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Os sambas de 2011 - São Paulo
Os sambas de 2011 - Grupo Especial (São Paulo) por Ronaldo Figueira

Pelo terceiro ano consecutivo, as agremiações dos grupos especial e acesso mantiveram a divisão entre duas entidades representativas: Liga e Super Liga. Assim, novamente temos dois CDs produzidos separadamente: o da Liga com nove escolas e o da Super Liga com as outras cinco, além da presença de todas as agremiações do Grupo de Acesso no CD de sambas.

Por um viés ideológico, irei fazer minha análise seguindo a ordem como se houvesse apenas UM CD, pois espero que isso volte a acontecer logo!

GRAVAÇÃO DA LIGA: Gravado no auditório Elis Regina, no pólo cultural, o CD da liga é “ao vivo”, com uma qualidade invejável. É fácil ouvir com clareza todos os instrumentos e as cordas estão em bom volume. O andamento está ótimo para um CD, que se preza a divulgar e fazer conhecer as letras e melodias das obras. Na minha opinião é a melhor produção desde 2004, ano da última gravação no estilo. Nota da gravação: 9,5

GRAVAÇÃO DA SUPERLIGA: Propagandeado como a inovação em gravação digital, o CD da Super Liga pode ser resumido em uma palavra: decepção. A tentativa da produção em dar um clima o mais ao vivo possível é louvável, mas as faixas ficaram com uma péssima qualidade. Sambas excelentes, como Vai-Vai e Mancha Verde, tiveram suas audições prejudicadas pelo andamento “afrevado” da bateria e a desconexão evidente entre cordas e coro. Nota da gravação: 6,5

ROSAS DE OURO: Estilão parecido com os sambas de refrões felizes e soltos da Rosas de Ouro na década de 1990 (o que é excepcionalmente bom). Aliás, o samba tem o mesmo estilo e parceria de compositores do emocionante samba de 2009. A letra apresenta as partes do enredo com criatividade e clareza. Mesmo sem prestar tanta atenção, nas primeiras audições você percebe todo o desenvolvimento do enredo (que não é lá muito complexo, é verdade, mas tem começo, meio e fim, um desenvolvimento conciso. É um bom enredo). Vi e ouvi algumas pessoas comentarem à respeito do excesso de rimas terminadas em "ar", mas não acho que seja um problema. Rimas repetidas em excesso só são problema quando esse excesso torna o samba repetitivo, monótono, o que, definitivamente, não acontece nesse, que é um dos melhores do ano. Nota: 9,8

MOCIDADE ALEGRE: Escola supercampeã da década passada, já aprendeu com a Palmirinha a receitinha do sucesso e não conta pra ninguém. Pelo menos os aspectos mais externos dessa política a gente pode perceber. Um bom exemplo é o estilo de desenvolvimento do samba e do enredo: novamente abstratos, parecido com 2010. A semelhança entre os enredos e sambas é notável. A proposta é boa, a letra esclarece bem a história relativamente complexa e os versos de efeito não poderiam deixar de marcar presença, como em "viagem de encanto e sedução". A melodia não chama a atenção nem pela qualidade nem pela falta dela, mas é bastante funcional e segura bem a harmonia de uma escola de samba paulistana grande, como a Mocidade Alegre. É bom, mas dá uma pena se comparado com os sambas arrasa-quarteirão do período 2003-2007. Nota: 9

VAI-VAI: Com um enredo sobre um personagem distinto daqueles que normalmente vemos em escolas de samba, o Vai-Vai traz o melhor samba do ano. A melodia é de qualidade, tanto para sustentar um bom desfile quanto para ser ouvida durante o ano (e durantes os próximos vários anos). Pena que a gravação joga um balde de água fria; além da tremosite já em estado avançado do intérprete Wander Pires. Desejo melhoras. Nota: 9,9

MANCHA VERDE: O enredo, que passa por vários períodos históricos, parece o único do estilo que não fala do Egito (e isso é bom, porque eu já posso me dizer egiptólogo de tanto desfile sobre essa civilização que já vi). O samba representa muito bem, com uma melodia pra cima, que anima e ao mesmo tempo potencializa o poder poético da letra. A única ressalva é quanto à utilização do recurso de divisão silábica em: "U-ma i-de-ia ge-ni-al". A letra tem qualidade constante, deixa a proposta do enredo clara e tem seu ponto alto em "Um mundo sem ódio e rancor / onde o maior valor seja se expressar / larguem minha fantasia / eu quero sambar". A proposta dos compositores em unir poesia e modernidade foi bem sucedida. Nota: 9,7

