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Os sambas de 2014 por Marco Maciel
As avaliações e notas referidas apresentam critérios distintos dos utilizados pelo júri oficial, em nada relacionados aos referidos desempenhos que as obras virão a ter no desfile A
GRAVAÇÃO DO CD - Todo ano, a
produção dos CDs dos sambas-enredo tenta inovar em alguma
coisa,
trazer uma grande novidade para os simpatizantes de Carnaval. Já
foi anúncio das escolas pelo saudoso Demétrio Costa, por
Jorge
Perlingeiro, gravação sem bateria na primeira passada,
intérprete chamando o outro no fim da faixa ("Faz barulho
pro Wantuir"), introdução à la Rei Leão
(Porto da Pedra
2007)... Mas, para 2014, Laíla e companhia se superaram.
Colocaram explanações dos carnavalescos no começo
das faixas,
com estes resumindo, por cerca de 30 segundos, o enredo que será
apresentado. No começo dos anos 90, um resumo dos enredos vinha
por escrito no encarte dos álbuns de samba-enredo. Iniciativa
louvável, mas que foi abandonada com o tempo. Obviamente, seria
muito mais coerente se as explanações viessem nos
encartes, e
não na abertura das faixas de áudio. Vamos supor que os
sambas-enredo
serão tocados numa festa, em alguma balada. Aí
começa com
carnavalesco falando por intermináveis segundos. Tira por
completo o clima! Sobre o que interessa mesmo, que são os
sambas,
pelo quinto ano seguido as bases foram produzidas na Cidade do
Samba. São poucas as mudanças em relação
aos álbuns
anteriores. Se for apontar uma diferença, talvez seja o CD com
mais clima de "ao vivo" desde o de 2011, através de
uma força maior dada aos corais. Na safra, três sambas se
destacam: Salgueiro, Portela e Mocidade. Entre as
atuações,
destaque absoluto para Luizito na Mangueira. NOTA DA
GRAVAÇÃO:
9 (Marco Maciel).
1 - VILA ISABEL - "O coração vem na marcação". A atual campeã do Carnaval Carioca abre o CD com um belo samba, porém um tanto subestimado em virtude do sucesso arrebatador do "Festa no Arraiá" no ano anterior. Mas a obra reúne as características valentes que ditam o ritmo das composições de André Diniz e parceiros, em especial nos refrões fortíssimos, que mexem com os brios do torcedor da Vila. Os trechos finais da primeira parte também se destacam melodicamente, além de não faltar nestes um interessante jogo de palavras com "sertão/ser tão". Como se trata de um enredo complexo, a letra se concentra em citações na segunda parte. No disco, o andamento da bateria está um pouco mais acelerado. A curiosidade fica por conta da explanação do enredo por parte de Cid Carvalho, carnavalesco que deixou a Vila antes do lançamento do álbum. NOTA DO SAMBA: 9,4 (Marco Maciel). 2 - BEIJA-FLOR - "Boni, tu és o astro da televisão". Talvez o samba que mais tenha gerado repercussões após a escolha, tanto pelo enredo contestado como pelas bruscas mudanças promovidas por Laíla após a escolha, através do corte do refrão principal, medida que pessoalmente não me agradou. Melodicamente, é uma obra muito qualificada. Na gravação, o andamento ficou bem para trás pra valorizar sua dolência. O "clareou" do segundo refrão, além de representar o fato da escola desfilar no amanhecer, pode significar uma relação com Santa Clara, padroeira da televisão. A respeito da letra, alguns trechos são de gosto bem duvidoso, como "sonhar, o sonho de um sonhador", "um lado a comunicar, o outro comunicou" e, obviamente, "mostra que babado é esse de samba no pé", que o homenageado Boni jura de pés juntos que a expressão "babado" é utilizada com frequência por ele. Versões à parte, um outro verso contestado termina por exclamar uma pura verdade: "a marca do Carnaval é ela". Isso desde o lamentável fim da TV Manchete... Plim plim! NOTA DO SAMBA: 8,8 (Marco Maciel). 