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Os sambas de 2014 - Série A por Marco Maciel

Os sambas de 2014 - Série A por Marco Maciel


As avaliações e notas referidas apresentam critérios distintos dos utilizados pelo júri oficial, em nada relacionados aos referidos desempenhos que as obras virão a ter no desfile

A GRAVAÇÃO DO CD – O estilo de gravação do álbum com os sambas-enredo do Grupo de Acesso, comandada mais uma vez por Leonardo Bessa, é o mesmo de 2013, sem tirar nem por. Arranjos simples, sem floreios e coral de volume mais baixo são os predicados. A única diferença significativa é a produção num único CD, ao invés do álbum duplo do ano anterior. Com o expediente, as 17 faixas tiveram que ser reduzidas para todas caberem num compact disc de 74 minutos, com os sambas tendo duração média de quatro minutos e meio, refletindo no feijão com arroz do intérprete dando o grito de guerra e indo direto pro samba, sem direito a alusivo ou até mesmo às famigeradas explanações de carnavalescos. Pra encaixar no tempo mais enxuto, algumas escolas iniciam os sambas na primeira parte ao invés do refrão principal, além de outros casos privados, como a Inocentes ter sua faixa encerrada antes da repetição do refrão e o Alegria ter apenas uma passada e meia de seu samba reproduzido, com a interrupção no refrão do meio. A respeito da safra, desconsiderando as três reedições, Cubango, Renascer e Estácio de Sá apresentam os melhores sambas do ano na chave. NOTA DO SAMBA: 8,5 (Marco Maciel).

1 – VIRADOURO – “Neste palco o artista quem é? Pode apostar sou eu”. A vermelho-e-branco de Niterói abre o CD exaltando a sua cidade com um samba valente, cuja melodia é fácil de ser assimilada rapidamente, tendendo mais pro lado funcional. Mesmo sendo uma obra muito agradável, é inferior aos últimos sambas apresentados pela agremiação. Estreante na Viradouro, Zé Paulo tem atuação segura. NOTA DO SAMBA: 9,3 (Marco Maciel). 

2 – IMPÉRIO SERRANO – “O reizinho de Madureira chegou”. As características do samba imperiano para 2014, que relaciona os Três Reis Magos à comunidade quilombola de Santa Rita do Bracuí em Angra dos Reis, são similares ao do ano anterior: melodia forte, envolvente, mas que carece de momentos de maior explosão, optando por soluções mais técnicas. O conjunto melódico apresenta momentos felizes, como o começo da segunda parte. O Carnaval imperiano marca o retorno de Clóvis Pê ao Segundo Grupo da Sapucaí, depois de uma passagem consagradora pela Mocidade Alegre em São Paulo. NOTA DO SAMBA: 9,3 (Marco Maciel). 

3 – INOCENTES – “Mulata da Lapa, sua voz encantou”. Fruto de uma fusão construída por Laíla, o samba que exalta a trajetória da soprano Joaquina Lapinha, de carreira exitosa no século XIX, apresenta uma poesia rebuscada que o enredo recomenda, aliada à melodia dolente, mas que em alguns momentos torna-se sonolenta. É um bonito samba, bem defendido por Ciganerey, mas com tendência de arrastamento. NOTA DO SAMBA: 9,3 (Marco Maciel).

4 – ESTÁCIO – “E bota-abaixo, já levantou poeira”. A faixa valeria a pena só pela volta de Dominguinhos do Estácio à escola que leva seu sobrenome artístico. O veterano intérprete faz uma bela parceria com o ótimo Leandro Santos. De todas as 17 faixas do disco, a da Estácio é a que o coral se destaca mais, dando força ao excelente samba, de pegada e que, entre outras belas variações melódicas, apresenta um falso refrão na segunda, referente ao célebre bota-abaixo do prefeito Pereira Passos. Com um enredo parecido com que a Portela vai levar no Grupo Especial, a vermelho-e-branco do Berço do Samba tem um dos melhores sambas do grupo. NOTA DO SAMBA: 9,5 (Marco Maciel).

