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Coluna do João Marcos

DAS JUSTIFICATIVAS E DO MEU IMPÉRIO

Com a divulgação das justificativas, começa o chororô de sempre. E o pior, além da análise minuciosa das falhas nas justificativas, os sambistas agora utilizam os recursos da tecnologia para documentar os erros das concorrentes. O vídeo dos problemas da Grande Rio foi um hit na internet carnavalesca. Como uma escola com tantos problemas pode ter sido a terceira colocada? E a Beija-Flor - por que os jurados só tiram 0,1 dos problemas da escola e, com as demais, são tão mais severos? E aí, começam as teorias, cada uma mais doida do que a outra. Se bobear, até o FBI e a CIA teriam entrado no meio para que a escola do “papai” fosse campeã.

Não é nada disso. O que acontece é que o julgamento da LIESA não é nem um pouco técnico. E é impossível que seja. Hiram Araujo quis enganar todo mundo, mas a verdade é que o jurado julga o todo. Ou você acha que o jurado de alegorias só vê os carros e não se influencia pela bateria, o samba e o canto? Seja sincero – você acha que o cara que analisa a Comissão de Frente não vê as alegorias também?

A nota do jurado, em geral, não é técnica – é apenas uma reação visceral ao desfile. E isso explica as incoerências e os diferentes pesos e medidas do julgamento. Se o jurado vê um erro na Beija-Flor, ele pondera aquele erro em relação ao resto do desfile. E faz o mesmo com o desfile da São Clemente. Por isso, o mesmo erro pode ter descontos diferentes. Eu senti isso naquela reportagem da Globo, que mostrou a leitura labial dos jurados. Com algumas escolas, o jurado via a falha, mas achava o espetáculo tão bonito que tinha pena de tirar ponto.

Algumas vezes, o jurado sequer viu a falha. Como dar 10 para a escola X, que foi tão morna? E aí, começa o problema das justificativas malucas. O sujeito tem de justificar porque tirou 0,3. Ele não pode dizer que foi porque a escola foi um saco e ele odiou o desfile. Então, ele inventa. Ou então, ele percebe que a escola foi muito mal em alguma coisa e, simplesmente, não sabe explicar. P.ex., os jurados de 2007 não souberam explicar as notas baixas em samba e harmonia no Salgueiro. O samba não funcionou, ninguém cantou e a escola toda foi prejudicada por isso. Como explicar que a melodia, tentando ser diferente, estava mal resolvida, com buracos, e que, por isso, não conseguia manter a atenção? Que o refrão não dizia nada para o público e que o samba se arrastou na avenida? É querer demais. Aí, é mais fácil culpar o ôôô. O mesmo aconteceu com o inacreditável samba da Vila Isabel deste ano – o jurado pode até não saber as razões técnicas, desconhecer a fusão Frankestein, mas sentiu que o samba foi uma catástrofe.

Quando a Beija-Flor entra na avenida, a impressão do jurado é aquela que a leitura labial mostrou: “é outro nível, é profissional”. E a Grande Rio, com seu gigantismo, impacta o jurado também. Ele vai ver o desacoplamento, o carro parado, a ala dando marcha-ré para o buraco não ficar muito grande, a correria no final e... vai tirar 0,1 mesmo. Como tirar mais do que isso? Como massacrar uma escola que veio com um ótimo samba, uma bateria que dispensa comentários, com fantasias e carros, riquíssimos, de encher os olhos? A Mocidade podia ter a melhor Comissão de Frente do ano, mas o desfile foi nota 9,9. E foi a nota que o jurado deu no quesito.

Por isso, aos meus olhos, as classificações acabam sendo justas. Como a coisa acaba indo para a questão de gosto pessoal, eu gostaria de ver a Imperatriz e a Mocidade em posições melhores. Sinceramente, não gostei muito da Portela (o desfile de bichinhos do comercial da Parmalat não me convenceu). Porém, a classificação deixou bem claro quais as escolas que foram muito bem (Beija-Flor e Salgueiro), as que foram medianas (de Grande Rio à Mocidade) e as que foram muito mal (de Vila Isabel em diante). As escolas que querem melhorar de colocação, tem de pensar no todo.

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Em 1992, o Império Serrano desfilou, pela segunda vez em sua história, no Grupo de Acesso. Tinha sido rebaixada em 1978, mas logo em seguida voltou a desfilar entre as grandes. Poucos anos depois, em 1982, conquistou o seu último título de campeã do grupo principal. Foi justamente quando meu coração se apaixonou e eu descobri ser imperiano – sim, descobri, porque essas coisas não escolhemos. Nós é que somos escolhidos.

O samba foi uma coqueluche nacional e uma das músicas mais exibidas nas rádios durante o ano, repetindo o mesmo feito que “Das Maravilhas do Mar...”, samba portelense de 1981. O final do samba era emblemático:

Super Escola de Samba S.A.
Super alegorias
Escondendo gente bamba
Que covardia...

