, quanto em bateria, houve muitíssimos problemas. O canto da comunidade foi decepcionante e quase ninguém nas alas cantava algo que não fosse o refrão. Ademais, por conta da chuva e de um desarranjo após a primeira paradinha, a Ritmo Responsa decepcionou e não conseguiu um bom desempenho. Nos quesitos plásticos, o desenvolvimento do enredo foi um ponto positivo, mas alegorias e fantasias estiveram abaixo. Em alegorias, o carro 3 que tinha uma Aranha gigante — com problemas graves de acabamento e concepção — puxou muito pra baixo, o desempenho no quesito. Em fantasias, a vermelho e branco optou por um conjunto simples, mas de pouca criatividade e excessiva repetição de formas. Por conta das falhas e por abrir os desfiles, era consenso de que a agremiação do Brás era uma candidata séria a voltar para o Grupo de Acesso em 2020.

Na sequência, a Império de Casa Verde fez um desfile de altos e baixos sobre os 124 anos de Cinema. O início foi fortíssimo em todos os aspectos, a cabeça do desfile com a linda comissão de frente seguida de um dos melhores casais da cidade — de linda indumentária — foi um começo sensacional. Além deles, o fantástico abre-alas dava o tom de uma passagem que prometia muito. O problema é que a empolgação foi diminuindo à medida que a agremiação (não) avançava na pista. Com uma evolução travada pelos carros gigantescos e uma harmonia bastante aquém do tradicional, o desfile foi caindo na proporção com o que tempo passava. Descontando os carros gigantes, o número de componentes era bem alto para o padrão do ano e, com isso, o Tigre Guerreiro passou a errar cada vez mais gravemente no quesito evolução e teve que correr intensamente no fim para passar no limite permitido pelo regulamento.

O fantástico abre-alas da Império de Casa Verde; Escola teve problemas nos quesitos Harmonia e Evolução (Foto: Recordar É Viver — Adriano Moraes)

Outros problemas foram que apesar da inegável qualidade, o samba não funcionou bem pela harmonia abaixo da média e da evolução problemática, que deixou a impressão de frieza na pista, mesmo com a bela resposta do público. Por fim, as fantasias também estiveram bastante abaixo do que se podia esperar de uma escola com o poderio financeiro da agremiação da Casa Verde. Diante destes fatos, nem mesmo um dos mais lindos conjuntos alegóricos do ano e um público quente por entender do começo ao fim, um enredo simplório, mas de fácil leitura, poderia tirar a Império da lista das decepções do ano e sendo assim, a sensação era de que a azul e branco havia regredido bastante em relação a 2018 e ficaria no meio da tabela na apuração.

Foi na terceira agremiação da primeira noite de desfiles foi que a briga pelo título começou a esquentar. Com o maior aporte financeiro da história do Carnaval de São Paulo, a Mancha Verde entrou na pista disposta a levar o primeiro campeonato de sua história e se credenciou fortemente para isso. Confesso que falar isso é bastante redundante, mas o Jorge Freitas, mais uma vez, fez um conjunto visual pra entrar na história do Anhembi. Em termos de alegorias, havia tanto capricho, tanto cuidado que é impossível destacar um ponto meramente. Ademais, poucas vezes, vi uma comunidade extremamente bem vestida e condizente com o enredo como foi no desfile da alviverde nesse ano. Nada plasticamente estava abaixo do irretocável na Mancha.

O capricho do conjunto visual da Mancha Verde impressionou o Anhembi. (Foto:Recordar É Viver — Adriano Moraes)

Nos quesitos musicais, após uma temporada de ensaios apenas mediana, a Puro Balanço deu um show na avenida fazendo um samba pra lá de mediano render muito bem na voz de Freddy Vianna e do ótimo carro de som que segurou bem nos momentos em que foram acionados. Em Harmonia, a alviverde não foi perfeita como outras seriam, mas também esteve muito bem, o que fez com que o canto mais tímido não trouxesse qualquer prejuízo ao desfile. Outros pontos positivos foram: O excelente enredo — extremamente de fácil leitura, a boa Comissão de Frente e a evolução, que apesar de um momento irregular, esteve tranquila em boa parte do tempo. Mesmo com um desempenho abaixo dos principais do ano, o casal da escola também não chegava a comprometer o objetivo do primeiro título. Por conta disso, a escola, mesmo sendo apenas a terceira a desfilar e com onze concorrentes — algumas delas bem favoritas no pré-carnavalesco — pela frente, demonstrou que pra ganhar o campeonato em 2019, era preciso vencer a verde e branco.