3 - UNIDOS DA TIJUCA - "Numa corrida maluca repleta de bambas". Com Paulo Barros no comando plástico do Pavão, não há como mudar: o samba seguirá sendo apenas um complemento do desfile. Enquanto os mais diversos automóveis estiverem passando pela pista da Sapucaí, pilotados pelos personagens da Corrida Maluca, Ayrton Senna e Michael Jackson, Tinga entoará mais uma obra funcional, pra cima, cujo melhor momento se encontra disparadamente no refrão do meio, um achado. Bem-humorado e gingado, mistura muito bem o nome da bateria tijucana com o clássico desenho de Hanna-Barbera. Já o restante da obra não chama atenção e peca em letra, principalmente na primeira parte. O trecho "impressionante a ousadia, a internet ultrapassando a energia", por mais que seja paupérrimo poeticamente, tem certa coerência e humor dentro do contexto do enredo. É um samba divertido, porém o mais fraco do ano no Grupo Especial. NOTA DO SAMBA: 8,6 (Marco Maciel). 4 - IMPERATRIZ - "Zico, faz mais um pra gente ver". O Galinho deu samba, apesar das adversidades! Mesmo que o enredo seja distinto da característica gresilense e que temas sobre futebol tradicionalmente não gerem grandes obras. Mas é um hino competente que esbanja valentia, com um refrão principal arrasa-quarteirão, baseado nos cânticos das torcidas. Há quem diga que o "da-lhe, da-lhe, da-lhe ô" faça mais referência ao colorado D'Alessandro, mas... O samba tem ótimos momentos em letra e melodia, em especial no trecho "Fardado nas cores da nação/Armado de raça e paixão/Nos pés, o poder!/Vencer, vencer, vencer!", numa clara menção ao hino do Flamengo. Pra quem considerava o samba diferente do estilo de Wander Pires, o excepcional intérprete responde com uma belíssima e vibrante gravação. No alusivo, canta Elymar Santos, que pela primeira vez sagrou-se vencedor de samba-enredo na escola do coração. NOTA DO SAMBA: 9,4 (Marco Maciel). 5 - SALGUEIRO - "Meu samba vai tocar seu coração". Eis o primeiro candidato ao Estandarte. A Academia aposta numa fórmula ousada e pouco utilizada pelos compositores atuais, que é o recurso do falso refrão. Os últimos seis versos da obra geram um efeito mais do que positivo. A melodia prossegue forte e envolvente, sem cair em nenhum momento, até atingir seu clímax no refrão central que evoca os orixás e remete ao refrão principal de "Candaces" (2007). A segunda parte mantém o excelente nível até chegar à explosão do falso refrão. Possivelmente, é o melhor samba da vermelho-e-branco da Tijuca pós-Ita. Uma obra poderosa que te conquista rapidamente. Grande momento do CD! NOTA DO SAMBA: 9,7 (Marco Maciel). 6 - GRANDE RIO - "O mar quando quebra na areia desliza na beira da praia". Mais uma vez a produção faz da faixa da Grande Rio a mais animada do CD. Trata-se de um bom samba, correto, ainda que enredos CEP tornem inevitáveis os velhos clichês como as citações ao índio, fauna e flora, progresso... Agora sozinho no microfone oficial da agremiação, Émerson Dias conduz com segurança o samba, que tem refrões fortes e vários momentos dolentes, disfarçados pelo andamento acelerado da bateria Invocada. O refrão principal se difere por alternar versos gingados com notas prolongadas, como "Grande Rio vai passaaaaaaaar, o couro vai comeeeer". No CD, destaque pra paradinha na segunda passada. NOTA DO SAMBA: 9,2 (Marco Maciel). 7 - PORTELA - "Lá vem o Rio de terno de linho e chapéu Panamá". Pelo terceiro ano seguido, a Águia apresenta um samba "pagodeado", capitaneado por Luís Carlos Máximo e Toninho Nascimento, que proporcionaram a estrutura diferenciada das duas últimas obras portelenses que resultaram em merecidas notas 50 na apuração. É uma obra impulsionada por seus três refrões, o principal de uma felicidade ímpar. Não só na melodia, mas muitos versos também são inspirados, como "A ilusão é uma atriz se exibindo na praça linda e feliz" e "Meu peito é um porto aberto pra te receber meu bem". É mais um samba daqueles que dá gosto de ouvir, apesar da desnecessária subida de tom no verso "nesse rio que vem, que vai". Mas certamente brigará pelo Estandarte. NOTA DO SAMBA: 9,7 (Marco Maciel). 