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O CARNAVAL TAMBÉM TEM AS SUAS "CENAS LAMENTÁVEIS" - VERSÃO ATUALIZADA
Saudações, caríssimos
leitores deste Sambario. A coluna de hoje é um tributo ao blog Ouro de Tolo,
que recentemente anunciou o encerramento de suas atividades - a ser concluído
após o fim da série Histórias do Sambódromo. Como uma forma humilde de
homenagear os onze anos de serviços bem prestados a folia - tendo em destaque
os Guias do Sambódromo, o Justificando o Injustificável - que inspirou o
Dissecando as Justificativas, feito anualmente neste humilde espaço - e a
excelente série Sambódromo em Trinta Atos, escrita por Fred Sabino entre 2013 e
2014 (e remodelada anos depois como a já mencionada Histórias do Sambódromo),
esta coluna resgata e atualiza uma postagem, originalmente escrito por Pedro
Migão e Bruno Malta em 2016, que lista algumas "cenas lamentáveis" em
apurações de carnaval ao longo da história. Agradecimentos ao amigo Pedro Migão
por autorizar a atualização do texto. Introdução feita, vamos
ao que interessa.
Chamam-se de “Cenas
Lamentáveis” situações em diversos esportes onde há confusão. Uma troca de
sopapos, uma briga generalizada, xingamentos, uma entrada mais forte… Se tornou
uma nomenclatura comum para estes casos. Se o leitor pensa que o
carnaval está imune a estas situações, se engana redondamente. As apurações de
resultados, tanto no Rio de Janeiro como em São Paulo, são campos férteis para
confusões e “Cenas Lamentáveis”. Pancadarias, xingamentos, cadeiras
arremessadas, acusações de propinas, notas rasgadas, notas sumidas, ameaças de
morte e coisas semelhantes ocorrem com razoável periodicidade na história do
carnaval. Nos últimos anos o Grupo
Especial do Rio de Janeiro tem andado “comportado” em termos de confusões, mas
o Grupo de Acesso e o Especial de São Paulo tem mantido esta tradição. Já
passaram os tempos onde a apuração carioca era realizada dentro do quartel da
Polícia Militar por conta das pancadarias ocorridas entre dirigentes e
especialmente entre torcidas. O objetivo é lembrar
algumas destas confusões ocorridas em apurações de resultado. E já temos aqui
farto material de análise. 1960 – A Pancadaria de
Natal A apuração dos quesitos
havia proclamado a Portela tetracampeã do carnaval, com 100 pontos contra 95 do
Salgueiro, vice campeão. Entretanto, nas apurações de penalidades o Salgueiro
seria declarado campeão originalmente. Natal protestou e apanhou
da Polícia, gerando uma grande confusão e a suspensão da contagem dos pontos.
No dia seguinte ele deu a sugestão que acabaria aceita, de declarar campeãs as
cinco primeiras colocadas. A década de 60, aliás, foi pródiga em pancadarias
entre torcidas durante apurações. 1988 – Mangueira x Vila Isabel No ano anterior o
insólito título da Mangueira havia gerado bastante animosidade entre as
torcidas. Em 1988, as duas escolas disputaram ponto a ponto o título. O
resultado? Pancadaria generalizada entre as torcidas. 1989 – A apuração que não
terminou Esta vem do carnaval de
São Paulo. Camisa Verde e Branco e Unidos do Peruche disputavam o título ponto
a ponto até que o presidente do Camisa pura e simplesmente pegou as notas
restantes e levou para casa. Como o Camisa estava na frente, foi declarado
campeão. 1993 – Divisão suspeita? A apuração paulista de
93, a princípio, ocorreu sem problemas. O que pouca gente sabe, porém, é de uma
confusão gigantesca que aconteceu horas antes da apuração. Essa história só se
tornou pública em 2010, quando o locutor oficial da apuração, Zulu, a revelou
no programa "No Mundo do Samba". Nessa época, Zulu era coordenador da