GAVIÕES DA FIEL: Letra e melodia seguem à risca o já clássico "Manual do compositor paulistano do século XXI - como vencer disputas de sambas-enredo"; A fórmula deu certo: vestindo a camiseta de uma co-irmã do mesmo grupo, venceram em cima do ótimo samba do Grego. O samba é tão genérico que a semelhança melódica com o refrão da Grande Rio de 2009 é evidente ("A força de um povo que revoltado, se uniu / Cruzou fronteiras movimentando meu Brasil / Tenho o anseio de alcançar... /Liberdade! / Meu lema é egalité, freternidade" e "De carona na folia vem ver / A cidade do futuro vai passar / Embala meu sonho na realidade / O combústivel da felicidade!"). A situação é tão deprimente que se “São Paulo Aquariana" entrasse nessa eliminatória, seria derrotado. Nota: 6,1

VILA MARIA: A escolha desse samba foi muito criticada pela própria comunidade da Vila Maria, que estava dividida entre os outros dois finalistas. A obra é correta e passa bem a proposta do carnavalesco. O refrão principal é muito forte e é a melhor parte do samba, que oscila muito, chegando ao verso de gosto duvidoso "Apesar da ventania a luz não se apagou". A melodia é de qualidade, mas é inconstante; O que pode ser até bom, já que mesmo no CD isso deu um dinamismo a mais ao samba. O ponto alto melódico é na subida repentina em "Ressurgiu com lindos festivais". Nota: 8,7

IMPÉRIO DE CASA VERDE: O samba é amargo que nem cerveja, a letra é cheia de todacrilhos "irreverentes" e engraçadinhos, como o início deste parágrafo. A fusão dos dois finalistas foi bem executada, resolvendo problemas de ambos os sambas (e, ao contrário de 2010, dando uma unidade melódica, ficando imperceptível que eram duas obras distintas). O samba é leve e bem pra cima, assim como as fantasias e o enredo. O ponto alto, tanto em letra quanto em melodia, é a homenagem à madrinha da escola, Camisa Verde e Branco, que foi campeã em 1991 com um enredo também sobre a cerveja. Apesar de não ser um samba exatamente bonito, é funcional e agradável de ouvir. Conta bem o enredo de acordo com a sinopse e é um bom candidato a notas boas pelos jurados oficiais (afinal, a mais nova sensação, que não é tão nova assim, é o 10). Entretanto, numa avaliação pessoal de um sambista, alguns versos de gosto duvidoso e o merchandising implícito doem no ouvido. Nota: 8,5

ACADÊMICOS DO TUCURUVI: Um samba que não me agradava muito durante as eliminatórias da escola e que sempre me chamava a atenção por citar que os nordestinos migraram... Em busca de um lugar ao Sol! Muitos foram contra essa escolha. Nos fóruns de Internet, até o descenso da escola foi previsto, por causa do samba. No fim, depois de colocada a voz de Freddy Vianna, um dos melhores intérpretes de São Paulo, e a excelente bateria do Mestre Adamastor, passa como um dos melhores sambas do ano. Melodia interessante, com pontos altíssimos em "um sorriso é a moldura do meu traço cultural" e "sonho ou realidade? vou construindo ilusão"; A letra conta bem o enredo, sem furos ou clichês. Nota: 9,2

X-9 PAULISTANA: Samba que muito me agradou nas eliminatórias pela sua qualidade e a bela interpretação de Bruno Ribas. Mas como uma mexida aqui outra ali pode desandar o bolo, foi isso que aconteceu. A interpretação de Zé Paulo é péssima e torna o samba o pula faixa do ano. A aceleração inexplicável da bateria piora ainda mais a audição da faixa. Nota: 8,5

PÉROLA NEGRA: A letra passa bem o enredo, que é um pouco confuso, sem nenhum trecho que tenha destaque ou me chame atenção. No geral, a letra é muito boa. A melodia é bem pra cima, mas reciclada de 2010 que, por sua vez, é reciclada de 2009 que é de 2007, enfim flash back total... Nota: 8,3

