Nascido em 27 de abril de 1940, no Morro da Mangueira, Aroldo Santos
começou a cantar e sambar bem cedo na vida. Aos 10 anos, que
ironia do destino, o autor do megassucesso “Batida de
Limão”, vendia limão na feira, com molejo e
eloquência, próprios de qualquer garoto negro que usa de
sua peraltice para ganhar seu sustento. Começou a compor aos 12
anos, e logo ficou conhecido nas rodas de samba, por onde nasceu e por
onde andou.
Quando mais tarde, foi carregador de sacos de batata, pedreiro,
asfaltador de rua, pintor entre outras profissões
braçais. Mas não demorou para perceber que sua
força não estava só nos braços, mas na voz.
Seu umbigo ficou na Mangueira, mas Aroldo foi criado no Morro de
São Carlos, o berço do samba, onde viveu por 24 anos.
Participou da fundação do Bloco Vai Quem Quer, onde
começou como ritmista e vagou cantando por aí, por onde a
turma lhe pedia: bares, tendas, bailes, festinhas e batizados. Na
juventude, depois de ter feito mais de uma centena de músicas em
parceria, dizia que compunha até dormindo. “É
só arrumar uma mesa para fazer um acompanhamento e já sai
alguma coisa”.
Como compositor e puxador de samba pertenceu a vários blocos
carnavalescos: Vai Quem Quer, Acadêmicos do Catumbi (com o samba
“Primeira vez”, que foi o seu debutar como autor em
agremiações carnavalescas), também no
Império do Pavão (bicampeão com “Baile das
Rosas” e com “Histórias do Rei Baltazar”, de
parceria com Dino); Independente do Pavãozinho (campeão
com “Zumbi dos Palmares”), de parceria com Wilson Simonal
do Cantagalo); Unidos do Cantagalo (onde apareceu com “Deixa
comigo”); e posteriormente fez parte da ala dos compositores do
Bafo da Onça.
Aroldo Santos constou como inscrito na Federação dos
Blocos Carnavalescos do Estado do Rio de Janeiro como compositor do
GRBC Unidos do Cantagalo.
Garboso, elegante e boêmio, os mais de um metro e oitenta de
altura, sempre alinhados, era cobiçado pelas mulatas mais belas
do metiê. Sua primeira união foi com Marihinha, com quem
teve quatro filhos. Mas foi no Morro do Cantagalo, na zona sul carioca,
que seu coração bateu mais forte: casou-se com a mulata
Marlene, com quem completou a prole de 12 filhos, até onde se
sabe. Como dizia Aroldo: “um time com reserva”.
Figura fácil no meio do samba, o negão das camisas
listradas e calças no estilo, da voz firme mas aveludada, fazia
parte do burburinho radiofônico.
Amigo de personalidades como Adelzon Alves, Carlos Imperial e Oswado
Sargentelli, Aroldo reclamou, em 1967, a autoria da música
“A praça”, aquela lançada por Ronnie Von e
creditada a Carlos Imperial. Nunca foi provado a veracidade do
plágio, ou se era um acerto entre amigos para
divulgação da música, haja vista que as partes
mantinham uma grande amizade e Carlos Imperial já se fazia
conhecido como o “Imperador da Pilantragem”. Mas é
fato de que a disputa ocupava as mídias e programas musicais e
impulsionava a venda do disco.
Em parceria com seu velho amigo Murilo, gravou em 1970 dois sambas:
“Tempo de criança”, juntamente com Adão dos
Santos, e o “Gazeteiro”, com Eny Silva. Estas obras tiveram
uma ótima aceitação no 1º Festival da
Música da Favela e lhe rendeu o 3º lugar, cativando suas
respectivas participações no LP que o evento gravou na
época.
Vale frisar que Festival de Música da Favela condicionava as
participações à representação de
agremiações. Foi um empreendimento idealizado e
coordenado pelo visionário Etevaldo Justino de Oliveira –
então presidente da Federação das
Associações de Favelas do Estado da Guanabara (FAFEG)
– revelando muitos cartazes que hoje integram os quadros da
música popular brasileira. Dedicado exclusivamente aos moradores
das favelas cariocas, o evento cresceu ano a ano, movimentando na sua
longa fase classificatória, milhares de pessoas.
Em 1972 gravou o samba “Amor, amor”, de autoria de Maria
Luiza, filha de Carlos Imperial, que o bloco carnavalesco Bafo da
Onça apresentou na avenida no carnaval de 1973. Participou
também do álbum lançado pela
Continental/Musicolor, Samba Enredo 73, interpretando “ABC do Carnaval”, de Gibi e Toco.
