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Coluna Olhar Externo

21 de outubro de 2011, nº 5, ano I

HINOS OFICIAIS – BREVES COMENTÁRIOS SOBRE OS SAMBAS DE ENREDO DAS ESCOLAS DE SAMBA DO GRUPO ESPECIAL DO RIO DE JANEIRO

Depois de um inverno necessário para todos que acompanham carnaval, já que é aquela época de disputas, nervos a flor da pele, discussões acaloradas sobre este e aquele samba, que no fim das contas as agremiações sempre escolhem o que elas julgam melhor, a despeito do que se é discutido, estamos aqui novamente para comentar as escolhas das escolas de samba. Independente de como será a mudança na gravação, o que vai subir, descer, trocar de verso (as que a gente já sabe estarão presentes, claro)... o que interessa aqui é avaliar quais escolas estão ‘na frente” no que tange ao quesito samba-enredo e quais são as perspectivas sobre a safra num âmbito geral.

Sobre a safra, é nítido que há algo diferenciado no ar... Todos os anos, na historia dita contemporânea das disputas pelo hino oficial, apareceu um samba que contagiasse boa parte do publico de quadras, esquinas, e desse boteco da liberdade de expressão que é a internet por ter um que a mais, seja de ousadia, seja do mais profundo tradicionalismo. E quase sempre o samba acabava virando um mártir do ano, sendo sacrificado em detrimento de uma obra mais funcional, com a cara pasteurizada de sempre que faz aquele coro tradicional dos anti-sambistas se reforçar: samba-enredo é tudo igual.

Pois bem, eis que chega a disputa de 2012 e o que se vê são parcerias consagradas ou não apostando veementemente em melodias mais ousadas, em mais elaboração nas suas obras, e fazendo uso de palavreado mais simples do que o “padrão Beija-Flor” tinha ensinado durante toda a primeira década deste século. E mais do que isso, algumas escolas resolveram afinal topar esse desafio  e fazer dessas obras seu hino oficial. Quem for pegar o CD de 2012 cometerá uma heresia se disser que são sambas iguais, pois será possível identificar cada escola pelo estilo de sua obra. Talvez haja uma confusão entre três ou quatro aos menos habituados com o carnaval e os desavisados, mas  em compensação, haverão sambas em que bastará escutar uma vez para identifica-los onde quer que se ouça.

Pautar agora se são buchas ou clássicos não convém, mas sim, elencar os que mais atraem os ouvidos é natural. Na minha forma de analisar esse é o critério principal, e com certeza as escolas que optaram por repetir a receita de bolo estão mais órfãs do meu interesse, e devem figurar no final da fila, que será  feita em ordem decrescente,  da  pior para a melhor obra:
 
13 – Porto da Pedra: Entra ano, sai ano e o Tigre de São Gonçalo insiste em replicar uma forma que a própria escola está cansada de saber que não dá certo. Eu não costumo Acompanhar as disputas, e não sei se os diretores pedem, ou a situação está tão complicada que os compositores não conseguem desenvolver obras leves e descontraídas para a agremiação.  O samba continua pesado, com uma letra enorme, com tentativas vãs de se poetizar um enredo que mais parece uma tese científica, pouco carnavalizado. Paga o preço, e recebeu a pior obra, não por ela ser ruim, mas sim por ser o ápice do requentado. E  a “seiva jorrando” é terrível!

12 – União da Ilha: A sinopse não ajudou, embora contenha tudo que a Ilha vá levar à Sapucaí, complicou a vida dos compositores, e por consequência  a safra não teve uma obra que se pudesse considerar completa, o que propiciou a fusão entre duas obras, onde minimamente a escola procurou manter a irreverência e a alegria da Ilha. Ótimo, se não tivesse momentos  em que parecesse forçado, como  no refrão do meio, principalmente no verso do chá.

