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ARRANCADA PARA 2009 Saravá, galera. Quem frequenta a LIESV sabe quem
sou: Rodrigo Raposa, atual vice-presidente da Liga, compositor e intérprete. Já
fui julgador de samba-enredo, de alegorias e diretor do Avaliação. Hoje, baixo
aqui no Sambario como comentarista do Carnaval Virtual, uma função divertida e
prazerosa pra mim que gosto tanto dessa forma de cultura que ainda é tão
obscura. Além de falar a quantas andam os movimentos no Carnaval Virtual da
LIESV, vocês vão saber por mim como os talentos que saem daqui se saem em suas
aventuras no que a gente se acostumou a chamar de "Carnaval Real", o
de carne e osso. Quem sabe um dia eu acabe contando uma peripécia minha por cá
(oxalá!)... Hoje, a minha proposta é a seguinte: comentar os
sambas-enredo da LIESV que começam a desfilar já nesta semana no endereço www.liesv.com.br. Se você comeu
mosca e ainda não baixou os CDs, faça isso ONTEM, e conheça o nosso trabalho. Uma coisa que vão perceber é que eu não dou notas
para os sambas. Coisa mais baixo astral... É muito complicado tirar décimos ou
quartos de um samba por causa de uns errinhos cá e lá. Por isso, a minha
"nota" é a minha reação aos sambas. Funciona assim: Eu ouço o samba
inteiro para poder avaliá-lo mais tecnicamente, e depois boto na agulha uma
segunda vez. Minha reação imediata à essa segunda rodada é o que conta. Tem
sambas que ouvi novamente, ouvidos de folião, com prazer... Tem sambas que
pulei descaradamente. Acho mais justo e mais interessante fazer assim. Aviso prévio: os comentários aqui são relaxados e chegam a ser ácidos, mas não são destrutivos; são só, quem sabe, puxãozinho de orelha pra uns e outros. Os poucos que tomarão bronca daqui pra frente são quem mais mereceu, e quem for safo vai saber como usar as minhas palavras como trampolim para voos mais altos e bem sucedidos.
União do
Samba Brasileiro: Podem até dizer que é barbada a atual campeã ter
um belíssimo samba, mas confiem em mim quando eu digo: esse samba só virou O
SAMBA depois de algumas modificações não no samba em si – que já estava pronto,
esperando os retoques administrativos na escola. Em primeiro lugar, quem diria
que o criador da LIESV e atual indiferente à tudo Miguel Paul teria uma
incomensurável má vontade em defender esse samba. Além de chegar atrasado, fez
beicinho quando o negócio ficou complicado. No final das contas, como ninguém
queria mesmo ceder, pegaram uma serra e acabaram com o cabo de guerra. No lugar
dele, meu amigo de Acadêmicos de Santa Cruz, Igor Vianna, ex-Tradição, que deu
uma senhora valorizada nesta faixa, composta por Murilo Duarte. O Murilo tem um
jeito de fazer samba que, dirão, não tem como dar errado: tom menor bem pegado,
alternando entre o convencional (maioria do samba) com sacadinhas de melodia bem
interessantes. Basicamente mais um aprendiz do grande mestre Imperial na praça.
A poesia consegue confundir a personagem que a escola homenageia com a própria
agremiação, o que é sensacional. Alguns poucos versos bateram mal no ouvido,
seja por, não sei, métrica? (em “Que nesta terra, somos todos iguais”), seja
por sentido (ou falta dele) na letra (o tal do “rodopio fascinante”. Saiu de
onde isso?). No conjunto geral da obra, um dos sambas do ano. Problemas: Nenhum que eu tenha achado.
O presidente do uirapuru da ilha, Willian Tadeu, sempre foi expert em escolher
bons sambas. O que eu faria de
diferente: Deixaria a repetição em “Mostrou que asas não são só para voar”.
Sabiam que esse verso era para ser repetido? É, tipo aqueles super maneirinhos
de Kizomba (Unidos de Vila Isabel
1988 – “Vem, menininha, pra dançar o caxambu”/“Esta quizomba é nossa
constituição”). Ouvi inteiro. Imperatriz
Paulista: Quem já foi Imperatriz nunca perde a majestade, como
sempre dizem. Com a duas vezes campeã e atual vice da LIESV não é diferente.
Com mais um enredo doidão-cultural, cortesia do agora presidente da Liga, João
Marcos, a Paulista chama novamente Anderson Paz pra defender a bagaça e chega
rasgando. É até meio suspeito de eu falar desse samba, pois participo da composição
junto ao grande mestre Imperial, João Pinho, Thiago do Porto e Thiago Meiners.