Liga e as notas eram recolhidas por um outro membro, que levava as notas para
casa, montava uma tabela com os resultados e devolvia tudo no dia da apuração. Tudo ia muito bem até
horas antes do início da divulgação das notas, quando Zulu, já preparado para a
leitura, recebeu a informação de que já tinha um pessoal da imprensa com o
resultado final na mão. As diretorias armaram uma verdadeira quizumba e, sem
dar maiores detalhes, Zulu, que sempre foi ligado ao Camisa, disse que a
história – o empate entre Camisa e Vai-Vai – “não foi bem assim” e que a
Saracura só se sagrou campeã porque a Presidente Magali optou por dividir o
título. Ou seja: o Camisa teria, ao menos segundo Zulu, terminado à frente da
preta e branca. De todo modo, a Liga aprendeu a lição e, a partir de 1994,
passou a guardar as cédulas no Batalhão da ROTA. 1994 – Pancadaria e
troféu quebrado Revoltado com a sequência
de notas 9 que o Salgueiro estava recebendo, o presidente Paulo César Mangano
invadiu a mesa apuradora para tirar satisfações com o presidente da Liga, Paulo
de Almeida. Saldo: o troféu foi quebrado. Mangano acusou a Liga de
armação e afirmou que a entidade "colocou jurados comprados pela
Caprichosos e outras escolas amigas do presidente" Dirigentes de Mangueira,
igualmente descontentes, também se envolveram em confusão durante a leitura das
notas. 1997 – Bolinha Fria? Acesso do Rio. Tradição,
São Clemente e Caprichosos de Pilares acabaram empatadas com 178 pontos e
somente duas subiriam. A Tradição foi declarada campeã mesmo com bateria e
baianas desfilando sem fantasia. Foi realizado um sorteio para definir a
segunda promovida e o pessoal da São Clemente até hoje jura que houve “bolinha
fria” no sorteio. Obviamente, acabou em
confusão. A São Clemente foi a Justiça para garantir presença no Desfile das
Campeãs, e conseguiu. Mas quando acionou o jurídico para tentar uma vaga no
Grupo Especial, foi derrotada. Ao menos, o destino foi generoso: no ano
seguinte, a aurinegra conseguiu o acesso. 1997 – X9 em todos os
sentidos Então Presidente da
LigaSP, Laurentino Marques, o Lauro, era também o Presidente da X-9 e o
encarregado da leitura das notas. Durante a apuração, ele por algumas vezes se
esqueceu de dizer os nomes dos jurados, o que levou a uma série de suspeitas
sobre possíveis fraudes nas notas. A apuração foi paralisada algumas vezes por
conta dos incessantes protestos vindos dos diretores – que, à época, não
ficavam em mesas como atualmente, mas sim em bancos de madeira, um ao lado do
outro – e da gritaria nas arquibancadas. O vídeo abaixo é
indispensável, e épico. Algumas declarações como as que estão transcritas
abaixo do então presidente da Vai Vai, o falecido Sólon Tadeu: “- O último carro da X-9
atropelou os garis! Porra, quebrou a harmonia. Deram três 10! A fantasia deles
veio com índio amarelo, índio verde e índio cor de rosa, não tava dentro do
enredo. E a comissão de frente ‘prágio’ (sic) da União da Ilha. Mas tudo bem, deixa
esse safado comigo que ele tá fora da Liga. – Solón, e agora o que
você vai fazer? – Primeira coisa que eu
vou fazer é dar uns tapas na cara dele pra ele deixar de ser pilantra”. 2001 – Gaviões e
novamente Solón A torcida da Gaviões da
Fiel armou um quiproquó danado na apuração. Ao final da divulgação das notas,
torcedores atiraram paus e pedras em alegorias de outras escolas e entraram em
confronto com a Polícia. Outros espancaram um cinegrafista da Band. O
Presidente da Vai-Vai, Solón Tadeu, acusou os membros da Fiel Torcida de
invadirem seu barracão. O próprio Solón protagonizou um momento ímpar na
