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Coluna do João Marcos

PAULO BARROS E OS NOVOS CONCEITOS

7 de fevereiro de 2013, nº 54, ano VIII

Fui questionado por uma leitora sobre Paulo Barros – a senhora Renata mandou um e-mail sobre os supostos erros de concepção no enredo da Tijuca sobre a Alemanha. Reclama do Deus Thor, que viria da mitologia nórdica, e de aspectos pontuais, como a menção ao Lego, que é dinamarquês. Por fim, cola reportagem do jornalista Leonardo Bruno, que afirma que o desfile terá um carro sobre o homem na lua, com a justificativa de que o foguete é uma invenção de origem alemã.

Renata e amigos: Paulo Barros tem como proposta a originalidade. E sua originalidade está, justamente, em romper com o padrão tradicional. Ele não segue o roteiro estabelecido – se ele faz uma homenagem ao Gonzagão, ele não começa do nascimento e faz um enredo cronológico. Na verdade, ele segue uma lógica semelhante a de quem usa a internet. Seus desfiles são como entrar num site e sair clicando os hyperlinks e abrindo janelas, dar uma rápida olhada no conteúdo, pescar o que é importante e não se aprofundar. Todos nós já fizemos isso e sabemos que de uma simples pesquisa no Google, podemos sair da represa de Itaipu e chegar a Henrique VIII, conectando idéias de forma menos sistemática, usando uma lógica própria, impulsiva.

No ensaio “O que é Pós-Moderno”, de Jair Ferreira dos Santos, as características da arte pós-moderna são elencadas: comunicação direta, fusão com estética de massa, materiais não artísticos, objetividade, anti-intelectualismo, anti-humanismo, superficialidade, efemeridade. É ou não é Paulo Barros?

Nas faculdades de carnaval, não discutirão o “fenômeno Paulo Barros” como se deveria – são cursos mais direcionados para uma logística de mercado, de produção de profissionais para a confecção de um desfile através da aprendizagem dos processos, dos macetes, etc. A coisa, no entanto, é muito mais profunda. É preciso pensar o carnaval do ponto de vista artístico e é por isso que, ainda hoje, os alunos de Pamplona e oriundos da Escola de Belas Artes têm uma vantagem brutal sobre os demais carnavalescos. Estão preparados para pensar os desfiles dentro de um contexto maior. Paulo Barros, não sei se por intuição ou por conhecimento de artes, conseguiu encontrar uma fórmula que vai de encontro ao que se espera do artista hoje em dia. Por isso, ele é o rei no momento.

E mesmo aqueles que fazem um carnaval com um ar mais tradicional, como o Paulo Menezes, estão passando a utilizar a “lógica hyperlink” em seus desfiles – ou vocês esqueceram que na reedição do “Tititi do Sapoti”, a chegada aos Estados Unidos deu origem a uma série de alas sobre musicais da Broadway?

O povo que vê o desfile cada vez mais se afasta do “todo” em busca do “fragmento”. É o carro do DNA, que vive como uma manifestação com vida própria. Paulo Barros trabalha isso – ele não faz um carro apenas para contar parte do enredo. Ele faz um enredo e amarra suas obras, sendo cada carro um evento em si mesmo.

Se você entra num site sobre a história da Alemanha, terá um link sobre Wagner; Wagner terá um link sobre o ciclo de óperas “O Anel de Nibelungo”, que terá um link sobre o Edda, que terá um link sobre Thor. A conexão está pronta. Estão, faça-se Thor na avenida.

E isto é errado? Não necessariamente. Não existe certo ou errado. Depende da proposta. A internet carnavalesca costuma ter uma tara pelo barroco, pelos desfiles afros, por uma estética mais tradicional, mais luxuosa. Um desfile mais linear. A proposta de Paulo Barros é outra e vem dando certo, caindo no gosto de um público maior.

Pessoalmente, prefiro conexões com um encadeamento lógico um pouco mais consistente e uma maior preocupação com o “todo”, mas me divirto com os desfiles do Barros e acho que o caminho é esse mesmo – cada artista fazendo do seu jeito. Ruim é ver doze escolas iguais na Sapucaí. 

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Análise sobre os sambas de Corumbá, maior carnaval do Centro-Oeste:

ESTAÇÃO PRIMEIRA DO PANTANAL – A melodia empolgante compensa os deslizes da letra. Evidente que falar de um bairro é algo difícil, que a “Maplan” não é uma coisa muito carnavalesca, mas a letra poderia ser mais poética. O diferencial é a melodia: os dois refrões são explosivos e igualmente marcantes, e o samba tem uma pegada guerreira que lembra alguns sambas de São Paulo. É o melhor do acesso. Destaque para a impressionante ‘performance’ de Tiganá, intérprete da União de Jacarepaguá. NOTA: 9,1.

CAPRICHOSOS DE CORUMBÁ – A escola aposta numa marcha com um clima meio nostálgico. Em alguns momentos, a melodia é excessivamente reta. A letra também tem momentos fracos, como no momento “O gato preto foi pra longe”. Melhora um pouco no final, a partir de “Reluz...”, onde o samba ganha um pouco mais de sentimento, principalmente ao invocar São Jorge Guerreiro. Tem potencial de render bem avenida, mas poderia ser melhor trabalhado. NOTA: 7,5.

