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Os sambas de 2020 - São Paulo por Bruno Malta
Pelo
quinto ano seguido, analiso os sambas de enredo do Carnaval Paulistano para o
Sambario. Mais uma vez, agradeço o convite do Marco Maciel, editor chefe do
site. É importante destacar o crédito que o Marco novamente deposita em mim.
Sem mais delongas, vamos analisar os sambas que desfilarão no Anhembi no
Carnaval de 2020. As avaliações do texto abaixo em nada
têm relação com os critérios de julgamento utilizados pela Liga-SP e nem
relação com o julgamento oficial. Gravação do CD: Nesse ano, achei a gravação bem
feita. Pelo terceiro ano, nesse formato ao vivo, acredito que a produção
acertou o projeto e agora só precisa de leves ajustes para ficar tinindo. As
baterias, finalmente, tiveram um destaque adequado. Nada de muito show, muita
bossa, mas também nada de passada reta. Brilho adequado, com cara de
apresentação curta, como se vê na festa de lançamento do CD. Gostei também que
diminuíram os discursos, embora alguns ainda aconteçam – de maneira
surpreendente, temos ótimas surpresas nesse sentido – e que os intérpretes, em
sua maioria, gravaram muito bem. Acho que o tempo de 5:37 como limite ainda é
um atraso, mas a evolução é notória. Nota: 9,9. Mancha Verde: “Perdoa se algo te fiz, me
abraça e vem ser feliz” – Defendendo o
título de campeã do Carnaval, a Mancha Verde traz um samba adequado, mas de
pouco brilho nesse CD. Se o leitor ouvir o CD com atenção, vai perceber que a
trilha sonora da alviverde campeã em 2019 é feita irrestritamente para passar
pelo Anhembi com correção. Com versos com perfil autoajuda “É hora de darmos
as mãos, cumprir a nossa missão” e “nunca perca a esperança”, a
canção não se destaca na safra. Em mesma medida, a melodia de intenso
ritmo e sem nenhum grande destaque também não faz a composição se destacar e
cativar a audição de quem escuta o samba. Ademais, destaco negativamente, o
péssimo verso “quero me deitar em verdes campos” que abre a segunda
estrofe. A menção positiva é o refrão principal que mesmo óbvio, anima o
componente e deve funcionar muito bem. Freddy Vianna e a bateria Puro Balanço
tiveram um desempenho de alto nível na gravação. Nota: 9,7. Dragões da Real: “Solte a voz e vamos rir de
nós” – Talvez um dos sambas mais
despretensiosos do ano. Leve, divertido e até raso, por isso. De qualquer
forma, é uma faixa com uma cara clara, o que já é um ponto positivo em meio a
tanta coisa igual no Carnaval de São Paulo. A Dragões que há anos repete como
mantra ser a “escola mais feliz do Carnaval” pegou um enredo e um samba que
deixam a vertente mais viva do que nunca. Tudo muito bom, tudo muito bem, menos
por um ponto. A letra do samba. A melodia da obra passa bem, apesar de nas
estrofes dever bastante em relação aos refrães. Mesmo assim, é balanceada e tem
variações interessantíssimas, especialmente na segunda estrofe. O ponto
negativo é mesmo a letra. A letra em si, nem é ruim. Mas falta profundidade,
falta tocar mais o coração de quem escuta. Tudo é muito leve e, por tabela,
raso. Alguns versos como “A festa não tem hora pra acabar” só parecem
estar ali para fechar a métrica. Numa visão geral, acho que o samba passa bem a
mensagem, mas fica devendo um pouco na média da safra. Gostei da gravação do
Renê Sobral que soube entrar no espírito do tema. Nota: 9,6. Rosas de Ouro: “A
nossa relação, não importa a geração, renascerá!” – Certamente, o samba que
mais me emociona no ano. De um enredo criticado, injustamente, por muitos, para
um dos sambas mais tocantes do ano. Humano, sensível e conectado com o
componente da azul e rosa, o samba é um dos destaques da safra. A letra da
trilha é uma daquelas que você para, lê e entende como o Carnaval é um
mensageiro de histórias surpreendentes. Advindo de um tema sobre a relação do
homem com a modernidade, a obra parte do ponto de vista de uma modernidade
humanizada que também não sabe o seu futuro e que sente a necessidade de
valorizar sua relação com o homem. Com versos lindos como “Feito criança,
vou sorrir ou chorar” e “chegou a hora de rasgar o manual”,
o brilhantismo
se mantém em quase todo samba. Os versos finais da segunda
estrofe exaltando a
relação com a Roseira e valorizando sua presença
constante em diferentes
gerações – como a modernidade – são os
mais bacanas do ano no Grupo Especial.