5 – ROCINHA – “Sorria, você está na Barra da Tijuca”. Encomendado à parceria campeã de 2013, mais uma vez a Borboleta Encantada apresenta um samba funcional que visa apenas ser um elemento do desfile, e novamente com alguns trechos trash, como “Nesta Miami já fiquei lelé da cuca”, pra fechar a rima forçada com “Barra da Tijuca”. Contraste com alguns versos bonitos como “Faz o sol se apaixonar, verde esmeralda na onda a bailar, no espelho d’água o céu quis se olhar”. O aguerrido Leléu mais uma vez faz o samba crescer, mas ainda assim é o mais fraco do grupo. NOTA DO SAMBA: 8,5 (Marco Maciel).

6 – CAPRICHOSOS – “São treze ruas para se encantar”. Uma pena que a azul-e-branco de Pilares tenha modificado o refrão principal, o deixando mais quadrado e pasteurizado em relação ao original “Tem boemia no ar, lalaiá, se a Caprichosos me chamar eu vou...”, que apresentava um falso refrão acompanhado de estribilho, dando um ótimo efeito. Isso tirou boa parte do brilho do bom samba, que tem no refrão do meio e a segunda suas melhores partes. Após dois anos na Inocentes, Thiago Brito está de volta à Caprichosos. NOTA DO SAMBA: 9 (Marco Maciel).

7 – UNIDOS DE PADRE MIGUEL – “Quem sou eu? De onde vim, pra onde vou?”. É um samba de bela melodia, mas que não deixa de ser funcional. Pelas semelhanças com o enredo, a obra lembra o clássico “É Segredo” que deu o título à Unidos da Tijuca em 2010. Possui ótimos refrões, em especial o do meio, este a melhor parte do hino. As demais partes são dolentes, com bons momentos de explosão. Ótima faixa em que Marquinho Art Samba mais uma vez aparece muito bem. NOTA DO SAMBA: 9,4 (Marco Maciel).

8 – RENASCER – “Um samba no pé e uma ideia na cabeça”. Outra agremiação do Acesso que também optou por encomendar sua obra, a Renascer recorreu ao experiente compositor Moacyr Luz que, em parceria com o consagrado Cláudio Russo, teceu um dos melhores do ano no grupo. É um samba que tem uma particularidade: uma estrutura distinta dos demais, com quatro versos colocados depois do refrão principal que se constituem numa ótima transição para o início da primeira parte. Tem excelentes variações melódicas, com muitos trechos classudos e rebuscados que servem de trampolim pra explosão dos belos refrões. Estilo bem diferente dos sambas valentes levados nos carnavais anteriores pela vermelho-e-branco de Jacarepaguá na voz de Rogerinho Renascer. A nova dupla da escola Evandro Malandro e Diego Nicolau apresenta ótima sintonia na faixa. NOTA DO SAMBA: 9,6 (Marco Maciel).

9 – PORTO DA PEDRA – “Toma de assalto o meu coração”. Para homenagear os casais de mestre-sala e porta-bandeira, o Tigre de São Gonçalo traz um samba poético, de melodia dolente, mas que remete ao da Inocentes: em alguns momentos, torna-se chato, carecendo de momentos de explosão. De volta aos carros de som depois de um ano de afastamento, Anderson Paz (de Deus) gravou a obra num tom mais baixo. NOTA DO SAMBA: 9,2 (Marco Maciel).

10 – SANTA CRUZ – “Tão belo verde cinturão”. A vitória de uma parceria formada por jovens talentos do samba é importante para provar que não há uma hierarquia na escola, pra muitos comandada por Fernando de Lima e sua quase centena de vitórias em concursos de samba-enredo, a maioria na verde-e-branco da Zona Oeste. Mas o samba tem suas limitações, muito pelo enredo CEP que torna clichês inevitáveis (pelo menos não rimaram Jundiaí com Sapucaí) e também pelo já tradicional estilo funcionalíssimo levado pela agremiação, não significando assim um acréscimo de qualidade em relação às obras de Fernando. O hino, que no CD ganha muita força na voz do experiente Paulinho Mocidade, é simbólico por provar que, na Santa Cruz, há lugar para a juventude de compositores sim. NOTA DO SAMBA: 8,7 (Marco Maciel).

