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Coluna do João Marcos

SEM PAMPLONA, COMO EXPLICAR AS INOVAÇÕES? 

13 de fevereiro de 2018, nº 57, ano X

O óbvio é fácil.

Conseguir decodificar um desfile que já teve referências anteriores é um exercício de comparação de conceitos. Você pega o que já foi feito e usa os mesmos parâmetros para a avaliação.

E quando não há esse parâmetro?

É justamente este o problema do desfile da Beija-Flor.

Em tempos anteriores, teríamos Pamplona para nos ajudar. Ele, que percebia tudo que acontecia e nos dava exata noção do que significava cada inovação na época das inovações, no período J30.

Ele não está mais entre nós e faz falta. Porque ele reagiria visceralmente ao desfile da Beija-Flor. Criticando ou elogiando, mas nos dando a base para nossa avaliação.

Confesso que vi o desfile com um misto de atração e repulsa. Que diabo era aquilo? Principalmente porque claramente a ideia original não era aquela - bastava ler a sinopse dos compositores.

O enredo mudou totalmente. E por isso, tive dificuldades com a mensagem do samba. E fiquei estupefato com o desfile. Tive de reorganizar a mente, desconstruir as expectativas e os conceitos que havia solidificado na mente.

Ao mesmo tempo, senti a reação visceral de todos que viram o desfile, uns êxtase, outros horrorizados.

A Beija-Flor conseguiu a emoção extrema, e isso é o mais importante para a arte.

A estética era o choque total. Não havia lógica setorizada. Era apenas paulada atras de paulada. E você que se virasse. O desfile sobre os abandonados virou um desfile mostrando a opressão de forma crua, sem retoques. Foram tiros à queima-roupa.

A Beija-Flor fez o diferente. Como escola de samba, achei Mangueira o melhor desfile. Como manifestação artística, a Beija-Flor foi o extremo do extremo.

Os dois desfiles foram o que mexeram e desafiaram a mesmice. Eu gostaria da campeã saindo de uma das duas.

Outra campeã será a vitória do modelo vigente. E está na hora de chacoalhar as coisas.

O primeiro dia de desfiles do Rio foi um confronto entre a expectativa e a realidade. De quem se esperava muito, veio a decepção.

Acredito que o problema é que a expectativa era irreal. Então, um desfile razoável como Vila Isabel se transforma num horror porque Paulo Barros não pode apenas fazer um desfile razoavel, tem de botar o mundo de pernas pro ar. Mangueira não foi uma catarse total, teve otimos momentos, mas para alguns tinha de ser o começo de uma revolta popular pra tirar o prefeito do poder. Mocidade tinha de ser exuberante e o samba funcionar como o Ita.

Do Tuiuti, ninguém esperava nada. Veio um bom desfile, com uma mensagem inteligente. Já tem gente querendo dar o caneco pra escola.

Não vejo assim. Vejo o Império rebaixado. Vejo a São Clemente correndo sérios riscos pelo samba fraco que esfriou a escola. Vejo a Vila brigando pela campeãs. Vejo Grande Rio numa posição ruim pelos problemas, mas com nota suficiente pra se manter sem susto. Vejo Mangueira e Mocidade bem.

E vejo o Tuiuti com uma incógnita total.

É um desfile bom, que daria um ótimo sétimo ou oitavo lugar numa escola com mais peso. E o problema é justamente esse - qual vai ser o peso da bandeira no julgamento?

A internet abraçou a escola. É a eterna torcida pelo azarão. Quando há uma superação tão grande, a gente tende a ter simpatia. E o confronto entre expectativa e realidade foi muito positivo pro Tuiuti.

Para o jurado, no entanto, a responsabilidade pesa no momento de decisão da nota. Por isso, não me surpreenderia com um rebaixamento.

A escola fez um desfile que talvez renda a permanência. Pode ser uma referência pra futuros desfiles de escolas com ambições semelhantes. Acredito que vai brigar ponto a ponto pra não cair. Mas não vejo muito mais do que isso não.

Se eu fosse chutar, neste momento, acho que a escola ficará em décimo primeiro, o que seria histórico e motivo de orgulho para sua comunidade. O samba da São Clemente, que sempre me incomodou demais pela total ausência de qualquer sentimento, que eu sempre disse que pra mim era o pior do ano no Especial e arrastou todos os quesitos de chão, pode fazer a diferença, infelizmente.