história das apurações. No meio da leitura das notas, discutiu com um
jornalista da TV Cultura. Rodeado por fotógrafos e outros repórteres, bradava: “Isso
é uma festa! Quem tá querendo guerra aqui, agora? Quem tá querendo guerra pra
você me fazer uma pergunta dessas? Ô, meu irmão, eu tô cheio de mulher lá! Você
é irresponsável!” Solón chegou a ir para cima do “adversário”, mas foi contido por quem estava por ali. Enquanto a briga rolava, as notas eram lidas normalmente ao fundo. 2005 – Solón pede música
no Fantástico Ao final da apuração, o
Presidente da Vai-Vai, Solón Tadeu, se dirigiu à grade onde ficavam
representantes da Liga. Exasperado, ele, ao lado do filho, disse palavras duras
aos dirigentes. De repente, um enorme quebra-pau se instalou. Sobrou porrada
para tudo quanto é lado. Gente de tudo quanto é escola entrou no meio e, por
pouco, nada mais grave ocorreu. As duas versões: uma diz
que o filho de Solón empurrou um segurança e ali se deu toda a confusão. A
outra, diz que o segurança agrediu o filho de Solón e dali surgiu o quebra-pau. Em meio ao quebra-pau do
pós-apuração, chamaram uma vez mais a atenção as declarações do Presidente da
Vai-Vai, Solón Tadeu Pereira. Irritado com a suposta agressão que sofreu do
segurança da Liga, ele disse que, graças ao segurança em questão, seria capaz
de “explodir o Anhembi”. Ele, aliás, cumpriu a promessa da escola não se
apresentar no Desfile das Campeãs por considerar o resultado uma fraude. 2003 – 35 mil doletas (?)
e uma saraivada de palavrões O vídeo é um dos mais
lembrados da bolha carnavalesca. Revoltados com a São Clemente tirando notas 10
de todos os jurados, os presidentes da Vila Isabel (Evandro Bocão) e da União
da Ilha (Jorge Gazele, o Peixinho) soltaram o verbo em rede nacional. Bocão: “Não, a Vila
Isabel não tem nem o que falar, ô. Bota um Carnaval desse na Avenida, um gasto
danado, pra ele já ter escola que ganha antes e com uma porra duma fantasia
daquela tá ganhando de mim. Eu vou fazer o que? Isso é o Presidente da
Associação. Por isso que não tem credibilidade porra nenhuma, prefeito não dá
aumento porra nenhuma, com um filho da puta desse ladrão aí. Carnaval tá na
merda que tá: por causa de um ladrão filho da puta desses aí”. Peixinho: “Isso aí é
um roubo, é uma sacanagem. Todo mundo já sabia que a São Clemente ia ser
campeã. São Clemente tá melhor que a Beija-Flor, 10 em tudo! E todo mundo viu a
São Clemente desfilar… Agora, culpada disso é a Liesa, que tem que intervir.
Todo mundo sabe da idoneidade da Liesa, tem que intervir, que o Walter, é o
último ano dele, tá enchendo o rabo de dinheiro, a verdade é essa, tá levando o
dinheiro de todo mundo. Fizemos Carnaval pra ganhar, foi o melhor Carnaval da
Avenida (sem desfazer das corimãs). Agora chega aqui: 10; 9.9; 10; 9.9. Isso é
sacanagem, pô. Um ano de trabalho” Índio, diretor de
carnaval da Vila: “O que tá havendo? Deveria perguntar ao Walter e essa
cachorrada que julga o Grupo de Acesso. Isso é uma pouca vergonha! Ano passado
fomos garfados e esse ano não foi diferente. O Grupo de Acesso deveria
terminar, ou então a Liga assumir esse grupo.” Walter no caso é Walter
Teixeira, presidente da Associação das Escolas de Samba do Rio de Janeiro a
época. No vídeo, o presidente da São Clemente ainda tripudia das outras
escolas. Nunca se provou documentalmente, mas o que se fala desde a época no
meio (jamais desmentido, bom que se diga) é que a São Clemente teria pago 35
mil dólares pela ascensão ao Grupo Especial. Aliás, não foi o primeiro
acesso polêmico deste milênio. Nem o último… 2006 – o vendedor da
Nestlé enxotado Após uma apuração onde a
