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Coluna da Denise

METAMORFOSE AMBULANTE

3 de novembro de 2008, nº 16, ano I

E a cada dia mais sambas para o carnaval de 2009 são escolhidos e, nós, foliões, estamos vivendo aquela fase de escutá-los e repeti-los em exaustão. Enossa opinião oscila conforme os ouvidos, descobrindo nuances desses sambas que nas primeiras passadas não foram percebidas.

 No balanço das ondas
Navegando não imaginava encontrar
O pranto e o riso, paixões mascaradas,
Rosas do mundo pra te encantar
Embala eu babá
Eu vi brilhar, em seu olhar, a devoção
E lá do céu vem o cinzel da perfeição
Faz meu coração com emoção pulsar!
A festa vai começar
Embarque nesse bonde, é Carnaval!
Mistura de raças num só coração
O mar não pode invadir o meu sertão

Não, não estou maluca. Estou extravasando felicidade pela proximidade do carnaval. A partir de agora, a trilha sonora da minha vida é samba-enredo até, pelo menos, o sábado das campeãs.

Gostando ou não, essa é a safra escolhida, e é ela que vai nos embalar nas quadras, nos ensaios, no nosso dia-a-dia.

Não foi fácil fazer avaliações prévias dos sambas do Grupo Especial (ainda mais antes da gravação oficial, dos acertos nas letras etc). Por isso, eu pensei bem se valeria a pena avaliar os sambas do Grupo da Lesga. Mas o site para qual eu escrevo, vive, revive e respira samba-enredo, que é o carro-chefe da nossa folia.

Minha vacilação é porque a minha escola estará presente neste primeiro desfile da Lesga, assim como esteve no primeiro desfile da Liesa. Fica sempre aquela sensação de só ver qualidades na obra de minha escola do coração (o que pode ter lá um fundo de verdade).

É lógico que como clementiana “pretíssima e amarela” (mas amarela que preta, pelo menos até a chegada do verão), eu estarei sempre junto com a minha escola, na alegria e na dor, mas por mais subjetivo que seja o julgamento do samba, aqui, nesta coluna, eu optei por continuar adotando como critério a minha identificação imediata com as obras escolhidas. Até porque muita coisa ainda vai mudar em nossos conceitos, especialmente quando da gravação oficial.

Por exemplo, da coluna passada, onde fiz uma análise preliminar dos sambas do Grupo Especial, em nenhum momento quis classificar os sambas como bons ou ruins, apenas registrar a minha identificação inicial com eles, algumas impressões prévias sofreram modificações, especialmente em relação ao sambas da Vila Isabel, Imperatriz e Grande Rio que, num primeiro momento, não me seduziram e, com o tempo, com muita audição, até pelas reclamações que eu recebi dos torcedores dessas escolas, realmente constatei que mereciam uma melhor análise. Mas nada que modifique substancialmente a minha opinião inicial, a não ser em relação ao samba da Vila Isabel, que teve um ligeiro crescimento no meu conceito, apesar de ainda achar alguns trocadilhos desnecessários.

O samba do Porto da Pedra na voz de Luisinho Andanças também ficou muito legal e desponta como um dos melhores do ano, com certeza (essa é para o tigrão Léo Andrade, pela passagem de seu aniversário. Que Deus lhe permita que o seu amanhã seja só alegria).

Logo, a nossa opinião é mutável. Sábio foi Raul Seixas que exprimiu em uma de suas obras a importância da mudança de conceitos, pois se tudo no mundo evolui, no atual estágio de nossa vida, em que a mídia nos coloca mil novidades em tempo real, porque nossas opiniões deveriam ser estáticas? O que se disse hoje, amanhã é descartável, e assim vamos vivendo e aprendendo nesse mundo globalizado.

Nisso, nós advogados, levamos muita vantagem. Pois sempre enxergamos a realidade fática pela ótica que melhor atenda aos anseios de nossos causas.  E a maturidade, após anos acompanhando carnaval, também nos traz a paciência e a serenidade em relação às críticas e às divergências de opinião, que são saudáveis e devem coexistir em tudo em nossa vida.

 Mas, voltando ao sambas das escolas da Lesga, assim como no Grupo Especial, neste grupo também tem samba reeditado. E eles levam muita vantagem numa análise inicial, pois já conhecidos do grande público, fica difícil não ter uma identificação imediata com eles.

A safra do Grupo A não está melhor que a safra do Especial, como vinha acontecendo nas últimas edições. Aliás, para ambas ficou a sensação que poderiam estar melhores (mais um chavão que se traduz em verdade absoluta que nos acompanha, como exigentes torcedores do carnaval carioca). Mas será que quem acompanha carnaval há menos tempo não achou a safra ótima? Será justo escolhermos algum padrão, ainda mais se baseado no passado, se hoje as coisas estão tão diferentes? Ponto para reflexão.

