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O CULTO AOS DEUSES AFRO-BRASILEIROS NO SAMBA-ENREDO Olá amigos! Há muito tempo vinha
prometendo a mim mesmo escrever a respeito do tema citado acima,
mas confesso que não me sentia "preparado para isso".
Vou explicar melhor. Eu pretendia fazer um longo trabalho de
pesquisa a respeito do tema, mas a pobreza de informações
encontradas (as escolas parecem dar cada vez menos valor a
espiritualidade) fez com que eu resolvesse deixar temporariamente
de lado a minha idéia e lhes brindar com uma coluna que destoa
do meu objetivo inicial, mas que eu espero ser interessante.
Vamos a ela, portanto. Começo dizendo que nenhum setor (nem
sequer a axé music) tem tanta ligação com os orixás do
candomblé como o nosso samba, e isso se explica
antropologicamente. Os temas afro são fontes inesgotáveis de
belos enredos para as nossas escolas. Se elas resolvessem beber
delas com mais freqüência, com certeza iriam lograr maior
sucesso do que com os famigerados enredos patrocinados.
Determinadas agremiações são pródigas em desenvolver enredos
nesses estilo, como, por exemplo, Beija–Flor, Unidos da
Tijuca, Salgueiro, Império Serrano. Mais atrás temos União da
Ilha, Cubango - com os sambas antológicos de Heraldo Faria e
Flavinho Machado - e Unidos do Cabuçu, com os belos hinos do
início da década de 80. A religiosidade é um assunto muito
sério, tanto é que as escolas têm um cuidado muito grande
quando da elaboração de enredos voltados para o tema. Em 1996,
com sua "viagem da pintada encantada", a Ilha teve o
cuidado de alertar seus componentes para "cuidarem de seus
santos" a fim de não terem problemas durante o desfile.
Muita gente não levou a sério e entrou em transe em plena
avenida. Em 2001, com Agotime, a Beija–Flor teve o cuidado
de não colocar médiuns em sua comissão de frente para evitar
problemas. Dizem até que o incêndio no carro da Viradouro em
1992 foi obra de forças ocultas. A seguir, vou apresentar um pouco da
história de cada orixá, e sua relação com as escolas de samba
e com os hinos compostos por elas em sua homenagem. Confiram: Exu -
É um mensageiro entre o Orum (céu) e o Ayê (terra).
Responsável por "abrir caminhos", costuma–se
fazer um despacho para ele antes das cerimônias e trabalhos,
para que tudo corra bem. É tido como demoníaco por muitos, pois
a Igreja Católica ajudou para que sua imagem fosse associada ao
diabo cristão, o que, lamentavelmente, foi acolhido pela
Umbanda, onde as entidades (exus) recebem nomes assustadores,
como Caveira, Sete Catacumbas, etc. Outro equívoco a respeito
desse orixá é que ele não bebe cachaça, mas sim bebidas doces
(como Martini, por exemplo). Sua área de influencia são os
mercados, como o Mercadão de Madureira (que lembra muito os
mercados nigerianos) e as encruzilhadas. Suas cores: vermelho e
preto. Exu é citado em pelo menos dois sambas que falam sobre a
sua influência na prisão de Oxalufã pelos soldados de Xangô:
"A visita do Ony de Ifé ao Oba de Oyó" (Cabuçu 83) e
"Águas de Oxalá" (Boi da Ilha 2005). Também é
citado em outros, como "Oferendas" (Ponte 84), junto
aos demais orixás. Ogum
– Deus da guerra e da luta, seu símbolo é uma espada de
ferro. Suas cores são o azul escuro e o branco. Seu dia é
terça–feira. Corresponde a Santo Antônio na Bahia e a São
Jorge no Rio de Janeiro. É padroeiro de várias escolas, dentre
elas Império Serrano, Beija–Flor, União de Ilha, Porto da
Pedra, Grande Rio, etc. "Magia africana no Brasil e seus
mistérios" (Tijuca 75) é um dos sambas que cita o orixá,
assim como Porto da Pedra 2003, numa das chamadas mais fortes da
história recente dos sambas enredo ("Ô sarava meu pai Ogum
eu peço axé"). Oxossi
– Irmão de Ogum e rei de Ketu. Oxossi é deus da caça e
das florestas. Seu símbolo é o arco e flecha, e suas cores o
verde e amarelo. Seu dia votivo é a quinta–feira e
corresponde a São Jorge na Bahia e São Sebastião no Rio de
Janeiro. Oxossi é o padroeiro da Portela, juntamente com Oxum,
com quem viveu um caso de amor, muito bem retratado em
"Fruto do Amor Proibido", sambão da Cubango de 1981,
dos tempos em que ainda desfilava em Niterói.
Logum Ede
– Esse orixá é justamente o fruto do amor a que se
referíamos acima. Sua história também é contada no samba
"Logun, pricipe de Efan", que deu o Estandarte de Ouro
ao Arranco em 1977. Acredito que seja o padroeiro da Unidos da
Tijuca, pois tanto suas cores (azul e amarelo), quanto seu
símbolo (pavão), são os mesmos da escola. Ossãe
– É um dos orixás da medicina. Dono das folhas, é o
próprio mato. No Brasil, tornou–se famoso pela música
"Canto de Ossanha", de Vinícius de Moraes. Suas cores
são rosa e verde, as mesmas da Mangueira. Nanã
– É o orixá mais velho das águas, das chuvas. Suas cores
são azul e branco. Corresponde a Sant’anna, avó de Jesus.