Grande Rio quase se sagrou campeã, os vendedores de picolé da Nestlé – que
patrocinava a agremiação – que trabalhavam na Praça da Apoteose foram enxotados
por outros presidentes. Com direito a um comentário feito por um deles: “-
Agora só tomo Kibon” Por que será? Até hoje
não se sabe o que motivou a reação. 2006 – Cadeiras Voando
(Parte I) Inconformado com o
resultado e por ter recebido apenas quatro notas 10, o Presidente da Gaviões,
que parou a apuração em diversas oportunidades (não foi o único, o Presidente
Betinho, da Nenê, chegou a arremessar cadeiras em direção à mesa de apuração),
afirmou que a escola deixaria o Carnaval. Não cumpriu a promessa. 2008 – Um Caso de Polícia
e uma Pancadaria Acesso B do Rio de
Janeiro. A Unidos de Padre Miguel, apontada como a melhor escola do ano no
grupo, ficou apenas em terceiro lugar em uma apuração que foi caso de Polícia. Revoltada,
a torcida da
escola desceu baixando o pau no que visse pela frente, em uma
pancadaria de
proporções razoáveis. Aliás, a
agremiação de Padre Miguel tem uma coleção
considerável de “garfos” nos seus últimos
desfiles – suficientes para formar um
aparelho de jantar… 2010 – “Polícia pra quem
precisa” Mais uma vez a Unidos de
Padre Miguel, desta vez no Acesso A. Revoltada com o rebaixamento, a torcida da
escola começou a jogar pedras, cadeiras e tudo o que estivesse à mão na mesa
apuradora. A Polícia foi chamada para conter os ânimos e em resposta os torcedores
começaram a gritar: “- Polícia pra quem
precisa! Polícia pra quem precisa!” (referindo-se aos julgadores e dirigentes); “- Prende o Reginaldo!” (em alusão ao presidente da LESGA Reginaldo
Gomes, entidade que organizava os desfiles à época, de triste memória); A propósito, a quadra da
campeã São Clemente estava fechada naquela oportunidade… 2010 – Cadeiras Voando
(Parte II) Integrantes da Gaviões,
que já não estavam muito satisfeitos, perderam de vez a paciência com as notas
no quesito Enredo. Entre diretores e torcedores, voaram em direção à mesa de
apuração copos, chinelos e cadeiras. Ao fim da leitura das notas, os
componentes invadiram a Marginal Tietê e assustaram quem por ali passava de
carro. 2011 – Copia e cola das
justificativas Outra vez o Grupo de
Acesso do Rio, mas aí as "cenas" foram bem depois da apuração:
investigação do Ministério Público descobriu que quatorze (!) cadernos de
julgamento estavam com a letra idêntica. Óbviamente, não deu em
nada. No ano seguinte a coisa seria um pouco pior. 2012 – Notas Rasgadas e
Cadeiras Voando Nessa teve de tudo: notas
rasgadas, cadeiras voando, troféus derrubados, pescoção em repórter, carros
incendiados – e o inesquecível episódio da “clorofila” após uma troca de
jurados não comunicada aos presidentes das escolas paulistas. O vídeo abaixo dispensa
maiores comentários. 2016 – Deu até prisão Novamente São Paulo. A
apuração foi realizada no Palácio de Convenções do Anhembi, já que as chuvas do
domingo de carnaval danificaram o toldo do camarote do Sambódromo onde
costumeiramente as notas são lidas. Integrantes de algumas escolas - entre elas
a Vila Maria - já estavam exaltados com as notas baixas em Evolução, mas a
coisa azedou de vez quando o jurado Nilton de Oliveira, de Harmonia, não
atribuiu nota para a Dragões da Real. Instalou-se uma confusão generalizada. Um
segurança da Vila Maria acabou detido. Como os leitores podem
perceber, este artigo fica longe de esgotar o tema. Vamos aguardar o que irá
acontecer nos próximos carnavais. Afinal, que a paz reine entre os homens de
boa vontade…
Carlos Fonseca |
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