O Império nunca se adaptou muito bem ao carnaval das Super Escolas de Samba S.A. Talvez tenha sido culpa dos princípios que nortearam a sua criação, quando o povo do Prazer da Serrinha se revoltou contra os desmandos do presidente e fundou um império democrático. Sem um Castor ou um Anízio, ficou difícil acompanhar o ritmo das demais. Talvez não tenha sido nem isso. Talvez, apenas, tenha faltado visão e organização. Sei lá. Só sei que a escola viveu um verdadeiro calvário nos anos 90.

Porém, talvez por não ser uma Super Escola de Samba S.A., o Império resistiu. Enquanto, várias escolas tiveram ascensões meteóricas, quase sempre seguidas de quedas homéricas, o Império continuou sendo o Império - mesmo quando o enredo era equivocado, mesmo quando nada dava certo no desfile. E o Império se tornou uma escola segregada – ao mesmo tempo em que não combinava com as demais escolas do desfile da LIESA, era estranho e esquisito vê-lo no grupo inferior.

Algumas vezes, o Império tentou acompanhar o ritmo das Escolas de Samba S.A. Quase sempre, o resultado foi trágico. Os melhores desfiles da escola, nos últimos anos, foram com enredos simples – Betinho, Suassuna, religiosidade, etc. E este talvez tenha sido o grande trunfo deste ano. Por mais que o sujeito não conheça a história de Carmem Miranda, estava tudo muito claro nas alegorias e fantasias. O samba, que não chamava atenção no CD, cresceu absurdamente no desfile. E, com o enredo simples, a mensagem chegou ao público e ao componente. E pensar que, no ano anterior, o Império veio com um carro que era uma redinha de neon com um cérebro em cima e que simbolizava Einstein... (Observação – o mesmo carnavalesco conseguiu, este ano, a proeza de fazer de “É hoje” um desfile afro!)

O Império, em 2008, desfilou como Império. Bom gosto, delicadeza, emoção. O público, depois de nove escolas (algumas, com apresentações muito ruins), ficou lá, esperando o Império. A chuva caía torrencialmente, mas ninguém foi embora. Ela só serviu para lavar a alma do imperiano. A brancura da saia das baianas não se alterou - sabe por quê? Porque as senhoras imperianas flutuavam. E a exibição da bateria de Mestre Átila? O que você me diz?  A única coisa que faltou foi uma Comissão de Frente tradicional. Como escola de samba mesmo, o Império sobrou. Quem estava lá e viu com os olhos do coração, sabia que tinha visto algo especial, que não se repetiria mais em 2008.

Calejado, eu não acreditava no título. E quem se importa com título? Eu prefiro este Império do Grupo de Acesso, do que aquela coisa do “Ser Diferente é Normal”. Porém, os jurados, como todos os que estavam lá, sentiram o desfile. O título não foi porque a escola foi a mais técnica. Foi a reação dos jurados à emoção que tomou conta da avenida.

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Aliás, a dupla Renato e Márcia teve um sacada brilhante. Talvez o Rio de Janeiro seja o tema mais cantado pelo Salgueiro - assim como Carmem Miranda, pelo Império. E utilizar estes temas foi fundamental para que estas escolas se reecontrassem. São enredos tradicionais, desenvolvidos como se os carnavalescos tivessem entrado na máquina do tempo e voltado aos anos 80. O carro da Lapa foi uma típica alegoria dos anos 80 – simples, de fácil leitura e bom efeito. Não tenham dúvidas - o Salgueiro fez um desfilaço e, para o meu gosto pessoal, merecia o título. Renato e Márcia fizeram o mesmo que a Beija-Flor, só que percorreram um caminho diferente – eles redescobriram a pólvora. Só que enquanto a Beija-Flor aposta no chão e em sambas lençóis, continuando com os enredos maionésicos e patrocinados, como as demais, Renato e Márcia vêm apostando numa criação artística mais tradicional. E está dando certo.

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Agora, palavras sobre o samba da Cubango – é evidente que o júri se deixou influenciar pela apresentação péssima da escola. Só que os jurados conseguiram perceber problemas que realmente existiram e que eu já sinalizava no meu último artigo. O jurado Jovi Joviniano, p.ex., tirou 0,2 porque houve falha na adaptação da letra com a melodia, e 0,3 por incoerência no fraseado melódico. Na verdade, ele tirou 0,5 pela mesma coisa – versos longos demais, que prejudicavam a melodia e o canto, em alguns momentos. A dificuldade de cantar o samba, inclusive no refrão do meio, com os termos em francês le embromacion, também foi observada pelo jurado Marvio Batiste Ciribelli, que em vez de simplesmente dizer isso, veio tentar dar uma aula de fonética maluca.

