PRINCIPAL    EQUIPE    LIVRO DE VISITAS    LINKS    ARQUIVO DE ATUALIZAÇÕES    ARQUIVO DE COLUNAS    CONTATO

Coluna do João Marcos

NÃO É SAUDOSISMO, É CONSTATAÇÃO

Abro hoje o "Esquentando os Tamborins" (www.tamborins.com.br) e me deparo com o artigo do André, colunista do site, criticando o saudosismo e dizendo que não se deve falar mal do CD deste ano para o bem do carnaval. Sinceramente, lamentáveis sobre todos os aspectos tais afirmações. O papel do analista é dizer a verdade. Não é uma crítica negativa que vai detonar o carnaval - é a péssima qualidade dos sambas e do espetáculo em si.

Na minha opinião, a produção do CD foi excepcional. Apesar do andamento de cada samba ainda estar muito semelhante, já podemos perceber uma preocupação dos produtores em tentar colocar as características das baterias das escolas nas faixas. Este ano, o chute bateu na trave, mas a iniciativa é elogiável. A cadência do sambas está agradável: nem lenta demais, o que é bom porque os sambas são horríveis em sua maioria e, quanto mais lentos, ficam mais perceptíveis os erros de métrica, a retidão das melodias, a repetitividade e a utilização das mesmas fórmulas na confecção das composições; mas, também, não está tão rápida que estrague a experiência de se ouvir o CD apenas por ouvir.

A produção é tão boa que a safra, apesar de tenebrosa, está sendo elogiada. A maioria das escolas conseguiu a proeza de trazer sambas piores do que os de 2006. Na verdade, a única diferença é que, para 2007, não teremos tantos sambas pavorosos quanto 2006. É como se a média dos sambas fosse ainda mais baixa, mas os piores sambas de 2007 não são tão ruins quanto os de Caprichosos e Porto da Pedra 2006.

A maior prova de que está tudo nivelado (e por baixo) é que a crítica está batendo a cabeça para encontrar o melhor samba do ano. "É tudo japonês". Nada se destaca. Não tem um samba que você diga: "é este!" E não me venham com a balela de que samba bom só se percebe na hora do desfile - uma samba ruim pode "acontecer"... Mas continuará sendo um samba ruim.

Não é questão de saudosismo dizer que a safra é horrenda. É constatação. É só comparar com a dos carnavais antigos. Evidente que sempre tivemos sambas terríveis - é só observar os meus comentários para os LPs dos anos 60 e 70 para que fique claro que a questão não é o famoso "se é velho, é bom". Um samba como o da Vila Isabel de 1978, por exemplo, é vergonhoso. Imperatriz 1975? Inacreditavelmente ruim. Porém, ao lado destes, ouvíamos um "A Criação do Mundo na Tradição Nagô", um "Macunaíma", um "Festa do Círio de Nazaré", etc.

A impressão que eu tenho ao ouvir o CD deste ano é que são 13 sambas do nível de Em Cima da Hora 1985. Peço desculpas, mas eu acho pouco. Eu fui acostumado a esperar todo ano por pelo menos um samba do nível de "Contos de Areia", "Bumbum Paticumbum Prugurundum" e "Raízes". Ainda me lembro de quando ouvi pela primeira vez, no rádio do carro dos meus pais, o samba "Cem anos de Liberdade, Realidade ou Ilusão?", Mangueira 1988. Você percebia de cara que o samba era antológico.

A última vez que eu escutei um samba novo realmente fora do comum foi em 2004, com "Manôa". São TRÊS anos sem um samba nota 10. É muito tempo. Aí bate o saudosismo. Não um saudosismo de frases feitas. Eu não tenho saudades de Império da Tijuca 1984. Eu tenho saudades, como amante de sambas enredo, de ir até a Sendas, comprar um LP duplo como o de 1989, com 18 escolas, e ter a emoção de ouvir cada escola com uma personalidade própria, com enredos simples e criativos e descobrir, no meio de sambas fracos e medianos, um "Liberdade, Liberdade" que, quase vinte anos depois, volta e meia vem à minha mente quando eu ando pela rua. É um samba que se tornou trilha sonora da minha vida, não morreu na quarta-feira de cinzas.

Por isso, não dá para eu fazer o que o André do Tamborins sugere, ignorar a qualidade do CD e esquecer a parte artística devido aos interesses econômicos e turísticos relacionados à festa. Se o carnaval hoje se resume a isso, é porque muitos erros foram cometidos no passado. E eu não tenho saudades deste passado. Tenho saudades da passarela cantando em uníssono um "Peguei um Ita no Norte". Foram manifestações espontâneas como esta que chamaram a atenção do mundo, e não as estratégias de marketing da Liga.

Justificar uma safra dessa com tiradas como "é a evolução", é como tentar justificar o aumento do número de casos de câncer com avanços tecnológicos. "O câncer aumentou, mas pelo menos temos telefones celulares e fornos microondas!" Não consigo aceitar.

Em breve, teremos os comentários de cada samba do ano aqui no SAMBARIO.

*****

Tôco foi um grande compositor, o melhor de uma das grandes escolas do Rio. A Mocidade não é uma escola de sambas sensacionais, mas se teve alguns antológicos, considerável parte dos méritos é devida ao seu poeta maior.

Ao escolher o samba de Tôco este ano, a Mocidade não homenageou ninguém. Escolheu o melhor da disputa e pronto. Aliás, quase sempre, o melhor era o do Tôco. Se a escola sentiu a falta de Ney Vianna e de Fernando Pinto, a falta de Toco vai ser ainda mais devastadora.

Por isso, uma sugestão - já que Toco ainda não foi homenageado, que tal uma reedição de "Rapsódia da Saudade", com um setor todinho dedicado ao compositor? Além de a escola apresentar um samba de verdade - coisa que não faz a quase 10 anos, resgataria sua identidade, faria o componente sentir o que é a Mocidade e seria uma bela lição para a ala de compositores da escola. Quem sabe escutando um grande samba, eles possam tentar também fazer um?

*****

A ausência de Jamelão no CD é lamentável. O tempo é um senhor implacável, mesmo com Jamelão. Se sua voz é imortal, seu corpo, como o de todos nós, sofre com o passar dos anos. Mas espero vê-lo conduzindo o carro de som da Mangueira para o bem do carnaval e de nossos ouvidos.

Luizito fez um bom papel, mas não é a voz da Mangueira. Aliás, quase todos os intérpretes fizeram um ótimo papel na gravação. Preto Jóia, então, fez chover no Rio de Janeiro durante um mês.

*****

E para o pessoal que curte o Carnaval Virtual, está no ar o novo site da LIESV, agora ponto com! O www.liesv.com traz todas as novidades do maior espetáculo da telinha. O grande destaque é que um dos intérpretes das escolas virtuais, o Delezcluze da Ilha, foi chamado para integrar o carro de som da União da Ilha do Governador, ao lado de Ito Melodia, Jorge Tropical e Sobrinho, mostrando que cada vez mais os elos entre o carnaval virtual e o real estão se estreitando.


Abraços a todos!

João Marcos
joaomarcos876@yahoo.com.br