Fazendo uma comparação com o ano passado, a Paulista resolveu para 2009 apostar
num samba um pouco mais convencional, se bater de frente com a doideira que foi
2008. É mais ou menos assim: 2008 foi Eduardo Medrado, 2009 é Gilson Bernini
(é, eu sei. Acontece). O refrão principal dá um toque de bom humor estilo
Imperial na poesia do resto inteiro do samba, vestindo “casaca e chapéu de
panamá”. A fluidez da melodia, que vai do menor pro maior e pro menor de novo
com transições suaves, é cortesia de Pinho. Uma delícia, como sempre. Ah,
Imperatriz... Problemas: Nenhum.
Assim como Willian, João Marcos sabe o que está fazendo quando o assunto é
escolher samba. O que eu faria de diferente:
Talvez pegaria um pouco mais no pé do Anderson Paz, por conta de algumas
notinhas enjoadas que ele não conseguiu alcançar nos três últimos versos do
samba. Uma ajeitadinha na melodia dessa parte viria a calhar também. Enfim,
ninguém é perfeito. Cantei junto. Imperiais
do Samba: Quem freqüenta a LIESV conhece o “Tá-Ruim”. É o seguinte:
é uma “técnica” de engodo antiga por parte do pessoal da Imperiais (e não há
exceções – até os novatos Yuri Aguiar e Rodrigo Meiners – ops, Oliveira –
adotaram o tá-ruim) onde eles tentam convencer (hoje em dia, sem muito sucesso)
toda a galera que “o trabalho tá atrasado, o samba tá mal gravado, vamos brigar
pra não cair”, enfim, “tá ruim”. Mas esse ano eu testemunhei algumas das
dificuldades da Imperiais e posso dizer que foi uma luta pra botar esse samba
no ar. Entre algumas das armadilhas, passaram por intérprete com pneumonia e –
o “tá-ruim” de todo bom brazuca – falta de grana. Mas o samba saiu, e que
samba. Como sempre, um samba louco e imprevisível, que passa a primeira toda em
sol menor, vai pra maior e, no meio do andamento, muda de sol pra mi com a
sutileza de um bico no estômago. Valente, como todo samba da Imperiais. O
projeto original, que era meu, era “um pouquinho” convencional, mas, claro, o
que passa na mão de Imperial tem que dar uma entortada, uma ajeitada, e fica
jóia. “Pinho Neles” deu a moral no refrão, que deixa o samba redondíssimo (“E o
que é eternidade:/É não saber bem certo o início...”). Problemas: O samba é valente até demais nas suas variações. Não que
isso seja um problema, não pra mim, mas, como diz o grande mestre, “de cabeça
de jurado e bumbum de neném”... O que eu
faria de diferente: Daria mais gás no refrão do meio. A versão concorrente
tinha uma explosão de adrenalina que fez falta. Ouvi inteiro. Império
do Progresso: A águia do Norte Fluminense registrou ao longo dos
últimos três anos um recorde interessante: três 4os lugares. E tem
gente – não são poucos, tenho que dizer – que culpa os sambas. Bem, se for isso
mesmo, talvez a história mude. Ouso dizer que o samba desse ano é o melhor da
história da Progresso. A super interpretação de James Bernardes só estava
precisando de sambas inspirados e enredos diferentes das grandes paixões do
presidente e ex-enredista Diego Araújo, que ficou conhecido por martelar
enredos afros e indígenas. Isso agora ficou a encargo do carnavalesco Vítor
Saraiva, que está fazendo um ótimo trabalho. O samba de João Marcos, João
Pinho, Imperial, Thiago Morganti e Biel Carioca é leve, e parece estar dando
para a Liga a mensagem de que a azul e verde está finalmente encontrando o
caminho certo para sair do quarto lugar, para brigar pelo pódio. Repetições e
variações inteligentes (“E encontrar mil maravilhas/Para poder te encontrar”;
“Cheirando a cravo/Um cheiro doce, cheiro sonhado”; “Brasil sem fim/Brasil pra
mim”) são o grande máximo. Mas esse samba não é aquela maravilha toda, não. O
final do samba é forçado e pouco atrativo. Além do mais, há versos igualmente
forçados dentro do samba que não pegam tão bem assim. Problemas: Os dois últimos versos são o problema desse samba (“Quem
chega pra tecer esse caminho/É brasileiro, é indiano, é infinito”). Não fazem o
menor sentido, são piegas e repelentes, destoando do resto do samba, que é em
maioria atraente. Além do mais, os julgadores podem estranhar a repetição de