Quarta a entrar no Anhembi, o Acadêmicos do Tucuruvi fez uma passagem complicada na defesa do enredo “Liberdade, o canto heroico de um povo retumbante”. Confesso que, por vezes, tive dificuldade de entender o que era o tema na pista. As alegorias, em momentos do desfile reproduziam uma ideia e em outros, reproduziam conceito distinto. No fim das contas, pareceu que não se sabia reproduzir o que defendia na parte plástica, dificultando bastante à realização do contexto temático na avenida. Além disso, outro ponto decepcionante aconteceu na concepção plástica da escola. Ora apostava no tradicional, ora numa modernidade estilo Beija-Flor 2018. Em ambas as situações, as escolhas foram ruins. Nos quesitos musicais, o grande destaque da apresentação aconteceu. Pela primeira vez em muitos anos, eu vi uma comunidade vibrante e cantando forte. Ademais, o samba passou razoavelmente bem e a bateria foi absolutamente espetacular, acertando tudo que tentou.

O bom casal Kawan Alcides e Waleska Gomes foi um destaque na passagem do Acadêmicos do Tucuruvi. (Foto:Recordar É Viver — Adriano Moraes)

Nos quesitos de dança, me chamou a atenção à apresentação do casal que embora fosse aquém do potencial deles, foi leve e bastante competente. A Comissão de Frente teve bons momentos, mas pecou pelo excesso de movimentos, o que dificultou sua interpretação. Na evolução, o Zaca teve alguns poréns, especialmente após o recuo de bateria que deixou a escola parada e descompassada na hora de seguir pela pista. Por conta dos problemas plásticos, o Tucuruvi estava ameaçado pelo rebaixamento, mas sabendo que uma concorrente já havia passado pior, acreditava-se que a azul e branco tinha feito um desfile para permanecer, com leve drama, no grupo da elite.

Na tentativa do tricampeonato, o Acadêmicos do Tatuapé entrou pisando firme na avenida e com uma Harmonia espetacular, mostrou credenciais de um grande desfile que esbarraram em adversidades vindas do pré-Carnaval e de acontecimentos da pista. É fato irrefutável que a azul e branco apresentou enredo e samba abaixo do costumeiro recente e, isso, inegavelmente, influenciou numa passagem bem mais fria que nos dois anos anteriores. Por conta disso, a parte plástica embora de bom nível, não traduziu tudo com fácil leitura, o que dificultou o entendimento do enredo. Além disso, no que diz respeito à parte alegórica, existiram falhas graves. Quatro das cinco alegorias tiveram algum tipo de problema seja na hora de entrar — ocorreu dificuldade de colocar o abre-alas e o carro 3 na avenida; Seja na pista, como um telão apagado na alegoria 5 — perda de ponto óbvia segundo o manual de julgamento. No entanto, em fantasias, mesmo com algumas indumentárias poluídas, a agremiação passou com intenso brilho, requinte e luxo tendo ótimo desempenho.

A fantástica Comissão de Frente do Acadêmicos do Tatuapé deu um tom clássico ao desfile. (Foto:Recordar É Viver — Adriano Moraes)