Ademais, a melodia, como já é costume nessa parceria,
resgata o jeito antigo de
fazer samba em São Paulo e combina constância com
variações espetaculares como
na preparação para o refrão principal. O
único lamento nessa ótima composição
é
que sinto um encaixe melhor na transição para a mensagem
de exaltação a escola.
Se não fosse isso, seria 10. Royce do
Cavaco, mais uma vez, fez uma gravação de exímia categoria. Nota: 9,9. Unidos de Vila Maria: “Por tuas glórias, meu canto
ecoou”. – Pelo terceiro ano seguido, a Vila Maria apostou num enredo sobre
um país. Dessa vez, o escolhido é a China e uma vez mais, a escola optou por
uma homenagem mais disfarçada, digamos assim. A escola quis contar a trajetória
do país tentando criar uma história um pouco menos propagandista e mais
cultural. Parece que o comentário repete o mesmo início do ano passado, mas é
diferente. É mais ou menos como me sinto ouvindo o samba da Vila Maria nesse
ano. A obra vai pelo caminho de criar
cenários de uma China riquíssima culturalmente, mas acaba apelando para o óbvio
caminho da propaganda, como no ano passado, na segunda estrofe. A letra, por
exemplo, tem versos surrealistas como “É
fascinante, sonho real, que retrata esse país continental” e “Desperta a potência e a bonança” que
vendem a ideia quase de uma China perfeita. Com uma letra problemática pelo
perfil adotado no enredo, a melodia tenta dar uma cara alegre ao samba e
consegue, especialmente na subida pro refrão. A célula melódica do “Xiê Xiê! A Vila Maria vem agradecer” é
uma das mais criativas do ano e consegue trazer um leve brilho para a trilha.
Com um samba desnivelado em letra e melodia e um enredo de cunho duvidoso, a
escola do Jardim Japão tem como grande destaque na faixa, o ótimo desempenho do
espetacular Wander Pires. Com um show particular, o cantor fez a melhor
gravação do grupo e deu um belo upgrade para a obra, valorizando os trechos de
maior inspiração. Nota: 9,6. Império de Casa Verde: “Tantas emoções ao
lutar, pra te defender, por te amar” – Homenageando o Líbano, a Império de Casa Verde traz um samba funcional
para o Anhembi em 2020. Sem ser brilhante, a obra aposta em soluções “de
sempre”, mas “funcionais” para ter um bom desempenho na pista. Se no ano
passado, a obra da escola ousava em melodia, nesse ano, optou-se por um caminho
mais seguro com células melódicas que garantem funcionalidade para o canto. O
início da primeira estrofe, certamente, vai remeter a outros sambas que já
passaram pelo Anhembi nos ouvidos mais aguçados. O refrão central, por exemplo,
aposta em rimas óbvia, mas que fortalecem a identificação do componente com o
tema. Por fim, o refrão principal também é mais um daqueles que sempre remetem
a outros sambas, especialmente ao último verso “são duas bandeiras, um só
coração” que recentemente tiveram versões semelhantes em Vila Maria (2019)
e Tom Maior (2018). Com esse cenário, acredito que a obra passe a mensagem com
correção, mas sem brilho, tanto em letra, quanto em melodia. É um samba que
deve funcionar a contento, mas não deixará grandes marcas para o futuro. Carlos
Júnior, como sempre, fez ótima gravação. Nota: 9,7. Águia de Ouro: “É nova era, o futuro começou”
– Com um enredo sobre a sabedoria, a
escola da Pompeia aposta numa obra forte, valente e cheia de clichês em vários
aspectos. O refrão principal segue o padrão óbvio de exaltação da comunidade e
da realização de um sonho (o título inédito, no caso do Águia) na letra.
Melodicamente, também não foge muito de tudo isso. As células melódicas da obra
sempre causam enorme sensação de dejavu no ouvinte, principalmente no refrão.
