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Editorial Sambario

Edição nº 54 - 06/03/2014

Aos trancos e barrancos, as pazes com a história - Domingo de Carnaval em 1976. A Em Cima da Hora se prepara para adentrar a Avenida Presidente Vargas, então o palco dos desfiles das escolas de samba repleto de antológicos enfeites no alto, para abrir as apresentações do primeiro grupo naquele ano. Um dilúvio, no entanto, desaba sobre os componentes. O abre-alas é o único carro alegórico da azul-e-branco de Cavalcante que resta. Em meio a tantos infortúnios, um lindo samba, a obra-prima do Senhor Edeor de Paula (acima, foto de Diego Mendes), sublime momento do gênero. A tristeza de sua melodia e letra parece ser a trilha sonora perfeita para o problemático desfile que se desenha. O rebaixamento na 13ª colocação entre 14 escolas é inevitável. Apesar dos pesares, "Os Sertões" entra para a história e sua primazia como "o melhor samba-enredo de todos os tempos" na opinião de muitos se eterniza.

Porém, o descenso daquele samba impôs uma incômoda dívida do destino com o Carnaval. Como uma música tão divinal como aquela não conseguiu evitar a queda da Em Cima da Hora, que na época emendava uma sequência no grupo principal desde 1972? O reconhecimento naquele longínquo 1976 foi imediato, com o Estandarte de Ouro. Por décadas, o infeliz desfile da escola, mesmo com os versos de Edeor pulsando no asfalto da Presidente Vargas, se perdurou como um dos grandes mistérios da Folia do Momo.

Trinta e oito Carnavais depois, surge a oportunidade das pazes com a história, de erguer a bandeira branca no destino. Retornando à Sapucaí, onde não pisava há dez anos, a Em Cima da Hora teria a sempre ingrata missão de abrir os desfiles, repetindo o expediente de 76. As reedições de enredo foram liberadas em 2004. Consta que algumas escolas solicitaram autorização para cantar "Os Sertões". Numa postura mais do que correta, a escola de Cavalcante não liberou o empréstimo. Sabia que um dia aquele momento teria que ser só dela.

O tira-teima ocorreria em circunstâncias adversas. No Carnaval atual, a agremiação que abre os desfiles geralmente é punida com o rebaixamento. Império da Tijuca foi a última a provar do veneno de forma covarde pela LIESA nesta quarta. No ano passado, exemplificando na Série A, a tradicional Unidos do Jacarezinho não resistiu. A Em Cima da Hora vinha de uma década inteira se apresentando em Campinho, na Estrada Intendente Magalhães. Chegou a parar no penúltimo grupo neste meio tempo. Já havia se desacostumado por inteiro à pompa do Sambódromo. Horas antes do desfile de 2014, chuva no Rio de Janeiro. O temor desceu. Será que 1976 se repetiria?

São Pedro logo trata de se acalmar. Antônio Carlos e Arthur Franco esquentam com "33, Destino Dom Pedro I" de 1984, mais um grande representante da magnífica safra azul-e-branco. Na sequência, os intérpretes iniciam o canto de um dos marcos do gênero samba-enredo. "Os Sertões" está novamente na avenida. Dessa vez no moderno Sambódromo. E através da própria Em Cima da Hora. Eis a chance do definitivo acerto de contas com o destino. 

O samba passa. A escola faz um desfile correto e digno, tecnicamente suficiente para a permanência no grupo. Enfim, cada verso do Senhor Edeor - presente na Sapucaí, na flor de seus mais de 80 anos - é ecoado numa apresentação sem grandes problemas, em contrapartida àquela distante noite chuvosa na vizinha Presidente Vargas. O papel está cumprido.

Na apuração, entretanto, algo incrível acontece. Apenas uma nota 10 dos quatro julgadores de samba-enredo, concedida por Lilia Paranhos. André Gimenes aplica 9,9. Já parecia um estupro? Desvario maior estava por vir: Celso Chagas e um inadmissível 9,6 (descartado na pontuação final), cuja justificativa para o atentado já é ansiosamente aguardada, sendo disponibilizada em breve. Marcelo Rodrigues retira mais um décimo da obra. No quesito Harmonia, o sétimo dos dez julgados, a Em Cima da Hora chega a figurar na zona do rebaixamento. Os inesperados décimos descontados no samba poderiam fazer falta. A tragédia do descenso se repetiria novamente? "Os Sertões" se perpetuaria como pé-frio injustamente?

A Comissão de Frente, penúltimo quesito, permitiria à comunidade de Cavalcante o suspiro de alívio. A permanência na Série A para 2015 estava sacramentada. Em mais uma peça do travesso destino, "Os Sertões" repete a mesmíssima 13ª colocação de 1976. Dessa vez, suficiente para continuar na Sapucaí. Mesmo com a afronta dos seis décimos descontados, cujos motivos saberemos mais tarde. As pazes com a história vieram dessa forma, aos trancos e barrancos. Mas vieram! O samba segue marcado pela própria natureza, apesar de ferido.

Rápidas considerações:

Parabens à Unidos da Tijuca por mais uma conquista! Para o Pavão, desfilar em ano par passou a dar sorte nos últimos tempos.

Muito obrigado, Portela, por me proporcionar o momento de maior emoção no Grupo Especial no ano. Portela Verdade, o caminho a ser trilhado é este!

União da Ilha, orgulho insulano, de volta ao Sábado das Campeãs. Vinte anos de espera foi muito!

Mocidade, que chão maravilhoso! A nova virada ainda está por vir.

Acorda, Vila Isabel!

LIESA, basta dessa covardia de sacrificar quem vem do Acesso! Erga a cabeça, Império da Tijuca!

Como você fez falta, Viradouro! Bem-vinda de volta!