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Coluna do João Marcos

REPETINDO A FÓRMULA DE NOVO MAIS UMA VEZ...

“E aí João Marcos, tudo blz?

Vendo a sua última coluna, me pergunto se você não foi um pouco incoerente. Explico: no início faz elogio ao estilo Medrado, de mudanças bruscas de melodia, como diz, e meio que critica o público por não "entender" ou não querer entender e, ao final, diz que o melhor samba em disputa é o do Adalto, Rico e César Veneno, que tem um simplicidade a la anos 80, o que vem faltando para contagiar o público das arquibancadas.”

Recebi este email do compositor Gustavo Monteiro, logo após a minha última coluna. Fiquei pensando no que responder. A “luz” me veio com a audição de alguns sambas das eliminatórias deste ano: Cláudio Russo e cia., na Beija–Flor; Fernando de Lima e cia. na Santa Cruz; Arlindo Cruz e cia. no Império Serrano, etc. Tais parcerias utilizaram as mesmas fórmulas vitoriosas dos anos anteriores. Alguns chamam isso de “assinatura”. Eu, particularmente, acho falta de criatividade. Para mim, fizeram o mesmo samba. Evidente que há pequenas alterações na melodia, a letra é diferente... Porém, a sensação é a do “já vi este filme antes”.

Isso me irrita. Principalmente, quando vejo na minha escola. Sinceramente, é como piada repetida. Você só acha graça uma vez. A reação, na segunda vez, nunca é a mesma. Parece que o mundo do samba não entende isso. Vejam as reedições, que ainda teimam em aparecer em algumas escolas – nunca causam a mesma emoção do desfile original. Quando Arlindo Cruz e cia., no meio do refrão do meio, jogam o tom de maior para menor, pelo terceiro ano seguido, o que era uma sacada inteligente passa a ser simplesmente... chato. Será que nenhum santacruzense não se incomoda de escutar o mesmo samba pela sexta vez seguida? Será que o torcedor da Beija-Flor não percebe que Cláudio Russo repetiu trechos melódicos inteiros de seu samba do ano passado?

É melhor errar tentando fazer algo diferente do que errar tentando recriar um momento que ficou no passado. O Salgueiro tentou, durante anos, recriar o Ita. Não iria conseguir nunca, da mesma forma que “Minha Madrinha Querida”, de 1972 não repetiu “Festa para um Rei Negro”, de 1971. Tem de se acrescentar algo, buscar outros caminhos. Não adianta imaginar uma fórmula para o sucesso. Quando o sucesso é atingido, as regras do jogo mudam - e essa é a graça do carnaval.

É por isso que eu queria ouvir na avenida um samba como o de César Veneno e cia, com cara de anos 80, simples, bonito, fácil de cantar; e também queria um samba ousado, com letra mais rebuscada e variações bruscas de melodia, com os do “núcleo Medrado”, que desafiam o ouvinte. Não sou partidário de um estilo determinado de se fazer samba. Eu quero é ter sensações diferentes, ouvir sambas que têm aquele ar de ineditismo, de novidade. E essa novidade pode ser, simplesmente, voltar ao passado e resgatar algo que se perdeu. Eu quero algo que mexa de alguma forma com as “fórmulas” que estão estagnando os sambas. Não quero que o CD de 2008 seja um cópia piorada do de 2007.

Só que, diante do que estou vendo por aí, acho difícil isso não acontecer.

* * * * *

E começam a cair meus favoritos, como de costume. No Salgueiro, o samba de Cezar Veneno já foi cortado sem dó e nem piedade. Agora, minha torcida vai para o samba do “núcleo Medrado”. Na Tijuca, o famoso samba do “1+1+1+1+1” e sua inocência, que me cativaram, também já foi eliminado. Os demais sambas são “profissionais” demais para me chamarem a atenção neste momento.

Na Imperatriz, o meu favorito é o de Alexandre D’Mendes e Cia. Aquele samba na voz do Preto Jóia faria a escola reviver os sambas classudos dos anos 90. O de Josimar e cia., muito cotado pelas bandas de Ramos, perde pontos no meu conceito por ter um refrão muito semelhante ao “samba da Xuxa” da Caprichosos. Não é plágio, mas tem sabor de coisa requentada.