Posto isso e retomando a análise da letra, vemos um samba cheio de frases
feitas “Brincar de Deus, recriar a vida” para definir conceitos de
sabedoria no refrão de meio, o que, novamente, já vimos em tantos outros sambas
(Mocidade Alegre 2013, Gaviões da Fiel 2016). O que ajuda no canto da obra para
os componentes são os previsíveis versos finais que exaltam a paixão pela escola
“Águia...razão do meu viver, berço que Deus abençoou, nada se compara a esse
amor” que fortalecem a conexão entre a escola e seu apaixonado. Com uma
obra cheia de poréns, mas forte de canto, o Águia é mais uma faixa que apenas
compõe o CD de São Paulo. A dupla de cantores Douglinhas e Tinga teve
entrosamento considerável na gravação e agregou ao samba. Nota: 9,6. Acadêmicos do Tatuapé: “É Atibaia...nos braços do povo a cantar”
– Talvez o mais insólito enredo do ano. Depois do bicampeonato e o sétimo lugar
pra lá de decepcionante em 2019, o Tatuapé resolveu apostar numa homenagem a
cidade de Atiabia para disputar o título. O samba, na mesma linha, é bem
diferente do que a escola vinha apresentando, mas não é dos piores. De cara, a
obra estranha um pouco do ouvinte mais atento, mas a cada audição, fica mais
gostosa e passa com razoável tranquilidade. A letra, obviamente, é bastante
clichê e segue padrões comuns para o estilo de tema. Em vários momentos,
sentimos que qualquer cidade poderia estar no lugar da escolhida. Versos como “Um
violeiro que seguiu em romaria” e “Trago no peito, essa tradição”
também cabem em diversos enredos. Por fim, a letra também apela para um verso
conhecidíssimo (“Levante, sacode a poeira”) em outros sambas e que é
sempre utilizado em qualquer adversidade no refrão principal. Com tanta
obviedade na letra, o destaque maior fica pela beleza da melodia que conquista
em cada audição. Gosto muito das variações nas estrofes, especialmente na
virada da segunda estrofe saindo do verso “Do alto da pedra, obra divina do
meu criador” para “É Carnaval” que traz um brilho e frescor
essenciais para fechar a trilha em alto astral convidando para o canto forte no
refrão principal. Celsinho, com auxílio luxuoso (e costumeiro) de Lêci Brandão,
faz excepcional gravação se consolidando como um dos melhores intérpretes da
atualidade. Nota: 9,7. Mocidade Alegre: “Carregada
de axé, nossa Morada renascerá” – Depois
de amargar a pior posição desde 2002, a Morada do Samba resolveu resgatar as
raízes africanas que a consagraram em diversos Carnavais para “renascer” para a
disputa do título. O samba vai muito bem, obrigado. Seguindo o padrão
consolidado da escola de letra clara e melodia que busca o impacto no refrão
principal, a obra conquistou a escola e boa parte da comunidade sambista. O
enredo convoca as Yabás (orixás femininas) a juntas construírem um novo mundo
(uma nova Morada, segundo o título do tema) e o samba segue isso claramente. A
obra opta por uma letra que traça o tema através da ligação de suas
protagonistas. Versos “Como Yaô...bela menina...yaô (ôô), a esperança”
já são seguidos de “entregue nos braços de Iemanjá” mostrando a conexão
entre elas. Melodicamente, há uma fuga dos padrões – especialmente pelo formato
da gravação – que é louvável. Vemos claramente vários pequenos trechos
melódicos que juntos tentam formar uma unidade pouco incômoda. Confesso que
gostei do resultado, especialmente por em todos os momentos, as células
melódicas respeitarem os momentos distintos da letra e, consequentemente, do
tema. O único senão – nem sei se dá pra chamar assim – é o batido verso “Lá
vêm elas...” que além de fazer uma menção um tanto forçada com o hino da
agremiação, também ocasiona no trecho de menor impacto na segunda estrofe. Tudo
isso é compensado pelo ótimo final, mas mesmo assim, é um ponto negativo. Igor
Sorriso retomou seu alto nível de sempre e gravou com extrema competência.
Nota: 9,9. Gaviões da Fiel: “E se eu
enlouquecer, será de tanto amar” –
Comemorando seu cinquentenário, os Gaviões da Fiel buscam quebrar um jejum
amargo de mais de dezesseis anos sem conquistar o título do Grupo Especial e
para isso contrataram o experiente carnavalesco Paulo Barros. Paulo, aliás, é
conhecido por trazer muito impacto visual e pouco impacto musical em suas
aventuras e confirma a tese nos Gaviões. A obra da alvinegra não é das mais
gloriosas da história da escola. Apesar disso, o samba não é horrível e nem
nada parecido de ruim como tenta mostrar uma parte da comunidade sambista. Com
versos interessantes como “Quantos sentimentos me levam à luta por um ideal”
que traça um paralelo interessante entre o enredo (sobre o amor) e a história
da escola que completou, no último mês de Julho, 50 anos, a obra da escola passa
com razoável qualidade no CD. Mais um ponto positivo da letra é o fim da
segunda estrofe que traz ótimos versos como “sou o canto que ecoa pelo ar e
se eu enlouquecer será de tanto amar” que faz ótima referência ao “bando
de loucos”. Apesar disso, por motivos óbvios, há pontos negativos como os
óbvios “vai se arrepiar, abra seu coração” e “vem se apaixonar,
explodir de emoção” que aparecem no refrão principal e causam enorme
sensação de “já ouvi isso”. Melodicamente, a obra recorre uma receita interessante.
