Coluna do João Marcos
QUE
TITITI É ESSE QUE VEM DA SAPUCAÍ?
Começam a ser definidos os
enredos de 2007 e vemos poucas mudanças nos estilos das escolas.
Mesmo com a Vila, o Império e a Mangueira mostrando que o
caminho da simplicidade leva a uma melhor comunicação com o público
e facilita o trabalho dos compositores, a maioria das escolas vai
continuar optando pelo estapafúrdio.
A Vila Isabel, agora comandada por um ex-carnavalesco da Comissão
da Beija-Flor, com o seu estranhíssimo "Metamorfoses"
parece querer confundir totalmente a cabeça dos compositores e
alienar o público em geral. Aliás, o carnavalesco não aprendeu
nada, uma vez que a viagem "na maionese" da Beija-Flor
foi altamente punida pelos julgadores de enredo. Já ouvi falar
que André Diniz não deve compor este ano. Acredito que, lendo a
sinopse, ele tenha se desmotivado.
A Tijuca vai falar da história da fotografia e, pelo nível da
sinopse, os compositores vão ter de coçar muito a cabeça para
fazer mais uma marchinha safada como as que vem sendo apresentada
pela escola nos últimos anos.
Algumas escolas apostam nos patrocinadores. Grande Rio vem com
Caxias. Imperatriz, com Noruega. Infelizmente, sem a liberdade
que era dada aos compositores antigamente, engessados por
sinopses cada vez mais detalhadas e tendo de colocar palavras e
expressões para vender o produto do patrocinador, a tendência
é que apresentem sambas burocráticos.
O Império, que lavou a alma em 2006, resolveu ceder ao
politicamente correto e vem com o "Ser Diferente é
Normal". Este tipo de enredo geralmente não dá bom samba,
mas a ala de compositores da escola é acima da média e pode
tirar água de pedra. Mas, sinceramente, eu estava muito mais
feliz com o "Admirável Mundo Novo" que Paulo Menezes
preparava para a Serrinha.
A Viradouro deve mudar de estilo de samba com a chegada de Paulo
Barros. O enredo sobre jogo poderia dar um samba bacana, mas com
o carnavalesco querendo que todo mundo "procure o
Wally", a minha expectativa é a pior possível. Eu fico com
pena de Flavinho Machado e Heraldo Farias tendo de lidar com uma
concepção de carnaval como esta para comporem seus sambas
concorrentes.
Beija-Flor e Salgueiro vêm com temas "afro". A princípio,
o que pode parecer uma boa notícia, deve ser aguardado com
reservas, uma vez que tais enredos, a primeira vista, lembram
muito o tipo de enredo das escolas de São Paulo. E eu tenho
minhas restrições com a "paulistização" do carnaval
carioca que vem se dando progressivamente nos últimos anos.
E o que sobra? Sobra o Tititi da Estácio. Sim, a escola irá
reeditar pela terceira vez seguida. Sim, está apelando para não
ser rebaixada. Mas... e daí? O grande barato é que levará para
a avenida um samba alegre, leve, popular, totalmente diferente
das bobagens que as "escolas do estapafúrdio"
apresentam ano após ano.
A escola parece ter aprendido com 2006, quando conquistou o título
do acesso com o levíssimo "Quem é Você?". O
interessante é que a escola foi campeã com a reedição de um
samba que, apesar das qualidades, não foi destaque em 1984, que
não é uma safra das melhores. Entretanto, apesar disso, todo
mundo cantava a plenos pulmões o irresistível refrão "Vem
de lá, vem de lá, vem de lá... ôôô". Nada mais simples
e comovente. Eu diria que juntamente com o nome de Paulo Barros
(apenas o nome, por que a participação dele na construção do
carnaval da escola não gerou grande coisa), foi o samba quem deu
o título para a escola.
Particularmente, prefiro "Quem é Você" à
"Tititi do Sapoti". O desfile de 1987 foi uma delícia,
com as referências pop que a Rosa Magalhães trouxe para a
escola, como o leão da MGM no abre-alas. Mas o samba de 1984, na
minha opinião, é melhor. O samba de 1987 é um pouco marcheado
demais para o meu gosto. A simplicidade é sempre melhor
apreciada com um andamento mais gingado, com a dos sambas de
David Correa, p.ex. Porém, diante do que deve aparecer por aí,
é sempre uma boa notícia saber que pelo menos teremos UM samba
que foge da mesmice desfilando na Sapucaí ano que vem.
O que não dá para entender é qual o motivo das escolas que
reeditam repetirem os mesmos erros nas escolhas quando abrem seus
concursos. São estes erros que vêm enterrando o gênero
samba-enredo ano após anos. Grande parte dos compositores que
tiveram sambas reeditados continua viva e concorrendo. Mas aí é
que esta: peguem o próprio Dominguinhos, p.ex., autor dos três
sambas reeditados pela Estácio - ele teve de mudar seu estilo de
compor para se adaptar aos novos tempos.
Quando Rubem da Mangueira, autor do imortal "No Reino da Mãe
do Ouro", de 1976 (Oba bá, ola, oba ba / É a mãe do
ouro / Que vem nos salvar) apresentou seu samba concorrente
ano passado, uma pedrada que lembrava os melhores sambas da
escola nos anos 70, e foi eliminado logo no início das eliminatórias,
ficou muito claro que a decadência não é dos compositores, mas
da administração das Escolas, formada por pessoas que sabem
muito de política e de dinheiro... e nada de samba.
Gênios como Dona Ivone Lara, Martinho da Vila, Niltinho, David
Corrêa, Rubem, Jabolô, Toco e etc. estão aí. Dêem a eles
sinopses simples, ligadas à realidade do povo. Dêem a eles
liberdade criativa. Duvido que não sairiam clássicos com o nível
dos sambas de antigamente...
João
Marcos
joaomarcos876@yahoo.com.br