“Brasil” (e sua variação, “brasileiro”). O
que eu faria de diferente: Terminaria o samba de maneira diferente. Pulei depois da primeira passada. Sociedade
Cruzeiro do Sul: Pega mal eu falar da minha própria escola? Espero
que não, pois é o que eu vou fazer agora. Pelo terceiro ano seguido, a Cruzeiro
(e em “três anos” eu incluo aí a época Acadêmicos da Vila dos Cabanos, depois
que o presidente original saltou da barquinha e eu assumi) vem com uma fusão de
três sambas. A relação completa de poetas é João Marcos, Willian Tadeu,
Imperial, Thiago Morganti, Leonardo Moreira, Leandro Kfé e Júnior Santana. Sem
dúvida, a reunião de cinco dos maiores compositores que a LIESV já teve, mais
dois iniciantes que têm um futuro brilhante pela frente. Mas uma reunião tão
estrelada não impede que um samba tenha problemas, e como eu não sou macaco
escondido que deixa o rabo de fora, vamos à autocrítica. Esse ano, a Cruzeiro,
assim como a Paulista, aposta num samba mais tradicional que o do ano passado,
apostando numa primeira em tom maior, e refrão e segunda fluidos. A entrada da
segunda parte vem com um balanço muito gostoso, daqueles sambas que, quando
você ouve, tem vontade de ir de um lado pro outro fazendo uma ondinha com o
andamento. Mas há o problema do samba ser “corinthiano” demais (eu juro, gente,
eu não conhecia o “Eu nunca vou te abandonar” do Coringão! A parte das torcidas
de futebol era pra ser só no “Canto até ficar rouco/Me chamem de louco, não to
nem aí”), além do refrão do meio perigoso por lembrar muito um estribilho da
Mangueira, coisa que o próprio Maciel já comentou (“Ah, eu nunca vou te
abandonar...” = “No canto e na dança, no pecado ou na fé...”). Neste ponto, eu
“culparia” a impaciência com a melodia por parte do nosso cavaco de ouro,
Júnior Santana. Mas isso acontece. Toda grande família tem que ter um
arranca-rabo de vez Altaneiros
do Samba: Assim como a Progresso, a Altaneiros resolveu apostar num
samba menos convencional, e – não pelo samba ser meu – deu muito certo. O
concorrente era valente e louco, e o intérprete Evandro Malandro, lá de Nova
Friburgo, cantou muito. Papai tá orgulhoso do samba que saiu! O enredo é sobre
cores, mas é muito sutil, parte disso graças à abordagem poética do
carnavalesco do sol do Maranhão, Eduardo Bueño. A melodia, toda em tom maior, é
maleável e malandra, meio safada em certas partes. O refrão do meio vem com um
gingado forte, contagiante. Enfim, dá vontade de estar lá. Você vê o arco-íris.
A única parte desse samba lindíssimo, um dos sambas do ano, que bate mal no
ouvido, é o refrão principal. O caco que virou oficial, o “meu amor” do
terceiro verso, não ficou tão legal assim. Mas toda bela criação tem seus
probleminhas e, no fim das contas, a Altaneiros está encontrando o caminho
certo pra “fazer laranja a cor da alegria”. Problemas: Nenhum. O que eu
faria de diferente: Deixaria o refrão original, de oito versos (“Esse
sangue que corre na veia/Incendeia a avenida/É o Sol que ilumina esse jogo/É o
fogo da vida/E se hoje eu sou esperança/Na dança do bem-querer/Então pode ter
certeza/É minha natureza sempre amar você”). Cantei junto. Estrela
do Amanhã: Quem diria que um dos sambas que estava fadado a estar no
plano de fundo do Grupo Especial, um daqueles que não é bom nem ruim, fica ali
no cantinho, só esperando pra entrar, ia virar um dos sacodes do ano? O mérito,
imagino eu, é de três pessoas: dos compositores, Eduardo Nunes (presidente da
Raízes, historiador, compositor e mais um dos arrasadores de quarteirão em
formação) e João Marcos, e do intérprete Pixulé (da Império da Tijuca). Com sua
voz incomparável, Pixulé transformou esse samba tradicionalíssimo, em sua
grande maioria em tom menor, tirando seis versos, dois da primeira parte e o
refrão do meio, numa tremenda porrada. Na verdade, o samba todo é muito
convencional. O refrão principal é a síntese do que vem pela frente, e o samba
em si é uma história muito bem contada pelos compositores. “Tá certo, sim”. Problemas:
O refrão do meio é genérico
e tem sentido prejudicado, pode se tornar um ponto negativo para este
samba.