A PESADA – O samba é muito simpático e tem bons momentos, passa o enredo com clareza e conta com boa interpretação de Pixulé. O grande problema, ao meu ver, é que a melodia tem dois momentos desconjuntados, o primeiro num menor mais pesado, que contrasta com o espírito do enredo, e o outro mais leve, depois de “Diga, Espelho Meu”. Os refrões são interessantes, mas achei que, no do meio, a sacada do compositor acabou não funcionando bem por causa do tamanho dos versos. O destaque maior, pra mim, é a entrada da primeira parte. NOTA: 8,8.

MOCIDADE DE NOVA CORUMBÁ – O enredo super árido sobre a Associação Comercial e Industrial de Corumbá gerou um samba burocrático, descritivo, sem grandes sacadas e com melodia muito reta. É um samba que passa de forma despercebida, sem chamar a atenção. O refrão de cabeça é muito simples e mais parece um "começo de primeira". O pequeno destaque é o refrão do meio, que mesmo assim não tem nada de muito forte, apenas a pequena pausa em ““Ya habibi”... a trabalhar” marcando como algo interessante. Fraco. NOTA: 7,9.

IMPÉRIO DO MORRO – É um samba interessante. Tem diversas variações melódicas bem feitas como o “sou raiz” esticado do refrão de cabeça, que  é um exemplo de como as quebras na linearidade podem enriquecer a melodia de um samba. O refrão do meio também é bom. Mas a sensação que eu tenho é de que o samba é muito grande, que se cortassem dois terços dos versos da segunda parte, a escola poderia ter uma obra bem arrojada e marcante. A segunda faz com que o samba caia bastante em qualidade. Além disso, alguns deslizes de letras, que ficam sem resolução como em “Dando vida a fantasia / Entre fadas e duendes desvendar / Portas de um mundo colorido” – você vê que a idéia não se fecha: desvendar o quê? O portal da imaginação se abre no inicio do samba, depois as portas do mundo colorido também se abrem, repetindo o mesmo recurso poético. É um samba com potencial, mas houve certo desleixo. NOTA: 8,7.

MARQUÊS DE SAPUCAÍ – Samba inocente, com ar nostálgico. Parece que o enredo, que deveria ser simples, a “Carnavalização”, complicou bastante os compositores, que tiveram de unir elementos bem diferentes, Carmem Miranda, Dona Ivone, praia, bola, cerveja, festa de fantasia em bailes da cidade, etc. Na primeira parte, o ar de samba do acesso do Rio do início dos anos 80 da melodia até cai bem. A segunda é que vira uma confusão, com muitos trechos mal resolvidos, melodia sem definição, versos sem rima como em “Com arlequim o palhaço se encontrou”, que fica solto. Tecnicamente, muito fraco, mas a ingenuidade da composição me agrada. NOTA: 7,2.

VILA MAMONA – É, de longe, o melhor samba de Corumbá e um dos melhores do Brasil. A letra é poética e descreve bem o enredo, e a melodia é muito forte, de variações elegantes, fazendo um todo harmônico. Destaque para o refrão do meio, bem melodioso, e o final do samba, que tem uma boa sacada na subida para entrar forte no refrão. A escola volta ao Grupo Especial da cidade em alto estilo, e a faixa conta com a ótima interpretação de Pingo Sargento. NOTA: 9,5.

MAJOR GAMA – O samba é valente e tem momentos bacanas, como a excelente variação melódica do final da primeira para a entrada do refrão do meio, que traz um efeito bem interessante. Mas talvez seja o samba mais desconjuntado da safra. Não gostei do verso do “Cariri, Pageú, Siridó”, que é basicamente o mesmo usado pelo Salgueiro em 1990, inclusive em melodia. O recurso do “Vim” e do “Vi” foi bem usado no inicio da primeira, exceto no verso “E as rezadeiras também vi”, que não produz efeito e deixa o verso sem rima correspondente. Também não gostei da mudança da linha poética em “A chuva que não veio lá do céu / Tudo fez chorar / O nordestino com seu sonho de menino / Que legal / É hoje enredo do meu carnaval”, que faz com que a passagem densa e dramática seja seguidas por um trecho leve e alegre, o que causa estranheza. As esticadas da segunda parte deixam a melodia cansativa, perdendo força. NOTA: 7,1.

ACADÊMICOS DO PANTANAL – Samba bem interpretado por Nino do Milênio, sobre os carnavais anteriores da escola. A melodia é redonda, sem grandes problemas e sem grande diferencial. A letra as vezes deixa a história meio confusa, juntando idéias díspares sem muita lógica. Não faz feio, mas não chama atenção na safra. NOTA: 8,0.

IMPERATRIZ CORUMBAENSE – A melodia é bem feita, mas a letra, sobre uma determinada avenida da cidade, está muito solta, sem começo, meio e fim. E quem não prestar atenção, pode não só se confundir com o enredo, que passa a falar de futebol em boa parte; como pode até mesmo confundir a escola – o verso  “É a Pesada colorindo o alvorecer” está mal contextualizado, causando ambigüidade. É bom, mas parece que os elementos do desfile estão muito jogados. NOTA: 8,1.

Ouça os sambas em:

http://www.diarionline.com.br/index.php?s=pagina&id=27 

Abraços a todos!