No módulo de dança, o casal repetiu as imperfeições de 2017 e 2018 e, portanto, não conseguiu fazer uma apresentação irretocável, ao contrário da Comissão de Frente que foi fantástica e relembrou desempenhos clássicos do quesito. Em Evolução, a apresentação foi melhor que no ano anterior, mas com imprevistos após o recuo, especialmente num espaçamento que ocorreu devido ao travamento da primeira alegoria após a entrada da bateria no espaço destinado a ela. No contexto musical, como fora citado, aconteceu um show de Harmonia que segurou perfeitamente o canto, mesmo com vários clarões na sustentação da percussão e do carro de som. A bateria, aliás, não foi muito bem e embolou durante o tempo no recuo após um clarão. Tenaram, inclusive, um apagão na sequência para buscar ajeitar a casa, mas não houve melhora e a escola seguiu com problemas no quesito. O samba, problemático desde o pré-Carnaval, rendeu bem no Anhembi e subiu de nível em relação ao CD, mas obviamente, não seria para nota 10. Por conta dos transtornos apresentados e da óbvia despontuação em Alegorias, o sonho do tri ficava mais distante e a briga da escola parecia por uma vaga no desfile das campeãs.

Homenageando Arlindo Cruz e com o poeta fazendo a primeira aparição pública após o AVC de 2017, a X-9 Paulistana fez uma passagem problemática, mas bastante emocionante. Falando primeiramente de questões técnicas, a escola teve grandes dificuldades no que diz respeito a parte visual. Havia alegorias com panos mal feitos e comprados no dia e outras com impressões de folha A4 que não casavam com o resto do carro, o que mostrava bem a atrapalhação na construção plástica. Além disso, as fantasias eram simplórias e tiveram inúmeros adereços despencando pela avenida. Em termos de enredo, foi dificílimo saber do que as fantasias tratavam sem um roteiro e, além disso, ficou clara a excessiva “imaginação” do carnavalesco nas alegorias. Tudo poderia ser mais simples, mais direto, mais tocante nesse sentido. Nos quesitos de dança, ainda não consegui compreender tudo o que a difícil comissão de frente retratava. Eram muitos movimentos e pouca coisa fazia algum sentido para o contexto ali.

A passagem de Arlindo Cruz na avenida durante os desfiles da X-9 foi uma das melhores imagens do Carnaval (Foto:Recordar É Viver — Adriano Moraes)

O casal da escola com uma bela indumentária fez uma apresentação simpática, mas abaixo do que os principais casais fariam na pista. No quesito evolução, a X-9 teve problemas, especialmente por conta da excessiva empolgação de alguns componentes que invadiam alas e causavam descompassos. Além disso, houve um grave espaçamento no após a entrada da bateria no recuo, o que causou zigue-zague e uma demora no acerto da evolução. O segmento musical foi um belo destaque. O bom canto dos componentes aliado à bela bateria impulsionou o ótimo samba na avenida e acabou sendo um ponto positivo numa apresentação muito irregular. A passagem de Arlindo Cruz, entretanto, emocionou todos os presentes e fechou muito bem o desfile da rubro-verde. Com falhas nos quesitos plásticos e problemas em outros como Comissão de Frente e Evolução, a X-9 deixou a pista bastante ameaçada pelo rebaixamento, mas contava com o emocional para tentar tocar o coração dos jurados na batalha contra a queda.

Como em 2018, a Tom Maior fechou os desfiles de Sexta-Feira e fez uma passagem extremamente simpática e funcional, com vários quesitos bem defendidos e com um tema com ótimo, e surpreendente, desenvolvimento. Confesso que tinha uma expectativa bem aquém do que a pista mostraria o que acabou fazendo da vermelha e amarela do Piqueri ser uma belíssima surpresa. O enredo que parecia confuso na sinopse e no samba-enredo, se fez acertado e passou com clareza no Anhembi, graças ao trabalho do ótimo carnavalesco André Marins. Além disso, rendeu um visual bem interessante que realçado pelas cores da manhã, mostrou ainda mais potencial estético. Um dos meus carros prediletos do ano é o abre-alas em branco que deu o pontapé de partida para um ótimo conjunto visual.