Foi citada em vários sambas, como por exemplo,
"Oferendas", "Trevas e Luz, a explosão do
universo" (Viradouro 97) e "Santos e Pecadores"
(Império da Tijuca 83). Obaluaê
– Também conhecido como Omulu, é o mais temido dos
orixás. Comanda a saúde e as doenças. Come milho branco e
pipocas. Seu dia é a segunda-feira. Suas cores são vermelho e
branco ou vermelho e preto. Corresponde a São Lázaro ou São
Roque. É o padroeiro da Cubango. Uma de suas lendas é relatada
em "A festa de Olubajé" (Ponte 78). Oxumarê
– É o arco–íris. Sua função é transportar água do
mar e dos rios para o palácio de Xangô. Suas cores são o
branco e o amarelo, e seu símbolo uma cobra de ferro.
Corresponde a São Bartolomeu. Os sambas "Dan, a serpente
encantada do arco–íris" (Engenho da Rainha 90) e
"Oxumarê, a lenda do arco–íris" (Imperatriz 79)
falam desse orixá. Xangô
– Grande rival de Ogum, é o Deus do fogo. Sua festa
é no dia 30 de setembro (tradicionalmente celebrada no morro da
Serrinha, em Madureira). Seu dia é quarta–feira. Suas cores
são o vermelho e o branco. O machado é o seu símbolo. Foi
marido de três mulheres: Obá, Oxum e Yansã. Corresponde a São
Jerônimo e São Pedro. Xangô é o padroeiro do Salgueiro e da
Mangueira, que possuem componentes com seu nome, tal qual
acontecia com a Estácio. É citado em vários sambas da vermelho
e branco da Tijuca, e em outros já relatados acima. Yansã
– É a divindade dos ventos e das tempestades.Terceira
esposa de Xangô, é guerreira e valente. Suas cores são o
vermelho e o branco, e seu dia de festa é 4 de dezembro.
Corresponde a Santa Bárbara. Clara Nunes era filha de Yansã, e
teve seu nome associado ao do orixá no enredo ‘’Contos
de Areia’’, que deu a Portela seu último título, em
1984. Obá –
Uma das esposas de Xangô e filha de Yemanjá, é uma figura rara
nos candomblés da Bahia. É citada em "A Visita do Oni de
Ifé ao Oba de Oyó". Oxum
– Deusa das águas doces. É filha de Yemanjá com seu
irmão Xangô. Nos candomblés, se apresenta com um leque de
latão (abebê), em cujo centro há um espelho. Sua cor: amarela.
Corresponde a Nossa Senhora da Conceição e é padroeira da
Portela, conforme foi dito anteriormente.Também é muito citada
em vários dos sambas-enredo mencionados aqui. Yemanjá
– É a senhora das águas salgadas. Também conhecida por
Rainha do Mar, Princesa de Aiocá, Janaína, Inaê e Oloxum.
"Arte negra na legendária Bahia", "A lenda das
Sereias" e "Mar baiano em noite de gala", sambas
de 1976 de Estácio, Império e Lucas respectivamente, são
exemplos do uso desses nomes. Seu dia é 2 de fevereiro. Suas
cores são azul e branco e seu dia de semana sábado. Corresponde
a Nossa Senhora dos Navegantes. Oxalufã
– É o Oxalá velho, que se apresenta apoiado num bastão
(opaxorô). É identificado com o Senhor do Bonfim, e
carinhosamente chamado de Papai. É citado em vários sambas,
como por exemplo: Mocidade 91, Cabuçu 83, Villa Rica 96, União
da Ilha 96, Império da Tijuca 97 e Viradouro 99, só pra ficar
nesses. Oxaguiã
– Confunde–se com Deus–menino na Bahia. É alegre,
jovem e ágil. Se apresenta com uma espécie de pilão prateado
na mão e uma espada na outra. É o meu. Existe uma infinidade de bons sambas que
não citei, mas se fosse fazê–lo, seria assunto para umas
dez colunas no mínimo. Espero que, com essa coluna, tenha
contribuído para divulgar um pouco da cultura
afro–brasileira. Mesmo não sendo candomblecista (fui criado
em centro espírita kardecista e hoje me considero agnóstico),
sou admirador da religião dos orixás e me interesso sobretudo
pelo aspecto folclórico a ela relacionado. No último conclave,
torci por um papa negro, mas desejo a Bento XVI um bom
pontificado. Acho que as pessoas devem acreditar na
espiritualidade, sobretudo aquelas ligadas a escolas de samba.
Vou me despedindo na esperança de que essa coluna represente um
alerta contra a mesmice que vem tomando conta dos carnavalescos
de hoje em dia. Portanto, fé em Deus e mãos a obra. Um abraço
e até a próxima. SAIBA MAIS: -
Candomblé, a panela do segredo- Pai Cido Osun Eyin -
Mandarin -
Mitologia dos Orixás - Reginaldo Prandi - Cia das
Letras - Orixás - Pierre Fatumbi Verger – Corrúpio
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