8 - MANGUEIRA - "Vem ouvir a voz do povo a cantar". Nada contra intérpretes de qualidade como Rixxa, Zé Paulo Sierra, Ciganerey e Agnaldo Amaral. Mas sempre defendi na Mangueira que a única voz da verde-e-rosa tinha que ser Luizito. Um intérprete absolutamente identificado com a escola, que, sem exageros, quase deu a vida pela Mangueira em 2007 ao segurar um desfile inteiro dias depois de ter um princípio de enfarte e contrariando a recomendação dos médicos. Depois de quatro anos dividindo o microfone oficial mangueirense, Luizito volta a comandar o samba de forma soberana. Como forma de agradecimento, brindou os bambas com uma atuação irrepreensível e aguerrida no CD, cantando com fúria e sangue nos olhos. Sem exagero, pode-se considerar a melhor interpretação de um samba-enredo no disco em muitos anos. Luizito fez crescer ainda mais o já qualificado samba da Mangueira. Mais uma obra que tem a cara da escola, valente, de pegada, com refrões fortes e letra objetiva que deixa o enredo bem claro. Talvez o "oba oba" do refrão seja a parte mais duvidosa, mas está bem encaixada no contexto do enredo. NOTA DO SAMBA: 9,4 (Marco Maciel). 9 - UNIÃO DA ILHA - "Ser criança não é brinquedo não". A Ilha vem com um samba dolente, leve, de uma pureza do tamanho de uma infância. É o que o enredo sobre as crianças recomenda mesmo. O refrão principal tem como bandeira a brincadeira com versos da canção "Ciranda, Cirandinha", já o central aparece com uma melodia mais ousada no verso "e pegue na estante um livro fascinante". As partes mais fortes da obra estão no fim da segunda parte. É um samba competente, que Ito Melodia fez crescer bastante no álbum. NOTA DO SAMBA: 9,2 (Marco Maciel). 10 - SÃO CLEMENTE - "É nas vielas que nasce o mais puro samba". É mais uma escola que aposta numa obra com três refrões, em detrimento à pasteurização da estrutura do gênero. O segundo refrão, que antecede o principal (que apenas exalta a agremiação), é a parte mais feliz em termos melódicos. Talvez seja o samba de melhor letra do Grupo Especial, de poesia inspirada em muitos momentos, como "Sem régua, sem esquadro, arquiteto da ilusão, com muita luta construí o nosso chão" e "Gangorra da vida, de que lado está?". O excelente Igor Sorriso opta por uma interpretação mais contida. NOTA DO SAMBA: 9,2 (Marco Maciel). 11 - MOCIDADE - "Levo comigo meu Padim Padre Miguel". O terceiro candidato ao Estandarte é um samba daqueles para incendiar a autoestima do ferido torcedor da verde-e-branco de Padre Miguel. A começar pelo refrão principal, que resgata o samba-exaltação "Cartão de Identidade" no verso "independente na identidade". Já é a injeção de ânimo que os componentes precisam para "virar esse jogo", nas palavras de Dudu Nobre, um dos compositores do samba e que participa da gravação ao lado de Bruno Ribas. Nos primeiros versos, a homenagem ao saudoso carnavalesco tropicalista Fernando Pinto, relembrando carnavais como "Ziriguidum 2001" (1985) e "Tupinicópolis (1987) - que inspirou o titulo "Pernambucópolis" - através do verso "parece que estou sonhando", é emocionante. A excelente melodia em muitos trechos se remete a canções nordestinas, nada mais relativo. O refrão central é daqueles que gruda no ouvido. A segunda parte é a que apresenta o conjunto melódico mais qualificado, difícil selecionar um trecho específico pra destacar. A brincadeira com "Padim Padre Miguel" é criativa, só espero que os jurados não descontem por considerar uma relação com o cearense Padre Cícero. É o melhor samba da Mocidade desde 1999. Que sirva pra reacender a esperança para a virada! NOTA DO SAMBA: 9,7 (Marco Maciel). 12 - IMPÉRIO DA TIJUCA - "O primeiro Império da corte do samba". O aguerrido refrão principal "vai tremer, o chão vai tremer" é o cartão-de-visitas do samba que marca a volta do Imperinho à elite do Carnaval Carioca após 18 anos. Fundado em 1940, o Império se autointitula, com orgulho e criatividade, "o primeiro Império do samba", já que o Império Serrano só apareceria sete anos depois. O samba esbanja valentia, em especial no refrão do meio e na segunda parte, e já é um dos melhores a abrir um desfile de Grupo Especial na Sapucaí. Um dos grandes acontecimentos do álbum é ouvir o ótimo Pixulé pela primeira vez num CD de Grupo Especial. NOTA DO SAMBA: 9,5 (Marco Maciel). |
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