O BONEQUINHO OUVIU

É muito interessante ler a reação das pessoas às críticas que faço aqui no SAMBARIO. Seja por e-mail, seja em fóruns abertos, seja no Orkut, eu tenho sentido na pele as conseqüências das minhas opiniões. Algumas vezes, confesso que fico assustado diante da agressividade desmedida e dos ataques de caráter pessoal. Outras, fico espantado com a dificuldade que alguns têm para entender o que está escrito.

Sofri ataques desnecessários, inclusive por diretores do Salgueiro, apenas por ter dado uma nota seis ao samba do ano. Engraçado é que Fernando Pamplona, salgueirense de coração, uma das pessoas mais influentes do mundo do samba, deu nota 6,5 para o samba. Outros foram muito mais rígidos em seus julgamentos, como a filha de Donga que deu nota 5,0 para o samba da Mocidade. Ambos não sofreram um décimo das críticas que recebi.

Agora, tive conhecimento de que o pessoal da comunidade “Carnaval de São Paulo” do Orkut teve conhecimento das minhas críticas aos sambas do ano. Tópicos e mais tópicos foram dedicados a me massacrar. Os tópicos, reproduzindo sem autorização as minhas críticas, foram colocados com o aviso “Avaliação Carioca” e serviram para detonar uma série de manifestações inacreditáveis - declarações de guerra ao carnaval carioca. Engraçado é que eu não sou carioca.

Ao criticar os sambas de São Paulo, a idéia foi a de atrair a atenção do público do SAMBARIO para as escolas de lá. Utilizei o mesmo peso e medida que eu uso para os sambas do Rio no julgamento dos sambas. Não fiz o levantamento estatístico, porém, provavelmente, as notas dos sambas paulistanos, em média, devem ter sido mais altas. Mesmo se não fossem, é apenas a minha opinião.

Diante disso, algumas coisas têm de ser ressaltadas – a escala de notas do SAMBARIO é de zero a dez. Se fosse a escala de cinco estrelas, como utilizado por muito críticos de cinema e de gastronomia, um samba “nota seis” seria três estrelas, um samba “nota sete” seria três estrelas e meia. Se fosse o bonequinho do jornal O Globo, “nota seis” seria o bonequinho olhando – um samba “nota oito”, seria o bonequinho aplaudindo; “nota dez” seria o bonequinho aplaudindo de pé.

Talvez os revoltados aceitassem tais escalas com maior naturalidade. Mas isso é o de menos. O que me assusta é essa reação tão visceral a uma simples opinião. E o pior, de “torcedores” de escolas que não tem qualquer ligação com torcidas organizadas. Eu usei a palavra “torcedor” de propósito – não acho que sambista seja torcedor. Sambista é a personificação da escola que ama. Não é torcedor. Eu não sou torcedor do Império Serrano - eu sou imperiano. Quero ver minha escola linda, quero me emocionar. Pouco me importa o que vai acontecer na quarta-feira de cinzas – o que eu quero é que os oitenta minutos de desfile da minha escola sejam mágicos, como no desfile de 2006. O Império não foi campeão? Azar da LIESA!

Em 1997, nos cinqüenta anos da escola, o Império cantou Beto Carreiro. Eu vou defender isso só por causa da minha ligação emocional com o Império? De jeito nenhum. Foi uma coisa horrorosa. Eu sofri com 1991 e 1999 não porque o Império foi rebaixado, mas porque fez desfiles pavorosos. Eu quero o melhor para a minha escola. Eu quero o melhor para todas as escolas. Não acho que aplaudir o que é ruim seja bom para as escolas. Adoraria dar nota dez para todas as escolas – mas eu quero sambas nota dez MESMO. E isto está cada vez mais raro.

Porém, o que tenho mais visto por aí são “torcedores”. E torcedor não quer opinião. É cego. Não consegue gostar de carnaval porque só gosta daquela determinada escola. Quer vê-la campeã, mesmo que ela faça um desfile burocrático com um samba ruim. É como se desfile de escola de samba fosse um torneio de futebol, que o que importa é ganhar, mesmo que jogando feio.

Por isso, eu lamento. A minha opinião é... minha. Eu sou o bonequinho. O bonequinho ouviu o CD de São Paulo. Aplaudiu uns sambas; ficou inerte ou dormiu em outros. E saiu do cinema ao ler os comentários de alguns internautas.

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Algumas comentários, seguidos de respostas:

“ESSE CAMARADA DEU NOTA 5 PARA O CD NÃO TEMOS QUE FICAR PREOCUPADOS COM A OPINIÃO DELE, QUEM É ELE? ELE SABE O QUE AS ESCOLAS AQUI PASSAM PRA PASSAR NO ANHEMBI? TEM ESCOLA QUE NÃO FEZ ENSAIO TECNICO NO ANHEMBI POR FALTA DE VERBA AQUI OS SAMBISTAS VALORIZAM SUAS ESCOLAS, DEFEMDEM COM GARRA, COMO FOI CITADO NO TÓPICO AQUI É DIFICIL PATROCINIO, POR ISSO O CARNAVAL É FEITO DA COMUNIDADE PRA COMUNIDADE, O MÍNIMO QUE TEMM QUE TER É RESPEITO PELOS SAMBAS DE TODOS OS PAVILHÕES, VALEU PESSOAL BOA SORTE PRA TODAS AS AGREMIAÇÕES QUE DEUS ILUMINE O CARNAVAL DE TODOS.....A PERUCHE VEM AÍ...” (Edílson) – Eu estou criticando o CD. Isto não é desrespeitar. Parabéns pelo esforço das escolas em colocar seus carnavais na rua, mas isto não tem qualquer ligação com a qualidade artística dos sambas.