Porém, falhas técnicas em sambas de compositores que correm riscos e tentam coisas diferentes são perdoáveis. Acho que a obra foi um sopro de criatividade e o fato de ter tirado nota menor do que muitos sambas péssimos do Acesso não deve fazer os compositores mudarem de caminho. Apostem sempre na emoção, como vocês fizeram, mas lembrem que o samba tem de ser cantado por milhares de pessoas.

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Na última coluna, falei do samba “Corumbê”, da escola de samba Climério Galvão, do Grupo de Acesso de Guaratinguetá, que é uma reedição de um samba da escola de 1972 e que é uma obra de arte. Achei o vídeo do desfile no Orkut. Esqueçam a pobreza da escola, as fantasias e alegorias super simples, e concentrem-se no belíssimo samba, cantado pelo meu amigo Pedro Ferraz, intérprete da escola virtual Colibris, da LIESV.

E, aproveitando o embalo, não deixem de participar da LIESV, www.liesv.com .

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A leitora Simone Fernandes perguntou para mim quem teria sido a campeã do carnaval de Vitória, em 1982. Foi a Independentes de São Torquato. A escola, este ano, foi a terceira colocada do Grupo de Acesso, mas possui cinco títulos de campeã do Carnaval Capixaba.

Como curiosidade, eia a foto do abre alas da São Torquato deste ano. Mais informações sobre os desfiles de Vitória no blog http://carnavalcapixaba.blogspot.com/ , do companheiro de LIESV, Lucas Monteiro.

 

O amigo Vitor Pedrassi pediu para eu comentar os sambas de Santos, mas vou ficar devendo esta para o ano que vem. Infelizmente, o carnaval no início de Fevereiro acabou dando pouco tempo para que eu pudesse fazer uma análise maior nos sambas dos principais desfiles do país, como era a minha intenção.

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Vamos ao giro das campeãs. No Rio, Beija-Flor consagrou-se bicampeã. Em São Paulo, a Vai-Vai deu um sacode absurdo e muitos estão chamando o seu desfile de “Ita paulista”. É só procurar no Youtube e ver as imagens para ter opinião semelhante.

Em Vitória, a Jucutuquara foi campeã. A sua grande rival, a MUG, que tinha sido rebaixada por causa dos desastres ocorridos no desfile do ano anterior, ganhou o grupo de acesso. Em Floripa, a Copa Lord interrompeu a série de títulos da Consulado, que se prejudicou pelos problemas internos, relatados na última coluna. Problemas que tendem a piorar – há boatos de que a escola encomendará o samba de 2009 a um escritório do Rio. Três vice-presidentes já pediram desligamento. Espero que as coisas se acalmem para não prejudicar o excelente trabalho do meu amigo Rapha Soares, carnavalesco da escola.

Em Manaus, deu Mocidade Independente de Aparecida, com Vitória Régia, em segundo e Reino Unido, em terceiro. Em Porto Alegre, a Império da Zona Norte conseguiu o campeonato depois de uma espera de 26 anos. Em Brasília, a Águia Imperial derrotou a ARUC - maior vencedora dos desfiles da cidade. Em Belo Horizonte, deu Acadêmicos de Venda Nova.

Em Santos, a campeã foi a X-9 (não confundir com a X-9 Paulistana, que desfila em São Paulo). Em Guaratinguetá, a Bonecos Cobiçados acabou perdendo o título por ter um homem na sua ala de baianas, sendo penalizada em cinco pontos. Acabou dando Embaixada do Morro.

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Continuando a saga pelos sambas enredos que poderiam ser reaproveitados por sambistas e cantores da MPB, trazemos o meu concorrente preferido para o enredo da Portela de 2006, a obra de Alexandre Fernandes e Caixa d´Água, cantada por Preto Jóia. Deixo os comentários para a seção de sambas eliminados do SAMBARIO.

Link:

http://www.4shared.com/file/42022431/c9c5cdc4/05_Portela.html?dirPwdVerified=ad5f427b

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Na próxima coluna, voltarei a falar dos sambas-enredos “canônicos”, que, junto com Aquarela Brasileira e Seca no Nordeste, fazem parte das obras fundamentais do gênero. Além disso, chamo a atenção ao site do meu amigo Marcelo Sampaio, o www.carnavaldecampos.com.br . Na minha próxima coluna lá, que deve ir ao ar em breve, falo dos sambas enredos de Campos, com direito a link para download.

Por fim, a LIESV, está selecionando jurados para os desfiles virtuais. O objetivo é encontrar pessoas novas, que conheçam de carnaval e queiram avaliar o trabalho da rapaziada. Os interessados serão selecionados através de um “simulado”, onde colocaremos desfiles antigos. Quem tiver interesse, basta se inscrever através do e-mail diretoriajuridica@liesv.com.

Abraços a todos!

João Marcos
joaomarcos876@yahoo.com.br