Não pela repetição de “país”
(“Soberano país, país cidadão”), mas
pela ligação
fraca entre as sensações (“Teu povo é
guerreiro, seduz/Num samba de paz que a
todos traduz/A glória e a honra desse nosso chão”).
O que eu faria de diferente: Escolheria outro refrão de meio. Ouvi inteiro. Amigos
do Samba: A azul naval e amarelo de Saint John of Meriti já vem
desde sua estréia na LIESV em 2006 apostando em enredos alternativos e
abstratos. Falou de cores, amizade e até de RPG. Dessa vez, o tema é uma Ode à
Alegria. Mas, parafraseando o intérprete da Acadêmicos do Setor 1, Thiago do
Porto, o samba, fusão de duas obras, de Willian Tadeu, João Marcos, Leandro
Thomaz, Luiz Henrique, Yuri Aguiar e Murilo Sousa, sofre de “vício de origem”.
Deixa eu explicar o que é isso: É quando o samba se dispõe a contar uma
estória, passar um sentimento, mas faz isso num andamento inapropriado. Lembra
da Grande Rio com aquele samba alegrinho, cantando “O homem com a sua
ambição/Matou e destruiu”? Coisa assim. A Amigos do Samba vem com um samba
sobre a alegria com melodia tradicional e passagens em tom menor que não
combinaram muito com o espírito que o samba queria mesmo passar. Em
compensação, o refrão do meio é um pancadão, pra cantar junto. Outra parte que
chega do nada, rasgando tudo, são os versos “Vejo nos olhos do povo um brilho
que diz/Somos o sol dessa noite, um lindo matiz”. Em outro tema, essa melodia
seria uma apoteose. Pena que na Amigos não pegou tão bem assim. Problemas:
O samba não executa o que se
dispõe a fazer, que é uma “Ode à
Alegria”. Aliás, não dá nem pra saber que o
objetivo é falar da alegria. Além do mais, há o
tal do “vício de origem”. Aí
não tem jeito. O que eu faria de
diferente: Não sei. Não acompanhei as eliminatórias da Amigos para conhecer
as alternativas... Mas com certeza, faria muita coisa diferente. Pulei depois da primeira passada. Princesa
da Zona Norte: Antes de qualquer coisa, o que ou quem é “Alasé”? É a
única coisa que me incomoda nesta porrada que é o samba da Zona Norte.
Parece-me que é oficial na comunidade de Carnaval Virtual que este é o samba do
ano, e eu não tiro a razão de ninguém, pois deve ser mesmo. Mas o que poucos
sabem é que esse samba nasceu de um erro do presidente João Pinho e do enredista
Arthur Macedo, e da intransigência (ou má interpretação) dos compositores João
Marcos e Guilherme Dourado. Lembro-me de ter visto no regulamento das
eliminatórias da Princesa, acho que feito pelo Pinho, que a escola “não queria
um samba afro”. Esse regulamento, é claro, entrava em conflito direto com a
sinopse do Macedo, que era afro até dizer chega. Ou seja, um senhor desafio
para os compositores, fazer um não-afro para um enredo afro. Seria possível? Se
era ou não, não interessava. O JM tem essa fama de jogar tudo pro alto mesmo, e
fazer as coisas do jeito que ele acha que pode dar certo. Se der, deu. Gui
Dourado, que é famoso por compor belíssimas obras Falcões
da Serra: Junto à Princesa da Zona Norte, a Falcões da Serra foi a
escola do CAESV 2007 que mais evoluiu, conseguindo o vice-campeonato, ficando
atrás apenas do leão de São Paulo. Diferente da Princesa, porém, é o estilo de
samba que a Falcões resolveu adotar: um estilo mais Grande Rio. Valente, tom
menor, ousado. Eu sei disso pois já cantei lá. Infelizmente, a Falcões resulta
em sambas que não causam aquela sensação. Ano passado, foi o ciclo da borracha;
esse ano, Mali. Tinha tudo pra ser um enredo ousadíssimo, estilo quando a Porto
da Pedra homenageou a África do Sul. O samba de Willian Tadeu é valente, todo
em tom menor, bem poético. O refrão do meio fecha com uma porrada, e os versos
repetidos estilo Kizomba (“Ficou a
força da coragem no Brasil”, “É a magia do meu sonho de griô”) são charmosos e
muito bem empregados. Mas não é aquilo tudo. Faltou um feeling, faltou uma
pegada maior. Não é problema; talvez seja só eu mesmo, já que não sou fã do
estilo Grande Rio. O samba é redondo e o compositor e quem escolheu o samba