Vila e Mocidade são as escolas que têm as eliminatórias mais interessantes. Na Vila, o de Martinho e cia., foi mal gravado por Wantuir, que não adaptou o samba para a sua voz. No entanto, é excelente e tem cara de avenida. O de Diniz, segue a linha de 2007. O da filha de Martinho é competitivo, e talvez seja escolhido se a Vila não quiser desempatar Martinho e Diniz em número de vitórias. Corre por fora o meu preferido, de Prof. Newtão e cia. A parceria, que venceu em 2005, perdeu as letras rebuscadas de Diniz, mas apresenta uma “paulada”, com algumas variações melódicas bem ousadas e dois refrões que grudam no ouvido. A Mocidade, por sua vez, busca uma identidade. Nas eliminatórias, vemos bons sambas, como o de Diego Nicolau e cia. e de Igor Leal e cia., mas que não parecem Mocidade, não têm a cara da Mocidade. A escolha do samba vai ser importante para mostrar para onde a escola está indo, porém, pela safra, o momento ainda é de transição para algo que não sei bem o que é.

Na Beija-Flor, o meu favorito é o de Déo e cia, cantado por Serginho do Porto. Seria muito bom ver um refrão mais curto, simples e com gingado como “Okê cabloco okê, essa magia fez a lua adormecer / O okê cabloco okê, a Beija-Flor fazendo a festa pra você”. Um samba pouco comentado, mas que me chama atenção é o de Sidney Pilares e cia., que começa parecendo mais um concorrente genérico da escola, com os clichês de sempre, como o refrão com “Sou Beija-Flor” e etc, mas que, depois do verso “Guardiã... de lendários tesouros perdidos”, tem variações melódicas interessantíssimas e um refrão do meio bem audacioso.

Na Viradouro, Gusttavo e cia. também ousaram e voltaram a acertar a mão. O samba é muito lírico e não tem a pretensão de apelar ao popularesco forçadamente, como nos “já és” que povoaram as obras da parceria nos últimos anos. Quando a melodia entra no verso “Bate Outra Vez”, fazendo referência ao samba de Cartola, mexe com quem conhece um pouco de samba. Esse tipo de referência em samba-enredo, que era muito comum nos anos 70, funciona brilhantemente quando bem empregado. Aliás, seria interessante ver um desfile de Paulo Barros com um samba mais... samba.

No Império, apostaria em duas opções antagônicas, mas que podem dar uma sacudida na estrutura de desfile da escola. O primeiro é de Paulinho Valença, Maurinho, Bil do Pandeiro, Xande, Luiz Carlos, e que está sendo interpretado pelo excelente Vitor Cunha. É um samba valente, coisa difícil de encontrar no Rio. O refrão de cabeça é maravilhoso, um dos melhores do ano, e o samba é bem rico em variações melódicas, costuradas de forma a não causarem estranhamento na audição. A segunda opção é a simplicidade do samba dos craques Luis Carlos do Cavaco e Carlinhos da Paz. A melodia tem o clima dos sambas da escola do meio da década de 90. A letra é interpretativa, curta e singela. Os refrões, curtíssimos, lembram os refrões arrasadores da escola nos anos 70. Muito bem resolvido, o samba facilitaria bastante o canto da escola.

*****

Falando em Carlinhos da Paz, ele me contou uma história interessante, acontecida nas eliminatórias da Beija-Flor de Nilópolis, em 2003. Ele era o intérprete do samba que acabou sendo campeão. O samba crescia cada vez mais nas eliminatórias e os concorrentes começaram a “achar” defeitos na obra.

Um deles chegou para o Carlinhos e perguntou:

- Vem cá, diz aí o que é “overdose de amor”?

Carlinhos explicou, gentilmente, ao honorável senhor:

- Meu amigo, pede para o teu namorado tomar quatro pílulas de Viagra. Aí você vai ver o que é “overdose de amor”...

Abraços a todos!

João Marcos
joaomarcos876@yahoo.com.br