11 – Grande Rio: Não sei, a escola ficou num patamar esquisito com essa escolha. É como se ela quisesse voltar aos sambas que a fez dela uma escola enfadonha de assistir, e não como se viu nos últimos dois anos, com sambas mais valentes e feitos para curtir. Analisando a primeira, o samba conserva a valentia mais recente, e uma melodia mais sinuosa, o que faz parecer que a Grande Rio fez fusão, o que fica mais estranho ainda. Sem contar com as palavras ocultas e aspadas que nem todas são de entendimento do grande público.

10 - Renascer de Jacarepaguá: Foi uma tentativa da turma do Cláudio Russo em encurtar seus sambas, o que até certo ponto deu certo, porque no meu entender, começa e termina no tempo certo.  Eu gosto muito do inicio, com “...Esse dom” com uma extensão do verso bem legal, depois o samba fica comum, e fica difícil de entender  o enredo. Chega no refrão do meio, o ultimo verso, uma tentativa de ousar, fica esquisitíssimo, nem tanto na primeira passada, mas no bis, fica uma sensação de que não vem uma segunda...mas ela vem, e  é burocrática em letra, e na melodia tem um ganho no fim, mas nada que faça diferença numa audição normal.

9 – São Clemente: Pedira, imploraram, e aí está, a São Clemente irreverente novamente. Não sei se sou eu que tenho um ar reacionário, mas acho que tem alguma coisa errada nesse samba. Ele tem melodia de samba mela-cueca e letra de samba sarcástico. A melodia parece inadequada a uma escola que quer fazer rir, fazer deboche, ficou com um ar... de coisa fora do lugar. Em alguns momentos, deixou até mesmo o samba sem-graça. Uma pena, porque a letra é interessantíssima, com direito a trocadilho e tudo.

8 – Mocidade: Encerrou a fase do desespero na Mocidade. Os sambas “blocados” dos últimos anos na agremiação foram substituídos por uma obra que privilegia a melodia mais sinuosa, mas a letra, sobretudo da segunda, ficou com pouca poesia, além da melodia não ter nada que surpreenda. Sou um dos que concordavam quando julgavam os sambas da Mocidade extremamente oba-oba, que precisavam de mais “tranquilidade”, mas esse ficou tranquilo demais, nenhuma parte q cause maior efeito. Faltou uma pitada de valentia.

7 – Salgueiro: A frase que dá a cara do Salgueiro não se confirma nesse samba. Ele não é diferente. Tem as características da maioria dos sambas escolhidos nos últimos anos pelas escolas do especial, sem momentos em que você possa dar uma identificação especifica a esta obra. Tudo indica que será bem funcional na avenida, sobretudo pela facilidade em se cantar, dada a melodia intuitiva que tem. O refrão do meio me lembra bastante Império 1995 (não é igual, só lembra).

6 – Imperatriz: Não mudou o estilo dos últimos dois anos, que vêm dando certo, inclusive... mas esse é o mais fraco deles, com os mesmos recursos dos últimos anos, começando lá no alto, antecipando os versos, o que deixa a obra gostosa de se ouvir. Vem o refrão do meio e há a real noção de que é um samba da Imperatriz, porque ele tem semelhança de estilo com os últimos sambas, mas a segunda ficou comum demais e não acompanha o resto do samba, sobretudo quando se aproxima do fim, que tem duas estrofes que parecem não acompanhar a linha do samba ficam destacados e soam estranho ao ouvido, mais por parecerem destacados do que pela qualidade dos versos em si, que é muito boa.

5 – Beija-Flor: O padrão da Beija-Flor está lá, incólume. Num ano qualquer, seria top 3 com certeza, como já é praxe na história recente, por se tratar de uma obra que mantém as características do samba-enredo, sempre com a levada mais em menor, com frases de maior elaboração, mais rebuscadas do que o comum. Mas 2012 está primando pela ousadia, e nisso a obra nilopolitana não tem nada, nem para o bem nem para o mal. Ela é mais do mesmo, tanto em melodia quanto em letra. Talvez o diferencial seja o mesmo do samba de 2011. Não cansa, não pesa tanto quanto outros dos últimos anos, há mais variação melódica, o que favorece o principal motivo das escolhas da Beija-Flor – o canto das alas. A respeito da fusão, pra mim o samba ficou num estilo "Frankstein" mesmo, mas com uma costura com mais capricho, talvez melhore até fevereiro. O refrão ficou mais pra baixo, e é uma aposta arriscada.