O excelente último carro fechou um agradabilíssimo desfile da Tom Maior (Foto:Recordar É Viver — Adriano Moraes)

Nos quesitos de dança, a escola apresentou uma excelente evolução deslizando na pista e uma comissão de frente bastante interessante. É uma pena que o consagrado casal Jairo e Simone tenha, a cada ano, mais dificuldade de mostrar a elegância e a excelência que sempre o marcaram e, infelizmente, acabou sendo o ponto negativo nesse módulo. Já o segmento musical foi desenvolvido com eficiência. Sabendo que o samba estava bem abaixo do ideal, a comunidade cantou forte e passou muito bem em Harmonia e a bateria, MUITO cadenciada em 2019, cruzou o sambódromo extremamente bem e com muita competência defendendo a nota sem nenhum dos graves problemas que a acompanharam em anos recentes, valorizando assim, a composição. Por tudo isso, mesmo com um poderio financeiro limitado, pela competência da apresentação, a Tom Maior deixou a avenida, pensando que poderia sonhar com o primeiro título, mesmo que no conjunto, tenha passado abaixo da Mancha Verde.

Os desfiles de Sábado

Reestreando no Grupo Especial, o Águia de Ouro fez uma apresentação técnica que marcou a volta de Laíla ao Carnaval de São Paulo. O enredo era um resumo de “todas as sacanagens que marcaram a história do Brasil” segundo palavras do presidente Sidnei Carrioulo. A partir daí, a tônica foi à representação de um tema bem político e que causou impacto pelas belíssimas alegorias. Pensando na história proposta, confesso que achei a tudo com pouco cuidado, já que claramente, havia saltos de tempo sem qualquer aviso prévio nas fantasias, o que, pra mim, dificultou na leitura do que a agremiação queria contar. Além disso, o último setor destoou bastante, já que preparou as alas para anteciparem a chegada de um carro excessivamente religioso para o tema. Em termos de fantasias, achei que aconteceram altos e baixos em termos de criatividade e requinte. Um ponto positivo, no entanto, que me causou surpresa foi à forma com que os carnavalescos tentaram usar mensagens claras nas roupas, ajudando bastante quem assistia um roteiro. Uma pena que nem isso salvou a confusão da história citada anteriormente.

Desfile do Águia de Ouro marcou a volta de Laíla após mais de 25 anos afastado do Carnaval Paulistano (Foto:Recordar É Viver — Adriano Moraes)

Nos quesitos de dança, o casal chamou a atenção pela indumentária toda em dourado, mas ambos, claramente, sentiram certo nervosismo — ela em especial e tiveram dificuldades. A Comissão de Frente foi parecida com a do Tucuruvi, só que se apresentou de forma mais direta e limpa, o que facilitou o entendimento. A evolução vinha bem até o carro 2 empacar na avenida e, consequentemente, abrir uma espécie de cratera perto da terceira cabine de julgamento. Ademais, a partir desse momento, a escola mostrou descompasso de andamentos entre as alas, abrindo novamente buraco já no fim do desfile. Nos quesitos musicais, Harmonia e Bateria defenderam muito bem a nota, mesmo com leves imprevistos durante a apresentação. Já o samba que possuía limitações, foi bem cantado pela escola e, surpreendentemente, pelo público, conseguindo assim, um ótimo desempenho na pista. Pelo maior número de acertos que de erros, o Águia de Ouro terminou sua passagem sonhando com uma vaga no desfile das campeãs. Para quem voltava do Grupo de Acesso, um mérito e tanto, fazendo com que a comunidade terminasse a passagem pelo sambódromo feliz da vida.

Segunda a desfilar na noite de Sábado, a Dragões da Real se credenciou a lutar, mais uma vez, pelo título do Grupo Especial com uma apresentação que se não balançou o Anhembi, foi corretíssima e sem erros evidentes. A escola da Vila Anastácio evidentemente não conseguiu uma grande comunicação popular até por preferir buscar o não-erro ao levantar de público, mas saiu da pista com jeito de candidata. Em termos plásticos, confesso que esperava mais. O conjunto plástico estava pouquíssimo criativo e abusou de relógios em alegorias e fantasias. Óbvio que pra falar do tempo, é preciso colocar relógios, mas não era necessário aparecer tantos nas roupas e carros. O enredo, aliás, foi uma decepção. Embora bem fácil de entender na sinopse, o tema ficou confuso na pista, já que as imagens dos carros não conseguiam, facilmente, contar o que cada setor queria mostrar.

