A DONA DAS MULTIDÕES

Olha só. Voltei por causa de uma situação excepcional. Bem excepcional mesmo.

Já tem um tempo que.... Não tenho tempo para escrever. Foram muitas incumbências e outras tantas responsabilidades. E a era do vídeo também é brutal e faz a gente escrever menos e falar mais de frente pras webcams da vida.

Problema é que tem coisa... Que só lendo você consegue entender. A emoção de quem sente só se transfere para o outro através da escrita. E é isso que eu vou tentar fazer agora.

No sábado, dia 01 de fevereiro, véspera do dia em que os baianos pensam em Jamelão com o coração na mão no Rio Vermelho, de acordo com a música "Onde o Rio é mais Baiano", houve mais um dia de ensaios técnicos na cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro.

Por si só, um dia de casa cheia. Com a valorosa Tuiuti de convidada para assistir um daqueles encontros que só o carnaval proporciona. Beija-Flor de Nilópolis e Estação Primeira de Mangueira se encontrando sob a poesia dos portões abertos, que abarrotam as arquibancadas com suas hordas de torcedores.

Peço a humilde licença de não falar sobre o Paraíso do Tuiuti e da estonteante Beija-Flor, que vai cantar um dos seus, com um samba que tem a assinatura musical que consagrou o homenageado, e embalado por uma pujante comunidade.

Vou falar da minha velha. A Velha Manga.

A Geni do carnaval 2025, cavalo fora do páreo, carta descartável nas apostas da vida. O jogo que não dá certo na banca. Tentar colocar a Mangueira como postulante a qualquer coisa era papo de doidivanas.

Até o dia 01 de fevereiro de 2025.


Confesso que me assustei. A velha manga virou o menino do morro. Que riscou e sambou na comissão de frente e acabou transitando em alma de saruê por todo canto da avenida, da arquibancada, atravessou todas as telas e tocou o coração de milhares. Uma Mangueira com a cara de Mangueira. Do Morro, descalça, que dança, canta e vira o catiço por ela mesma e tão somente pra ela.

Confesso que sou muito reticente quanto ao samba da minha escola para 2025. Não me agradou na disputa, não me agradou no áudio oficial... Mas quem viu, ainda que trechos do que a escola estava realizando nos seus ensaios de rua, já percebia um clima diferente no ar.

Sei lá, não sei... Sei lá, não sei, não... O povo que cantava na Visconde, em perfeita conexão com a bateria, que vive os seus melhores dias como há muito nao se via.... Era um prenúncio que tinha algo diferente acontecendo nas ruas e vielas daquele canto onde o samba mora bem.

No ensaio, se cumpre uma promessa. Quando Dowglas Diniz diz "Cuidado que a Mangueira vem aí", evocando os antigos que cunharam essa frase, ele só dá razão ao que diz antes, quando parafraseia o saudoso Luizito e diz que lá vem a Maior Escola de Samba do Planeta!

Mas sabem como é, por vezes a mulher de César tem que parecer honesta, para além do ser. E a Mangueira trouxe suas mais famosas credenciais para a pista do Ensaio.

O samba me tomou de assalto. A bateria fez o sutil milagre de transformar a obra, antes contestada, no pulmão pleno da Velha Manga.

E eu costumo dizer que a minha verde e rosa é uma Entidade carnavalesca. Do ponto de vista espiritual mesmo, longe das nomenclaturas cartorárias. E essa entidade baixou na avenida de novo. Era necessário ao ego do mangueirense (quase sempre infladissimo) uma apresentação como essa para que a escola dissesse: Ainda Estou Aqui (qualquer semelhança com o filme estrelado pela Mangueirense Fernanda Torres, não é mera coincidência).

A voz daquele povo, que é a mesma voz do protagonista do samba da Mangueira é a prova cabal de que essa escola tem sua energia emanada da sua gente.

A beleza pode ser fundamental, desde que seja a beleza popular que a Manga carrega consigo.

Foi um dia épico pro mangueirense. Apenas um ensaio para outros tantos. Mas o brilho no olhar do torcedor diz que uma centelha, maior do que qualquer iluminação da Marques de Sapucaí foi acesa.

Porque a minha velha Manga mostrou, como sempre mostra, que é a Dona das Multidões.