Mesmo com vários trechos que já ouvimos em sambas dos mesmos autores em outros
anos e outras escolas, a unidade é cativante e passa com correção. Gosto
bastante da célula melódica inserida no começo da primeira estrofe no “o que
é esse aperto no peito?” que é convidativa para o canto. Ernesto Teixeira,
para comprovar sua capacidade, é a grande notícia da faixa com um desempenho
brilhante. Nota: 9,7. X-9
Paulistana: “A Zona
Norte desfila e emociona outra vez” – Com um belo enredo que propõe
uma viagem sobre as festas brasileiras terminando na coroação do samba e do
Carnaval, a X-9 traz mais um samba de boa qualidade. A obra que na versão
original era ligeiramente melhor do que a versão final mantém um padrão de
melodia distinto do que vemos em São Paulo. Com um toque carioca, há variações
claramente diferentes do costumeiro na cidade. Os versos “No Ticumi, no Catopês, Pandeiros, Ganzás, Xequerés” elevam o tom do
samba, mas de uma forma mais trabalhada, pensando em cada palavra escolhida,
diferentemente do que é normalmente visto por aqui. Sem entrar em juízo de
valor, mas apenas mostra que até para fortalecer o refrão principal, nem sempre
a explosão pode vir apenas com uma melodia reta que só tem como função preparar
o destaque do que vem a seguir. Posto isso, gosto também da proposta melódica
do refrão central que busca também fugir do lugar-comum com uma variação que já
deságua diretamente na estrofe seguinte. É uma iniciativa válida que já tinha
sido usada por integrantes da parceria no samba do Colorado do Brás em 2019.
Apesar da boa melodia, acredito que a obra ficou devendo em letra. Em alguns
pontos, especialmente na segunda estrofe, há uma série de elementos apenas
listados que não conversam entre si. Além dos versos mencionados acima, temos “Maracatus, Caboclinhos” e “Festa do Divino e São João” como
exemplos dessa tentativa. Portanto, mesmo com uma proposta ousada e diferente,
acredito que a trilha da escola da Parada Inglesa poderia ter sido mais bem
trabalhada para ter (ainda) mais destaque dentro da safra. De toda forma, belo
samba. Gostei do Pê Santana que mesmo sem brilhar, não comprometeu a faixa.
Nota: 9,8. Colorado
do Brás: “O
sonho só começou...meu povo querendo mais” – Após conseguir
permanecer no Grupo Especial, o Colorado do Brás apostou num enredo sobre Dom
Sebastião para alcançar novos objetivos. Em termos de resultado musical, a
escola ficou devendo. O samba da vermelho e branco é bastante aquém ao de 2019.
Em termos de letra, me incomoda a construtiva narrativa que aposta em Dom
Sebastião contando sua história e, no fim, o associa diretamente na escola que
o homenageia, o que, convenhamos, é bem forçado. Além disso, os versos do
refrão central também são insólitos. “Pode
acreditar...louco eu não sou, missionário sonhador, marejado na retina,
consagrado...luz divina, abençoado...fiel desbravador” não conversam entre
si e nem conversam com as estrofes (“A
coroa me fez Dom Sebastião” e “Lá no
Marrocos segui a minha missão”). Além da questão da letra, a melodia tem
algumas variações incômodas. No verso “No
clamor desejado, capitão de Deus”, a nova construção melódica quebra a
construção anterior e não causa unidade, o que prejudica o canto e a riqueza.