“O carnaval de SP parece que inova mais que o do RJ e isso causa grande inveja. É incontestável o medo deles!” (Rufus) / ATE QDO ELES VÃO COMPARAR O CARNAVAL DELES COM O NOSSO??? SABEMOS Q NAO FAZEMOS E NEM COPIAMOS NINGUEM... TEMOS NOSSAS CARACTERISTICAS E DIFICULDADES ($$$$$$$$) COISAS QUE LA... NÃO TEM, MUITO PELO CONTRARIO NEH!?!?!? (Daniella) / “ATÉ Q É BEM FEITO, MANIA Q O BRASIL TEM DE ENGOLIR Q O MELHOR CARNAVAL É O DELES (DO RIO)..RESULTA NISSO..OS CARAS SE ACHAM OS "TAIS".. AHH QUE ISSO..N TROCO O CARNAVAL PAULISTANO POR NADAAAAAA E NENHUM LUGAR!!!!!” (Fernanda) / “deixa ele lá no rio lendo encartes de cd. esse cara nunca fez parte do nosso carnaval. axo mais.. axo q ele nunca saiu da frente do pc dele. oq uma pessoa dessa tem a opinar no nosso carnaval!? Affff nem vale a pena se stressar...kkkk. cada um vio! (Reee Tááá) / “com certeza.......ja to mandando e-mail pra ele dar palpites só nos sambas do rio!!!!” (LULA) – Bom, eu não troco o do Rio pelo de São Paulo, nem o de São Paulo pelo Rio. Posso ter os dois, não é verdade? Gosto de ambos. Realmente, os sambas de São Paulo estão inovando mais, o que eu já tinha observado na coluna. Eu não tenho inveja de nada e, muito menos, medo. Medo de quê? O que mais critico nos sambas de São Paulo é que, infelizmente, estão cada vez mais influenciados por pagode mauricinho e por intérpretes da linha “Wander Pires”. Há quem goste. Fico, no entanto, muito triste com essa rivalidade sem sentido que está sendo alimentada no tópico. Quem gosta de samba, não se importa se ele é do Rio ou de São Paulo. Esta rivalidade é de torcedor, não de sambista. E eu comentei o CD mesmo, não foi o carnaval de São Paulo - isto está bem claro na coluna.

“Fica evidente que trata-se de um picareta mal-intencionado quando, descendo o sarrafo geral nas demais, cai em elogios à escola da Vila Matilde com "ligeiras críticas" pra disfarçar a puxa-saquice; elogios que a Águia Guerreira sempre mereceu e bem o sabemos por que razão... nenhuma novidade, né? Ele nota que o Royce é muitissimo bom; que emocionante surpresa pra gente, né? Nunca tínhamos notado isso... kkkk. E olhe a cariocada não tem mesmo peito de falar mal da escola paulistana que percute muitissimo melhor que a imensa maioria das de lá... pagam pau mesmo pra Vila Matilde. O cara é engraçado, admita-se.” (Edu) – Eu não “noto” que o Royce é bom – eu alerto para o fato dele ser um dos mais importantes intérpretes da história do carnaval de São Paulo e que a performance dele no CD é muito boa. Ressalto que escrevi para um público “leigo” em carnaval de São Paulo e que talvez não conheça o intérprete. Acredito que o rapaz aí não tenha lido o meu comentário com a devida atenção. Eu gosto do samba da Nenê – aliás, é o que mais gosto e só não tem a maior nota porque tem muitos problemas técnicos. Mas é o que melhor representa as características históricas dos sambas enredo de São Paulo. Eu não entendi a razão de eu ser tachado de “mal intencionado” apenas por externar tal opinião.

“O engraçado é que qdo o Baby tava na Nene não prestava, agora que ta no Vila Maria, ele canta sem frescuras..... (Vinicius)” – Engraçado é que eu não comentei nada sobre o Baby na Nenê, mas tudo bem – ele foi muito mal no desfile do ano passado, é inegável. Mas é um cantor com personalidade própria, que não imita ninguém. É como o Quinho, também criticado por muitos e defendido por mim.