Para mim, não tenho o mínimo pudor de destacar o samba da São Clemente, que representa bem o enredo, ao estilo da queridíssima escola da Zona Sul. O da Estácio talvez seja o samba mais funcional do carnaval. As duas escolas que abrem o desfile de sábado estão de parabéns e prometem uma abertura do carnaval jamais vista na segunda divisão do carnaval carioca.

A decepção, para mim, ficou com o samba da Caprichosos de Pilares, que tem uma boa sinopse, mas que o samba, na minha opinião, optou por um estilo destoante da proposta inicial.

Mas a sensação que ainda fica, até este momento, é que a luz no fim do túnel ainda vem de Oswaldo Cruz e Madureira. O samba da Portela tem tudo para virar o grande “hit” do próximo carnaval. A cada dia me apaixono mais por este samba, que toca fundo em nossos corações. Imagino como os portelenses devem estar orgulhosos com esta bela obra. E se a proposta é falar de amor, a escola acertou em cheio. Mas se eu for falar da Portela, eu não vou terminar...Então vamos ao que interessa.

Ah, em relação às críticas e às discordâncias dos amantes do carnaval, elas serão sempre bem-vindas. São saudáveis e importantes para o debate. Ninguém precisa concordar com alguém para se ter por esse alguém respeito e admiração.

Se é inevitável, vamos às considerações iniciais acerca dos sambas, lembrando que é “chato chegar a um objetivo num instante”. Por isso, aquilo que é dito aqui pode ser desdito num futuro recente, pois nesse mundo do descartável, vivemos numa era de constante metamorfose ambulante. O ideal é viver um dia de cada vez.

1 – São Clemente

“Domo-a-dor” com esperança.... Um lutador
Tem magia na cartola..... Tem sim senhor!!!
Dou cambalhota, sou um rei no picadeiro
Na corda bamba se equilibra o brasileiro

Aaah, muleque!!! Esse samba da São Clemente é muito bom. Retrata bem o enredo, a letra é muito feliz, até os trocadilhos, aqui, que poderiam restar forçados, foram usados na medida, pois reportam ao cenário do qual vai se desenvolver a trajetória do homenageado. Um painel do circo Brasil que atravessou décadas e que, ainda hoje, é excludente. ESSE É O ESPÍRITO DA MINHA ESCOLA....ESTOU ORGULHOSA E FELIZ POR ESSE ENREDO. Como fui acesa pelo beijo irreverente da São Clemente há três décadas, espero que o samba seja apenas uma preliminar para eu chegar ao clímax na apoteose com o desfile da minha escola.

2 - Estácio

Desbravando esta terra na imensidão
Me pintei com o colorido deste chão
Com a fauna e a flora ergui sua bandeira
Sou a Chita Brasileira

O samba não é nenhuma “tropicália maravilha”, mas aquela bateria da Estácio deixa qualquer samba com gostinho de quero mais. A melodia está legal (o samba está levemente acelerado), a letra tá bacana. É o tipo de samba e enredo que se encaixam como uma luva para a escola. O uso da primeira pessoa também valorizou o samba, pois há uma identificação de cara com o que se está cantando. É simples, linear, descompromissado, objetivo, certeiro, leve, ótimo para desfilar, diria até que o samba é “colorido”. E tem uma pegada muito forte quando do seu retorno. Lembra em muito a fase do Estácio quando por lá passou a Rosa Magalhães. E se plasticamente a escola ousar como sugere os movimentos históricos pincelados pelo enredo, acho que o Morro de São Carlos vai ao delírio (tenho até receio da escola que passar depois, que traz um tema pesado, numa linha totalmente oposta ao da Estácio). Em se tratando de Estácio, o samba cresce muito com a força daquela comunidade maravilhosa. ISSO É CARNAVAL EM SUA ESSÊNCIA MAIS PURA. Adoooooooooooooooooooro.....

3 – Santa Cruz

O tesouro maior da criação
Pede em couro a luz de um guardião
E que a voz da razão ao ressoar
Fale de amor, de dar valor e preservar

O samba é correto. Ficou na medida certa, uma vez que os enredos politicamente corretos geralmente não combinam muito com o carnaval. O refrão do meio é muito bonito. Já o refrão principal não foge dos clichês e nada contribui para o resto do samba. A letra traz muitas frases de conscientização, mas fica o alerta: “correr pelos quintais da Amazônia” soou um pouco demais, mas, em carnaval, tudo é válido.