11 – CUBANGO – “A demanda da Cubango é vencer”. Poucas escolas sabem mandar sambas afro pra avenida como a Acadêmicos do Cubango. Quando é solicitada para a empreitada, nunca decepciona e geralmente coloca a mão no Estandarte do grupo. O que não será diferente em 2014. Melhor do ano no Acesso entre os inéditos, o samba é pesado, em tom menor, com a dolência que o tema recomenda. Marcelo Rodrigues tem boa atuação no CD muito pela beleza da obra. Mas é inegável que o hino possui mais a cara de um Tiãozinho Cruz, o intérprete que melhor canta sambas-enredo da temática e que defendeu obras antológicas da agremiação como em 2005, 2007 e 2008. NOTA DO SAMBA: 9,7 (Marco Maciel).

12 – CURICICA – “E se tem cachaça o povo fica, o povo fica”. Também originário de uma junção, o simpático samba da Curicica sobre a cachaça ganha uma irreverente atuação de Ronaldo Yllê, que no mínimo arranca risadas com seu caco “é coisa de bruxo” na segunda passada. O efeito da repetição do “povo fica” no refrão principal particularmente me agrada, sendo uma solução técnica arriscada, mas ousada, atraindo maiores atenções não só para o trecho como para todo o samba em si. As demais partes dão conta do recado e contribuem para a boa qualidade da faixa. NOTA DO SAMBA: 9,3 (Marco Maciel).

13 – TUIUTI – “Valeu Zumbi, o grito forte dos Palmares”. Primeira das três reedições do CD, não as analisarei com detalhes pelas obras já serem de total conhecimento dos bambas, além de não conceder notas. O único relato é que Daniel Silva tem atuação correta na condução do samba que embalou o primeiro título da Vila Isabel em 1988.

14 – ALEGRIA DA ZONA SUL – “Odoyá, Karoque, Orunmilá”. Uma pena que, pela necessidade das faixas serem mais enxutas devido ao tempo do disco, o bom samba do Alegria é o único em que só uma passada e meia da obra é reproduzida. O refrão principal é a melhor parte do samba que exalta Copacabana, seguindo todo valente, apresentando também um bom refrão do meio, embalado pela forte interpretação de Edmilton di Bem. Na segunda parte, que só é reproduzida na primeira passada, a obra cai um pouco de qualidade. NOTA DO SAMBA: 9,2 (Marco Maciel).

15 – UNIÃO DE JACAREPAGUÁ – “O negro canta, na dança levanta poeira”. Em mais um samba encomendado à Ala de Compositores, a União também apresenta uma obra afro. Esta bem mais leve em relação à Cubango, impulsionada por três refrões e bem interpretada por Tiganá. É um samba simpático e não tão carregado como a maioria dos sambas da temática, sendo apenas mais correto. NOTA DO SAMBA: 9,2 (Marco Maciel).

16 – TRADIÇÃO – “O palpite certo é Beija-Flor”. Como registro por mais uma reedição de sambas dos outros por parte da escola do filho do Natal, a primeira participação num CD de Grupo de Acesso de Neguinho da Beija-Flor, autor do samba da agremiação nilopolitana em 1976 que deu o primeiro título da escola e marcou a estreia do sorridente intérprete na azul-e-branco da Baixada. Neguinho dá um “up” no samba ao lado de Marquinhos Silva. Para efeitos de curiosidade, é a sexta reedição da Tradição nos últimos onze Carnavais, a quarta repetindo enredos de escolas alheias. Ainda mais que dá pra aproveitar o verso “na Tradição do Carnaval”...

17 – EM CIMA DA HORA – “Marcado pela própria natureza”. Segunda faixa seguida representando um samba do Carnaval de 1976. Pela primeira vez, um grupo apresenta dois sambas reeditados de um mesmo ano. No retorno ao Segundo Grupo depois de 13 anos, a azul-e-branco de Cavalcanti não surpreendeu ninguém ao anunciar a reedição de “Os Sertões”, que no meu gosto é o segundo melhor samba-enredo da história (só atrás de “Heróis da Liberdade”). No CD, o samba foi gravado um tom acima pra se adaptar ao estilo atual dos desfiles. Depois de oito desfiles consecutivos na Sereno de Campo Grande, Antônio Carlos aparece muito bem cantando os versos do Mestre Edeor de Paula, fazendo uma ótima dupla com Arthur Franco (ex-Mocidade de Vicente de Carvalho), constituindo numa das melhores atuações do disco e fechando de forma exemplar o álbum.