O ótimo casal da Dragões da Real se recuperou dos incidentes e brilhou na pista. (Foto:Recordar É Viver — Adriano Moraes)

No módulo de dança, achei que houve uma falha grave em Comissão de Frente, mas um show em evolução e casal. Contando com a volta do coreógrafo Anderson Rodrigues, a agremiação decepcionou no quesito de abertura de desfile. A coreografia e a indumentária dos integrantes infelizmente deixaram a desejar e sequer explicaram qualquer coisa sobre o que queriam apresentar. Além disso, o encontro entre os integrantes vestidos de macacos e os vestidos de pilotos de Fórmula 1 não conseguiu se mostrar claro para quem assistia, o que causou falta de clareza. Por outro lado, o casal brilhou e deixou as más impressões e os contratempos dos ensaios para trás. Com ótima indumentária, a dupla foi um destaque do desfile, assim como a evolução que sem qualquer percalço fez da Dragões, mais uma vez, a melhor no quesito no ano. No segmento musical, mesmo com o samba rendendo bem abaixo após um desempenho bem mediano do intérprete Renê Sobral e da bateria Ritmo que Incendeia, a Harmonia foi competentíssima e levou a comunidade a um ótimo canto e a uma passagem praticamente sem erros técnicos. Por conta disso e pelos descuidos serem pouquíssimos e em quesitos que historicamente não são julgados com tanto rigor em São Paulo, a comunidade de gente feliz saiu do sambódromo cotada ao primeiro campeonato de sua história.

Terceira a desfilar, a Mocidade Alegre tinha tudo para se credenciar ao décimo primeiro campeonato de sua história, mas jogou fora uma bela apresentação com erros que não cabem num pavilhão de seu porte. A escola do bairro do Limão começou de maneira espetacular, temos que admitir. O começo formado pela comissão, casal, alas iniciais e tripés eram algo que beirava a perfeição. Após um início arrebatador, mas extremamente lento, já era possível saber que algo não estava bem na evolução. Na medida em que o desfile caminhava, as fantasias apareciam cada vez melhores e mostravam toda a qualidade da escolha do enredo que apesar de ter tido dificuldades no sambódromo, foi um dos melhores em termos de concepção. Em alegorias, aconteceu uma notória melhora em relação a 2018, apesar de um péssimo carro 5 que destoou completamente do conjunto. A se lamentar que a primeira alegoria tenha tido contratempos de iluminação em determinados pontos da pista, o que certamente causaria descontos nas notas. Nos quesitos musicais, a Harmonia não foi tão forte como em outros anos pelos equívocos de evolução que deixaram algumas componentes bastante preocupadas com os problemas e pouco com o canto. Além disso, a má noite do carro de som também prejudicou a questão musical. A bateria, por outro lado, viveu uma boa apresentação e se mostrou, definitivamente, recuperada dos anos ruins entre 2016 e 2017. Até aí, mesmo com percalços, a escola ainda se candidatava ao título, mas foram nos quesitos de dança que a coisa azedou.

Os problemas da Mocidade Alegre não atrapalharam o fantástico casal Emerson e Karina que brilhou, mais uma vez, na pista do Anhembi (Foto:Recordar É Viver — Adriano Moraes)

Mesmo com o melhor conjunto Comissão de Frente e casal do ano, a Morada do Samba desperdiçou uma ótima passagem pelo Anhembi com uma evolução trágica. Nenhuma das 22 agremiações que desfilaram entre Sexta, Sábado e Domingo foi tão mal quanto a rubro-verde no quesito. Além do início lentíssimo, a comunidade não conseguia acelerar o passo por conta do empacamento do abre-alas no fim da pista e precisou correr feito membro de atletismo para não estourar o tempo. Um desastre total. Por conta disso e das dificuldades citadas anteriormente, a briga pelo título era uma utopia e, dessa vez, teria que se contentar em disputar uma vaga no desfile das campeãs.