4 - Império da Tijuca

Poeta no sentido figurado

De uma simplicidade sem igual

Que fascinado simplesmente

Retrata o Nordeste, sua gente

Apesar de não concordar com reedições, o samba tem uma ótima melodia, mas a letra não aborda muita coisa do enredo, o que, para os dias atuais, pode ser prejudicial na avaliação dos julgadores. Mas, tomara que com esse samba o Império da Tijuca consiga se amoldar à tendência de desfile do atual século XXI.

5 – União da Ilha

Sou essa máquina engrenada na folia
Vou levando alegria pro mundo inteiro
Da Terra eu vou céu,
Do céu eu vou pro mar
Num delírio aventureiro!

Esperava mais do samba a ser escolhido. Essa de que o samba respeita o estilo da escola não cola. A Ilha, já tem um tempo, não faz um samba com o qual acostumamos ver ser defendido no seu jeito livre, leve e solto de desfilar. Em relação ao enredo, fica fácil identificar as cidades a serem exploradas, a viagem na literatura (imaginativa), mas não identifiquei no samba o mundo desconhecido que retrata no enredo. De qualquer sorte, esperamos sucesso nessa aventura da Ilha, e que o desembarcar na apoteose da Sapucaí traga aos insulanos a certeza de uma boa viagem no carnaval de 2009.

6 - Renascer

Passo-a-passo caminhei
Pelas estradas da história
E encontrei na trajetória
A essência de viver

A letra é bem mais descritiva que a do samba da Caprichosos e mais poética. A melodia também se aproxima mais de um samba. Falta um pouco de bagagem para a Renascer encurtar a distância que a separa de ser especial. Eu não entendi a proposta do enredo e o samba, apesar de mediano, também não é destaque dessa safra.

7 - Tuiuti

Vou recordar e reviver
Um tempo bom, o croupier
Fantasia é doce magia
Da bombonieré

A sorte está lançada para ver se realmente o Tuiuti dará a volta por cima. De certa forma, a escola aproveitou a oportunidade que lhe foi dada de estar no Acesso A. O tema da escola é interessante, o samba é gostoso de ouvir, mas não tem uma estrutura melódica definida, por vezes remete-nos a melodias de sambas antigos, por outras, segue a tendência atual, incluindo aspectos de marchas.

8 - Inocentes de Belford Roxo

Um sonho idealista
Encantador nacionalista
Exala no ar o perfume da flor
A marca da democracia

Um samba cheio de clichês, com uma melodia razoável. Quem seria o “rei do povo”? Brizola? Menos, né....Ninguém aqui está a negar a importância da trajetória do homenageado, mas o enredo ficou muito panfletário, falando do político e de suas obras, mas faltou pautar o momento histórico da política brasileira. Ademais, o enredo só exalta o idealismo de Brizola, não coloca em prova suas realizações e as conseqüências de sua política, especialmente no Rio. Porém, a escola que já deixou de ser inocente há muito tempo, tem um ideal que precisará de maturação para chegar a um objetivo.

9 – Rocinha

Mas esse ano, não vai ser
Igual aquele que passou
Na quarta-feira de cinzas eu vou
Gritar é campeã com meu amor...

Como a Rocinha foi a última a escolher o samba, de certa forma, ele foi menos escutado que os outros e a primeira impressão não foi muito boa. Pode ser que com mais execução, eu mude de idéia. Mas não sei. A escola tem um enredo tão bonito, que eu esperava um samba mais melódico e poético. O samba tenta uma comunicação imediata com o público (tem uma melodia acelerada, uma letra fácil e direta), mas será que isso é fundamental para que 2009 não seja igual ao ano que passou para a Rocinha? Isso só vamos saber na quarta-feira de cinzas.

10 - Caprichosos

Se está engarrafado, tô nem aí
Tem festa, tem pagode e tititi

Com uma proposta de sinopse mais feliz que a Renascer, a Caprichosos, entretanto, não conseguiu se sobressair tão bem no samba. Apesar de alguns trechos bem irreverentes e engraçados, se depender apenas do samba-enredo, o sinal parece fechado para que a escola de Pilares consiga avançar rumo ao seu intento. Tele-transportar? Achei essa parte meio esquisita, lembrando-me aqueles filminhos B que passavam na Sessão da Tarde. E essa mania que a escola tem de inserir a palavra “especial” em seus sambas, também está ficando um pouco cansativo. Porém, nada ofusca a simpatia da escola e tomara que ela faça um grande desfile.

VALEU, LUIZ CARLOS DA VILA!!!
LUIZ CARLOS DA VILA, VALEU!!!


denisefatima@gmail.com