ÁGUIA DE OURO: A fusão desastrosa gerou esse samba que é, no mínimo, peculiar. Variações melódicas diversas, mas sem qualquer sequência lógica tornam esse samba o verdadeiro Boi com Abóbora de 2011. A letra passa um enredo confuso, sem ligação entre as partes. A melodia nos versos sobre Nero é tão estranha que chega a ser engraçada. Estou até agora tentando encontrar a relação entre seres naturais e viola caipira. Nota: 5,4

TOM MAIOR: O samba, da parceria de João Osasco, compositor que era da Rosas de Ouro, é muito bom. A letra não faz milagre com o enredo mais ou menos sobre São Bernardo. Cumpre bem seus objetivos regulamentares de contar a história, mas essa história começa daquele jeito que a gente já conhece sobre cidades do interior de São Paulo: bandeirante, jesuíta, a igrejinha, indiozinho feliz... Mas bem linear e conciso. Inclui momento trash "do carro tu és a capital" e "É você! / A cidade que embala as crianças". A parte "polêmica" fica por conta do desenvolvimento natural do enredo, ao final, onde São Bernardo se diferencia de "qualquer" cidade paulista e passa a ter uma importância nacional única: o movimento sindical, as greves de 1980, o partido dos trabalhadores e o sindicalista-depois-presidente Lula. Coloquei polêmica entre aspas porque é absolutamente desnecessária: a Tom Maior apenas fez seu enredo colocando um personagem que faz parte da história contada e que julgou ser importante. Está encaixado dentro do desenvolvimento do enredo e é isso que importa. O resto é ruído. A melodia é correta, interessante e, se não excepcional, se destaca por se diferenciar dos sambas-receitinha. Enxergo essa mudança de estilo da Tom Maior, que vinha escolhendo sambas de Maradona e cia., com bons olhos. Nota: 9

NENÊ DE VILA MATILDE: Uma das escolas mais tradicionais de São Paulo vem escolhendo desde 2009 sambas do Cláudio Russo, consagrado compositor carioca. Ora, a senhora NENÊ DE VILA MATILDE tem uma ala de compositores de se equiparar com qualquer grande escola carioca (como o carnaval de São Paulo, que apesar do orçamento menor, é em qualidade musical equiparável, sim, ao Rio de Janeiro). Seria normal se os sambas dele tivessem a mesma qualidade e primor que os levados pela escola até o carnaval 2008. A obra de 2011, pelo menos, traz como um dos nomes o de Santaninha, compositor já da Nenê. O reflexo disso, pelo menos a parte que eu enxergo, é uma qualidade melódica melhor que 2009/2010, passando-se melhor por um samba paulistano (mas ainda longe do que eu considero a cara da Nenê). A letra segue a fórmula: enredo ok, desenvolvimento ok, poesia nem tanto. No geral é boinha até, mas tem o seu momento de gosto duvidoso entre "Mas atenção" e "Seu exagero prejudica o coração". Para compensar, os versos seguintes fazem qualquer matildense se arrepiar e querer cantar junto: "Superação, comunidade matildense em união! / Suou, sangrou e até chorou / Agora em festa a zona leste que voltou!". Nas eliminatórias, o samba que me emocionou e fez sentir o gosto da verdadeira nenê é o da parceira de Nenê a Adriano Bejar, por acaso os compositores do samba de 2008. Infelizmente minha escola optou pelo samba da parceira carioca. Nota: 7,8

UNIDOS DO PERUCHE: Outra escola tradicionalíssima no samba de São Paulo, a Peruche vem de um passado de inconstâncias, subindo em um ano e caindo em outro. O samba em si não tem nada demais. Usa todos os clichês para falar sobre o teatro que já vi na vida ("Podem aplaudir", "O espetáculo vai começar", "As cortinas vão se abrir", "O erudito ao popular", "Bravo, bravissimo", "A plateia delirar"), fora os clichês bonitinhos não relacionados diretamente à teatro (um exemplo só, pra não esticar: "O futuro é agora"). O desempenho dos interpretes na gravação e da bateria deixam o samba pesadíssimo e arrastado, o que pode ser perigoso se levado pra avenida. Nota: 7,5


OBS: Ronaldo Figueira será o novo colunista da Samba Paulistano no SAMBARIO, em substituição a Weinny Eirado, que precisou deixar o site por motivos particulares. Ao Weinny, sucesso e muito obrigado pela extraordinária colaboração que você prestou ao site dos sambas-enredo. Ao Ronaldo, seja bem-vindo ao time!