“Um sujeito que diz que samba do Bixiga causa indiferença em sua totalidade... nunca viu uma escola de samba nesta vida... deve ser tocador de sanfona pra tchecos de terceira idade dançarem com saudades de Praga no inverno. Uma das maiores asneirices já lidas na net por quem vá viu a Saracura passando na avenida, né?  hahahahaahahahahaaaahahahaahahaaha, vamos fazer uma vaquinha e mandar esse mongo fazer tratamento das "oiça", colocar um aparelho de surdez daqueles feitos na Dinamarca... ou - melhor - manda-lo à NASA para ser nosso próximo fogueteiro... de ida sem volta. (Edu) / kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk vaguinho naum passa emoção, passa em branco kkkkkkkkkkkkkkkkkk q dahora...kkkkkkkkkkkkkkk RINDO MTOOOOOOOOOOO (Reee Tááá)” – Eu não vi a Saracura passando com ESTE samba (que é o que está sendo criticado) pelo Anhembi. Acho que só quem viaja pelo tempo viu. Eu critiquei o CD. Não gostei da faixa e da interpretação de Vaguinho pelos motivos apontados nos comentários. Tomara que eles calem a minha boca no desfile.

"Seo" Xangô da Vila Maria deve estar lá no alto caindo em gargalhadas, deixando o amigo "Seo" Natal portelense com cara de tacho ao lembrar de sua escola desfilando com o incrível enredo "Adelaide, a pomba da paz". Hihihi Que porra de pomba foi aquela? (Edu) Depois que certa escola que desfila no RJ levou dez com um samba contendo em dado trecho a pérola de "Taca fogo no rabo de quem nada faz/eu sou pobre, me acabo/e não aguento mais", quase foi campeã... e vive - como a maioria das demais - abiscoitando campeonatos com letras que são uma verborragia desconexa, apologias ao nadismo... qualquer avaliação vinda daqueles lados é pra ser vista com cautela por quem tem um mínimo de bom-gosto, né? (Edu) – “Adelaide, a pomba da paz”, é um enredo inspirado num poema Walmir Ayala, cuja leitura recomendo ao Edu. Já o refrão do “Taca o fogo no rabo” foi usado pela Beija-Flor, em 1990, no enredo “Todo Mundo Nasceu Nu”, de Joãozinho Trinta, que foi vice-campeã. Eu não fui jurado dos desfiles do ano. O samba realmente é muito fraco, totalmente diferente dos últimos sambas da escola.

FIQUEI NERVOSA COM ESSE OTARIO. Na minha opinião: VAMOS BOMBARDEAR O EMAIL DELE DE BOSTA... IGUAL AS Q ELE ESCREVEU NO SITE. TROXA!!! AFF...  (Daniella) – Relaxe, menina, não vale a pena tanto estresse, rs. Um beijo no seu coração.

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Além dos comentários no Orkut, recebi alguns e-mails sobre a coluna e três deles me chamaram a atenção. Um, da Renata Braga, puxando a minha orelha com toda razão – eu confundi Jorge Freitas com José Félix, carnavalesco da Portela em 1995. Jorge Freitas foi carnavalesco da escola em 2004 e também fez alguns trabalhos na Vila Isabel.

O Luis mandou esta mensagem: “SOU DA IMPERADOR DO IPIRANGA! FALAM QUE TEMOS QUE RESPEITAR AS OPINIÕES DOS OUTROS, MÁS A SUA É HORRIVEL, ENTÃO TENHO QUE RESPONDER PRA VC!!!! VOCE CONHECE A LECI BRANDÃO NÉ? POIS É!! ELA VEIO NA ULTIMA TERÇA FEIRA NA NOSSA QUADRA E ASSIM COMO EM 2004 ELA ELOGIOU MUITO NOSSO SAMBA......COMO UM DOS MELHORES!!! ENTÃO DEVO FICAR COM A OPINIÃO DELA OU SUA? COM CERTEZA COM A DELA, POIS PELO QUE VI  O SENHOR NÃO ENTENDE NADA DE SAMBA! ENTÃO SE CONTENHA A DAR NOTAS SÓ NO SAMBA DAI, DE VCS DO RIO!!!!! E OUTRA COISA, NOSSO SAMBA É DAQUI MESMO. GRAÇAS A DEUS!!! NÃO TEM NADA DA PORTELA. SEM MAIS”. Eu não acho que o Luis deva optar pela minha opinião ou da Lecy. Acho que deveria ter a sua própria opinião. E com relação ao samba da Imperador ter o mesmo refrão do samba da Portela, acho que cada sambista deve fazer seu julgamento.

Um último e-mail, do Edson Jr, mostra que pelo menos alguns entenderam o espírito da coisa, o que me deixa a certeza de que nem tudo é em vão: “Gostaria de te dar os parabéns pela avaliação dos sambas de São Paulo, no orkut não estão gostando muito não, mas eu apesar de ser paulistas concordei com a maioria (menos com a Vai-Vai, mas não me leve muito à sério pois sou excessivamente fanático!). Mesmo que não concordasse com tal avaliação acharia muito boa, pois não vai tentando agradar todo mundo, dando nota maior do que merece. Está de parabéns pela avaliação de São Paulo e pela avaliação do samba do Salgueiro também.” Obrigado pelos elogios.

Semana que vem, falarei dos melhores sambas-enredo da História de São Paulo, com direito a surpresa aos leitores.

Abraços a todos!

João Marcos
joaomarcos876@yahoo.com.br