Já na segunda estrofe, o verso “Mas, a
realidade é que sempre estive aqui” também provoca a mesma sensação, o que,
definitivamente, prejudica a melodia como um todo. Chitão Martins fez,
certamente, a melhor gravação da carreira e brilhou na faixa, mesmo com os
problemas da obra. Gostei muito. Nota: 9,5. Tom
Maior: “É coisa de pele, é
coisa de Preto” – Após o ótimo resultado em 2018 e a decepção em 2019, a Tom Maior
manteve o bom carnavalesco André Marins que apostou num tema pertinente e atual
para a escola. Mostrando as conquistas dos negros e sua importância na história
da humanidade, a escola traz uma bela mensagem traduzida num bom samba. O
início do samba já mostra as cartas do enredo mandando recado ao país. Com um
forte “Brasil, não vim pra ser escravo
nem servil”, a letra já começa com força. Além desse verso, gosto bastante
do verso “O meu talento é mais que samba
e Carnaval” que traz bem o espírito do enredo. O ponto que me incomoda,
apesar disso, é a repetição da ideia inicial de citação ao país no “Oh, meu país que tanto sustentei em meus
braços” que, no fim das contas, fica sem função no verso que poderia ficar
só com a parte final sem problemas ou com alguma outra questão. Apesar disso, a
letra tem outros momentos interessantíssimos como na segunda estrofe que cita “Liberdade... fazer da resistência, uma nova
verdade" que demonstra que a luta dos negros agora é mais do que pela
liberdade e, sim, pela resistência em manter suas origens preservadas.
Melodicamente, a obra, assim como a dos Gaviões da Fiel de mesmos autores, tem
trechos recuperados de outras composições, mas nada que abale a beleza do
samba. A unidade da melodia é respeitada em todo o tempo e transforma a audição
numa boa pedida do CD. Bruno Ribas gravou bem, especialmente na segunda
passada, e respeitou a identidade do samba. Nota: 9,9. Pérola
Negra: “A estrela da sorte é a
luz que me guia” - Retornando a elite do Carnaval de São Paulo, a Joia Rara do Samba
traz um bom samba para 2020. A composição tem uma letra bem feita e que abusa
de clichês de forma bem sucedida. Gosto muito da narrativa da primeira estrofe
que mostra bem a luta cigana. Os principais versos nesse sentido são “a esperança sempre foi motivação” e “levo na bagagem o talento que condena a
inquisição”. Melodicamente, o trecho se destaca pela constância e pelo
desenvolvimento mais seguro e sem tantas ousadias. A ousadia melódica fica pelo
refrão central que aposta em células que remetem a parte espanhola do tema
sobre os ciganos. O resultado é interessante, mas há pequenos poréns, especialmente
pela pobreza da letra no trecho. Na segunda estrofe, gosto da construção da
letra, mas acho que há um escorregão na repetição no fim da estrofe com versos
seguidos com início “Olhai por nós”.
Nessa parte, penso que a obra acabou tentando mais um passo ousado sem tanta
segurança e não foi feliz. Apesar de tudo isso, o final é embalado com um bom
refrão que consegue traduzir bem o espírito do tema tocando o coração do
apaixonado pela escola da Vila Madalena. No todo, um belo samba que poderia ser
ainda melhor. Daniel Collête gravou bem e passou mais qualidade ao samba. Nota:
9,8. Barroca Zona Sul: “Nossa força, nossa luta, de tantas Terezas por aí” – Tecnicamente, é possível que o samba seja o melhor do ano no grupo. Oriundo de um justo enredo sobre Tereza de Benguela, a obra segue a risca o padrão afro de composição e traz um feliz resultado para a verde e rosa. A letra é bem forte em vários momentos. Gosto muito dos versos “um sentimento, valentia quilombola” e “reluz o ouro que brota em seu chão” que remetem ao perfil guerreiro da homenageada. No refrão central, mais uma vez, esse estilo é novamente visto no verso “o meu grito de guerra é por libertação”. Além da força da letra que traz esse perfil valente, a melodia também segue um padrão de força claro com variações interessantes. Na segunda estrofe, vemos uma exaltação maior dos feitos de Tereza. Versos como “A coragem vem da alma de quem ergueu o parlamento” demonstram passagens da vida da homenageada. No fim, um ótimo trio de versos prepara muito bem para o refrão principal. Os versos “E a pele negra faz a gente refletir, nossa força, nossa luta, de Tantas Terezas por aí” fecham muito bem a estrofe e deságuam muito bem no refrão que começa muito bem e comete o único deslize do samba no redundante verso “Luz que vem do céu...clareia”. De qualquer forma, é impossível negar a força do ótimo samba que abrirá os desfiles do Anhembi. No que depender da trilha musical, o início será bem agradável. Pixulé é mais um destaque da safra e brilha na gravação. Nota: 9,9.
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