Em 1974 participou do LP Turma do Pagode,
formada por sambistas cantores e compositores: Paulo Carcará,
Zé Carlos, Guaraci, Pola Hyldon, Délcio Carvalho,
Flávio Moreira, Ary do Cavaco, Neném da Cuíca,
Marlene e Zélia, Janice e Edson Costa, e Osvaldo do Meier, todos
contratados pela gravadora Philips. A turma do pagode foi formada pelo
produtor Hyldon Souza. A empresa encarregou o grupo da
divulgação do disco, era a condição para as
possíveis próximas gravações acontecessem.
Na época, Aroldo Santos declarava: “Com o disco, ando meio
desanimado. Só gravo em pau de sebo!” – uma
espécie de long play
produzido pelas gravadoras com diversos artistas e nenhum tratamento
artístico, servindo apenas para cumprir a lei que rege a
música nacional, e também para descarregar o imposto de
renda das fábricas.
Figura conhecida nas rodas de samba, com sua voz firme, melódica
e clara, passou cada vez mais a interpretar sambas em clubes e casas de
show. Dizem até que supria honrosamente a ausência do
difícil Jamelão, cujo estilo lembrava pela forma
insinuante de cantar.
Vila, Casa de Bamba, Minerva realizaram a exposição de
Aroldo Santos, que em 25 de abril de 1975, numa sexta-feira às
vésperas de seu aniversário, teve seu LP solo
lançado pela Top Tape, com o nome de “Até que enfim”,
com músicas próprias ou com parceria com compositores do
Morro do Cantagalo e São Carlos, além de interpretar
sambas de Nelson Cavaquinho, Silas de Oliveira, Noca da Portela,
Jorginho do Império, Gracia do Salgueiro, dentre outros. Aroldo
Santos inaugurava ali o cast nacional da gravadora que foi muito
importante para o samba, sobretudo nas décadas de 70 e 80.
Levando consigo a voz do sambista mais humilde, o lançamento do
disco de Aroldo significava uma retomada do que havia de mais nativo na
nossa música, numa época em que o investimento das
produtoras no samba se dava na maioria das vezes por artistas que
não vivenciavam efetivamente o que cantavam.
Apesar de a música carro-chefe do LP “Até que enfim”
ser a mesma que deu nome à obra, foi na “Batida de
Limão” que Aroldo teve sua voz ecoada pelas rádios
do país inteiro. A melodia, de fácil
aceitação e ritmo alegre e descontraído, carregava
na letra simples e na voz do morro, mesmo sendo uma obra bem comercial
para a época.
“Batida de Limão”, com seu ritmo de samba-merengue,
deu a Aroldo Santos sua projeção musical. Não
seria leviano dizer que o cantor fez dos limões que a vida lhe
deu uma batida que deixou todo mundo doidão. O próprio
Aroldo disse nos bastidores que a música era um recado à
onda hippie que se expandia na época: “corta essa bicho (...) limão é o maior barato (...)”.
Uma mensagem para os usuários de drogas, especialmente os
hippies, sem discriminá-los, dizendo que é melhor curtir
batida de limão do que outras coisas mais pesadas. Por isso o
verso “corta essa bicho”, que era uma forma de se comunicar com os hippies da época.
Nos discos de carnaval, Aroldo “Gogó de Ouro” botou
voz no samba “O Negro de Ontem e de Hoje”, de autoria de
João Cabral Bororó, pelo bloco carnavalesco Unidos do
Cantagalo em 1975. Chegou a interpretar num compacto simples o
memorável samba “Arte negra na legendária Bahia”,
que a Unidos de São Carlos apresentou no carnaval de 1976. No
mesmo ano, foi intérprete da União de Jacarepaguá,
que obteve o 3º lugar do Grupo 2, com “Acalanto para Uiara”, de Norival Reis, Joel Menezes e Vicente Mattos.