Maior campeã da cidade, o Vai-Vai pisou fortíssimo na pista contando a história dos negros no passado, no presente e no futuro. A Saracura levantou o Anhembi e cantou forte para deixar o sambódromo como uma das candidatas ao caneco. Confesso que apesar ter aprendido a gostar do enredo, ainda duvidava de sua realização na pista, mas o tema ficou claríssimo no sambódromo e ainda teve doses de criatividade poucas vezes vista em São Paulo. O conjunto visual foi bem irregular, especialmente em alegorias. Os primeiros carros eram bonitos e bem acabados, além de ter concepções interessantes. Do terceiro em diante, ficou claro que o poderio financeiro é o mesmo de outrora e a realização foi ficando pior, embora em termos de ideia, tudo seguisse de maneira criativa. As fantasias eram excelentes em concepção, mas caíram um pouco no fim no acabamento, onde visivelmente, faltou mais aporte de dinheiro. De qualquer forma, no conjunto, o quesito não chegou a ser um problema. Já no segmento musical, poucas vezes a vi tão mal. Mesmo com um dos melhores cantos do ano, a alvinegra teve a bateria numa noite desastrosa e praticamente tirou todo o brilho do samba que era espetacular.

Pingo e Paulinha são, outra vez mais, um destaque irretocável de uma apresentação injustiçada. (Foto:Recordar É Viver — Adriano Moraes)

Já nos quesitos de dança, tudo foi praticamente irretocável. O Casal e a CF rivalizaram com a Mocidade Alegre como os melhores do ano, apesar de apresentações excessivamente velozes. Já a evolução da escola teve um pequeno contratempo no meio, mas quase não afetou a escola que passou com constância e sem qualquer tipo de erro mais fatal, concluindo o desfile com sobra de tempo — ao contrário dos anos recentes como 2015, 2017 e 2018. Além da questão técnica, o Vai-Vai foi à primeira agremiação a sacudir o Anhembi no Sábado e, na minha visão, terminou credenciado ao décimo sexto campeonato de sua história.

Buscando se recuperar de desfiles decepcionantes, o Rosas de Ouro fez uma apresentação simpática, mas mediana no Anhembi. A azul e rosa foi de uma simplicidade irritante, mas que pouco causava erros, o que certamente faria seu potencial crescer diante do júri. O enredo, aliás, foi uma decepção. Confesso que apesar da Armênia ser um tema insólito, pela cultura e os fatos que marcaram o país, eu esperava muito mais. A impressão que tive é que o bom carnavalesco André Machado não soube navegar na profundidade do tema e usou apenas da superficialidade pra construir o conjunto visual. Por conta disso, a plástica, tanto em alegorias, quanto em fantasias foi bem simplório e em, alguns momentos, de gosto duvidoso. Além disso, apesar de uma melhora em relação a 2018, ocorreram problemas de acabamento, especialmente em fantasias. No módulo de dança, a comunidade evoluiu sem grandes percalços, mas tiveram problemas em casal — o costeiro do mestre-sala Edgar despencou ainda no começo da pista — e na comissão de frente que não conseguiu impactar como nos ensaios devido a amenização da coreografia sobre o Holocausto.

O desfile da Roseira foi marcado pela irregularidade plástica. (Foto:Recordar É Viver — Adriano Moraes)

No segmento musical, a escola não conseguiu salvar o péssimo samba-enredo, mas, ao menos, cantou com competência e teve a bateria seguindo em sua evolução e tendo um desempenho satisfatório deixando até a composição, ligeiramente, mais agradável. Por conta do desempenho eficaz em muitos quesitos, mesmo com uma apresentação abaixo da média nos quesitos plásticos, a Roseira terminou o desfile com a sensação de que se ousasse um pouco mais, poderia disputar o G5 e voltar na Sexta-Feira das campeãs, mas nesse ano forte, a tendência era de meio de tabela.