4 – Unidos da Tijuca: A Unidos da Tijuca decidiu se afastar da receita de bolo que tinha se dado nos últimos anos. Nada de muito radical, mas ainda assim perceptível, e, pelo menos pra mim, de bom efeito. São muito bonitas as passagens onde o samba se mistura ao baião em levadas melódicas que juntam os dois mundos, como “Chuva, Sol... meu olhar” descambando pra uma pegada mais acelerada, deixando a obra mais interessante de ouvir, pela diferença que faz no contraste com os sambas da própria Tijuca dos últimos anos, e mais à frente tem mais uma palhinha dessas no “S’imbora que a noite já vem, saudades do meu São João...” muito bem colocada e totalmente dentro do enredo. É mais ousado que os recursos que eram usados nos anos 70, com versos de musicas de “meio do ano” como estribilho, mas nem por isso menos interessantes.

3 – Vila Isabel: Esse é dos bons para você mostrar aquele seu amigo que insiste em dizer que samba é tudo a mesma coisa, como eu disse no inicio do texto. É um samba difícil de prever para aqueles já acostumados com o gênero. Ele muda a pegada de verso em verso, fazendo com que você tenha que prestar atenção a cada momento para poder saber o que vem depois, se acelera, se estende, e ai vem o refrão do meio... opa! Parece um refrão do meio, mas na verdade são dos versos que exaltam Rainha Ginga, e já parte para outro setor do samba quando parece que vai voltar ao bis. Uma condução interessante, mas que deve fazer o componente bater cabeça algumas vezes. E o contracanto.... Expediente defenestrado no samba do Martinho em 2012, está de volta, mais ousado, mais complicado e talvez mais passível de ser canetado. Ficou bonito, mas achei ainda assim um pouco exagerado.

2 – Mangueira: Você vai ouví-lo da primeira vez e torcer a cara, vai achar ele meio estranho, meio diferente.. e vai escutar a segunda... a terceira... daqui a pouco possivelmente se sentirá contagiado por ele. Samba leve de cantar, com coisas que você, sambista, está mais do que habituado a ver, sentir, muito por conta do enredo que tem tudo a ver com quem gosta de samba e de carnaval; e mais um pouco você estará cantarolando o refrão do meio, que cai muito bem ao ouvido. Pra segunda ficou a ousadia da obra – O fim do samba costuma ser ponto alto na Mangueira, nos sambas mais recentes. E esse de 2012 faz sucessivos pontos altos desde a metade da segunda até o fim do samba, preparando pra explodir no “ Vem festejar”. Justamente o “terror” da maioria dos compositores se tornou o ponto mais exaltado do samba mangueirenses...

1 – Portela: É um samba. O samba. Sensacional. Juntaram a melodia típica da Portela e dos sambas dos anos 60, três refrãos fortíssimos, e uma letra muito simples (nem por isso deixa de ser linda) que dá o seu recado. Isso é samba-enredo! Tradição pura, de uma das escolas mais tradicionais do Rio de Janeiro, com enredo sobre a Bahia. A comunidade Portelense cantará de peito aberto, com orgulho, o melhor samba desde 1995 (excetuando a reedição em 2004). Não tem muito o que dizer sobre essa obra, o que tem muito a se fazer é emocionar-se a cada audição. Tem coisa mais legal do que cantar a plenos pulmões  um simples “iaiá”?
 
Obviamente a analise pode ser um tanto precipitada e com certeza não vou agradar a todos, ou mesmo a praticamente ninguém. Por isso mesmo o carnaval é tão apaixonante quanto o futebol. Todo mundo é técnico e entendedor de carnaval. Inclusive eu.
 
Sambem muito!