Aliás, Norival Reis, o famoso Vavá da Portela, contava
saborosas histórias sobre a gravação deste samba,
que ganhou o Estandarte de Ouro no carnaval de 1976. Vavá era o
produtor e engenheiro de som do disco de sambas enredo do Grupo 2 e
dizia que Aroldo estava bastante nervoso na sessão de
gravação e tinha dificuldades com os versos “canto / meu canto é o acalanto...”,
pois em vez de cantar “acalanto”, cantava
“alcalanto”. Vavá, que era um gênio dos
estúdios, interrompeu diversas vezes quando Aroldo dizia
“alcalanto”. Até que uma hora o produtor, conhecido
por ser extremamente debochado, perdeu a paciência, suspendeu a
sessão e disse: “Aroldo, vai no microfone e começa
a cantar em ritmo de samba que você é um tremendo de um
filho da p***”. Os dois caíram na gargalhada e após
a descontração Aroldo finalmente conseguiu gravar
corretamente a faixa.
Embora o primeiro disco solo tenha tido uma vendagem expressiva, Aroldo
Santos não conseguiu deixar o barraco do Morro do Cantagalo. O
desamparo da gravadora que muito lucrou com seu trabalho, e a
questão dos direitos autorais mal pagos, sequer deu-lhe
condições de concretizar seu desejo de mudar com a
família para uma casa no asfalto.
Em 1976, Aroldo lançou seu segundo LP, Grito Negro,
que apesar de toda a espetacular crítica dos meios de
comunicação, não conseguiu alcançar o
sucesso do primeiro. Em 1979, veio o terceiro trabalho
fonográfico, Vendaval da Vida.
Em 1985, no dia 16 de abril, Dia Mundial da Voz, o Gogó de Ouro
partia por problemas pulmonares. Foi uma partida até discreta,
dada a importância do moço para o carnaval. Uma
discrição justificada pelo turbilhão que o
país vivia naquele ano, pois a hospitalização do
presidente Tancredo Neves ocupava quase a totalidade dos
noticiários.
Entre os 12 filhos, Aroldo Santos deixou o radialista André
Gasparetty, além de Léo, José e Marquinhos,
responsáveis pelo projeto Resgate do Samba, sediado no Complexo
Cantagalo, Pavão e Pavãozinho, onde garimpam e zelam pela
memória cultural da comunidade.
Em 2022, será homenageado pela Alegria da Zona Sul, que
desfilará na Série Prata na Intendente Magalhães
com o enredo "Até que Enfim... Aroldo Santos".
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Início: Blocos
carnavalescos da zona sul do Rio de Janeiro, como Império do
Pavão, Independente do Pavãozinho, Acadêmicos do
Catumbi e Vai Quem Quer, nos anos 60.
1972 e 1973 – Bafo da Onça
1974 a 1977 – Unidos do Cantagalo (intérprete principal)
1976 – Unidos de São Carlos (gravou o samba em um disco não oficial)
1976 – União de Jacarepaguá (intérprete principal, junto com Jairo Espingarda)
GRITO DE GUERRA:
Não tinha um grito de guerra específico. No disco de
1976, lançou "Esta é a União de
Jacarepaguá!"
CACOS DE EMPOLGAÇÃO:
“simbora gente”; “que beleza”; “vai, vai,
vai, vai”; “nossa senhora”; “que beleza, lindo,
lindo lindo”; “no gogó”.
DISCOGRAFIA SOLO:
LP Até que enfim (Top Tape, 1975)
LP Grito Negro (Top Tape, 1976)
Compacto simples – “Água na cabeça / Pau no gato” (Top Tape, 1976)
LP Vendaval da Vida (Tapecar, 1978)
Compacto simples – “Serenou / Sua Presença” (K-Tel, 1981)
DISCOGRAFIA DE CARNAVAL / COLETÂNEAS
LP 1º Festival de Favelas (Caravelle, 1970)
LP Carnaval – 73 (Musicolor/Continental, 1972)
LP Turma do Pagode (Polyfar/Philips, 1973)
LP Sambas-Enredo 73 (Musicolor/Continental, 1973)
LP Escolas de Samba Enredo 75 (Tapecar, 1974)
LP Blocos de Enredo RJ 1975 – faixa Unidos do Cantagalo (Tapecar, 1974)
LP Sambas de Enredo das
Escolas de Samba do Grupo 2 Carnaval 1976 – faixa União de
Jacarepaguá (AESCRJ/Top Tape, 1975)
Compacto simples “Arte
Negra na Legendária Bahia”, samba enredo da Unidos de
São Carlos 1976 / “Seu colorido é
tradição” (Tapecar, 1975)
LP Carnaval 78 (RCA Camden, 1977)
LP Samba, sambão (GTA Records – Itália, 1978)
LP Samba dá saudade (Som Livre, 1981)
LP/CD Samba que te quero sempre 2 (Som Livre, 1992)
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