Os sambas de 2023 por Cláudio Carvalho
Os sambas de 2023 por Cláudio Carvalho
As avaliações e notas referidas apresentam
critérios
distintos dos utilizados pelo júri oficial, em nada relacionados
aos referidos desempenhos que as obras virão a ter no desfile
Grande Rio:
Responsavel por dois dos melhores sambas do século XXI nos dois
ultimos desfiles, a atual campeã do carnaval volta a falar de
Zeca Pagodinho, que já havia sido mencionado no enredo de 2007,
quando a escola conquistou o vice-campeonato. O cantor participa da
faixa, que, apesar de não fugir da fórmula de citar
vários de seus sucessos, tem uma pegada interessante. Não
chega a ser um Pedra Preta ou um Exu, mas agrada, até porque o
critério não é comparativo. Pela
gravação, já se observa que o samba encaixou
perfeitamente com a bateria, que faz diversas bossas e
convenções ao longo da faixa, sobretudo no refrão
chiclete do meio. Nota: 9.9
Beija-Flor:
Assim como em 2003, a Beija-Flor vem de um vice-campeonato e traz um
enredo político. Se naquele ano Neguinho gritou "o povo
está feliz" e "a esperança venceu o medo", dessa vez ele
grita "é o povo no poder", em alusão à letra do
samba e à eleição de Luis Inácio Lula da
Silva para presidente, como havia acontecido vinte anos antes. Trata-se
de mais um samba valente, de letra forte, que subiu de tom em seu
início para adequar enunciado e enunciação. Assim
como Belo em 1999, Ludmilla faz bonito em seu dueto com Neguinho. O
samba é um dos destaques da safra. Nota: 10
Viradouro:
Após o polêmico samba-carta, que dividiu opiniões e
não rendeu o esperado na avenida, a vermelha e branca de
Niterói vem com um samba inponente, gostoso de ouvir, e que
remete a obras da escola no final da década de 1990 e
início da década de 2000, seu auge. A história de
Rosa Courá é brilhantemente retratada, sobretudo no
emocionante trecho que começa em "A voz que cobre o cruzeiro
reluz sobre nós" e vai até "Eu sou a santa que o povo
aclamou". Importante ressaltar que a disputa de samba foi apertada,
porque tinha outras boas obras no concurso. Havia também a
preocupação quanto à interpretação
de Zé Paulo Sierra, já que a versão concorrente
foi gravada por cantores de timbres diferentes, mas o samba casou bem
na voz do intérprete oficial da escola, muito em parte pelas
adaptações que ele mesmo fez. Nota: 10
Vila Isabel:
Enredos de Paulo Barros, como já dito em outras ocasiões,
raramente costumam redundar em bons sambas. E esse, infelizmente,
não é diferente. Numa disputa da qual o
campeoníssimo André Diniz abriu mão de participar
para não competir com o amigo Martinho da Vila, que
também não levou, venceu um samba que começa com
um refrão pobre, da manjadíssima rima de Vila Isabel com
Noel, e mantém o nível ao longo da letra. A melodia
morna segue o padrão. A Vila Isabel, que havia interrompido uma
sequência de sambas regulares e ruins em 2022, na homenagem ao
próprio Martinho, deixa a desejar em 2023. Nota: 9.7
Portela: A
Majestade do Samba merecia um hino de muito mais qualidade no ano de
seu centenário. Sobretudo se levarmos em conta que, nos
últimos dez anos, a escola gabaritou samba-enredo de 2012 a
2016, em 2019 e 2020. Mais ainda se lembramos que havia pelo menos
três sambas melhores na disputa. O samba de Wanderley
Monteiro não é ruim, mas tem rimas fracas, previsiveis, e
num determinado ponto se torna uma colcha de retalhos de antigos sambas
e desfiles portelenses. Destaque para Gilsinho, que mais uma vez faz o
samba crescer na gravação oficial, e para a primeira
participação de Tia Surica, que já foi
intérprete oficial da Portela, numa faixa da escola. Nota: 9.8
Salgueiro: Assim
como a Portela, a Academia decepciona na safra de 2023. Isso já
havia acontecido com ambas no ano anterior, verdade seja dita. O samba
da vermelho e branca, além de politicamente correto demais para
o enredo, não empolga em momento nenhum, nem mesmo quando tenta
assumir um pretenso tom reivindicatório. A letra é pobre,
com rimas igualmente fracas e previsíveis, sobretudo nos dois
refrões. Destaque positivo para a homenagem que Emerson Dias faz
ao companheiro Quinho, afastado do carro de som da escola por motivos
de saúde . Nota: 9.7
Mangueira:
O samba da verde e rosa é outro destaque da safra. Tão
decantada em terceira pessoa no seu cancioneiro, dessa vez é a
escola que fala de si, o que se torna mais claro no verso "sou eu,
Mangueira, a flecha da evolução". Esse verso é
precedido por outro diferente (que não traz o nome da escola),
expediente parecido ao que é usado em "com ganzás e
xequerês, cantei o meu país". Mas o grande destaque do
samba é o pré-refrão "Epahei, Oyá! Epahei,
Mainha! Quando o verde encontra o rosa, toda preta é rainha".
