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Coluna da Denise

TODO MUNDO É JURADO NESTE CARNAVAL

22 de outubro de 2008, nº 15, ano I

Sei que é precoce, mas é inevitável não comentar os sambas escolhidos pelas escolas que farão parte da trilha sonora do carnaval de 2009 do Grupo Especial.

É lógico que atribuir notas aos sambas é complicado. Isso porque todo julgamento é subjetivo, ainda mais em se tratando de escolas de samba. São enredos diferentes, que, de plano, impedem o julgador de colocá-las no mesmo plano para a criação de critérios objetivos.

Dessa forma, o enredo influencia e muito na avaliação dos sambas. Antigamente, o enredo não influenciava tanto. O samba tinha vida própria, era mais fácil julgar esse quesito isolado dos outros.

Há duas décadas, samba bom era aquele que contagiava o público, que atendia ao apelo comercial e do desfile. Isso está cada vez mais difícil e também não serve mais de premissa para a adoção de um critério mais justo.

Na era do descartável, é difícil até fazer uma projeção sobre que samba vai se destacar, se é que algum vai saltar na frente dos outros. Assim, qualquer análise sobre os sambas é a mais pura visão particular de cada pessoa sobre eles.

Sendo assim, a minha visão particular da safra do Grupo Especial de 2009 das aponta o samba da Portela como o melhor. A decepção, para mim, ficou com o samba da Imperatriz. Talvez eu tenha sido exigente com a escola de Ramos, exatamente porque se esperava um samba mais poético e valente para exaltar o cinqüentenário da escola.

É de se acrescentar que a gravação oficial não foi ainda realizada, o que pode mudar a opinião, pois a história recente nos mostra que muitos sambas bons nas eliminatórias, praticamente se encolheram quando da divulgação oficial do CD.

Feita essa breve introdução, vamos ao que interessa: comentar os sambas das escolas do Grupo Especial, pela ordem de minha preferência.

Entretanto, é bom que se diga, primeiramente, que, nada obstante a visão particular desta colunista, devemos exaltar o trabalho dos compositores vencedores, que por terem sido agraciados após meses de disputa, encontram-se de parabéns.

1 - Portela

São vinte e uma estrelas que brilham no meu olhar
            Se eu for falar da Portela não vou terminar
            Lá vem minha águia no céu da paixão!
            O azul que faz pulsar meu coração!

            Oh! Majestade do samba
            Meu orgulho maior é tua bandeira!
           Chegou minha Portela! Meu eterno amor!
           A luz de Oswaldo Cruz e Madureira

Ótimo casamento da melodia com a letra.

O tema para mim é muito “aberto”, mas o samba foi bem mais feliz, exatamente porque fugiu do abstrato e colocou como mote principal o amor do portelense à escola de Madureira.

Para mim, o melhor samba escolhido de 2009. Tem um quê de nostalgia que contagia e nos faz relembrar carnavais passados, da própria Portela.

É e exatamente a simplicidade que os autores abordaram o tema que fascina neste samba. Pois todos sabem que para falar de Portela, não há como terminar, pois ela se traduz por si mesma.

A melhor parte para mim é exatamente a destacada, que exalta a Portela.

A parte inicial, para servir a proposta de enredo, é um pouco complexa, já que tenta em poucos versos retratar vários aspectos abordados na sinopse, que deverão estar plasticamente representados na avenida.

E como estamos na era do merchan, é bem provável que os caminhos da Índia, explorados no enredo, façam com que a escola atraia os atores da próxima produção global e consiga na mídia e na próxima novela da emissora transmissora do carnaval a divulgação para o samba.

Esse hino de amor à escola de Madureira tem o dom de conquistar os ouvintes de cara, até porque num mundo tão cheio de violência, nunca é demais exaltar o amor, que anda sumido de alguns lares neste mundo globalizado.

2 - Império Serrano

Toda a corte engalanada
Transformando o mar em flor
o Império enamorado
Chegar à morada do amor

O Império poderia ter se inspirado na Portela e ter trazido um novo samba para a releitura do seu enredo. O samba escolhido para reedição não é dos melhores da história do Império Serrano.

A escola de Madureira teria sambas lindos e clássicos, mas optou por escolher um samba, que apesar de não ser excelente, permite a carnavalesca, em termos plásticos, fazer um belo visual no desfile.

Acho que o excesso de gravações desse samba, tanto pela MPB, quanto para desfile, prejudica um pouco a avaliação dos jurados, pois ele foi realizado para outro tipo de desfile, outra época. Mas, não deixa de ser um bom samba.

3 - Mangueira

É sangue, é suor, religião
Mistura de raças num só coração
Um elo de amor à minha bandeira
Canta a Estação Primeira

Não é nenhuma obra prima, em se tratando de Mangueira, acostumada a levar grandes sambas para a avenida. Mas a má impressão da sinopse foi compensada pelo samba.

A melodia é bastante valente, a letra não é de todo especial, mas fez um bom casamento com a melodia e o samba ficou redondinho.

4 - Mocidade

Nos olhos da arte, reflete o legado
O gênio imortal, do bruxo amado
Que deu ao jornal, um tom verdadeiro
Apaixonado pelo Rio de Janeiro

Um samba normal. Poderia até se exigir um pouco mais de lirismo, tendo em vista, principalmente, a vasta obra de Machado de Assis.

O samba tem dois motes. Em relação a Machado de Assis, ele remete à época bucólica do Rio vivida pelo homenageado e a sua personalidade em prol de sua vasta obra. Já em relação a Guimarães Rosa, a obra sobrepõe o local e a sua condição particular, mas nada que comprometa a mensagem principal do samba.