está de parabéns. Em uma nota paralela, o intérprete Fábio Fernandes é de longe
a mais grata revelação desse ano. Continue assim, rapaz! Problemas: Não detectei nenhum além das minhas próprias opiniões
sobre samba. O estilo não ME agrada. Mas o samba é show. O que eu faria de diferente: Se eu fosse o presidente Murilo
Duarte, nada. Nem deixei começar. Sereno
de Cachoeiro: Diferente das colegas de CAESV Rainha
Negra: Mais uma vez a Rainha impressiona. Depois de conseguir o
título de melhor samba do Acesso Gaviões
Imperiais: O CD do Grupo Especial se encerra com um dos melhores
sambas do ano, mas com falhas e modificações simplesmente revoltantes. A obra
de João Pinho e Imperial sempre foi considerada a melhor nas disputas e, é
claro, não por acaso, foi a vencedora. Se fosse uma corrida de cavalos, eles
teriam ganhado por corpos e mais corpos de distância. E idéias pra dar mais
charme e diferenciais ao samba não faltaram, maioria delas muito boas. Uma
delas, a mais interessante, e uma das poucas que foi concretizada, foi o
convite ao inigualável Tiãozinho Cruz (Acadêmicos do Cubango) para defendê-lo.
E, é claro, toda a comunidade acreditou que esta teria sido a maior contratação
por parte de uma escola virtual. Mas aí a Gaviões executou a modificação mais
revoltante que já aconteceu em seu samba: colocou seu refrão do meio em tom
maior. O resultado foi, para mim, catastrófico. Além de quebrar a linearidade
melódica do samba, que, excetuando-se o refrão de meio, é todo em um tom menor
muito aguerrido, forçou o coitado do Tião de tal maneira que ele, logo ele,
justo ele, um dos maiores intérpretes que já agraciou o Grupo de Acesso do Rio
de Janeiro, não alcançou uma nota sequer. O “Me leva, me leva”, que era a sensação
do ano, levou um tiro na cabeça, e a Gaviões, um tiro no pé. Um tirambaço de
ponto-doze que eu gostaria que ninguém se esquecesse... Se alguém concordasse
comigo. Problemas: O refrão do meio
é o problema deste samba. O tom menor soaria mais natural, e manteria o
exotismo. Fazê-lo ser cantado naquele maior foi um crime. O que eu faria de diferente: Acho que não preciso nem dizer. Era
para ser um dos sambas do ano, mas depois das modificações, pulei depois da primeira passada.
Barra
Funda Estação Primeira: Depois de Primeira da Zona Leste, renascer como a
Estação Primeira da Barra Funda (pra quem não é de São Paulo, faz todo o
sentido, já que a estação Barra Funda do metrô era, na época da fundação da
escola, terminal da Linha Verde), virar cartaz do Imposto de Renda e voltar, a
escola mais desbocada e sem sentido da Liga volta em forma de bloco, com mais
um samba nonsense, dessa vez sobre a
peste negra. Ou coisa assim. Sobrou pro Leonardo Bessa, que depois de ser “o
pinto que passou em sua vida”, defendeu o Pula Pulga. O samba, que é uma fusão
de – ai, ai, ai, espero que a moda não pegue – TREZE sambas, é uma loucura
total, que exalta Paulo Cintura (“Saúde é o que interessa! O resto não tem
pressa! Irra!”) como herói nacional, não sem antes passar pelo “paraíso
asiático febril” Quirguistão (sabe onde fica? Nem eu) antes de voltar para o
Brasil “pestilento e maneiro” que é o seu lugar. Esse samba é para quem gosta
de um bom besteirol... E para quem acha que a LIESV é a epítome do pragmatismo.
Como a Barra Funda Estação Primeira é o bloco que vai abrir o Acesso, e não vai
disputar, não me comprometo em notificar os problemas e o que faria de
diferente aqui. Eles que se virem. União
Independente:
Estreante na LIESV depois de bater dois anos na trave, a
União Independente começou fazendo tudo errado. O
presidente Jeff Rodrigues não
se enturmou até agora, e até hoje a única coisa
que sei dele é que trata-se de
um torcedor da Tom Maior. O enredo foi lançado nem sei como, e
só fiquei
sabendo do que se tratava quando pipocaram as notícias do samba
vencedor. Samba
esse que é a expressão de um enredo SUPER original e
inovador: A história do
Carnaval (falando sério, agora, gente: por favor, né?