Penúltima a desfilar, a Unidos de Vila Maria fez uma apresentação absolutamente mediana para contar a história do Peru. Mesmo com ótimo desempenho dos quesitos da comunidade, a escola do Jardim Japão teve uma plástica bem fraca e um enredo mal desenvolvido como pontos a se lamentar. Plasticamente, foi o pior conjunto do ano junto de X-9 e Colorado. Pouquíssimas coisas serão tão lembradas de forma negativa, como o carro 5 que trazia um condor gigante de gosto bastante duvidoso. Além disso, as fantasias e o enredo foram simplórios e tiveram concepções difíceis de entender, além das realizações de gosto duvidosas, como já mencionadas nas alegorias. Na parte musical, em que pese o samba ser bastante aquém do mínimo tolerável, a Harmonia e a bateria tiveram desempenhos absurdos de bons. Confesso que não me lembro de ver a comunidade cantar tanto desde a volta do Grupo de Acesso. Soma-se a isso ao fato de Mestre Moleza estar cada vez mais solto na Cadência da Vila e ao fato de Wander Pires brilhar intensamente no Anhembi e temos um ótimo momento no segmento musical.

Mestre Moleza e seus comandados brilharam novamente e foram um destaque num desfile bem irregular. (Foto:Recordar É Viver — Adriano Moraes)

Já no módulo de dança, eu gostei muito da evolução da escola. Sem problemas, sem percalços e sem quaisquer buracos, não aconteceram erros no quesito. O casal, embora abaixo dos principais do ano, também passou com competência, mesmo com uma indumentária ligeiramente abaixo. No entanto, em Comissão de Frente, a agremiação errou. Assim como no quinto carro, o elemento alegórico era um condor que além de ser de característica duvidosa, tinha pouca serventia na apresentação, prejudicando a unidade no quesito. Por conta dos graves contratempos plásticos e de Comissão de Frente, além do fraco samba, apesar de ter quesitos competentes, a briga do pessoal do Jardim Japão parecia ser mais pela parte de baixo da tabela, apesar de uma passagem agradável na pista.

Para encerrar o Grupo Especial, um dos maiores sacodes da história do Anhembi. Eu vou ao Anhembi com constância desde 2017 em ensaios e desfiles e já tinha ido em 2013. Também vejo pela TV desde 2002, pelo que me lembro. Além de ter visto, inúmeros desfiles em VT. Poucas vezes, nem mesmo na exibição original, eu vi o sambódromo tão em transe quanto na exibição dos Gaviões da Fiel em 2019. A alvinegra, com o sambódromo lotado, fez uma passagem arrebatadora que contou com a força de sua espetacular composição para voltar à briga pelo título após 16 anos. Com o enredo sobre o Tabaco, a comissão de frente espetacular deu a tônica de uma apresentação que prometia. Além da ótima coreografia, cito que o tripé que trazia a figura de Santo Antão ao fazer o movimento de olhar para a serpente, soltava uma fumaça sensacional na sequência resumindo perfeitamente o início da história. Na sequência, o ótimo casal fez uma apresentação magnífica. No quesito evolução, houve pequenos percalços, muito pela empolgação dos componentes que invadiam alas, mas nada que atrapalhasse a escola.

O fantástico abre-alas dos Gaviões da Fiel; A alvinegra sacudiu o Anhembi como há anos não acontecia.(Foto:Recordar É Viver — Adriano Moraes)

Já no segmento musical, a escola foi perfeita. Com canto forte e uma bateria cadenciadíssima e com paradinhas maravilhosas, a obra reeditada rendeu intensamente, graças ao ótimo desempenho de Ernesto Teixeira e a resposta incrível das arquibancadas. Na parte plástica, o enredo foi desenvolvido com competência, apesar da ligeira queda no quarto e quinto setor. Em fantasias, a alvinegra passou bem e teve um dos melhores conjuntos do ano, apesar de pequenos problemas de acabamento. O problema é que nas alegorias, a queda foi muito gritante e visível. De qualquer forma, mesmo com os contratempos a Torcida Que Samba deixou a impressão de que o título era possível e, em minha opinião ao fim do Sábado, provável. Afinal, em 2015, com problemas semelhantes, o Vai-Vai arrebatou o décimo quinto título devido ao ótimo desempenho de seu samba e da resposta popular. Diante desse fato e com sacode parecido ou até maior, era possível imaginar que a quinta estrela viria para o céu do gavião.

Na próxima coluna, falo do Grupo de Acesso, da apuração, da repercussão do resultado, encerrando com curiosidades históricas sobre a folia paulistana. Até lá!