5 - Salgueiro

Vem no tambor da academia
Que a furiosa bateria... vai te arrepiar!
Repique, tamborim, surdo, caixa e pandeiro
Salve os mestres do Salgueiro

A melodia desse samba é bem valente e mexe com os brios até de quem não é salgueirense. Em relação à letra, ficou faltando algo, talvez propositalmente, já que a relação do som do tambor com a bateria das escolas de samba é o mote principal deste tema da escola tijucana.

O samba seguiu a proposta da sinopse, é cheio de palavras soltas, que falam por si e refletem o tema do Salgueiro para o carnaval de 2009.

As pequenas pausas utilizadas em excesso no corpo da letra do samba são excessivas. Se tal recurso fosse dosado, com certeza o samba ficaria bem melhor.

O samba serve aos propósitos da escola, mas está longe de ser o “samba” do carnaval carioca de 2009.

6 - Porto da Pedra

Um grande painel é arte
Eu traço a pincel meu estandarte
E lá do céu vem o cinzel da perfeição
Renascimento da inspiração

O samba não é ruim, mas devido ao enredo, que é subjetivo, foge da linha de construção dos sambas anteriores da escola, que tem começo, meio e fim.

A letra é bem construída, a melodia é interessante, mas a mensagem do samba não é assimilada de imediato.

Não há no contexto do samba uma proposta clara do que seja o enredo da escola, e isso dificulta muito a sua leitura.

Não consegui fazer uma conexão da curiosidade com os elementos trazidos na sinopse, e, consequentemente, no samba. Mas isso não é culpa dos compositores e sim da sinopse, que não foi concisa e objetiva.

7 - Beija-Flor

No chuveiro da alegria
Salve! As águas de oxalá, embala eu babá
Feito um rio de magia que deságua luxo e cor
Banhando o povo vem a Beija-Flor

Para esse enredo ousado da Beija-flor não era de se esperar um excelente samba, mas até que o escolhido pela escola cumpre bem o seu papel.

O refrão principal foi muito feliz. O refrão do meio é fraco. Se as pessoas prestarem atenção, verão que a letra está encadeada e retrata fielmente o enredo.

Isso é um ponto positivo, mas, no geral, o samba não conseguiu traduzir o que Laíla desejava: samba mais leve e de fácil comunicação com o público.

8 - Vila Isabel

Nas rimas da minha poesia
O meu Rio de Janeiro
Derrubava o passado e erguia
O cenário pra encantar o mundo inteiro

Não gostei muito dos refrões. Acho os trocadilhos desnecessários e desconexos com o enredo, que é bem clássico.

O samba poderia ter optado por uma linguagem mais poética e não vi retratado no samba a figura de João do Rio, que pela sinopse, seria o condutor do enredo.

Mas está no nível dos demais e principalmente vem na linha adotada pela escola nos últimos anos.

9 - Unidos da Tijuca

Cruzou o céu no limiar do infinito
O meu Borel visto de cima é mais bonito

Os compositores optaram por mostrar a viagem astral da Tijuca por alguns elementos presentes no enredo. Mas senti que não houve um encadeamento perfeito.

Como se trata de um tema, não há compromisso em se contar uma história com começo, meio e fim.

O samba poderia ser mais poético ou optar pelo lado científico. Ficou no meio termo, e, talvez por isso, não tenha uma assimilação fácil, não agradando nem a gregos e nem a troianos.

Além de alguns clichês soam desnecessários. Não entendi a parte que fala do carrossel infantil e sua relação com a constelação da Tijuca.

10 - Viradouro

A Viradouro pede axé
Caô, Xangô, Iansã, Yalodé

Até que para a sinopse, os compositores conseguiram fazer um samba razoável. Aliás, é bem melhor que o do ano passado.

Se pudermos olhar um ponto positivo no samba, é que ele foge do óbvio dos sambas sobre a Bahia. Mas está longe de ser um samba melódico.

A ligação dos orixás com a essência do enredo, biocombustível, não restou clara na sinopse e muito menos no samba.

As construções melódicas do samba não foram inovadoras, o refrão principal lembra até um samba antigo da própria Viradouro. A letra também não ousou.

11 - Imperatriz

Com Lamartine és a mais bela
Liberdade, liberdade na Passarela

Como disse, esperava bem mais de um samba que pretende exaltar o jubileu de ouro dessa maravilhosa escola de Ramos.

Para mim, essa relação do samba com o samba Palpite Infeliza pareceu forçada e inapropriada. Aliás, eu não gostei nem mesmo do título do enredo e o samba peca ao colocar no refrão principal essa conexão com a Vila Isabel.

A letra não é ruim, mas pareceu que deixou a melodia meio arrastada. As rimas são um pouco óbvias e faltou muita história da Imperatriz no samba.

12 - Grande Rio

Minha alma é tricolor!!
O meu orgulho é minha bandeira.

A sinopse da Grande Rio era rica em história e em detalhes, mas o samba não conseguiu ser tão feliz quanto à sinopse.

O samba chega a ser irregular (a primeira parte possui estrofes longas, a segunda parte é mais curta). A repetição de rimas também compromete um pouco (brilhar, comemorar, revelar, encontrar, olhar) e possui excesso de fonemas muito próximos que comprometem as rimas anteriores (paixão, evolução, nação, mão, união).

As expressões francesas usadas em excesso tornaram o samba cansativo. Não é um samba ruim, mas parece que faltou uma pegada.


denisefatima@gmail.com