Quando eu digo que a
LIESV é lugar pra investidas experimentais, negada não
vai na minha...). O
samba difere um pouco do enredo no quesito ousadia, já que,
enquanto o enredo
não é nem um pouco ambicioso, o samba traz
repetições bem feitas, e até um jogo
de palavras muito esquisito que pode ser uma armadilha: A esquadrilha
da morte
“balancê/balançar/balança/balançou”
do refrão principal (“Vem no balancê que eu quero
ver/Você balançar nessa
paixão/Balança traz saudade da folia/Que balançou
meu coração”). Inteligente?
Talvez. Perigoso, com certeza. Além do mais, os versos possuem
pouca coesão,
apesar de coerentes. No fim das contas, a sinopse e o comportamento
obscuros da
União Independente nos oferecem um samba fraco para
começar o Grupo de Acesso.
Uma pena: depois de bater dois anos na trave, a União ainda tem
muito a
aprender. Problemas: Não ter se
relacionado com a liga; repetições perigosas no refrão; versos com pouco
sentido no conjunto da obra; a interpretação dada pelo intérprete Léo Cantalice
(que é ótimo) não beneficia a letra. O
que eu faria de diferente: Confiaria no pessoal da Liga e me enturmaria
mais. Esse é um dos casos onde, se o samba saiu como saiu, a culpa é da escola
mesmo. Nem deixei começar. Pavão de
Osasco: A qualidade dos sambas da Pavão, todos haverão de
concordar comigo, está em queda livre. Depois do clássico instantâneo que foi Bandeirante
da Folia: A única escola da LIESV que veio de samba afro porque
queria mesmo, a Bandeirante quebra o paradigma que todo mundo pensou que ela
fosse seguir e vem com uma porrada, fusão de três sambas: Leandro Kfé, Junior
Santana, Serginho Castro, João Pinho, Arthur Macedo e o meu mesmo. Sabendo que
a Bandeirante foi apadrinhada por Imperial, você já sabe o resultado. Por isso,
vou direto em cima dos problemas, já que elogios não vão faltar, como por
exemplo pro refrão de meio, que é a porrada do Acesso, e pra primeira parte
inteira, que é impecável. A tristeza começa na segunda, quando entram algumas
palavras em, sei lá, iorubá?, que acabam com qualquer um. Teve que sair até
malabarismo, na língua e no encaixe melódico, pra poder soletrar “ogó de
Elegbará”. Aliás, sambas como o da Bandeirante tinham que vir com um dicionário
português-iorubá grampeado do lado, pra negada saber do que se trata. Eu pelo
menos sei o que significa cada palavra estrangeira que coloquei nas partes que
me cabem. Aparte disso, é o samba do Acesso. Problemas: Muitas palavras em iorubá, maioria delas o povo sequer
conhece. O que eu faria de diferente:
Não daria aquela louca na melodia da segunda parte – me refiro ao salto mi
menor—sol maior—si bemol maior—mi menor perto do fim do samba. Doideira total. Ouvi inteiro. Colibris:
Na mesma linha de Gaviões Imperiais, a Guerreira, hoje em dia longe de
seus momentos de glória, apresenta o samba que poderia ser o samba do ano, se
não fossem as modificações desnecessárias e revoltantes que fazem a sua qualidade
despencar. Mas, diferente da vermelho e branco do Rio, a Colibris cai de tal
maneira que o samba fica insuportável. A obra de Imperial e João Pinho,
lembro-me bem, era daquele tom menor característico que é impossível estragar.