Trata-se de um samba de letra e melodia diferenciadas, que foge ao
padrão 8-4-8-4 e que tem tudo para embalar um bom desfile da
Estação Primeira. A participação de
Margareth Menezes é a cereja do bolo. Nota: 10
Mocidade:
Com o perdão da piadinha infame, o samba que marca a estreia de
Nino do Milênio na escola de Padre Miguel é uma parte da
safra de 2023 que não emociona. A letra é bonita, mas a
melodia muito arrastada, o que preocupa se levarmos em conta que a
escola perdeu ponto em bateria em 2020, e em samba-enredo em 2022,
justamente por questões de andamento. Aguardemos o resultado nos
ensaios técnicos e na avenida, mas é sempre bom lembrar
que a nota aqui é para a gravação. Nota: 9.8
Tijuca:
Depois de colocar o sarrafo lá em cima com o injustiçado
Erê, a escola do Borel vem com um samba mediano, sobre a
Baía de Todos os Santos, 31 anos após homenagear outra
baia, a de Guanabara. Verdade seja dita, é um dos sambas que
mais cresceu em relação à versão
concorrente, e muito disso se deve ao entrosamento entre Wantur e
Wictória, pai e filha, respectivamente, pelo segundo ano
consecutivo. Está longe de ser um dos melhores da safra, mas
é um samba gostoso de se ouvir. Nota: 9.9
Imperatriz:
Outro destaque positivo da safra, sobretudo por tratar-se de um samba
cuja linha melódica tem o mérito de fugir do lugar comum,
e de não se descaracterizar quando introduz elementos de
cordel, como já aconteceu em sambas de outras escolas. Destaque
para as modulações efetuadas por Pitty de Menezes, que
faz sua estreia no Grupo Especial e promete ser
revelação. Em tempo: qualquer semelhança entre
Lampião e um certo capitão do qual nem Deus nem o diabo
querem mais saber não é mera coincidência. Nota:
9.9
Tuiuti:
A escola de São Cristóvão traz mais um bom samba.
A repetição do expediente de encomenda, do qual a escola
lança mão ininterruptamente desde 2018, deixa, todavia,
uma inevitável sensação de que já escutamos
algo parecido pelo menos uma vez. O refrão principal, que rima
"mocangueiro" com "mandingueiro" e "careta" com "cara preta",
também não é exatamente um primor. Wander Pires se
destaca na gravação. A ver como será na avenida.
Nota: 9.9
Império Serrano:
Samba em forma de acróstico, com o nome completo do homenageado
(Arlindo Domingos da Cruz Filho) formado pelas iniciais de cada verso,
o hino da verde e branca da Serrinha, que retorna ao Grupo Especial,
tem aí seu ponto forte e fraco. Forte pela originalidade. Fraco
porque alterna versos gigantescos com outros de apenas duas palavras.
Nada disso, porém, tira o brilho da obra. As mudanças em
relação à versão concorrente,
principalmente a "enxugada" no refrão principal, facilitaram o
canto. Além disso, emociona por ser um samba de grandes
compositores e amigos de Arlindo, que com certeza também o
assinaria. Nota: 9.9
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