Nas eliminatórias, barbada total. Dez a cada oito pessoas diziam que esse era O
samba. E foi escolhido. Mas aí alguém teve a idéia genial de jogar esse samba
em tom maior, e virou oba-oba. O samba tem indefinições e problemas melódicos
gravíssimos que a interpretação de Júnior Santana não salva. E ele sabe disso,
ao tirar o seu da reta, celebrando a escola “do presidente Guilherme Dourado”,
não a “nossa” escola. Aliás, a interpretação um tanto quanto atrapalhada de
Júnior nesse samba causou uma quebra melódica épica na primeira passagem do
refrão do meio que ninguém estava esperando, muito menos o Leonardo Bessa, que
foi o nosso violonista. Enfim, o samba é um conjunto de trapalhadas que
transformaram aquela que devia transformar a obra do ano no Acesso em um dos
piores. Problemas: O samba inteiro
soa mal, num tom maior alegrinho que não combina com a força da letra. O
tropeço no refrão do meio beira o aterrorizante, além de indefinições melódicas
na segunda parte, no trecho “Pelas mãos da ciência/Teve um novo caminho/Selando
paixões tão intensas/Sendo o bem ou sendo o mal”. O que eu faria de diferente: Deixaria esse samba em tom menor, do
jeitinho que ele deveria ser. Não tinha como errar. Nem deixei começar. Ponte
Aérea: Se a Ponte e a Amigos do Samba trocassem de melodia, as
duas estariam bem servidas. O enredo sobre lágrimas, um tema aparentemente
emotivo e forte, ganhou um samba acelerado e alegre. A obra de João Pinho e
Imperial tem uma característica interessante: a letra forte de Imperial e a
melodia do Pinho combinam, mas ao mesmo tempo não combinam. É algo que não dá
pra explicar, só ouvindo e tirando conclusões, mesmo. Estranho demais. Apesar
do – repetindo o termo cunhado pelo intérprete da Setor 1 Thiago do Porto –
“vício de origem”, o samba é muito legal. Parece que a energia e o bom humor da
interpretação de João Marcos dão um gás diferente no samba, dá vontade de ouvir
e curtir. A letra é correta e se encaixa perfeitamente com a melodia, fazendo a
“descombinação” entre tema e melodia ser o único defeito desse samba. Não muda
o fato do samba ser muito legal. Problemas:
A melodia não combina do tema que a escola propõe. O que eu faria de diferente: Uma melodia. Tão legal quanto, mas
mais apegada com o tema. Ouvi inteiro. Acadêmicos
do Setor 1:
Ouça esse samba e me diga: A Setor 1 vem falando das
flores ou de fé? O grande mistério deste enredo – e
o samba não ajuda – é saber
do que é que a escola quer falar. O título
“Pétalas de Fé” é enigmático e
não
ajuda a decifrar o que a escola quer mostrar. As referências
às flores são mais
freqüentes, mas tudo sempre pende pro lado da crença e da
religião. Estranho...
Enfim, samba. Muito bom, gostoso de ouvir. A obra de Murilo Sousa e
Eduardo
Nunes conta com a primorosa interpretação de Thiago do
Porto – ô, galera, vocês
ainda queriam dispensá-lo? Pensem melhor da próxima vez,
eu no seu lugar não
cometia esse crime. Conta com um tom maior valente e melódico,
fluído, que até
nas alongadas da letra (como em “Um botão de
esperança ao irmão”) fica bonito.
A gingada em “Oxum, teus lírios da
paixão/Fecundaram o encanto em Xangô” é
genial. Sem dúvida, a galera da Esquentando os Tamborins, depois
do campeonato
sensacional do ano passado, começa com todo pé direito no
quadro oficial da
Liga. Problemas: Nenhum. O que eu faria de diferente: Talvez deixaria,
no enredo, mais clara a intenção da escola. Flores ou fé? Ou mesmo flores na
fé? Não deu pra entender. Ouvi inteiro. Camisa 10: A remanescente da Acadêmicos de Madureira começa seus
trabalhos na Liga com toda a sorte de polêmicas e trapalhadas. A escola que
foi, por muito tempo, a mais impopular da LIESV – graças, é claro, às ações sem
sentido de seus dirigentes –, consegue se redimir com esse samba que passa
longe de ser bom, mas com certeza funcional e agradável. A letra, fusão entre
os sambas de João Pinho, Imperial, Yuri Aguiar, Leandro Thomaz, Rodrigo
Oliveira, Ewerton Fintelman e Murilo Sousa, conta com clichês antigos e
desagradáveis como “Eu vi nascer no destino/Um canto menino que foi caminhar”,
“A praga que passa revela a verdade/Traz brasilidade para cara olhar”, e, o
pior deles, “O canto de um eternizar”. Mas a interpretação indefectível e
incomparável de Celsinho (Camisa Verde e Branco) dá uma energia contagiante à
obra, que é a que conta com a produção mais completa do CD. A melodia é agradabilíssima,
e conta com viradas inesperadas, como em “A luz iluminou/O amor então brotou/Na
arte que eu seu peito abrandou” e, a mais espetacular do samba inteiro, a
jogada no chão em “No chão por qual passou/Seus filhos vão cantar”, que é raçuda,
corajosa e cheia de estilo. E, no fim das contas, a escola acertou ao dispensar
o bode pelo “tigre guerreiro e de raça”. Problemas:
A letra é recheada de clichês velhos e irritantes. Felizmente, a melodia salva.
O que eu faria de diferente: No
samba, nada. Os maiores problemas dessa escola estão na organização interna e
em como eles lidam com a imagem que transmitem para o resto da Liga. E isso não
cabe a mim. Ouvi inteiro. Império
da Zona Sul: O samba sobre extremos, opostos e dualidades é, tal qual
o enredo, feito de extremos. A obra de João Pinho, Imperial, Willian Tadeu e
Ronaldo Junior, sob a interpretação muito mais corajosa de Victor Nowosh (que
ano passado estava cheio de vergonha... Fica frio, rapaz, você é bom), além de
chegar prejudicada nas paradas pela sua própria qualidade, ainda foi boicotada
pelos erros e indefinições melódicas que surgiram no decorrer da produção.
Problemas esses que não são na primeira parte, que é genial. O desabafo do
personagem do enredo, autoria de alguém que meses depois estaria pulando do
barco pra deixar Heliópolis na mão, é sintetizado no trecho espetacular “O
mundo lá fora é tão louco/Me deixa contar só um pouco/De tudo aquilo que vi e
que senti”. O refrão do meio é misterioso e precisa de muita interpretação de
texto para ser compreendido. A segunda parte é que joga tudo pro alto: “Vão
dizer por aí que há o certo e o errado/Irão pregar que a verdade é singular”
tem um tom meio Porto Alegre, que emprega esse “vão dizer” solto de maneira
inteligentíssima (como em Imperadores do Samba 2008: “Hã quem diga então/Que
pra ser consagrado na nação...”). “Cadê os direitos? Cadê o respeito? Cadê o
amor/Que faz cada um sonhar seus sonhos na avenida/Sejam sonhos de roqueiro/Ou
sonhos de sambista?” é um trecho que só se entende se fizermos uma viagem no
tempo, uma vez que o nome original deste enredo não era “Os Dois Sentidos da
Vida”, e sim “A Roqueira e o Sambista”. Problemas:
O enredo original foi modificado e entregue aos compositores de modo que a
safra não colaborou. A escola fez o melhor que pode. Além do mais, a produção
foi impaciente com essa escola, prejudicando-a fortemente na construção de sua
melodia. O que eu faria de diferente: Tomaria
mais cuidado com o carnavalesco. Depois de mudar tudo e fazer suas besteiras,
foi embora e deixou todo mundo na mão. O “Boa noite, vitória” virou um
“Obrigado por nada”. Belo exemplo... Pulei
depois da primeira passada. Raízes: Encerrando o CD duplo, a Raízes não repete o trabalho do ano anterior. Depois de um épico do Carnaval Virtual sobre o Brasil da Ditadura – samba que cantei em estúdio e, rapaz, é uma tapa na orelha –, o presidente e carnavalesco Eduardo Nunes não sei se caiu na mesmice dos enredos sobre lugares ou se decidiu fazer algo inovador no que se refere a enredos sobre lugares. O que é certo: cometeu o mesmo pecado da Falcões da Serra, lá em cima no Especial, com Mali. Um samba pesado, maçudo, cansado sobre uma nação um tanto mais conturbada e misteriosa que é o Timor Leste. Diferente? Com certeza. Inovador também. Mas o estilo Grande Rio de fazer samba não agrada. O samba é quase todo em tom menor, e segue um estilo que inclina para o triste e sofrido (o que fica bem óbvio em “Meu deus! Quanto lamento a ecoar”). E olha que o Imperial, que as más línguas acusam de escrever sambas “que escorrem sangue”, nem participou da criação do samba oficial! A obra é de Luís Butti, Ewerton Fintelman, Leonardo Moreira e Leandro Kfé; justamente alguns dos compositores dos quais eu nunca esperaria um samba assim. O pecado é ainda mais grave quando o samba alcança o seu refrão principal. A melodia muda completamente, passa do triste para o quase infantil, em um tom maior extremamente descombinado. Quando alguém diz que o refrão principal da sua escola parece música sertaneja, é realmente fim de carreira. Um final pouco honroso para este CD infeliz do Grupo de Acesso. Problemas: A dualidade entre o refrão principal e o resto do samba é gritante. Vai prejudicar a escola, com certeza. O que eu faria de diferente: Escolheria outro refrão principal, com certeza. Este talvez não combinaria com nenhum samba. Além do mais, priorizaria o ar de mistério ao invés de escolher um samba triste. Em tempo: Parabéns ao intérprete Murilo Sousa, novamente. Com o samba certo, esse garoto detona. Nem deixei começar. Rodrigo Raposa |
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